Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
0070431
Nº Convencional: JTRL00013770
Relator: GUILHERME IGREJA
Descritores: QUESTIONÁRIO
RESPOSTAS AOS QUESITOS
FUNDAMENTAÇÃO
PODERES DO TRIBUNAL
RECURSO
PODERES DA RELAÇÃO
PROVAS
PRINCÍPIO DA LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA
RESPONSABILIDADE CIVIL POR ACIDENTE DE VIAÇÃO
PRESSUPOSTOS
PRESUNÇÃO DE CULPA
CULPA
OBRIGAÇÃO DE INDEMNIZAR
JUROS DE MORA
INÍCIO
DECISÃO JUDICIAL
CITAÇÃO
DANOS MORAIS
ÓNUS DA PROVA
OBRIGAÇÃO PECUNIÁRIA
DANOS PATRIMONIAIS
DANOS FUTUROS
Nº do Documento: RL199401250070431
Data do Acordão: 01/25/1994
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO.
Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO.
Indicações Eventuais: VAZ SERRA RLJ 113 PAG326 BMJ N68 PAG87.
Área Temática: DIR CIV - TEORIA GERAL / DIR RESP CIV.
DIR ECON - DIR TRANSP DIR RODOV. DIR PROC CIV.
Legislação Nacional: CPC67 ART655 N1 ART712 N1 B.
CCIV66 ART349 ART351 ART483 N1 ART487 ART503 ART508 ART564 N2
ART805 N3.
DL 262/83 DE 1983/07/16.
Jurisprudência Nacional: AC STJ DE 1993/02/02 IN CJSTJ 93 T1 PAG23.
AC STJ DE 1987/01/06 IN BMJ N363 PAG488.
AC STJ DE 1990/03/03 IN BMJ N390 PAG 535.
AC RC DE 1985/05/21 IN CJ T3 PAG81.
AC RL DE 1986/06/17 IN CJ T3 PAG124.
AC RL DE 1992/03/26 IN CJ T2 PAG152.
AC RP DE 1991/11/07 IN CJ T5 PAG182.
AC STJ DE 1993/04/15 IN CJSTJ T2 PAG59.
Sumário: I - O Tribunal aprecia livremente as provas e responde segundo a convicção que tenha formulado acerca de cada facto quesitado (art. 655 n. 1, CPC) e, depois de ter declarado quais os factos que julga provados ou não provados, especificará, quanto aos primeiros, os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador (art. 653 n. 2, CPC).
II - Segundo jurisprudência constante do STJ, tal fundamentação ou motivação compreende não só a indicação dos meios concretos de prova, mas também a das razões determinantes da respectiva credibilidade para o julgador.
III - A circunstância de o Tribunal não ter integrado, na fundamentação e respostas certos documentos, não implica que o respectivo valor probatório não tivesse sido objecto de apreciação, mas, antes, que tal valor foi denegado na produção dessas respostas.
IV - As respostas restritivas mostram-se devidamente fundamentadas e decorrem da liberdade do julgador na determinação do valor probatório das provas produzidas em que se incluem os referidos documentos que, como particulares, e impugnados, não permitem a alteração de tais respostas ao abrigo do art. 712 n. 1, b, CPC.
V - A carência de intervenção cirúrgica, a "perda de tempo" - sequente da imobilização, tratamentos, consultas e transportes - , os tratamentos e internamentos, quando desacompanhados do circunstancialismo específico da respectiva verificação, e a falta de aproveitamento escolar, sem menção da sua repercussão psicológica, eventuamente negativa, são insusceptíveis de explicitar ofensas de valores da personalidade física ou moral, que caracterizam o dano não patrimonial.
VI - Se, na fixação da indemnização, pode o Tribunal atender a danos futuros, quando previsíveis (art. 564 n. 2, CC), é necessário para o efeito que a previsibilidade radique em elementos seguros (Vaz Serra, RLJ, 113 - 326), sob pena de se cair no âmbito da ressarcibilidade de danos meramente conjecturais.
VII - A responsabilidade civil emergente do acidente de viação está sujeita ao regime geral da responsabilidade subjectiva prevista nos arts. 483 n. 1 e 487 do CC e ao regime excepcional de responsabilidade pelo risco a que se refere o art. 503, conforme, respectivamente, se verifique ou não dolo ou simples culpa do responsável, sofrendo as indemnizações fundadas na última os limites máximos fixados nos termos do art. 508.
VIII - Se inexiste qualquer presunção legal de culpa, devendo, assim, esta ser provada pelo lesado (autor) nos termos do art. 487 n. 1, CC, tal prova contenta-se com o estabelecimento de factos que, segundo os princípios de experiência geral, a tornem muito verosimil, podendo, então, o autor da lesão demonstrar outros factos conducentes da verossimilitude de produção da mesma sem culpa sua.
IX - A condução automóvel assenta, em princípio, na execução voluntária de actos sucessivos, sendo, portanto, normal que a vontade se repercuta em todo o seu desenvolvimento, a menos que, neste, intervenha um facto que, excepcionalmente, seja insusceptivel de ser evitado ou controlado pela vontade.
X - Daí a presunção judicial, admissível ao abrigo dos arts. 349 e 351 do CC, de que a infracção às regras de trânsito ou de mera prudência deriva de acção ou omissão dependentes da vontade do respectivo agente, impendendo sobre este provar que tal infracção foi estranha à sua vontade.
XI - Por isso, é jurisprudência corrente que, em matéria de responsabilidade civil resultante de acidente de viação provocado por uma contravenção ao Código da Estrada, existe presunção judicial de negligência contra o respectivo infractor, cabendo, então, a este provar, sob pena de responder a título de culpa, quaisquer circunstâncias justificativas da contravenção.
XII - Não tendo os reús provado que a invasão do passeio, causal do atropelamento do autor, decorreu de facto extraordinário estranho à vontade do reú condutor, é de concluir que o atropelamento ficou a dever-se a culpa do último, culpa que se mantém, ainda que verificado tal facto, em função da excessiva velocidade do veículo, aquando do mesmo facto, impeditiva da respectiva imobilização antes do atropelamento.
XIII - Não se mostrando provado que o autor, aquando do acidente, já sofresse de dificuldades de locomoção e de incapacidade de 60%, não obstante o estado doentio da sua perna direita, é de concluir, face à materialidade descrita, que aqueles danos foram provocados pelo acidente e que este é abstractamente adequado a produzi-los, o que tanto basta ao estabelecimento do nexo causal entre o acidente e tais danos.
XIV - Antes da redação introduzida no art. 805 n. 3, CC, pelo DL 262/83, de 16 de Julho, era indiscutível que a obrigação de pagamento de juros de mora sobre o montante indemnizatório apenas nascia com o trânsito em julgado da decisão.
XV - Reputada injusta tal posição legal, com a alteração daquela disposição ficou determinado que, em sede de responsabilidade civil por facto ilícito ou pelo risco, a mora se verifica a partir da citação, justificando-se esta solução pela relevância, além do mais, dada às flutuações do valor da moeda.
XVI - A indemnização por danos não patrimoniais, embora destinada a compensar o lesado em função dos mesmos e quantificada segundo critério da equidade, com ponderação, além do mais, de factores relativos ao valor da moeda, não deixa de se verter em obrigação pecuniária e, como tal, sujeita a mora apartir da citação, nos termos especialmente previstos para os créditos decorrentes da responsabilidade civil por facto ilícito ou pelo risco (art. 805 n. 3, CC).