Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
10010/2008-6
Relator: MARIA MANUELA GOMES
Descritores: ACÇÃO DE REIVINDICAÇÃO
ACÇÃO DE DESPEJO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 04/30/2009
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO
Sumário: 1. O arrendamento só deve estar sujeito ao regime proteccionista das leis do inquilinato, quando se tenha em vista especialmente arrendar e não apenas ceder casa para o inquilino dar cumprimentos a obrigações emergentes de outro contrato ou de outra situação jurídica ou para facilitar o exercício de certa actividade pessoal.
2. Estando em causa a cedência da habitação nestes termos, a forma de obter a restituição não é o despejo, mas sim a reivindicação.
(F.G.)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:
1. A Administração do Condomínio do Prédio …, em Lisboa, intentou acção, com processo ordinário, contra Maria, pedindo que fosse reconhecido o direito de propriedade do condomínio representado pela Autora em relação à casa de porteira do prédio…, em Lisboa e que a ré fosse condenada a restituir a referida Casa de Porteira ao condomínio, livre e devoluta de pessoas e bens, por não existir título que legitime a sua posse.
Alegou, para tal, em síntese, que o prédio sito na Rua …, em Lisboa, tem como parte comum uma casa de porteira, com duas divisões assoalhadas, sita na cave; que a ré foi contratada para exercer as tarefas de porteira do dito prédio, auferindo uma remuneração mensal satisfeita parcialmente em dinheiro e parcialmente em alojamento; o contrato de trabalho que vigorava entre as partes cessou por iniciativa do condomínio, que procedeu ao despedimento por justa causa da Ré; solicitada à ré a entrega da casa que vinha ocupando, esta recusou-se a tal, continuando a habitá-la.
Regularmente citada, a Ré contestou.
Invocou, basicamente, que reside na Rua … em Lisboa, pelo menos desde 28.02.1002, a título de arrendatária, não havendo a referida fracção sido cedida a esta enquanto porteira do referido prédio; sempre pagou pontualmente as rendas relativas à fracção autónoma que ocupa na referida morada e mesmo depois do seu despedimento, tem liquidado atempadamente a renda mensal pelo arrendamento da referida fracção, jamais havendo a Autora recusado tais pagamentos.
A Autora apresentou articulado de réplica, em que concluiu como na petição inicial.

Corridos os subsequentes termos processuais, foi proferida sentença a julgar a acção procedente por provada e, em consequência, declarou que é o condomínio o proprietário das dependências destinadas ao uso e habitação da porteira compostas de duas divisões assoalhada, existentes na cave do prédio urbano e condenou a Ré a restituir ao condomínio as referidas dependências ( fls. 176 a 192).

Inconformada, recorreu a ré para este Tribunal, onde foi proferido acórdão que anulou o julgamento para sanação de contradição de factos (fls. 241 a 244).

Repetido o julgamento para os fins enunciados no acórdão acima referido, foi proferido nova sentença, no sentido da primeira – a declarar que o condomínio, representado pela Autora, é o proprietário das dependências destinadas ao uso e habitação da porteira compostas de duas divisões assoalhada, existentes na cave do prédio urbano …, em Lisboa e a condenar a Ré a restituir ao condomínio as referidas dependências (fls. 266 a 284).

Dizendo-se, uma vez mais inconformada, apelou a ré.
Alegou e, a final, formulou as seguintes conclusões:
1. Um dos fundamentos da contestação apresentada pela ora apelante tinha a ver com o facto de a mesma não possuir qualquer outra habitação onde possa viver no caso de proceder a acção judicial contra si interposta pela ora apelada.
2. Na verdade, conforme resulta da factualidade assente da decisão recorrida, a apelante reside no local objecto dos autos desde, pelo menos. 1980, ou seja, há mais de 26 anos.
3. Significa, portanto, que a apelante organizou e viveu toda a sua vida no centro da cidade de Lisboa, havendo inclusivamente o seu marido constituído uma sociedade comercial que gere um supermercado que se situa exactamente na Rua …, a apenas alguns números de polícia do local sub judice.
4. É o facto de ali viver que permite igualmente à apelante lutar contra o estado depressivo em que se encontra desde que enviuvou, beneficiando da companhia e amizade dos que lhe são próximos.
5. Ora, sem prejuízo do infra indicado quanto à substância jurídico-legal da presente acção judicial, o facto é que o tribunal não pode "fechar" os olhos a toda esta situação que envolve o caso concreto.
6. Ainda assim, na sentença ora recorrida, o tribunal limitou-se a declarar de forma lacónica que "Não ficou demonstrado que a Ré não tenha outra habitação para residir. ".
7. Significa isto que, no que respeita a este aspecto em concreto, o tribunal não especificou os fundamentos de facto para a decisão tomada, o que é causa de nulidade da sentença - art. 668, nº 1. al. b}, do CPC.
8. Ao agir de tal forma, o tribunal deixou igualmente de se pronunciar sobre questões que deviam ter sido apreciadas e que assumem relevância para a boa decisão da causa, o que redunda também na nulidade da referida decisão - art. 668, n° 1, al. d), do CPC.
9. A decisão recorrida entendeu configurar o contrato que liga as partes como um contrato de trabalho em que uma parte da remuneração devida à apelante era satisfeita em alojamento.
10. No entanto, se ainda se pode aceitar que assim fosse por força do contrato celebrado em 1980, já o mesmo não se pode dizer do período posterior à celebração do contrato de 28.02.01.
11. Isto porque esse outro contrato de trabalho, celebrado cm 2001 apenas versou sobre matéria estritamente laboral, nada mencionando acerca da situação de alojamento.
12. Por outro lado, após a celebração do contrato de 2001, a apelada começou a emitir à apelante recibos de arrendamento, correspondentes aos valores entregues por esta a título de arrendatária.
13. Acresce que, por essa mesma altura, o recibo de remuneração da apelante deixou de mencionar o alojamento, correspondendo tal facto à vontade das partes, que quiseram separar o trabalho que a apelante prestava à apelada do facto de habitar na "casa da porteira"
14. Ora, toda esta factualidade consta dos autos, não se afigurando, pois, legítimo, que ainda assim, se faça tabula rasa de tudo isto e se conclua simplesmente que a apelante sempre habitou a casa onde mora a título de porteira e apenas enquanto esse vínculo laboral se mantivesse.
15. Se considerarmos que o contrato de trabalho de 2001 já não se encontra a vigorar, isso por si só não poderá ter efeitos no que respeita à casa onde a apelante habita.
16. De facto, pela leitura das cláusulas do mesmo, nada resulta no sentido de que a apelante deva sair da sua casa em virtude de haver deixado de trabalhar para a apelada.
17. A apelante é viúva e tem 56 anos de idade, não tendo jamais residido, após casar, em qualquer outro local.
18. De facto, sempre viveu a sua vida e organizou a mesma no centro da cidade de Lisboa, onde estão todas as pessoas com quem priva há décadas.
19. A apelante vive actualmente uma situação psicológica muito frágil, atendendo ao facto de haver perdido o seu marido muito recentemente.
20. Por tudo isto, uma eventual decisão que implique a mudança de residência da apelante, que a acontecer resultaria na inevitabilidade de esta se ter de mudar para fora de Lisboa, uma vez que não consegue comportar o preço da arrendamento de uma habitação dentro da cidade, faria perigar ainda mais a saúde e a vida da apelante, não podendo o tribunal ser cego a este circunstancialismo.

A recorrida contra alegou, pugnando pela manutenção do julgado.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

Matéria de Facto.
2. A sentença recorrida, que nesta parte não mereceu reparo, deu como provados os seguintes factos:
A) O prédio sito na Rua, freguesia de São Mamede, em Lisboa, descrito na 6ª Conservatória do Registo Predial de Lisboa, foi constituído em propriedade horizontal, registada pela apresentação de 30.01.1981, sendo parte comum, a casa da porteira, com duas divisões assoalhada, sita na cave.
B) Em 2 de Janeiro de 1980, antes de constituída a propriedade horizontal sobre o prédio referido na alínea anterior, os então proprietários celebraram com a Ré o acordo que consta do documento de fls. 27 e que apelidaram de "Contrato Individual de Trabalho", através do qual "estabeleceram um contrato de trabalho para porteira ( ... )" do referido prédio, ( … ) em regime de tempo parcial (duas horas diárias) e mediante a retribuição mensal total de 1.627$60, e em alojamento, de 312$00, sendo o horário de trabalho estabelecido das 8 às 10 horas, num total de 12 horas semanais".
C) Em 28.02.2001, foi redigido novo acordo entre o condomínio do prédio referido na alínea A), na qualidade de primeiro outorgante, representado pelo administrador P e a Ré, na qualidade de segunda outorgante, o qual consta do documento de fls. 28 e que apelidaram de "Contrato de Trabalho", de cujo teor consta "O primeiro outorgante admitiu ao seu serviço, a segunda outorgante, em 1 de Outubro de 1979) atribuindo-lhe a categoria profissional de porteira, para exercer as funções inerentes à mesma categoria no prédio sito na Rua …, freguesia de São Mamede, em Lisboa.
D) No documento referido na alínea anterior, consta como cláusula primeira que "A primeira outorgante pagará à segunda outorgante a retribuição mensal ilíquida de 19.140$00, actualizável anualmente por aplicação das actualizações do salário mínimo nacional, efectuando a proporção das 40 horas semanais a que ele corresponde, para as 12 horas semanais prestadas pela segunda outorgante", sendo o horário de trabalho de Segunda-feira a Sábado, das 11 horas às 13 horas.
E) Desde 1 de Outubro de 1979 que a Ré trabalhou no prédio referido na alínea A), na qualidade de porteira, e desde essa data que reside na casa de porteira do referido prédio.
F) O acordo referido nas alíneas C) e D) cessou por iniciativa do condomínio que procedeu ao despedimento da Ré, invocando justa causa, decisão que lhe foi comunicada por carta datada de 11 de Outubro de 2004, cuja cópia consta de fls. 29 e 30 e recebida por esta em 12.10.2004.
G) Na sequência do despedimento, a Autora, por carta datada de 19.10.2004, cuja cópia está junta a fls. 33, solicitou à Ré que lhe entregasse a casa de porteira que vem ocupando.
H) A Ré continua a residir na casa de porteira sita na cave do prédio localizado na Rua …, freguesia de São Mamede, em Lisboa.
I) A Administração do condomínio do prédio sito na Rua …, em Lisboa, emitiu o recibo junto a fls. 55, em nome da Ré, datado de 7 de Julho de 2004, no valor de 38,00 €, constando do mesmo "pelo arrendamento da casa de porteira correspondente ao mês de Junho de 2004".
J) A Administração do condomínio do prédio sito na Rua …, em Lisboa, emitiu o recibo junto a fls. 56, em nome da Ré, datado de 2 de Agosto de 2004, no valor de 38,00 €, constando do mesmo "pelo arrendamento da casa de porteira correspondente ao mês de Julho de 2004”.
L) A Administração do condomínio do prédio sito na Rua …, em Lisboa, emitiu o recibo junto a fls. 57, em nome da Ré, datado de 7 de Setembro de 2004, no valor de 38,00 €, constando do mesmo "pelo arrendamento da casa de porteira correspondente ao mês de Agosto de 2004".
M) A Administração do condomínio do prédio sito na Rua da Escola Politécnica, n° 20, em Lisboa, emitiu os seguintes recibos, em nome da Ré:
- O "recibo de remunerações" junto a fls. 58, referente ao mês de Novembro de 2002, datado de 30 de Novembro de 2002, no valor total de 185,84 €, referente a remuneração base, no montante de 104,40 € e subsídio de Natal, no montante de 104,40 €, sujeito a descontos no montante total de 22,96 €, constando do mesmo "categoria profissional de porteira";
- O "recibo de remunerações" junto a fls. 59, referente ao mês de Dezembro de 2002, datado de 30 de Dezembro de 2002, no valor total de 92,92 €, referente a remuneração base, no montante de 104,40 €, sujeito a descontos no montante de 11,48 €, constando do mesmo "categoria profissional de porteira";
- O "recibo de remunerações" junto a fls. 60, referente ao mês de Junho de 2004, datado de 7 de Julho de 2004, no valor total de 97,61 €, referente a remuneração base, no valor de 109,68 €, sujeito a descontos no montante de 12,07 €, constando do mesmo "categoria profissional de porteira";
- O "recibo de remunerações" junto a fls. 61, referente ao mês de Julho de 2004, datado de 2 de Agosto de 2004, no valor total de 97,61 €, referente a remuneração base, no valor de 109,68 €, sujeito a descontos no montante de 12,07 €, constando do mesmo "categoria profissional de porteira";
- O "recibo de remunerações" junto a fls. 62, referente ao mês de Agosto de 2004, datado de 1 de Setembro de 2004, no valor total de 195,24 €, referente a remuneração base e subsídio de férias, no valor de, respectivamente, 109,68 € e 109,68 €, sujeito a descontos no montante total de 24,12 €, constando do mesmo "categoria profissional de porteira".
N) A Ré depositou na Caixa Geral de Depósitos, a favor da Administração do condomínio do prédio sito na Rua …, em Lisboa, as seguintes quantias:
a) Em 07.10.2004, a quantia de 38,00 €, referente a "retido relativa ao mês de Setembro de 2004", com a menção "por a administração recusar a passar o recibo habitual da renda de casa, da qual pago há mais de (25) vinte e cinco anos";
b) Em 25.10.2004, a quantia de 76,00 €, com a menção "retido dos meses de Outubro e Novembro de 2004";
c) Em 03.11.2004, a quantia de 38,00 €, com a menção "retida do mês de Dezembro de 2004";
d) Em 12.02.2005, a quantia de 38,00 €, com a menção "retido do mês de Janeiro de 2005";
e) Em 05.01.2005, a quantia de 38,00 €, com a menção "renda do mês de Fevereiro de 2005";
f) Em 02.02.2005, a quantia de 38,00 €, com a menção "retida do mês de Março de 2005".
O) Em contrapartida do exercício das funções de porteira do prédio referido na alínea A), a Autora sempre pagou à Ré uma remuneração mensal, satisfeita parcialmente em dinheiro e parcialmente em alojamento.
P) Para efeitos de valoração do alojamento, sempre foram aplicados os valores anualmente publicados, de acordo com os parâmetros constantes do Anexo I da Base XI do Regime Jurídico das Porteiras, aprovado pela Portaria do Ministério do Trabalho de 02.05.1975, alterada pela Portaria do Ministério do Trabalho de 20.06.1975.
Q) Na sequência da carta referida na alínea G), a Ré recusou-se a entregar a casa de porteira.
R) A Ré viveu na casa referida na alínea E) com o seu marido, o qual sofreu de doença oncológica, tendo necessitado de permanentes e dispendiosos cuidados de saúde e, entretanto, falecido em Agosto de 2005.
S) A Ré habita a casa referida na alínea E) pelo menos desde Janeiro de 1980, data consignada no documento de fls. 27.
T) A utilização da casa referida na alínea E) pela Ré foi, sempre, como retribuição, em espécie, pelos serviços de porteira prestados ao condomínio.

O Direito.
3. A autora intentou acção de reivindicação – como aliás a denominou na petição inicial – alegando a propriedade da fracção reivindicada, o pedido do reconhecimento desse domínio pela autora e a condenação da ré na restituição da fracção, livre e desocupada.
Embora, na lide reivindicatória ou real a causa de pedir deva ser constituída pela alegação de uma forma originária de adquirir, a mesma pode ser preenchida, como foi, pela invocação da presunção que resulta do art. 7 º do C. Registo Predial.
Essa presunção da propriedade não foi ilidida pela ré, como lhe cumpria, nos termos do art. 350º do C. Civil; daí que fique assente a propriedade da autora sobre a fracção reivindicada.
Veio a ré, em sede de contestação, a alegar tratar-se de habitação de porteira, funções que desempenhava no prédio aquando da ocupação da parcela reivindicada, referindo, ao mesmo tempo, que pagava mensalmente uma renda pela ocupação da fracção.
Tal facto veio a ser vertido na resposta ao quesito 12º, onde foi considerado provado que a ocupação da casa pela ré foi sempre como retribuição em espécie pelos serviços de porteira prestados ao condomínio.
Mas também se provou – alínea F) dos factos assentes – que o contrato de trabalho como porteira, cessou por iniciativa do condomínio, que procedeu ao despedimento da ré invocando justa causa, situação que lhe foi comunicada por carta de 11.10.2004, recebida no dia seguinte.
Finalmente ficou provado, e tal releva em termos de aplicação da lei no tempo, que a ré trabalhou como porteira desde 1.10.1979.
Ao tempo do início da relação laboral era aplicável ao caso a alínea f) do nº 1 do art. 1093º do C. Civil, que dispunha a caducidade do arrendamento, se o arrendatário deixasse de prestar ao proprietário ou ao senhorio os serviços pessoais que determinaram a ocupação do prédio.
Para P. Lima, in RLJ, ano 99, p. 94, a ideia daquela alínea f) era a de que o arrendamento só devia estar sujeito ao regime proteccionista das leis do inquilinato, quando se tivesse em vista especialmente arrendar e não apenas ceder casa para o inquilino dar cumprimentos a obrigações emergentes de outro contrato ou de outra situação jurídica ou para facilitar o exercício de certa actividade pessoal.
Nestes casos o contrato devia caducar pela cessação da actividade pessoal e o dono do prédio podia obter a respectiva restituição.
Não se entrará na polémica de saber se a habitação fornecida funciona como pagamento parcelar dos serviços prestados e se esse acréscimo ao vencimento corresponde a uma renda não legal, por incerta ou indeterminada.
Actualmente a alínea g) do art. 1051º do C. Civil, na redacção do art. 2º nº 2 da Lei nº 6/2006, de 27 de Fevereiro, veio consagrar o mesmo princípio, aliás na esteira do art. 64º nº 1 al. j) do RAU. Só que, aqui, a cessação dos serviços pessoais eram causa de resolução do contrato, enquanto que na nova norma é um caso de caducidade.
Propendemos pela não aplicação deste regime quando a cedência de habitação a trabalhadores pela entidade patronal é uma mera forma de complemento do salário, existindo então um só contrato de trabalho.
Mas se está em causa a cedência da habitação nestes termos, a forma de obter a restituição não será o despejo, mas sim a reivindicação, opção que, e bem, a autora tomou.

Aqui chegados, é evidente que a acção terá de proceder, já que, reconhecido o direito de propriedade, a restituição só pode ser recusada nos casos previstos na lei, como dispõe o nº 2 do art. 1311º do C. Civil.
E as razões invocadas no acervo conclusivo da recorrente não cabem na previsão legal, para recusar a restituição.
Por muito respeito humano que se tenha pelo facto da apelante residir no local há mais de 27 anos, de atravessar um estado depressivo subsequente à morte do marido, de não dispor de outro local para habitar e de sempre ter vivido e ter todas as suas relações naquela zona da cidade, o certo é que tais razões – aliás em grande parte não constante do acervo de factos provados, à excepção da morte do marido por doença oncológica – não bastam para integrar a excepção do nº 2 do citado art. 1311º do C. Civil.
E a sentença apelada ponderou todos esses factos, não podendo por isso ser assacada de nula, por omissão de pronúncia, vício que, como é sabido, se traduz no silenciar absoluto das questões a que se refere o nº 2 do art. 660º do CPC, que não a exaurir todos os argumentos ou razões trazidas pelas partes.
Improcede, assim, o núcleo central da argumentação da recorrente, impondo-se confirmar o decidido.
Decisão
4. Termos em que se acorda em negar provimento à apelação e confirmar a sentença recorrida.
Custas pela recorrente.
Lisboa, 30 de Abril de 2009
(Maria Manuela B. Santos G. Gomes)
(Olindo dos Santos Geraldes)
( Fátima Galante )