Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
7534/13.5TBOER.L1-7
Relator: PIMENTEL MARCOS
Descritores: RESPONSABILIDADE DOS SÓCIOS
EXTINÇÃO DE SOCIEDADE
ACÇÃO EXECUTIVA
DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADE
LIQUIDAÇÃO DA SOCIEDADE
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 12/17/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDÊNCIA
Sumário: 1. Como resulta do n.º 1 do artigo 163.º do Código das Sociedades Comerciais, encerrada a liquidação e extinta a sociedade, os antigos sócios respondem pelo passivo social não satisfeito ou acautelado, mas apenas até ao montante que receberam na partilha, sem prejuízo do disposto quanto a sócios de responsabilidade ilimitada.
2. A extinção da sociedade não produz a extinção da instância nas acções em que a sociedade seja parte; estas prosseguem, a não ser que a sua continuação se torne inútil ou impossível.
3. Se numa acção executiva pendente contra uma sociedade comercial esta se extinguir por dissolução e liquidação, não deve a instância ser suspensa, nem é necessária a habilitação, devendo antes prosseguir, sendo a sociedade substituída pela generalidade dos sócios, representados pelos liquidatários, nos termos dos artigos 163.º, n.º 2, 4 e 5, e 164, n.º 2 e 5 do CSC.
(Sumário do Relator
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa – 7ª secção.
I
1. P e A instauraram execução contra “A… Ld.ª” para prestação de facto e para pagamento de quantia certa.
A senhora Solicitadora informou que tinha sido cancelada a matrícula da executada.
Os exequentes, em face da liquidação e extinção da sociedade, requereram, ao abrigo do disposto nos artigos 162.º, 163.º e 164.º, todos do CSC (do qual serão todos os citados sem indicação doutra origem), o prosseguimento da execução contra a sócia da executada, “Pa…”, na pessoa do seu liquidatário, RA.
Por despacho de 03.02.2014 foi decidido:
a) O indeferimento do prosseguimento da execução contra os sócios da executada;
b) A declaração de extinção da execução por inutilidade superveniente da lide (art. 277.º, alínea e) CPC).
Transcreve-se o essencial desse despacho:
«O art. 269.º, n.º 1, alínea a) do CPC, na redacção da Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, dispõe que a instância se suspende quando falecer ou extinguir alguma das partes, sem prejuízo do disposto no art. 162.º do Código das Sociedades Comerciais (CSC).
O art. 162.º, n.º 1 do CSC, dispõe por sua vez, que “As acções em que a sociedade seja parte continuam após a extinção desta, que se considera substituída pela generalidade dos sócios, representados pelos liquidatários, nos termos dos artigos 163.º, n.º 2, 4 e 5, e 164, n.º 2 e 5.”, salientando o n.º 2 do mesmo preceito, que “A instância não se suspende, nem é necessária a habilitação”.
O art. 163.º do CSC, sob a epígrafe de ‘passivo superveniente’, dispõe no seu n.º 1 que “Encerrada a liquidação e extinta a sociedade os antigos sócios respondem pelo passivo social não satisfeito ou acautelado, até ao montante que receberam na partilha, sem prejuízo do dispostos quanto a sócios de responsabilidade ilimitada.”.
O preceito visa promover, como que uma segunda liquidação de obrigações entre os sócios, a fim de que possam ressarcir o credor social, o que farão na proporção daquilo que tiverem recebido.
No caso vertente, trata-se de uma obrigação da sociedade que não foi satisfeita aquando da liquidação, pelo que a acção deverá prosseguir contra os sócios, representados pelos liquidatários (art. 163.º, n.º 2 CSC).
Na falta de indicação em registo dos liquidatários, aqueles serão os membros da administração da sociedade dissolvida (art. 151.º, n.º 1 CSC), porém, como a responsabilidade está limitada aos bens e obrigações que tenham recebido e como, por princípio, apenas os sócios recebem bens, apenas os sócios que sejam gerentes devem ser citados.
Porém, o prosseguimento de uma acção contra os sócios, pressupõe o reconhecimento da responsabilidade destes pela obrigação contraída pela sociedade, na medida do que tenham recebido do passivo da sociedade extinta ou que esta não tenha realizado em cumprimento da sentença, o que não é manifestamente aplicável em processo executivo, uma vez que o fim e limites da acção executiva estão definidos pelo título executivo, pelo qual se afere também a legitimidade do exequente executado (art. 45.º e 55.º CPC).
Acresce, que, no caso vertente, o reconhecimento não resulta do título executivo, nem se reconduz a uma mera questão de habilitação, impondo um juízo prévio de reconhecimento de uma obrigação de reparação a cargo dos sócios, o que não tem enquadramento na tramitação da acção executiva, bem como a existência de um bem recebido da sociedade, sobre o qual pudesse prosseguir a execução como execução para pagamento de quantia certa no caso de não serem efectuadas as reparações devidas.
Neste conspecto, a exequente nada alegou sobre a existência de activo que tenha sido partilhado, o que seria acessível pela consulta da deliberação de liquidação registada, sem prejuízo de os sócios serem responsabilizados em acção declarativa, neste sentido, vide, com pormenor, o Ac. TRP de 26.05.2009 relatado por Rodrigues Pires no âmbito do Proc. n.º 275-D/2000.P1 e disponível em http://www.dgsi.pt .
Por conseguinte, a execução não pode prosseguir em virtude da extinção da sociedade executada e da inadmissibilidade, por falta de título, do seu prosseguimento quanto aos sócios».
2. Inconformados apelaram os exequentes, formulando as conclusões que se transcrevem:
a) O presente recurso vem interposto da douta sentença proferida pelo MMº Juiz a quo, a qual determinou o indeferimento do prosseguimento da execução contra os sócios da executada e declarou a extinção da execução por inutilidade superveniente da lide nos termos do art. 277.º, alínea e), do CPC;
b) Entende a douta sentença recorrida que o prosseguimento de uma acção contra os sócios pressupõe o reconhecimento da responsabilidade destes pela obrigação contraída pela sociedade, na medida do que tenham recebido do passivo da sociedade extinta ou que esta não tenha realizado em cumprimento da sentença, o que não é manifestamente aplicável em processo executivo, uma vez que o fim e limites da acção executiva estão definidos pelo título executivo, pelo qual se afere também a legitimidade do exequente executado;
c) E acrescenta que o reconhecimento não resulta do título executivo, nem se reconduz a uma mera questão de habilitação, impondo um juízo prévio de reconhecimento de uma obrigação de reparação a cargo dos sócios, o que não tem enquadramento na tramitação da acção executiva, bem como a existência de um bem recebido da sociedade, sobre o qual pudesse prosseguir a execução como execução para pagamento de quantia certa no caso de não serem efectuadas as reparações devidas;
d) Contudo, diversa devia ter sido a decisão proferida; tendo os recorrentes instaurado a presente execução de sentença para prestação de facto e para pagamento de quantia certa nos próprios autos de accção declarativa, e tendo a executada sido dissolvida, liquidada e cancelada a respectiva matrícula no registo, conforme consta do ofício da Sra. Agente de Execução datado de 13-01-2014, impunha-se que o MMº Juiz a quo determinasse o prosseguimento da execução contra a sócia da executada, “Pa…”, na pessoa do respectivo liquidatário;
e) Atento o disposto nos arts. 269.º, n.º 1, alínea a) do CPC e 162.º do CSC, nas acções (e execuções) pendentes contra a sociedade, opera uma sucessão subjetiva, sem suspensão da instância e nem habilitação, considerando-se ela substituída pelos ex-sócios;
f) Com a extinção - que só se verifica com a inscrição, no registo, do encerramento da liquidação - deixa de existir a pessoa colectiva, que perde a sua personalidade jurídica e judiciária, mas as relações jurídicas de que a sociedade era titular não se extinguem.
g) As acções pendentes, em que a sociedade seja parte, continuam após a extinção desta, que se considera substituída pela generalidade dos sócios, representados pelos liquidatários;
h) Ainda que assim não se entendesse, sempre se deverá considerar que, extinta a pessoa colectiva antes de proposta contra a si a acção e só tendo o demandante, no caso os exequentes, conhecimento desse facto já na pendência da acção, deverá ser suspensa a instância para que aqueles possam requerer a habilitação dos sócios da pessoa colectiva extinta;
i) pois o facto de ter ocorrido a extinção da sociedade em data anterior à propositura da acção, facto que só foi conhecido dos exequentes, ora apelantes, durante a tramitação processual, não implica, desde logo, que se decrete a absolvição da instância da executada, sem que pelo menos antes se providencie pela habilitação dos sócios, seus sucessores;
j) A lei permite que se realize a habilitação de sucessores no âmbito do incidente de habilitação previsto no CPC, mesmo que no decorrer da tramitação processual da acção se reconheça que a causa que gera a habilitação ocorreu em data anterior à propositura da acção, e não só nos casos da mesma ocorrer já no decurso da acção (cfr. artº 351º n.º 2 do CPC).
k) Tal previsão contempla os casos em que o demandante (no caso o exequente) intenta a acção executiva contra determinada pessoa singular ou colectiva, pensando que ela não é falecida (singular), nem se encontra extinta (colectiva);
l) No caso vertente impunha-se substituição da executada pela generalidade dos sócios, conforme se prevê no art. 162º do CSC.
m) Mas mesmo que assim não o entendesse o MMº Juiz a quo, impunha-se que, pelo menos, ordenasse a suspensão da instância, nos termos dos art.ºs 269º nº 1, al. a) e 270º, nº 1 do CPC, a fim de que os exequentes providenciassem para que a habilitação dos sócios da extinta sociedade executada se efectivasse, para efeitos do artº 163º do CSC, pois a lei impõe habilitação de sucessores, mesmo que o facto que alicerce tal habilitação tenha ocorrido em data anterior à propositura da acção.
n) Acresce que a falta de um pressuposto processual não determina, automaticamente, a extinção da instância, desde que possa suprir-se, como claramente resulta do art.° 6º n.º 2 do CPC, que impõe ao juiz o dever de mesmo oficiosamente, determinar a realização dos actos processuais necessários à sua regularização;
o) A douta sentença recorrida, ao não entender assim, ao indeferir o prosseguimento da execução contra os sócios da executada e ao declarar a extinção da execução por inutilidade superveniente da lide nos termos do art. 277.º, alínea e) CPC) fez errada interpretação e aplicação da lei, violando, nomeadamente, o disposto nos arts. 162º e 163º do CSC, 6º n.º 2, 269º, nº 1, al. a), 270º, nº 1, e 351º nº 2 do CPC.
E terminam dizendo que deve ser dado provimento ao recurso, ordenando-se o prosseguimento da acção executiva contra os sócios da extinta sociedade “A… Ld.ª” representados pelo liquidatário, ou caso assim não se entenda, que se ordene a suspensão da instância a fim de os exequentes providenciem para que a habilitação dos sócios da extinta sociedade executada se efective.
II
1. Os factos a ter em conta são os referidos, esclarecendo-se que a única sócia da executada é “Pa…”, e que o liquidatário é RA.
É pelas conclusões que se determinam o âmbito e os limites do recurso (art.º 639.º do CPC).
A única questão a decidir é saber se a execução deve prosseguir contra a sócia da executada, representados pelo liquidatário, ou se, pelo contrário, como foi decidido, deve ser indeferido o prosseguimento da execução e declarada a extinção da execução por inutilidade superveniente da lide.
2. Foi entendido na douta sentença recorrida que o prosseguimento de uma acção contra os sócios pressupõe o reconhecimento da responsabilidade destes pelas obrigações contraída pela sociedade, na medida do que tenham recebido do passivo da sociedade extinta ou que esta não tenha realizado em cumprimento da sentença, o que não seria manifestamente aplicável em processo executivo, uma vez que o fim e limites da acção executiva estão definidos pelo título executivo, pelo qual se afere também a legitimidade do exequente executado. E acrescentou-se que o reconhecimento não resulta do título executivo, nem se reconduz a uma mera questão de habilitação, impondo um juízo prévio de reconhecimento de uma obrigação de reparação a cargo dos sócios, o que não teria enquadramento na tramitação da acção executiva.
Diferentemente, os apelantes entendem que, tendo instaurado a execução de sentença para prestação de facto e para pagamento de quantia certa, e tendo a executada sido dissolvida, liquidada e cancelada a respectiva matrícula no registo, impunha-se que o MMº Juiz a quo determinasse o prosseguimento da execução contra a sócia da executada, “Pa…”, na pessoa do respectivo liquidatário.
Parece-nos que deve ser seguida a posição defendida pelos recorrentes.
3. O art. 269.º, n.º 1, alínea a) do CPC, na redacção dada pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, determina que a instância se suspende quando falecer ou extinguir alguma das partes, sem prejuízo do disposto no artigo 162.º do Código das Sociedades Comerciais (CSC).
Por sua vez estabelece este artigo:
1. As acções em que a sociedade seja parte continuam após a extinção desta, que se considera substituída pela generalidade dos sócios, representados pelos liquidatários, nos termos dos artigos 163.º, n.º 2, 4 e 5, e 164, n.º 2 e 5.”.
2. A instância não se suspende, nem é necessária habilitação” .
São realidades distintas, sujeitas a regimes igualmente distintos, a dissolução e liquidação da sociedade e a sua extinção.
Com efeito, uma sociedade dissolvida e em liquidação não está extinta: a extinção só se verifica com a inscrição, no registo, do encerramento da liquidação (artigo 160º, n.º 2): “a sociedade considera-se extinta, mesmo entre os sócios e sem prejuízo do disposto nos artigos 162.º a 164.º, pelo registo do encerramento da liquidação”.
Dissolvida a sociedade, entra e mesma em liquidação (art.146º, n.º 1), mantendo ainda a sua personalidade jurídica (art. 146º, n.º 2). Com efeito, é o artigo 146.º, n.º 2 que estabelece que “a sociedade em liquidação mantém a personalidade jurídica e, salvo quando outra coisa resulte das disposições subsequentes ou da modalidade de liquidação, continuam a ser-lhe aplicáveis, com as necessárias adaptações, as disposições que regem as sociedades não dissolvidas”. Os seus gerentes passam a ser liquidatários, salvo disposição estatutária ou deliberação noutro sentido (art. 151º, n. 1), competindo-lhes, então, nomeadamente, tratar dos negócios pendentes e cumprir as obrigações da sociedade (art. 152º).
Com a extinção da sociedade é que deixa de existir a pessoa colectiva, perdendo a sua personalidade jurídica e judiciária, mas as relações jurídicas de que a sociedade era titular não se extinguem, como resulta do preceituado nos artigos 162º, 163º e 164º.
Estas disposições normativas tratam de matérias conexas, todas elas derivadas da subsistência de relações jurídicas, depois de extinta a sociedade[1].
Assim, no que diz respeito às acções pendentes em que a sociedade seja parte, as mesmas continuam (após a sua extinção), que se considera substituída pela generalidade dos sócios, representados pelos liquidatários (sem que haja suspensão da instância, por não ser necessária a habilitação): são eles que passam a ser parte na acção, representados pelos liquidatários. E estes passam a ser considerados como representantes legais da generalidade dos sócios.

Como resulta do n.º 1 do artigo 163.º “encerrada a liquidação e extinta a sociedade, os antigos sócios respondem pelo passivo social não satisfeito ou acautelado, até ao montante que receberam na partilha, sem prejuízo do disposto quanto a sócios de responsabilidade ilimitada”.
Significa isto que, extinta a sociedade comercial, pelo registo de encerramento da liquidação, as obrigações jurídicas que a vinculavam transitam para a esfera jurídica dos antigos sócios.
Portanto, os antigos sócios respondem pelo passivo social não satisfeito ou acautelado, mas apenas até ao montante que receberam na partilha. A sua responsabilidade pessoal (no caso, como o sub judice, dos sócios das sociedades de responsabilidade limitada) não excede, pois, as importâncias que hajam recebido em partilha dos bens sociais.
E, por isso, determina o n.º 3 do artigo 163.º que o antigo sócio que satisfazer alguma dívida, por força do disposto no n.º 1, tem direito de regresso contra os outros, de maneira a ser respeitada a proporção de cada um nos lucros e nas perdas.
«A extinção opera-se “sem prejuízo do disposto nos art.ºs 162.º a 164.º”, ou seja, do disposto quanto a acções pendentes, activo e passivo supervenientes. Isto não significa que, para os efeitos desse artigo, a sociedade não se considere extinta, mas sim que o facto de a sociedade se extinguir, nos termos referidos, não prejudica as soluções que o legislador criou, nos artigos 162.º a 164.º, para as acções pendentes e para a superveniência de activo  ou de passivo»[2].
4. Como se disse, a extinção da sociedade não produz a extinção da instância nas acções que a sociedade seja parte[3]; Estas acções prosseguem, a não ser que a sua continuação se torne inútil ou impossível, que não é o caso.
No Código anterior, a redacção do artigo 276.º, n.º 1, do CPC era igual à do citado artigo 269.º e foi alterada pelo DL 329-A/95, de 12 de Dezembro, mas esta alteração limitou-se à inclusão da ressalva do preceituado no citado artigo 162.º.
Portanto, as acções pendentes em que a sociedade seja parte continuam após a extinção desta, nos termos dos artigos 163.º, n.º 2, 4 e 5, e 164, n.º 2 e 5. E a instância não se suspende, nem é necessária a habilitação, o que significa que a acção prossegue (sem a realização daquelas formalidades) e a sociedade é substituída pela generalidade dos sócios, representados pelos liquidatários, nos termos dos artigos 163.º, n.º 2, 4 e 5, e 164, n.º 2 e 5.
Na generalidade dos casos, a instância suspende-se quando se extinguir alguma das partes. Mas esta regra não se aplica precisamente nos casos a que alude o artigo 162.º, em que se determina expressamente que a instância não se suspende, nem é necessária a habilitação, antes prosseguindo seus termos, considerando-se a sociedade representada pela generalidade dos sócios.
5. E, salvo sempre melhor opinião em sentido contrário, esta doutrina é também aplicável às execuções
Por exemplo o acórdão desta Relação, de 04.02.1988 BMJ 372-474) decidiu: “extinta uma sociedade comercial, a acção ou a execução, em que seja parte, prossegue com a generalidade dos sócios, representados pelos liquidatários, sem necessidade de suspender a instância e de habilitar ou sucessores para com eles prosseguir os termos da demanda”.
É certo que, nos termos do artigo 10.º, n.º 5 do NCPC (anterior 45.º) toda a execução tem por base um título pelo qual se determinam o fim e os limites da execução. E determina o artigo 53.º que a execução tem de ser promovida pela pessoa que no título executivo figure como credor e deve ser instaurada contra a pessoa que no título tenha aposição de devedor. Mas o artigo 54.º prevê vários desvios à regra geral da determinação da legitimidade. E, atento o disposto nos arts. 269.º, n.º 1, alínea a) do CPC e 162.º do CSC, nas acções pendentes contra a sociedade (também nas execuções) opera-se uma sucessão subjetiva, pelo que passam a correr contra os antigos sócios, os quais são representados pelos liquidatários.
E um grande desvio à regra, segundo a qual a instância se suspende quanto se extinguir alguma das partes, está previsto precisamente no citado artigo 162.º.
O artigo 354,º do NCPC refere-se à habilitação no caso de a legitimidade ainda não estar reconhecida. E determina o seu n.º 3: Se for parte na causa uma pessoa colectiva ou sociedade que se extinga, a habilitação dos sucessores faz-se em conformidade do disposto neste artigo, com as necessárias adaptações e sem prejuízo do disposto no artigo 162.º do Código das Sociedades Comerciais (no mesmo sentido o n.º 3 do artigo 374.º no código anterior). Também aqui se estabelece uma excepção à regra geral e no mesmo sentido.
Se a instância não se suspende nem é necessária a habilitação, e aludindo a lei apenas às “acções pendentes” (e uma execução é uma acção pendente) não vemos por que razão não devem aquelas disposições legais ser aplicáveis à execução.
Os exequentes vieram exercer o seu alegado direito contra a dita sociedade comercial. Mas, com a sua extinção, as obrigações jurídicas que a vinculam transitaram para a esfera jurídica da única sócia da executada, a “Pa…”, sendo liquidatário RA.
Sucede, porém, que os sócios só respondem pelas dívidas da sociedade nos termos referidos. Mas isso não significa que numa acção executiva não possam defender os seus direitos. Com efeito, à semelhança do que sucede com outros executados, podem deduzir oposição. E nela podem invocar os fundamentos a que aludem os artigos 728.º a 731.º do CPC.
Por isso, também nas acções executivas pendentes e relativas a sociedades comerciais, extintas por dissolução e liquidação, nos termos referidos, não é necessária a suspensão da instância (nem a mesma é inútil) a fim de o exequente proceder à habilitação “da generalidade dos sócios” representados pelos liquidatários, devendo a execução prosseguir contra eles.
Em conclusão: Se numa acção executiva pendente contra uma sociedade comercial esta se extinguir por dissolução e liquidação, não deve a instância ser suspensa, nem é necessária a habilitação, devendo antes prosseguir, sendo a sociedade substituída pela generalidade dos sócios, representados pelos liquidatários, nos termos dos artigos 163.º, n.º 2, 4 e 5, e 164, n.º 2 e 5 do CSC.
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Por todo o exposto acorda-se em julgar procedente a apelação, revogando-se o despacho recorrido, o qual deverá ser substituído por outro que ordene o prosseguimento da execução nos termos referidos, se a tanto não obstarem outras circunstâncias.
Custas pela parte vencida a final.
Lisboa, 17.12.2014.
José David Pimentel Marcos
Maria do Rosário Morgado
Rosa Maria Ribeiro Coelho.
[1] Cfr. RAUL VENTURA, Dissolução e Liquidação de Sociedades, Almedina, 1987, pág. 461.
[2]  Idem ibidem, pág. 436.
[3] Cfr. RAÚL VENTURA, ob.cit. págs. 466 e segs.