Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
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| Relator: | LEOPOLDO SOARES | ||
| Descritores: | GRAVAÇÃO DA PROVA NULIDADE PRAZO DE ARGUIÇÃO | ||
| Nº do Documento: | RL | ||
| Data do Acordão: | 02/28/2007 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Meio Processual: | AGRAVO | ||
| Decisão: | NEGADO PROVIMENTO | ||
| Sumário: | I- O prazo de oito dias a que alude o nº 2º do artigo 7º do DL nº 39/95, de 15 de Fevereiro, destina-se ao Tribunal e não às partes , sendo aquele de que o primeiro dispõe para facultar a quem a requereu as cópias da gravação da audiência. Não resulta da supra citada norma um termo de oito dias sobre a realização de cada diligência para se requerer cópia da sua gravação nem para arguir a nulidade decorrente de deficiente gravação. II – O disposto no artigo 9º do DL nº 39/95, de 15.2, deve ser interpretado em conjunto com o regime de arguição de nulidades. III - Uma vez que qualquer dos litigantes se pode socorrer desse regime , a interpretação em apreço não se afigura arbitrária, irrazoável ou infundada. IV - Afigura-se de maior relevo a observância dos princípios da plenitude da assistência dos juízes, da oralidade e da imediação do que o da economia processual. (sumário elaborado pelo Relator) | ||
| Decisão Texto Integral: | Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa: F…, casado, (…), residente na P…., Amadora, intentou a presente acção emergente de contrato individual de trabalho, contra C…, Lda, com sede na E…, Alverca. Pede que: a) se declare a nulidade do processo disciplinar que a Ré lhe instaurou, com a consequente ilicitude do despedimento, ou, em alternativa, se declare ilícito o despedimento por não se verificar o invocado fundamento da justa causa ; b) se condene a R. a pagar-lhe : - a indemnização por antiguidade, pela cessação ilícita do seu trabalho; - todas as quantias devidas a título de vencimento, desde a data de interposição da acção e até ao trânsito em julgado da sentença; - todas as quantias devidas a título de férias não gozadas referentes ao ano de 2001 e vencidas em 01.01.02, no valor de € 12.894,60; - todas as quantias devidas a título de férias não gozadas referentes ao ano de 2002 e vencidas em 01.01.03, no valor de € 12.894,60; - subsídio de férias relativo ao ano de 2002, vencido em 1 de Janeiro de 2003, no valor de € 4.298,20; - férias e subsídios de férias e de Natal relativos aos 3 meses do ano de 2003 em que o A. esteve ao serviço da R., no valor de € 3.223,65; - a quantia devida a título de isenção de horário, no valor de 20% da sua remuneração, desde a data da contratação até à data da sentença transitada em julgado; - quantia correspondente a 8 dias de trabalho do mês de Março de 2002 e 12 dias de trabalho do mês de Junho de 2002, a liquidar a final; - quantia a determinar, em liquidação de sentença, relativa ao prémio de 0,25% sobre o volume de vendas, em Espanha, nos anos de 2000, 2001 e 2002; - todas as quantias acrescidas de juros de mora vencidos, desde a data da interposição da acção, e vincendos até integral pagamento; - a quantia devida a título de indemnização por danos morais, em valor nunca inferior a € 100. 000, 00. Realizou-se audiência de partes. Notificada para o efeito a Ré contestou. O julgamento – que foi gravado – terminou em 5 de Fevereiro de 2004, sendo certo que no seu decurso o Autor prestou depoimento de parte que se mostra transcrito em acta ( vide fls 282 a 286) . Em 13 de Junho de 2005, foi proferida sentença que na parte decisória teve o seguinte teor: “Pelo exposto, julgo parcialmente procedente e parcialmente improcedente a presente acção, e, em consequência: a) condeno a R. C…., Ldª, a pagar ao A. F…., as quantias de : - € 3.048,20 ( três mil e quarenta e oito euros e vinte cêntimos ), a título de subsídio de férias relativo ao ano de 2002, vencido em 01.01.2003; - € 1.092,28 ( mil e noventa e dois euros e vinte e oito cêntimos ), a título de férias, subsídios de férias e de Natal proporcionais ao trabalho prestado no ano de 2003; - € 2.032,13 ( dois mil e trinta e dois euros e treze cêntimos ), de retribuições correspondentes a 8 dias do mês de Março de 2002 e 12 dias do mês de Junho de 2002; -acrescidas de juros de mora, à taxa de 4 % , vencidos desde 23.06.2003, inclusive, e vincendos até integral pagamento; b) absolvo a R. de todo o resto peticionado”. Em 14 de Julho de 2005, o Autor requereu a reprodução em cassete da prova produzida em audiência de julgamento ( fls 351), o que foi deferido por despacho de 16-9-2005 (fls 352). As cópias foram entregues em 22 de Setembro de 2005 (vide fls 353). Em 27 de Setembro de 2005, o Autor alegou que apenas duas das cinco cassetes continham a reprodução requerida. Assim, solicitou a anulação da sentença e a repetição da prova produzida na audiência de julgamento ( fls 354/355), sendo certo que também interpôs recurso de apelação. Em 6 de Outubro de 2005, também a Ré solicitou a reprodução da gravação da prova ( fls 429). A Ré respondeu ao requerimento do Autor , sustentando que a nulidade cometida se encontra sanada e que não se justifica a repetição do julgamento (fls 430/431). Em 7 de Junho de 2006, foi proferido despacho que na parte que aqui releva tem o seguinte teor: “Faço consignar que analisei e ouvi as cassetes da gravação da audiência de julgamento e constatei o seguinte: - sessão do dia 05.12.03 ( cfr. fls. 278 e ss. ): não existem as cassetes a que se faz referência como" 2ª cassete ", " 3ª cassete" e " 4ª cassete ", não havendo gravação do depoimento das testemunhas A… ( parte ), P…, J… e V… ( não obstante a Sra. Funcionária ter escrito no envelope onde guardou as cassetes" avariou a aparelhagem, só tem 1 cassete , ( nada mais me foi possível apurar, em virtude daquela se encontrar de baixa por doença, não sendo previsível o seu regresso a breve trecho ); - sessão do dia 12.12.03 (cfr. fls. 282 e ss. ): a gravação do depoimento de parte do legal representante da R., P…, é de difícil percepção e não existe a cassete que se referencia como 4ª, não havendo gravação de parte do depoimento da testemunha C… ; - sessão do dia 05.01.04 ( cfr. fls. 255 e ss. ): não se ouve a gravação da cassete identificada como 2ª - parte do depoimento da testemunha M…. * Fls 354 : entendemos que a deficiência na gravação da prova consubstancia nulidade processual a ser arguida no prazo de 10 dias a contar do momento da entrega da cópia da gravação ao requerente - arts. 201°, n° 1 e 205°, n° 1 do CPC ( aplicável ex vi do art. 1°, nº 2, aI. a) do CPT ) - ( cfr., entre outros, o Ac. da RL de 24.06.04, P. 459312004-2, in http://www.dgsi.pt/itr1. nsf e Acs. do ST.J de 12.03.02. P . JST J00042876 e de 14.12.05, P . JST JOOO, in http: www. dgsi. Pt/jstj.nsf). ln casu, as cópias da gravação foram entregues em 22.09.05 ( fls. 353 ), pelo que a arguição da nulidade apresentada pelo A. em 27.09.05 ( fls. 354 ), foi tempestiva. Constatada a deficiência na gravação das declarações do legal representante da Ré ( dificilmente perceptíveis ), do depoimento das testemunhas arroladas pelo A. J…, V… ( totalmente omissas ), C… ( parcialmente omissa ), e das testemunhas arroladas pela R., A. ( parcialmente omissa ), P… ( totalmente omissa) e M… ( parcialmente omissa ), e sendo certo que o Exmº Magistrado que procedeu ao julgamento já não se encontra ao serviço, por se ter reformado por invalidez, impõe-se a anulação do julgamento e repetição de toda a prova produzida, o que é preferível até pelo lapso de tempo já decorrido desde a última sessão de julgamento - art. 654°, nºs 1 e 3 do CPC ( aplicável ex vi do art 1º, nº 2, aI. a) do CPT ). Pelo exposto, declaro nulo o julgamento e todo o processado subsequente, nomeadamente, a sentença de fls. 323 e ss. Sem custas, por não terem as partes dado causa à anulação. Notifique. * Para audiência de julgamento designo os próximos dias…”. Inconformada a Ré interpôs recurso de agravo (vide fls 464 a 468). Apresentou as seguintes conclusões: (…) Finalizou solicitando que o presente recurso seja julgado procedente, por provado, revogando-se o despacho recorrido e substituindo-o por outro que declare a extemporaneidade da arguição da nulidade invocada pelo Autor e a consequente sanação do vício em causa. O Autor não contra alegou. A Exmª Juiz sustentou a decisão recorrida. O Exmº Procurador Adjunto emitiu parecer no sentido da procedência do recurso (fls 484). Foram colhidos os vistos dos Exmºs Adjuntos. Nada obsta à apreciação. ** O objecto do recurso apresenta-se delimitado pelas conclusões da respectiva alegação (art 684º nº 3º e 690º nº 1º ambos do CPC ex vi do art 87º do CPT). Nas palavras do Conselheiro Jacinto Rodrigues Bastos: “As conclusões consistem na enunciação, em forma abreviada, dos fundamentos ou razões jurídicas com que se pretende obter o provimento do recurso… Se as conclusões se destinam a resumir, para o tribunal ad quem, o âmbito do recurso e os seus fundamentos pela elaboração de um quadro sintético das questões a decidir e das razões porque devem ser decididas em determinado sentido, é claro que tudo o que fique para aquém ou para além deste objectivo é deficiente ou impertinente” – Notas ao Código de Processo Civil, Volume III, Lisboa, 1972, pág 299. In casu, as questões a decidir são saber se : - a nulidade processual invocada pelo Autor no seu requerimento de 29 de Setembro de 2005 é extemporânea. - a interpretação dada pelo despacho recorrido aos artigos 201°, nº 1 e 205°, nº 1 ambos do CPC - no sentido de que aqueles artigos são aplicáveis à arguição de uma nulidade decorrente de deficiente gravação da prova, sem necessidade de atender ao disposto no Decreto-Lei nº 39/95, de 15 de Fevereiro, permitindo a sua arguição após o decurso do prazo estabelecido naquela legislação - é materialmente inconstitucional por violação do Princípio da tutela jurisdicional efectiva, vertido no artigo 20°, nº 4 da Constituição da República Portuguesa e do Princípio da segurança jurídica e da protecção da confiança, ínsito no Princípio do Estado de Direito Democrático, consagrado no artigo 2° da referida Constituição. - ainda que se repita o julgamento o depoimento de parte do legal representante da Ré, P…, não se justifica uma vez que, nos termos do artigo 563º do CPC, aplicável ex vi artigo 1°, nº 2 a) do CPT, foi reduzido a escrito todo o depoimento. ** A matéria de facto atinente à decisão do presente recurso mostra-se enunciada no relatório supra constante. O Decreto-Lei nº 39/95, de 15 de Fevereiro (objecto da Declaração de Rectificação n.º 73/95, de 31 de Maio), consagrou a admissibilidade do registo das provas produzidas ao longo da audiência de discussão e julgamento. Nos termos do preâmbulo do supra citado diploma, tal possibilidade destina-se a alcançar um triplo objectivo. “Em primeiro lugar, na perspectiva das garantias das partes no processo, as soluções ora instituídas implicarão a criação de um verdadeiro e efectivo 2.º grau de jurisdição na apreciação da matéria de facto, facultando às partes na causa uma maior e mais real possibilidade de reacção contra eventuais – e seguramente excepcionais - erros do julgador na livre apreciação das provas e na fixação da matéria de facto relevante para a solução jurídica do pleito”. “Em segundo lugar, o registo dos depoimentos prestados em audiência configura-se seguramente como meio idóneo para afrontar o clima de quase total impunidade e da absoluta falta de controlo que precisamente por força do referido peso excessivo da oralidade e da audiência - envolve o possível perjúrio do depoente que intencionalmente deturpe a verdade dos factos”. Por último , “ o registo das audiências e da prova nelas produzida configura-se ainda como instrumento adequado para satisfazer o próprio interesse do tribunal e dos magistrados que o integram, inviabilizando acusações de julgamento à margem ( ou contra ) da prova produzida, com os benefícios que daí poderão advir para a força persuasiva das decisões judiciais e para o necessário prestígio da administração da justiça. O registo das provas permitirá ainda auxiliar de forma relevante o próprio julgador a rever e confirmar no momento da decisão, com maior segurança, as impressões pessoais que foi colhendo ao longo de julgamentos demorados, fraccionados no tempo e comportando a inquirição de numerosos depoentes sobre matérias complexas”. Cabe agora salientar que a gravação da audiência pode ser requerida por qualquer das partes ou ser determinada oficiosamente pelo tribunal, quando a decisão admita recurso ordinário ( nº 2 do artigo 68º do Código de Processo do Trabalho e artigo 522-B do Código de Processo Civil). A gravação deve ser requerida nos cinco dias posteriores ao termo do prazo para oferecimento do último articulado, ou na audiência preliminar se a esta houve lugar – vide n.º 4 do artigo 68.º do Código de Processo do Trabalho e alínea c) do n.º 2 do artigo 508.º-A do Código de Processo Civil. Segundo o artigo 522-C do CPC: “1 – A gravação é efectuada, em regra, por sistema sonoro, sem prejuízo do uso de meios audiovisuais ou outros processos técnicos semelhantes de que o tribunal possa dispor. 2- Quando haja lugar a registo áudio ou vídeo, deve ser assinalado na acta o início e o termo da gravação de cada depoimento, informação ou esclarecimento». Os artigos 3º a 9º do Decreto-Lei n.º 39/95, de 15 de Fevereiro, regem sobre a gravação. Esta , em regra, é efectuada com o equipamento para o efeito existente no tribunal (artigo 3º), por funcionários de justiça (artigo 4.º). A gravação deve ser levada a cabo de modo a que «facilmente se apure a autoria dos depoimentos gravados ou das intervenções e o momento em que os mesmos se iniciaram e cessaram, averbando-se estes no invólucro da fita magnética » - (artigo 6.º). Nos termos do art 7º: «1 - Durante a audiência são gravadas simultaneamente uma fita magnética destinada ao tribunal e outra destinada às partes. 2- Incumbe ao tribunal que efectuou o registo facultar, no prazo máximo de oito dias após a realização da respectiva diligência, cópia a cada um dos mandatários ou partes que o requeiram. 3 – O mandatário ou a parte que use da faculdade a que alude o número anterior fornecerá ao tribunal as fitas magnéticas necessárias”. O art 8º estabelece que “ a audiência será interrompida pelo tempo indispensável sempre que ocorra qualquer circunstância que impossibilite temporariamente a continuidade da gravação ». O art 9º do aludido diploma estabelece : « se, em qualquer momento, se verificar que foi omitida qualquer parte da prova ou que esta se encontra imperceptível, proceder-se-á à sua repetição sempre que for essencial ao apuramento da verdade». Cabe agora salientar que o artigo 690-A do CPC impõe um ónus de alegação a cargo do recorrente que impugne a decisão de facto que se traduz na necessidade de especificar: - os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; - os concretos meios probatórios que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida (n.º 1). Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, «incumbe ainda ao recorrente, sob pena de rejeição do recurso, indicar os depoimentos em que se funda, por referência ao assinalado na acta, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 522.º-C» (n.º 2). Daí que o n.º 6 do artigo 698.º do Código de Processo Civil, bem como o n.º 3 do artigo 80.º do Código de Processo do Trabalho, estabeleçam que os prazos para as alegações e resposta referidos nos números anteriores «são acrescidos de 10 dias», se o recurso tiver por objecto a reapreciação da prova gravada. Também o regime previsto no artigo 712.º do Código de Processo Civil, com o título «Modificabilidade da decisão de facto», respeita à possibilidade de registo das provas produzidas na audiência de discussão e julgamento. Esse preceito, na segunda parte da alínea a) do seu n.º 1, permite à Relação alterar a decisão do tribunal de 1.ª instância sobre a matéria de facto, «se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada, nos termos do artigo 690-A, a decisão com base neles proferida». Dispõe o n.º 2 do mesmo preceito, ex vi do artigo 87º do CPT, que «no caso a que se refere a segunda parte da alínea a) do número anterior, a Relação reaprecia as provas em que assentou a parte impugnada da decisão, tendo em atenção o conteúdo das alegações de recorrente e de recorrido, sem prejuízo de oficiosamente atender a quaisquer outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados». A Relação tem a possibilidade de «determinar a renovação dos meios de prova produzidos em 1.ª instância que se mostrem absolutamente indispensáveis ao apuramento da verdade, quanto à matéria de facto impugnada, aplicando-se às diligências ordenadas, com as necessárias adaptações, o preceituado quanto à instrução, discussão e julgamento na 1.ª instância e podendo o relator determinar a comparência pessoal dos depoentes» (n.º 3 do artigo 712.º citado). No caso em apreço, foi requerida e deferida a gravação de depoimentos. Por outro lado, após ter sido proferida sentença pelo Tribunal de 1ª instância o Autor veio arguir nulidade com base na falta de gravação de alguns depoimentos. Constata-se que os registos magnéticos foram entregues à mandatária do autor, em 22 de Setembro de 2005, sendo que só a partir dessa data a mesma podia ter tomado conhecimento das apontadas deficiências, agindo com a necessária diligência (artigos 205º, n.º 1 e 153º, n.º 1, ambos do Código de Processo Civil). A mandatária apercebeu-se das apontadas deficiências quando procedia à respectiva audição, com vista a motivar a pretendida impugnação da decisão do tribunal de 1ª instância sobre a matéria de facto, sendo certo que arguiu tal nulidade em 27 de Setembro de 2005 ou seja cinco dias após o recebimento das gravações em causa. Assim, atento o disposto no artigo 9.º do citado Decreto-Lei n.º 39/95, afigura-se que a nulidade atinente à deficiente gravação do depoimento das testemunhas foi suscitada atempadamente em 1ª instância. Argumentar-se-á com o prazo de oito dias referido no nº 2º do art 7º do DL nº 39/95. Todavia, salvo o devido respeito por entendimento distinto , tal prazo destina - se ao Tribunal e não às partes . É o prazo de que Tribunal dispõe para facultar a quem o requereu as cópias da gravação em causa, sendo certo que não resulta dessa norma que a mesma estabeleça um termo de oito dias sobre a realização de cada diligência para se requerer cópia da sua gravação e muito menos para arguir a nulidade decorrente de deficiente gravação. Os argumentos referidos no preâmbulo do diploma quanto aos Magistrados no tocante aos julgamentos demorados, fraccionados no tempo e comportando a inquirição de numerosos depoentes sobre matérias complexas, também funcionam para as partes e seus mandatários. Por outro lado, a ser assim não se compreenderia o disposto no art 9º do DL nº 39/95, o qual contudo sempre tem de ser interpretado em conjunto com o regime de arguição de nulidades. Ora é evidente que as invocadas deficiências técnicas na gravação que tornaram imperceptíveis à Exmª mandatária da autora trechos significativos de depoimentos produzidos em audiência de discussão e julgamento, tornam-se impeditivas da reapreciação da prova legalmente facultada às partes (artigo 712.º, nºs 1, alínea a), 2 e 3, do Código de Processo Civil). Desta forma, tal falta é susceptível de assumir manifesta influência na decisão da causa, o que constitui nulidade processual sujeita ao regime dos artigos 201º, 202º, 203º, 205º, 206º, n.º 3, e 207º todos do Código de Processo Civil. Ora essa nulidade processual foi – como tinha de ser - arguida perante o tribunal onde foi cometida, em requerimento próprio (reclamação), apresentada no prazo de 10 dias previsto nos artigos 205º, nº 1, e 153º, n.º 1, do mesmo Código abrindo-se, assim, um incidente autónomo, ao qual a parte contrária pode ter direito a responder, nos termos do artigo 207º citado diploma. Segundo o Supremo Tribunal «se a "incompletude" ou "vício" da gravação só pode ser detectado e apercebido após a sua audição, e não ocorrendo a audição durante a audiência, aquando da recolha do depoimento, não poderá razoavelmente defender-se que o vício tenha de ser arguido na própria audiência, nem que seja a partir dela que começa a correr um qualquer prazo para essa arguição» ( acórdão de 31 de Maio de 2001, processo n.º 01A4057 , disponível em www.dgsi.pt/jstj, com o n.º convencional JSTJ00042876 citado no acórdão de 14.12.2005 do mesmo Tribunal com nº SJ200512140044524 do referido sítio). Assim, afigura-se que a autora arguiu atempadamente a nulidade relacionada com a deficiente gravação do depoimento das testemunhas em causa, a qual foi - e bem - deferida pelo tribunal onde foi cometida. Por estes motivos afiguram-se improcedentes as conclusões de recurso alinhadas sob os nºs 1 e 2. ** Mas será que a interpretação dada pelo despacho recorrido aos artigos 201º, nº 1 e 205º, nº 1 do CPC - no sentido de que aqueles artigos são aplicáveis à arguição de uma nulidade decorrente de deficiente gravação da prova, sem necessidade de atender ao disposto no Decreto-Lei nº 39/95 , de 15 de Fevereiro, permitindo a sua arguição após o decurso do prazo estabelecido naquela legislação - é materialmente inconstitucional por violação do Princípio da tutela jurisdicional efectiva, vertido no artigo 20º, nº 4 da Constituição da República Portuguesa e do Princípio da segurança jurídica e da protecção da confiança, ínsito no Princípio do Estado de Direito Democrático, consagrado no artigo 2º da referida Constituição. Segundo esta última norma ao Estado de direito democrático incumbe não apenas “ « respeitar» os direitos e liberdades fundamentais, mas também «garantir a sua efectivação» - vide J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, CRP, Anotada, 4ª edição, Coimbra Editora, pág 208. Por sua vez, o nº 4º do art 20º do CRP estatui que todos têm direito a que uma causa em que intervenham seja objecto de decisão em prazo razoável e mediante processo equitativo. Para os referidos autores “ o direito de acção ou de agir em juízo terá de efectivar-se através de um processo equitativo. O processo, para ser equitativo, deve, desde logo, compreender todos os direitos – direito de acção, direito ao processo, direito à decisão, direito à execução da decisão jurisdicional”. “A doutrina e a jurisprudência tem procurado densificar o princípio através de outros princípios através de outros princípios: 1) direito à igualdade de armas ou direito à igualdade de posições no processo, com proibição de todas as discriminações ou diferenças de tratamento arbitrárias; 2) o direito de defesa e o direito ao contraditório traduzido fundamentalmente na possibilidade de cada uma das partes invocar as razões de facto e de direito , oferecer provas , controlar as provas da outra parte, pronunciar-se sobre o valor e resultado destas provas; 3) direito a prazos razoáveis de acção ou de recurso, proibindo-se prazos de caducidade exíguos do direito de acção ou de recurso(…); 4) direito à fundamentação das decisões; 5) direito à decisão em tempo razoável; 6) direito ao conhecimento de dados processuais; 7) direito à prova, isto é, à apresentação de provas destinadas a demonstrar e provar os factos alegados em juízo; 8) direito a um processo orientado para a justiça material sem demasiadas peias formalísticas” . Referem ainda os mesmos constitucionalistas que o princípio da efectividade articula-se “ como uma compreensão unitária da relação entre direitos materiais e direitos processuais, entre direitos fundamentais e organização e processo de protecção e garantia” – vide obra citada, pág 415/416. Como já se referiu na interpretação que se perfilha o prazo referido no nº 2º do art 7º do DL nº 39/95 destina-se ao Tribunal e não às partes. Ora não se vislumbra que a interpretação dada pelo despacho recorrido aos artigos em apreço (201°, nº 1 e 205º, nº 1 do CPC) impeça por alguma forma a efectivação dos direitos e liberdades fundamentais ou que seja violadora quer da segurança jurídica quer da protecção da confiança. E também não se detecta que coloque em causa a obtenção de uma decisão jurisdicional em prazo razoável bem como a existência de um processo equitativo o qual postula a efectividade do direito de defesa, bem como os princípios do contraditório e da igualdade das armas. Estamos no domínio do controle das provas, sendo certo que qualquer dos litigantes, se for caso disso, se pode socorrer da verberada interpretação que não se afigura arbitrária, irrazoável ou infundada. Assim, não se vislumbra que a censurada interpretação padeça de qualquer inconstitucionalidade pelo que improcede a terceira conclusão de recurso. ** Cumpre agora apreciar a terceira questão que se prende com a não repetição do julgamento no tocante ao depoimento de parte do legal representante da Ré, P…. Segundo a recorrente não se justifica uma vez que, nos termos do artigo 563º do CPC, aplicável ex vi artigo 1°, nº 2 a) do CPT, foi reduzido a escrito todo o depoimento. É evidente que as invocadas deficiências técnicas na gravação, que tornaram imperceptíveis à autora partes significativas de depoimentos produzidos em audiência de discussão e julgamento, tornam-se impeditivas da reapreciação da prova legalmente facultada às partes (artigo 712.º, nºs 1, alínea a), 2 e 3, do Código de Processo Civil). Ora o deferimento da nulidade determina a repetição dos depoimentos deficientemente gravados e a anulação dos termos subsequentes à primitiva inquirição. Tal contudo só se afigura possível desde que a repetição dos depoimentos se processe com o mesmo Juiz que presidiu à prestação dos depoimentos deficientemente gravados, sob pena de violação do princípio da plenitude da assistência dos juízes consignado no art 654º do CPC. Ora, no caso concreto, a Mmª Juiz consignou na decisão recorrida que o Exmº Magistrado que procedeu ao julgamento já não se encontra ao serviço, por se ter reformado por invalidez, sendo certo que nenhuma das partes questionou tal afirmação. Assim , apesar do depoimento de parte ter sido reduzido a escrito, quando a lei apenas impõe que o seja a confissão obtida em depoimento de parte por forma a valer como meio de prova com força plena ( vide art 358º nº 1º do CC e 563º nº 1º do CPC) há que reputar correcta a anulação do julgamento e repetição de toda a prova produzida. De outra forma a Mmª Juiz sempre teria de proceder à valoração de prova a cuja produção não assistiu ( sendo certo que o pode fazer). Todavia afigura-se de maior relevo a observância dos princípios da plenitude da assistência dos juízes, da oralidade e da imediação do que o da economia processual consignado , nomeadamente no art 201º do CPC. Improcedem, pois, as 4ª e 5ª conclusões de recurso. ** Nestes termos acorda-se em julgar improcedente o recurso. Custas pela agravante. DN (processado e revisto pelo relator - vide nº 5º do art 138º do CPC ). Lisboa, 28/02/2007 Leopoldo Soares Seara Paixão Ferreira Marques |