Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
69/13.8TTLRS.L2-4
Relator: SEARA PAIXÃO
Descritores: CADUCIDADE DO DIREITO DE APLICAR A SANÇÃO DISCIPLINAR
PROCESSO DISCIPLINAR
CELERIDADE PROCESSUAL
DEVER DE LEALDADE
JUSTA CAUSA DE DESPEDIMENTO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 06/29/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Sumário: Nos termos do art. 357º nº 1 e 2 do CT o empregador dispõe de 30 dias para proferir a decisão de despedimento, sob pena de caducidade do direito de aplicar a sanção. Este prazo conta-se a partir da data da conclusão da última diligência de instrução.
Não se mostra violado o princípio da celeridade processual pelo facto de o processo disciplinar ter estado parado entre diligências durante cerca de dois meses, porque o legislador não fixou prazo para a realização das diligências probatórias, para além do referido no nº 3 do art. 329º do CT, nem caducou o direito da entidade empregadora aplicar a sanção do despedimento porque o prazo de 30 dias a que alude o art. 357º nº 1 e 2 do CT conta-se a partir da última diligência de instrução.
Viola o princípio da lealdade o trabalhador que, sendo vendedor, comunica à sua entidade empregadora que visitou determinadas lojas no âmbito da sua actividade e não o fez, o que consubstancia justa causa de despedimento, nos termos do art. 351º do CT.
(Elaborado pelo relator)
Decisão Texto Parcial:Acordam na secção social do Tribunal da Relação de Lisboa:

 

Relatório

AA, vendedor, NIF (…) residente na Rua (…), Loures instaurou a presente ação especial de impugnação da regularidade do despedimento contra BB, SA, NIPC (…), com sede no (…), pedindo que seja declarada a ilicitude ou a irregularidade do despedimento de que foi alvo, com as legais consequências.

Teve lugar a audiência de partes (fls. 24 e 25), não se tendo logrado a conciliação entre as partes.

Regularmente citada, a entidade empregadora apresentou articulado a motivar o despedimento (fls. 26 a 55), afirmando que o mesmo ocorreu na sequência de processo disciplinar regular e que se verificou a prática pelo trabalhador de factos integradores de justa causa de despedimento, porquanto o autor no exercício das suas funções de vendedor não realizou as visitas às lojas que declarou à entidade patronal ter realizado, o que pôs em causa a relação de confiança necessária entre o autor e a ré até porque o autor prestava funções fora do escritório, com autonomia, o que exige uma especial confiança.

Notificado o autor/trabalhador contestou a fls. 368 a 400, por excepção e por impugnação. Por excepção invocou a caducidade do procedimento disciplinar, por ter sido ultrapassado o prazo previsto no art. 329.º, n.º 2 do CT e a caducidade do direito da entidade patronal a aplicar a sanção de despedimento, nos termos do art. 357.º, n.º 1 e 2 do CT. Para fundamentar estas excepções alegou, no que se refere à primeira, que o procedimento prévio de inquérito não foi conduzido de forma diligente e que a nota de culpa não foi notificada até 30 dias após a conclusão do referido procedimento. Quanto à segunda excepção o autor alega que a Ré excedeu o prazo de 30 dias para proferir a decisão de despedimento, prazo este que se conta desde a última diligência probatória, ou seja desde 09/10/2012, pois que a diligência realizada em 26/12/2012 foi apenas uma mera manobra de ilusão, logro e engano com o objectivo de tentar sanar e encapotar tardiamente a circunstância de já ter caducado o prazo e o direito da ré em aplicar qualquer sanção disciplinar ao autor.

Conclui, pedindo que seja declarada a ilicitude do despedimento do autor e a ré condenada a pagar-lhe:

a) 23.816,00€ de indemnização pela antiguidade, correspondente a 45 dias de retribuição mensal, atendendo ao valor desta e ao grau de ilicitude do despedimento;

b) as retribuições vencidas e vincendas, incluindo os subsídios de férias e de Natal, que o autor deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento, sendo já devida, à data da contestação (maio de 2013), a quantia de 7.144,80€;

c) 20.000,00€ de indemnização por danos não patrimoniais;

d) os juros de mora calculados à taxa legal sobre as importâncias acima peticionadas, contados desde a citação até efectivo e integral pagamento.

Respondeu a ré, nos termos do art. 98.º- L, n.º 4 do CPT, a fls. 490 a 503, pugnando pela improcedência das excepções invocadas por entender terem sido respeitados todos os prazos legalmente previstos.

A fls. 504 a 512, foi proferido saneador-sentença que julgou procedente “a arguida excepção de nulidade do processo disciplinar, por caducidade” e, consequentemente, declarou “ilícito despedimento de que o autor foi alvo, nos termos do disposto no art. 382.º, n.º 1 do CPT” e condenou a ré a pagar ao autor as retribuições que este deixou de auferir e uma indemnização por antiguidade.

Houve recurso desta decisão e por acórdão do Tribunal da Relação, junto a fls. 630 a 636 (IV volume), que transitou em julgado, foi decidido:

“1) Julgar improcedente a excepção de caducidade do procedimento disciplinar;

2) Não conhecer da excepção da caducidade do direito de aplicar a sanção de despedimento;

3) Determinar o prosseguimento dos autos.”

Regressados os autos à 1ª Instância, procedeu-se à realização da Audiência de Discussão e Julgamento, que decorreu em várias sessões, com observância do legal formalismo, tendo o autor – a fls. 817 – acta de 28/0472015 – declarado que em caso de procedência da ação optava pela indemnização em substituição da reintegração.

           

Elaborada nova sentença, foi proferida a seguinte decisão:

“Por todo o exposto:

I - Declaro a ilicitude do despedimento do Trabalhador AA;

II - Condeno a Empregadora BB, SA a pagar ao autor AA, as seguintes quantias:

a) As retribuições vencidas entre 04/01/2012 (rectificado, a fls. 983, para 4/01/2013) até ao trânsito em julgado da presente sentença. Ao montante dessas retribuições, serão deduzidas as importâncias que o Trabalhador tenha obtido com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento. os montantes do subsídio de desemprego que tiver auferido, devendo, neste caso, a Empregadora entregar essa quantia à Segurança Social e, ainda, os valores devidos pela segurança social nos termos do disposto nos artigos 98.º N e 0 do CPT.

b) €6390 (€ seis mil trezentos e noventa euros), a título de indemnização em substituição da reintegração, a que acresce o proporcional que se vencer entre o dia 20/07/2015 e o trânsito em julgado da sentença.

c) Os juros de mora à taxa de 4%, sobre as referidas quantias, a partir do trânsito em julgado da presente sentença e até integral e efectivo pagamento.

III - Absolvo a Empregadora do demais que contra si foi peticionado.”

A Ré, inconformada, veio arguir a nulidade da sentença (invocando as al. b) e c) do nº 1 do art. 615º do CPC) e interpor recurso da mesma, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões:
(…)
ee) Em conclusão, concedendo provimento a este recurso, deverá ser revogada a Douta Sentença em crise e julgada totalmente improcedente a acção intentada por ter sido corretamente e atempadamente aplicada a sanção de despedimento do A., aqui Recorrido).

O Autor, aqui recorrido, contra-alegou pugnando pela improcedência das nulidades invocadas pela Ré/recorrente e pela improcedência do recurso interposto pela Ré, na sua totalidade.

           

O Autor interpôs também recurso da mesma sentença, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões:

(…)

Termos em que, pelo exposto, deve ser julgado procedente o presente recurso de apelação e alterada a sentença recorrida na parte impugnada desfavorável ao autor, no âmbito delimitado pelo objecto da presente apelação, e, em consequência:

a) considerar que inexiste justa causa que permita à ré proceder ao despedimento do autor;

b) substituir o valor correspondente a 15 dias da indemnização devida em substituição da reintegração, fixando-a em 45 dias de retribuição base por cada ano completo de trabalho desde 19/04/2004 até ao trânsito em julgado da decisão judicial, atendendo ao valor desta e ao grau de ilicitude do despedimento, indemnização que nesta data se calcula em 25.938,00€, condenando a ré a pagá-la ao autor;

c) condenar a ré a pagar ao autor uma indemnização por danos não patrimoniais em quantia não inferior a 20.000,00€;

d) rectificar o erro material da sentença assinalado na presente apelação, alterando-a em conformidade com a verdade dos factos e da prova produzida nos autos; mantendo-se tudo o demais que o tribunal a quo decidiu na sentença a favor do autor.

            A Ré contra-alegou pugnando pela improcedência do recurso interposto pelo Autor.

            Admitidos os recursos, foram os autos remetidos a este Tribunal da Relação.

            Colhidos os vistos legais, tendo o Sr. Procurador-Geral Adjunto emitido parecer no sentido da confirmação da decisão recorrida.

Cumpre apreciar e decidir.

Estão interpostos dois recursos, um interposto pela Ré e outro pelo Autor.

No recurso interposto pela Ré suscita-se a impugnação do ponto nº103 da matéria de facto provada e, em matéria de direito, impugna-se a decisão da caducidade do direito da Ré de aplicar a sanção do despedimento.

No recurso interposto pela Autor, também se impugna a matéria de facto, nomeadamente os factos dados como provados nos nº 6. a 8., 10., 12., 15. a 19., 24., 26., 29., 30., 33., 34., 38. a 40., 43. a 47., 49. a 59., 61., 67. a 74. e 87., bem como o ponto n.º 8 dos factos não provados e, quanto à questão de direito, suscita-se a questão da inexistência de justa causa e consequente condenação da Ré.

Fundamentação de facto

 Factos provados:

1. O A. Desempenhou as funções de Vendedor, na empresa “BB, SA” desde 19/04/2004 até ao dia 03/01/2013; (art. 19.º AMD)

2. O A. trabalhou em isenção de horário, mas com obrigação de prestar, semanalmente, o período de 37,5 horas semanais, sendo que tem um período de trabalho de 37,5 horas semanais. (art. 20.º e 75 AMD)

3. As suas funções consistiam em fazer o acompanhamento das lojas onde os produtos da entidade empregadora são comercializados, sendo responsável por observar a venda dos produtos da BB, bem como inteirar-se, junto do responsável de cada loja, da forma como as vendas estão a decorrer, posicionamento dos produtos (informação que deverá ser registada no sistema CC), eventuais ruturas (informação que deverá ser registada no sistema CC) e necessidade de maior fornecimento e acompanhamento de acções promocionais. (21.º AMD).

4. O sistema CC é uma ferramenta disponibilizada a toda a equipa de vendas e onde o vendedor deverá agendar o plano do registo semanal de visitas, para a semana seguinte e inserir as informações relativas a ruturas de produtos, preços, posicionamento e higiene dos produtos aquando da própria visita às lojas. (22.º ADM)

5. Aquando da implementação deste Sistema, todos os vendedores receberam formação sobre o mesmo, tendo ainda sido entregue uma folha com os procedimentos CC. (23 AMD)

6. Os vendedores deveriam ainda informar, por e-mail outras informações que considerassem relevantes e que não pudessem ser submetidas pelo sistema CC. (art. 24 AMD).

7. No caso de avaria do sistema CC, os vendedores deveriam prestar as informações sobre a forma como as vendas estão a decorrer, e outras informações que considerassem relevantes, através de e-mail, para o seu superior hierárquico, no caso do A. para o Senhor DD. (25.º AMD)

8. Em cada visita a uma loja, um vendedor, como o autor, despende a verificar os preços, contactar o responsável da loja, entre outras funções, acima melhor enumeradas, entre 10 e 15 minutos no caso de lojas pequenas ou com uma lista de produtos da BB menor e cerca de 30/40 minutos nas lojas maiores. (art. 26.º AMD)

9. No desempenho destas funções, o A. utilizava o veículo automóvel, de marca e modelo Ford Fiesta, de matrícula (…), veículo que lhe esteve adstrito para o desempenho apenas das funções profissionais. (art. 27.º AMD)

10. A ré pretendia que fossem visitadas o maior número de lojas possíveis, utilizando as auto-estradas quando tal fosse a melhor rota. (art. 28.º AMD).

11. O veículo fica entregue ao vendedor, que fica responsável pelo mesmo, não sendo permitido o uso de outro veículo. (art. 29.º AMD)

12. No dia 2012/01/05, o A. almoçou em local perto da sua residência (restaurante sito em (…), Santa Iria da Azóia) – (art. 30.º AMD).

13. No dia 10/01/2012, o autor informou, por email, EE, seu superior hierárquico que na 5.ª feira dia 05/01/2012, tinha visitado as seguintes lojas: FF, GG, HH, II, JJ e LL. (art. 31.º AMD).

14. No dia 05/01/2012 o autor não passou na Ponte 25 de Abril, nem na Ponte Vasco da Gama, nem noutro qualquer troço de auto-estrada portajado. (32.º AMD)

15. A ré deu instruções a todos os vendedores, incluindo o aqui A., no sentido destes seguirem os trajectos mais rápidos, nomeadamente as autoestradas, por forma a, entre outros motivos, rentabilizarem o seu tempo; (33.º AMD)

16. Instruções que são do conhecimento de todos os vendedores, incluindo o A.. (34.º AMD).

17. A não ser assim, não faria sentido que a despesa de via-verde fosse inteiramente suportada pela entidade patronal, nas deslocações de trabalho. (35.º AMD)

18. No dia 05 de Janeiro de 2012, o A. não visitou as lojas as lojas FF, GG, HH, II, JJ e LL. (37.º AMD)

19. Não obstante o referido em 18. o autor informou o seu superior hierárquico conforme mencionado em 13. de forma livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que não correspondia à verdade. (39.º AMD)

20. O sistema CC esteve em baixo entre os dias nos dias 02 a 13 de Janeiro de 2012; (40.º AMD).

21. O A. tinha deslocações agendadas, segundo o próprio, deslocações para os dias 02 a 05 e 09 a 13 de Janeiro, já que no dia 06 de Janeiro teve lugar reunião nos escritórios da entidade empregadora, em Lisboa.(41 AMD)

22. O autor comunicou à Ré que no dia 2012/01/02, segunda-feira, foram efectuadas seis visitas nas localidades de Porto Alto, Benavente e Samora Correia.(42. AMD)

23. A primeira passagem da via verde no percurso Alverca-VF Xira ocorre às 11h56 e o regresso a casa, percurso Carregado-Alverca, às 16:33 (DOC. N.º 7). (43 AMD)

24. Simulado o percurso na ferramenta “Google Maps”, constata-se que só para efectuar o referido percurso, desde a casa do A. e regresso a esta, é necessário cerca de uma hora e meia. (Doc. 44)

25. O A. referiu ter visitado no dia 02/01/2012 as lojas MM, NN, OO, PP, QQ e RR, num total de seis lojas;

26. O que implicaria o dispêndio de duas horas.(46.º AMD)

27. O Sr. AA declarou que no dia 2012/01/03, terça-feira, efectuou oito visitas em Évora: as lojas SS, TT, UU, VV, XX, ZZ, AAA e BBB, num total de oito lojas; (49.º e 52 AMD)

28. A primeira passagem na Via Verde é a chegada a Évora, às 13h19 e o regresso a casa, pela Ponte Vasco da Gama, cerca das 17h58 (DOC. N.º 7).

29. Simulado o percurso na ferramenta “Google Maps”, constata-se que para efectuar o percurso desde a casa do A. e regresso a esta, são necessárias três horas e trinta e oito minutos.

30. O que, só por si, implicaria o dispêndio de cerca de 3 horas.

31. O A. informou a ré que no dia 2012/01/04, quarta-feira, tinha efectuado sete visitas a lojas de Ferreira do Alentejo e Beja: CCC, DDD, EEE, FFF, GGG, HHH e III, num total de sete lojas. (59.º AMD)

32. A primeira passagem na Via Verde é a chegada às 13h26 a Grândola e o regresso, a casa, pela Ponte Vasco da Gama às 18h07, sendo que nesse dia almoçou em Beja às 14h23. (57 AMD)

33. Na ferramenta “Google Maps” para efectuar o referido percurso mas desde a casa do A., em Loures, e regresso a esta, são necessárias quatro horas e vinte e seis minutos. (58.º AMD)

34. As visitas referidas em 32., só por si, implicariam o dispêndio de cerca de duas horas e vinte minutos. (60.º AMD)

35. No dia 06 de Janeiro de 2012, realizou-se reunião nos escritórios da entidade empregadora, em Lisboa, na morada na (…), Lisboa, durante a manhã e tarde, durando cerca de 7,5 horas.

36. O Senhor AA informou à Ré que no dia 2012/01/10, terça-feira visitou oito lojas, na zona de Sines, Santo André, Santiago do Cacém e Grândola: JJJ, LLL, MMM, NNN, OOO, PPP e QQQ, num total de sete lojas. (64 e 67 AMD)

37. Há registo de passagem na portagem de Grândola pelas 14h06 e regresso pela Ponte Vasco da Gama às 17h17.(65 AMD)

38. Na ferramenta “Google Maps” para efectuar o referido percurso mas desde a casa do A. e regresso a esta, são necessárias quatro horas e quarenta minutos.

39. As visitas referidas em 36., só por si, implicariam o gasto de duas horas e vinte minutos. (68 AMD)

40. O Autor não visitou as sete lojas referidas de Grândola, Santiago do Cacém e Sines.

41. O A. declarou à Ré que no dia 13 de Janeiro de 2012 visitou seis lojas nas zonas de Odemira, Vila Nova de Milfontes, (…) Alvalade do Sado e Alcácer do Sal.(71 AMD)

42. Não há qualquer registo de movimento na Via Verde (DOC. N.º 7).

43. As visitas declaradas pelo A. referidas em 41. não foram realizadas.

44. No dia 2-01- 2012, o autor trabalhou 5h30 (30 min. até às portagens de VFXira; 4,5h "entre" portagens; 30 min. das portagens VFXira até casa.

45. No dia 03-01-2012, o autor trabalhou 6h30 (1,5h até às portagens de Évora; 5h "entre" portagens; 1h da portagem Pte. Vasco Gama até casa)

46. No dia 04-01-2012, o autor trabalhou 6h45 (1h15min até às portagens de Grândola; 4,5h "entre" portagens; 1h da Pte. Vasco Gama até casa)

47. No dia 05-01- 2012 o autor não trabalhou.

48. No dia 06-01-2012 o autor trabalhou 7h30 (reunião no escritório de Lisboa).

49. O autor trabalhou assim apenas 29h 15 minutos (26h15 mais três horas de preparação das visitas), na primeira semana de janeiro 2012.

50. No dia 09-01-2012 o autor trabalhou 5h30 (30min. até às portagens de VFXira; 4,5h "entre" portagens; 30min. das portagens VFXira até casa)

51. No dia 10-01-2012 o autor trabalhou 5h45min (1h15min até Grândola; 3,5h "entre" portagens; 1h da Pte. Vasco da Gama até casa)

52. No dia 11-01- 2012, o autor trabalhou 10h (1h até Torres Novas; 8h "entre" portagens; 1h da Pte Vasco da Gama até casa)

53. No dia 12-01- 2012, o autor trabalhou 8h10min (1h até Grândola; 6h10 "entre" portagens; 1h Pte. Vasco da Gama até casa)

54. No dia 13-01- 2012, 0h

55. Na semana de 09 e 13 de Janeiro de 2012, o A. prestou 33 h 25 minutos (29h25 mais 4 horas de preparação das visitas) minutos de trabalho (78.º AMD).

56. A conduta do autor não permite saber como, na verdade, os produtos estão expostos nas várias lojas, questão essencial na venda de produtos nos super ou hipermercados. (80 AMD)

57. (eliminado por decisão deste acórdão adiante proferida) [1]

58. (eliminado por decisão deste acórdão) [2]

 59. Ao não visitar as lojas o autor não viu se os expositores estavam limpos e arrumados, se os produtos expostos estavam dentro do prazo de validade ou se faltaria algum em concreto; (84)

60. O A. era responsável pela zona Sul do país (Alto e Baixo Alentejo, Algarve e ainda um pouco do Distrito de Setúbal e de Santarém), zona muito importante da rede de distribuição dos produtos da Entidade Empregadora, pela sua dimensão geográfica.

61. O comportamento do A. pôs em causa a relação de confiança entre o mesmo e a Entidade Empregadora, porque se trata de um trabalhador em que existe uma especial exigência de confiança, pelo facto das suas funções serem prestadas fora dos escritórios. (87)

62. O Autor durante o processo disciplinar manteve a sua postura de que efectuou todas as visitas que declarou, mesmo confrontado com os extractos da Via Verde.

63. Com a resposta à nota de culpa, o A. juntou, como documentos aí numerados com os n.ºs 1 e 2 de tal resposta, duas declarações escritas, em que aquele visava comprovar a sua presença nas lojas FF e GG da localidade de (…), na data de 05 de Janeiro de 2012. (92.º)

64. Menciona o documento n.º 1 da resposta à nota de culpa do aqui A., o seguinte:

Declaração

Eu, RRR, chefe Dep. Alimentar do FF, confirmo a presença no dia 05 de Janeiro de 2012, do vendedor das BB, AA, para uma visita à loja, conforme tem sido habitual.

Sem outro assunto.
Atentamente, (assinatura)” (93 AMD)

65. O documento n.º 2 da resposta à nota de culpa do Autor refere:

“Declaração

Eu, SSS – responsável de mercearia do GG, confirmo a presença no dia 05 de Janeiro de 2012, do vendedor das BB, AA, para uma visita à loja, conforme tem sido habitual.

Sem outro assunto.
Atentamente, (assinatura)”

66. No prosseguimento do mencionado processo disciplinar, o instrutor procedeu à inquirição das signatárias das “Declarações” supra transcritas no dia 21 de Setembro de 2012, as quais informaram que não estavam a trabalhar.

67. (eliminado por decisão deste acórdão) [3]

68. (eliminado por decisão deste acórdão) [4]

69. O A. pretendeu e conseguiu tirar partido de já conhecer as referidas pessoas, em virtude de ter efectuado visitas no passado a tais estabelecimentos; (103.º AMD)

70. (eliminado por decisão deste acórdão) [5]

71. Posteriormente procedeu à junção dos aludidos documentos ao seu processo disciplinar, os quais sabia que não correspondiam à realidade;

72. (eliminado por decisão deste acórdão)  [6]

73. A aqui R. apresentou queixa-crime junto do Ministério Público do Tribunal de Reguengos de Monsaraz, a fim de se apurar das responsabilidades criminais do aqui A (vide DOC. N.º 13, aqui dado por integralmente reproduzido para todos os devidos efeitos legais).

74. (Eliminado por decisão deste acórdão) [7]M

75. O fundo de maneio para despesas com portagens, estacionamento, pequenas reparações e alimentação, disponibilizado ao autor antecipadamente pela entidade empregadora no valor de € 500,00 foi, nos meses de Junho, Setembro, outubro, novembro de 2011, maio, junho, julho, outubro, novembro e dezembro de 2012, insuficiente para o autor fazer face às despesas mensais efectuadas no exercício das suas funções, pelo que o montante excedente foi pago ao autor pela Ré cerca de 2 ou 3 semanas após apresentar o comprovativo das despesas. (38.º contestação)

76. O fundo de maneio disponibilizado aos trabalhadores da Ré é, em regra de € 500,00, mas pode ser superior, caso o trabalhador o solicite, em razão das necessidades do trabalho desenvolvido. (art. 31.º a 34.º da resposta à contestação)

77. É com o cumprimento das suas funções de vendedor junto das lojas que o autor – tal como os seus colegas vendedores – contribui para as vendas dos produtos que a ré comercializa, razão porque tais prémios de vendas se encontram contabilizados nos seus recibos de vencimentos.

78. O contacto com o responsável de cada loja nem sempre é exequível porque cada uma das lojas a visitar tem as suas características conforme se afere pela listagem das 235 lojas que o autor tinha sob a sua responsabilidade. (45. contestação)

79. Quando o sistema CC esteve sem funcionar o autor registou manualmente, como sempre fez paralelamente ao sistema CC, os mapas previamente fornecidos pela ré para cada pasta de cliente, tendo o autor preenchido as referidas folhas colocando as visitas às lojas nos dias 5 e 13 de Janeiro de 2012 (cfr. doc. 31 a 42). – 49.º e 98 contestação

80. Na ausência do sistema CC o autor também se suportou da sua agenda em papel, que também utilizava para organizar, orientar e desenvolver as visitas às lojas (cfr. doc. 4 e 5 juntos com a resposta à nota de culpa; fls. 89 e 90 – proc. disciplinar). 50.º contestação

81. As lojas NNN, TTT e UUU (doc. 40 a 42) não se encontravam listadas no sistema CCC, sendo o seu registo efectuado manualmente.

82. A ré nunca definiu aos vendedores, entre os quais ao autor, um tempo mínimo de visita a uma loja (53)

83. A recolha dos dados na loja pode ser rápida ou demorada, dependendo de diversos circunstancialismos do momento, nomeadamente do atendimento do responsável de loja (se na altura estiver presente e/ou disponível para o efeito), do cardex estipulado para a loja, da disposição física dos produtos na loja ou do movimento da clientela no momento da visita.(54)

84. Nas lojas que têm um cardex e espaços de exposição reduzidos, como é o caso das que a seguir se enunciam, em cerca de 15 minutos cumprem-se as funções estabelecidas e atingem-se os objectivos propostos em cada visita:

(…):  NN, QQ, RR, ZZ, AAA, BBB, FFF, GGG, III, LLL,

(…): PP, UU, EEE, HHH, QQQ

VV e NNN (55)

85. O identificador de Via Verde foi adquirido pelo autor em seu nome, para simplificar os processos de registo das despesas mensais, evitando assim a acumulação de tickets e de papéis com despesas de portagens e de estacionamento. (59.º)

86. O autor prepara as visitas aos clientes, com recolha de informação das pastas dos clientes, na elaboração de relatórios e de acções promocionais a apresentar aos clientes, na análise e desenvolvimento de soluções de vendas para propor a clientes, no levantamento de expositores e/ou brindes junto da empresa para colocar nas lojas, na conferência e análise de encomendas, entre outros procedimentos realizados. (86)

87. O tempo máximo de preparação das visitas, em casa, é de uma hora por dia. (art. 43.º da resposta á contestação)

88. A fls. 91 a 114 do processo disciplinar – doc. 6 a 19 juntos da resposta à nota de culpa - está informação promocional e portfólios de produtos a apresentar às lojas que foram elaboradas pelo autor. (87).

89. O telemóvel do autor esteve sem funcionar até 16/01/2012, pelo que não lhe era possível registar dados no sistema CC das visitas que fez às lojas nesse período. (97)

90. O autor informou por email conforme instruções superiormente emanadas sobre o agendamento das visitas realizadas e a realizar nas duas primeiras semanas do ano (de 2 a 13 de janeiro de 2012). (98)

91. A ré não suspendeu o autor das funções, que continuou a trabalhar até 03/01/2013. (114)

92. O autor auferia o vencimento mensal ilíquido de € 1136,00 e um prémio de vendas variável, que se traduzia numa prestação regular que era paga com uma periodicidade mensal.

93. A média dos prémios de venda tinha o valor de € 696,00.

94. Com o despedimento o autor sentiu-se triste, desanimado e deprimido, tendo dificuldade em dormir descansado à noite quando no seu agregado familiar tem 4 crianças para criar (duas nascidas em 30/11/2011, uma em 16/03/2000 e outra nascida em 24/10/2001).

95. O instrutor abriu o processo disciplinar no dia 30/05/2012. (12.º da contestação)

96. O autor não era representante sindical e não havia comissão de trabalhadores na Ré. (20.º)

97. Durante o inquérito prévio, a Ré ouviu as seguintes testemunhas:

- VVV (fls. 3 e seg. do processo disciplinar)

- EE (fls. 13 e seg. do processo disciplinar)

- DD (fls. 17 e seg. do processo disciplinar). (art. 9.º do AMD)

98. E ouviu o arguido (fls. 6 e seguintes do Processo disciplinar)

99. Foi proferida a nota de culpa com data de 25/06/2012.

100. A qual foi notificada ao autor no dia 20/07/2012, (art. 12.º do AMD)

101. O A. Respondeu à nota de culpa com o requerimento junto a fls. 129 e seguintes do procedimento disciplinar, negando, em síntese, qualquer infracção disciplinar juntando documentos e requerendo a inquirição de três testemunhas. (art. 14.º do AMD)

102. O processo disciplinar esteve parado, sem a realização de qualquer diligências probatórias entre a audição do vendedor Sr. XXX, no dia 08/10/2012 (fls. 136 a 138 do processo disciplinar) e as declarações complementares que o Director Administrativo e Financeiro prestou referidas em 6. (fls. 139 do processo disciplinar). – (21 da contestação)

103. O referido director podia a todo o tempo prestar as suas declarações complementares pois exerce as suas funções nos escritórios da Ré, em Lisboa. (25)

104. A inquirição do Dr. VVV, enquanto director Administrativo e Financeiro da Ré, no dia 26/12/2012 serviu para este referir, face ao vertido pelo trabalhador no item 9 da sua resposta à nota de culpa que os trabalhadores não adiantam despesas, mas que têm um fundo de maneio e ainda que os prémios de venda não resultam directamente do desempenho dos vendedores, já que as vendas são feitas ao nível do director de vendas da Ré. (16.º do AMD e da Resposta à contestação.)

105. O A. Foi notificado no dia 03/01/2013 da decisão final do processo disciplinar datada de 27/12/2012. (art. 17.º do AMD)

106. O relatório final de 26 páginas foi elaborado no mesmo dia em que foi ouvido o director: 26/12/2012 (26.º da contestação e 17.º da resposta à contestação).

2.2. Factos não provados:

1. Toda a frota de veículos dos vendedores da Ré tinha via–verde.

2. Não raras as vezes poderia ser necessário mais de trinta minutos em cada loja, para se realizar a recolha de todos os dados e contacto qualitativo com o responsável de loja e nalguns casos com o responsável de corredor

3. Dado o horário registado na passagem pelas portagens da Via Verde, não é possível a visita das seis lojas e cumprimento integral das funções de visita que estão adstritas ao autor, pelo que as visitas declaradas pelo A. ou parte delas referentes ao dia 02/01/2012 não foram realizadas. (art. 47)

4. Dado o horário registado na passagem pelas portagens da Via Verde, não se crê possível a visita das oito lojas e cumprimento integral das funções de visita que lhe estão adstritas e que o autor declarou ter realizado no dia 03/01/2012.(54.º e 55.º do AMD)

5. Dado o horário registado pelas portagens da Via Verde, não se crê possível a visita às sete lojas referidas em 31. e cumprimento integral das funções de visita que lhe estão adstritas, pelo que as visitas declaradas pelo A. realizadas no dia 04/01/2012 ou parte delas não foram realizadas.(61.º e 62.º AMD)

6. que não houvesse norma ou directiva onde constasse que em caso de avaria do sistema “CC” o autor devesse prestar “outras informações relevantes” através de email para o seu superior hierárquico.

7. Que não houvesse directiva ou norma para usar as auto-estradas de forma a rentabilizar o seu tempo porquanto era necessário e imperativo visitar diariamente o maior número de lojas possível, conforme indicações emanadas superiormente. (53)

8. Que o autor suportasse antecipadamente os encargos com a passagem em troços com portagem. (58.º)

            Fundamentação de direito

Antes de mais, para melhor compreensão do objecto dos recursos importa esclarecer que a decisão recorrida considerou verificada a caducidade do direito de aplicar a sanção do despedimento, nos termos do art. 357º nº 1 do CT, pelo que julgou o despedimento ilícito, tendo contudo, nos termos do nº 2 do mesmo artigo, apreciado a existência de justa causa e considerado que existia justa causa para o despedimento, tendo fixado a indemnização em 15 dias de retribuição base por cada ano de trabalho.

            Recurso interposto pela Ré

Quanto à arguição de nulidades

            A Ré, a fls. 861, argui a nulidade da sentença com dois fundamentos:
a) A conclusão a que o tribunal chega, em sede de fundamentação da decisão da matéria de facto, de que a diligência de inquirição de testemunha ocorrida no dia 26.12.2012 era desnecessária, não tem correspondência a qualquer facto dado como provado, pelo que se verifica a nulidade prevista no art. 615º nº 1 al. b) do CPC.
b) Contradição insanável entre a matéria de facto dada como provada e a fundamentação probatória da matéria de facto, verificando-se o vício de nulidade previsto na al. c) do nº 1 do art. 615 do CPC.

O Mº Juiz pronunciou-se sobre esta alegação (fls. 984) concluindo “não se verificarem as nulidades apontadas”.

Antes de mais importa referir que não se podem confundir nulidades de sentença com eventuais erros de julgamento.

Nulidades de sentença são taxativamente as indicadas nas al. a) a e) do nº 1 do art. 615º do CPC, entre as quais, quando:

(b)Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;

(c)os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível.

Mas, as nulidades da sentença reconduzem-se à própria sentença, tal como vem descrita e definida nos artigos 607º a 609º do Código de Processo Civil, nomeadamente à relação entre a fundamentação de facto e de direito e a decisão propriamente dita.

 No caso vertente, as nulidades invocadas pela Apelante reportam-se à decisão da matéria de facto e respectiva fundamentação, considerando, num caso, que a afirmação de que “a diligência de inquirição de testemunha ocorrida no dia 26.12.2012 era desnecessária, não tem correspondência a qualquer facto dado como provado” e, no outro, que existe “contradição insanável entre a matéria de facto dada como provada e a fundamentação probatória da matéria de facto”.

Estas afirmações têm a ver com a discordância da Apelante quanto à decisão da matéria de facto, mas não constituem nulidades da sentença propriamente dita.

A discordância acerca da decisão da matéria de facto pode ser objecto de impugnação específica, nos termos dos art. 640º e 662º do CPC e, efectivamente, a Apelante também impugnou a decisão relativa à matéria de facto, sendo esse o objecto do recurso interposto pela Ré.

Porém, lendo a sentença sindicada, constata-se que esta se encontra correctamente elaborada, não se vislumbrando qualquer um dos vícios apontados.

Com efeito, relativamente à nulidade de sentença por falta de fundamentação convém ouvir os ensinamentos da doutrina:

Fernando Amâncio Ferreira, em “Manual dos Recursos em Processo Civil”, 6.ª Edição, Almedina, páginas 52 e seguintes, afirma que: “A falta de motivação suscetível de integrar a nulidade de sentença é apenas a que se reporta à falta absoluta de fundamentos quer estes respeitem aos factos quer ao direito (…).

O Prof. Alberto dos Reis, in C.P.C., Anotado, volume V, pág. 140, ensina o seguinte: «(…) Há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afeta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade. Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto (…)».

No mesmo sentido, pronunciou-se o Prof. Artur Anselmo de Castro, in Direito Processual Civil Declaratório, volume III, págs. 141-142, segundo o qual «(…) Também a falta de fundamentação constitui causa de nulidade da sentença, quer a omissão respeite aos fundamentos de facto, quer aos de direito. Da falta absoluta de motivação jurídica ou factual – única que a lei considera como causa de nulidade – há que distinguir a fundamentação errada, pois esta, contendo apenas com o valor lógico da sentença, sujeita-a a alteração ou revogação em recurso, mas não produz nulidade (…)».

Ora, da leitura da sentença não ressalta uma absoluta carência de fundamentação, quer em termos fácticos, como meramente jurídicos, que possa, de alguma forma, ser reconduzida à nulidade prevista na alínea b) do número 1 do artigo 615.º do C.P.C.
A nulidade por contradição entre os fundamentos e a decisão (al. c) do nº 1 do art. 615º do CPC) verifica-se quando existe uma contradição intrínseca entre os fundamentos invocados pelo julgador e a decisão por ele tomada, ou seja, quando a fundamentação aponta num sentido e a decisão segue caminho oposto, ou diferente. Mas, "na al. c) do nº 1 do art. 615º a lei refere-se à contradição real entre os fundamentos e a decisão e não às hipóteses de contradição aparente, resultantes de simples erro material, seja na fundamentação, seja na decisão" ([8]).

Este vício da sentença não pode confundir-se com o erro na subsunção dos factos à norma jurídica ou, muito menos, com o erro na interpretação desta, pois nestas situações estamos perante o erro de julgamento e não perante oposição geradora de nulidade ([9]). "Se o juiz disse o que queria dizer, mas decidiu mal, decidiu contra legem ou contra os factos apurados, então está errado o julgamento"([10]), mas esse erro não constitui nulidade de sentença.

Analisando a sentença recorrida facilmente se constata que não sofre de nenhuma das referidas nulidades, pois a decisão está suficientemente fundamentada quer de facto quer de direito e não existe qualquer contradição no raciocínio do julgador entre a fundamentação da sentença e a respectiva decisão.

A discordância da apelante traduz-se antes num eventual erro de julgamento sobre a apreciação da matéria de facto, mas isso não constitui nenhuma das referidas nulidades de sentença.

Improcede, pois, esta pretensão da Apelante.

Quanto ao objecto do recurso interposto pela Ré

Relativamente à impugnação da matéria de facto.

(…)

Quanto à questão de direito

Pugna a Recorrente pela inverificação da caducidade da decisão de aplicar a sanção disciplinar do despedimento.

A decisão recorrida considerou que quando foi aplicada a sanção disciplinar do despedimento já estava caduco o prazo para aplicar qualquer sanção, nos termos do disposto no art. 357º nº 1 e 2 do C.T., o que implica a invalidade do procedimento disciplinar e a ilicitude do despedimento, com as consequências estabelecidas no art. 389º nº 1 do CT.

Relevam para a apreciação desta questão os factos constantes dos n.º 95 a 106º, da matéria de facto provada, aqui dados como reproduzidos, nomeadamente o facto de o processo disciplinar ter sido instaurado no dia 30/05/2012 (facto 95) e de o autor não ser representante sindical e não haver comissão de trabalhadores na Ré. E de a última testemunha indicada pelo trabalhador ter sido ouvida no dia 8.10.2012 e o processo disciplinar ter estado parado desde essa data até 26.12.2012, em que, por iniciativa do instrutor do processo disciplinar, foram tomadas declarações complementares ao Dr. VVV.

Antes de mais importa referir que face à data em que foi instaurado o processo disciplinar era aplicável o Código do Trabalho de 2009 (na redacção anterior à Lei nº 23/2012 de 25.06, que entrou em vigor em 1.08.2012).

Dispõe o art. 357º nº 1 e 2 do CT que o empregador dispõe de 30 dias para proferir a decisão de despedimento, sob pena de caducidade do direito de aplicar a sanção. Este prazo conta-se a partir da data da conclusão da última diligência de instrução.

Por “última diligência de instrução”, a que alude o nº 2 do art. 357º do CT, tem a doutrina e a jurisprudência entendido tanto a diligência que tenha sido requerida pelo trabalhador, como a que tiver sido oficiosamente ordenada pelo instrutor do processo, desde que necessária e pertinente (neste sentido Ac. do STJ de 13.11.2013, proc. 196/12.9TTBRR.L1.S1).

 Ora, no caso vertente, coloca-se a questão de saber se se verifica a caducidade do direito de aplicar a qualquer sanção disciplinar, nos termos do art. 357º nº 1 e 2 do CT, pelo facto de o processo disciplinar ter estado parado sem realização de qualquer diligência entre 8.10.2012 e 26.12.2012 e da diligência instrutória de 26.12.2012 ter sido realizada por iniciativa do instrutor do processo, sem que exista no processo disciplinar qualquer justificação para esse facto.

Entendemos que a realização da diligência de instrução de 26.12.2012, - tomada de declarações complementares à testemunha VVV - se mostra justificada e pertinente, pelas razões que constam do ponto 104 da matéria de facto provada (o qual não foi impugnado), tendo servido para se apurar se os trabalhadores adiantam despesas do seu bolso e se os prémios dependem do desempenho de cada vendedor já que as vendas eram feitas a nível central (sendo que o prémio global era distribuído pelos diversos trabalhadores).

A jurisprudência continua a entender, à face do CT de 2009, que “as diligências probatórias - a que alude, agora, o artigo 356.º, n.º 5, do Código do Trabalho de 2009 - não se circunscrevem àquelas que o trabalhador haja requerido na sua resposta à nota de culpa, abrangendo também quaisquer outras que, na sequência daquelas, o instrutor do processo disciplinar entenda oficiosamente promover”, como decidiu o Ac. de 7/3/2012 do STJ, no P. 17/10.7TTEVR.E1.S1 (Fernandes da Silva), já que “a instrução é formada pelo conjunto dos atos necessários à averiguação dos factos alegados na acusação (nota de culpa) e na defesa (resposta à nota de culpa), não se confinando esta fase do processo à realização das diligências probatórias requeridas pelo trabalhador, até porque tais atos de instrução poderão justificar a realização de outras diligências para confirmar ou refutar os meios probatórios por ele produzidos” ([11] ).

Por outro lado, a jurisprudência também tem entendido que “O legislador não fixou qualquer prazo para serem efectuadas as diligências probatórias requeridas pelo trabalhador na resposta à nota de culpa ou outras da sua iniciativa que repute de relevantes, impondo no entanto o princípio da celeridade processual que esta fase seja tão breve quanto possível. E que “dispondo o nº 3 do art. 329º do CT que o procedimento disciplinar prescreve decorrido um ano contado da data em que é instaurado, quando nesse prazo o trabalhador não tenha sido notificado da decisão final, o legislador considerou que desta forma estava garantida a celeridade do procedimento disciplinar, não havendo necessidade de consagrar outras normas que a promovessem.” – Ac do STJ de 8.10.2015, proferido no processo nº 903/13.2TTMTS-A.P1.S1.

Assim, no caso vertente, não se mostra violado o princípio da celeridade processual, pois o legislador não fixou outro prazo para a realização das diligências probatórias, para além do referido no nº 3 do art. 329º do CT, o qual não se mostra ultrapassado, pois entre a instauração do processo disciplinar e a decisão do despedimento (8.05.2012 e 27.12.2012), não decorreu um ano. Por outro lado, também não se mostra ultrapassado o prazo de 30 dias para proferir a decisão, visto que este prazo se conta a partir da última diligência de prova que teve lugar em 26.12.2012 tendo a decisão de despedimento sido proferida em 27.12.2012, razões pelas quais se considera não haver caducado o direito da entidade empregadora aplicar a sanção do despedimento.

Revoga-se, pois, a decisão recorrida que considerou caduco o direito da empregadora aplicar a sanção, considerando-se não haver caducado esse direito, pelo que não há qualquer invalidade do processo disciplinar.

Procede desta forma o recurso interposto pela Ré.

Recurso interposto pelo Autor:

Começa o Apelante por requerer a rectificação da sentença na parte em que na decisão se refere que o A. tem direito às retribuições vencidas entre 14.01.2012 até…, quando aí deveria constar 14.01.2013.

Essa rectificação, porém, já foi feita pelo tribunal “a quo”, através do despacho de fls. 893, pelo que nada mais há a dizer a esse propósito.

Quanto à impugnação da matéria de facto

(…)

Quanto à inexistência de justa causa

O Apelante pugna pela inexistência de justa causa de despedimento.

Porém, as alterações introduzidas por este acórdão na matéria de facto não permitem alterar a decisão de direito constante da decisão recorrida, a qual considerou a existência de justa causa para o despedimento do Autor.

Com efeito, estando provado, como está que o autor informou a sua entidade patronal que no dia 05/01/2012 teria visitado cinco lojas na zona de Reguengos de Monsaraz, mas que de facto não as visitou, que no dia 10/01/2012, declarou ter visitado oito lojas na zona de Sines, Santo André, Santiago do Cacém e Grândola e não as visitou e que e que no dia 13/01/2012 o autor declarou ter visitado seis lojas na zona de Odemira e que não o fez, não só incumpriu os seus deveres laborais, como quis enganar a sua entidade empregadora fazendo-lhe crer que tinha visitado as referidas lojas quando o não fez. Este comportamento é grave, culposo e torna impossível a manutenção da relação de trabalho, face à violação de dever de lealdade que é essencial, na actividade exercida pelo Autor, que se desenvolve longe da presença física do empregador.

Fazendo um juízo de prognose sobre a viabilidade da relação laboral, entendemos que o comportamento do Autor, era apto a destruir ou abalar a confiança que a entidade empregadora nele podia depositar, ficando, assim, irremediavelmente abalada a confiança que a entidade empregadora podia depositar no seu comportamento futuro.

Verificando-se a justa causa de despedimento, não tem o A. direito a receber as quantias reclamadas, nem aquelas em que a Ré foi condenada.

Improcede, assim, o recurso interposto pelo Autor.

Decisão:

Nos termos expostos decide-se:

A) Julgar procedente o recurso interposto pela Ré, revogando-se a decisão recorrida que declarou caduco o direito da entidade empregadora aplicar a sanção disciplinar;

B) Julgar improcedente o recurso interposto pelo Autor, confirmando-se a existência de justa causa para o despedimento deste.

C) Absolve-se a Ré de todas as importâncias em que foi condenada.

Custas da acção e dos recursos a cargo do A.

Lisboa,

  Claudino Seara Paixão

Maria João Romba

Paula Sá Fernandes

___________________________________________________

[1] Constava neste ponto o seguinte: “A falta de informação rigorosa e a sua errónea, atrasada ou mesmo não transmissão para o superior hierárquico dos dados, que deveria ter recolhido, pode não permitir à Entidade Empregadora reagir atempadamente, entre outras situações, no caso de alteração irregular de preço e provocar problemas nas relações comerciais com as várias empresas de distribuição, que também fazem shopping (obtenção dos preços das cadeias de super e hipermercados concorrentes) diariamente e que se podem sentir enganadas, pelas “BB”, se empresa distribuidora concorrente comercializa o mesmo produto a um preço mais baixo. (81 AMD)”

[2] Constava deste ponto o seguinte: “Esta falta de informação reflecte-se no volume de vendas e na captação indirecta da clientela que localmente se vai verificando, uma vez que a Entidade Empregadora tem a sua capacidade de reacção, nas lojas, reduzida. (82 AMD).”

[3] Constava neste ponto o seguinte: “Pelo predito, o A. induziu as declarantes em erro, bem sabendo que o teor da informação que constava dos documentos que lhes pediu para assinarem era falso;”

[4] Constava neste número o seguinte: “Não lhes explicando o verdadeiro conteúdo dos documentos que preparou a fim de estas assinarem, nem o propósito dos mesmos, ou seja instruir o seu próprio processo disciplinar, pelo que conseguiu que as mesmas os assinassem. (102 AMD)”

[5] Constava neste número o seguinte: Logrando obter das mesmas uma declaração que aquele sabia ser falsa, pois no dia em causa, 05 de Janeiro de 2012, o A. sabia que não tinha visitado tais lojas.

[6] Constava neste número o seguinte: Visando demonstrar factos que sabia serem inverdadeiros e assim obter a sua absolvição no processo disciplinar.

[7] Constava neste ponto o seguinte: “O A. traiu e afectou a confiança que a R. entidade patronal nele depositava;”

[8] Cfr. A. Varela, M. Bezerra e S. da Nora, em Manual de Processo Civil, 2ª ed. pág. 690.
[9] Lebre de Freitas, CPC Anotado, Coimbra Editora, Vol. II, pág. 670.
[10] Cfr. A. Neto em CPC Anotado, 14ª ed. pág. 699.
[11] Ac do STJ de 7.10.2010, proc. nº 887/07.6TTALM.L1.S1


Decisão Texto Integral: