Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
386/22.6T8CSC.L1-8
Relator: ANA PAULA NUNES DUARTE OLIVENÇA
Descritores: ACÇÃO ESPECIAL DE ACOMPANHAMENTO DE MAIOR
ESCOLHA DO ACOMPANHANTE
NOMEAÇÃO DE DIRECTOR DE INSTITUIÇÃO
ADMISSIBILIDADE
PESSOA SINGULAR
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 09/12/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Sumário: 1. Prevenindo a hipótese de nenhuma pessoa com vínculo familiar e que por isso, na generalidade das situações manteria com o beneficiário uma relação mais estreita, prevê-se a nomeação de pessoa indicada pela instituição em que o acompanhado esteja integrado ou pessoa idónea.
2. A lei não prevê, a nomeação para acompanhante de titular de cargos profissionais em si mesmo considerados mas, apenas, de pessoas individuais e concretas.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam as Juízes que compõem a 8ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa:

1.Relatório
O Ministério Público, ao abrigo do disposto nos arts. 138º e 141º, nº 1 do CCivil e arts. 892º e seguintes do CPCivil, propôs acção especial de acompanhamento com representação geral, relativamente a:
R., melhor id. nos autos, pedindo-se decrete o acompanhamento, por razões de saúde, do requerido.
Alega não serem conhecidos familiares próximos ou amigos ao requerido. Com vista a confiar o requerido à assistência pública com integração em estrutura da Rede Nacional de Cuidados Continuados em Saúde Mental e indicação de responsável pelo acompanhamento, requereu que se solicite à Segurança Social a elaboração de relatório e indicação de responsável para nomeação como acompanhante, dispensando-se a nomeação de Conselho de Família.
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Considerando o tribunal, não serem conhecidos familiares próximos ou amigos ao Requerido, aguardou-se pela integração deste em estrutura da Rede Nacional de Cuidados Continuados e, bem assim, pela elaboração de relatório social por parte do Instituto da Segurança Social, I.P., que indique pessoa responsável para nomeação como Acompanhante.
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Após várias insistências junto dos serviços da segurança social para a indicação de pessoa para exercer o cargo de acompanhante, sem sucesso, foi solicitado à equipa de Acção Social da Câmara Municipal de Cascais a indicação de responsável para nomeação como Acompanhante do beneficiário do autos.
Não tendo logrado resposta, foi determinado se solicitasse ao Município de Cascais, que no prazo e 10 dias prestasse informação, para além do mais, indicasse pessoa e instituição disponível para ser acompanhante, a fim de poder posteriormente proceder à audição do Requerido, e proferir sentença em conformidade.
Em resposta, foi informado por técnica do município via departamento dos assuntos jurídicos, não ter conhecimento de pessoas ou instituições que possam desempenhar o cargo de acompanhante do beneficiário.
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Nessa sequência foi ordenado pelo tribunal a quo que se oficiasse, de novo, à Câmara Municipal de Cascais para que informem se alguma das técnicas identificadas pelo beneficiário, Dras. A e B se encontra na disponibilidade de exercer o cargo de acompanhante.
Mais se oficiou ao Centro de Apoio ao Sem-Abrigo, que se encontra a proceder a acompanhamento ao aqui beneficiário, na pessoa do seu director, que informasse sobre a existência de alguém que possa assumir as funções de acompanhante do beneficiário e que com o mesmo tenha relação de proximidade.
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O Município, via departamento jurídico, remeteu aos autos declaração das aludidas técnicas, dando a conhecer a sua indisponibilidade para desempenhar o cargo de acompanhante do beneficiário. Mais se deu a conhecer que a equipa da Divisão de Intervenção Comunitária também não detém elementos com disponibilidade para desempenhar o cargo de acompanhante do beneficiário.
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Pelo tribunal foi, então, ordenado que e atentas as respostas negativas, e não dispondo o Tribunal de uma bolsa de acompanhantes, sob  pena de risco de inoperacionalidade da lei, se oficiasse ao Chefe de Gabinete do Ministério da Justiça, solicitando os seus bons ofícios junto da Segurança Social para lograr encontrar instituição disponível para a acolher o Requerido e ser designada o seu acompanhante.
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Consignou-se, nos autos, que foram extrajudicialmente solicitados os bons ofícios à Exma. Juiz Presidente da Comarca, para tentar desbloquear a situação junto das entidades competentes a qual, por sua vez, solicitou os bons ofícios de S. Exa. o Secretário de Estado Adjunto e da Justiça, para tentar desbloquear a situação.
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Não tendo logrado resposta veio, então, a ser proferida sentença na qual se decidiu:
«V – DISPOSITIVO
Pelo exposto e decidindo, o Tribunal julga a presente ação procedente, e em consequência:
A) DECLARA o acompanhamento do maior R..
B) FIXA o dia 01.02.2022, como data de começo da incapacidade (art. 900.º CPC).
C) NOMEIA como acompanhante, o(a) Diretor(a) do Centro Atendimento Integrado Vida  Cascais da Divisão de Intervenção Comunitária da Câmara Municipal de Cascais, na pessoa de quem desempenhar o cargo;
D) FIXA o domicílio jurídico do acompanhado, na instituição onde o mesmo recebe aconselhamento.
E) ESTABELECE o conteúdo do acompanhamento, com:
- regime de representação especial (art. 145.º, n.º 2, b) Cód.Civil) restrito à seguinte categoria de atos:
i) Acompanhamento do Requerido às consultas médicas no caso de não comparência voluntária e aceitação ou recusa de tratamentos médicos e cumprimento das suas prescrições e toma de medicação;
ii) O beneficiário não poderá exercer pessoalmente os direitos conferidos aos utentes do Serviço Nacional de Saúde (Lei n.º 95/2019, de 04 de Setembro, Base 2) cabendo ao acompanhante o exercício de tais direitos em nome daquele;
iii) Contratualização de serviços de saúde ou de natureza residencial, reabilitativa ou de apoio considerados medicamente necessários;
iv) Contratualização de serviços necessários para manutenção da residência, sua conservação e limpeza, com vista a promover o bem estar e recuperação do beneficiário;
F) DISPENSA constituição de conselho de família por falta de indicação de pessoas para o compor.
G) INEXISTE procuração de cuidados de saúde.
H) REVISÃO no prazo legal de cinco anos, se antes não se justificar.
I) PUBLIQUE-SE a decisão (art. 902.º, n.º 3 CPC).
J) COMUNIQUE à Conservatória do Registo Civil (art. 902.º, n.º 2 CPC).
Sem custas, atento a isenção do maior acompanhado (art. 4.º, n.º 2, alínea h) RCP).
Registe e notifique, deprecando-se o compromisso de honra do acompanhante nomeado após o trânsito em julgado.»
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Devidamente notificado da decisão, o Município de Cascais veio aos autos informar, para além do mais, que o cargo de Director do Centro de Atendimento Integrado Vida Cascais, não existe tendo, apresentado recurso da decisão concluindo:
«CONCLUSÕES:
A-O ora Recorrente, tem legitimidade para interpor o presente recurso, na medida em que é directa e efectivamente prejudicado pela decisão, ora impugnada, já que a pessoa nomeada não o foi em função da sua personalidade ou qualidades pessoais, mas sim, em resultado da actividade profissional que exerce no Município de Cascais.
Estando a nomeação associada ao cargo funcional que a pessoa desempenha ou venha a desempenhar no Município, este possui legitimidade para recorrer, na qualidade de acompanhante, pois a decisão, tem implicações no vínculo laboral, condicionando a disponibilidade das pessoas que assumem ou vierem a assumir, um vínculo com tal encargo.
B- A douta Sentença incorreu em erro nos pressupostos de facto, na medida em que designou como Acompanhante, na pessoa que desempenhar o cargo, o Director do Centro de Atendimento Integrado Vida Cascais, no entanto, na estrutura organizativa, do Município de Cascais, não existe o cargo de Director do Centro de Atendimento Integrado Vida Cascais.
C- As competências no domínio da ação social que foram transferidas para as autarquias locais, no âmbito do Decreto-Lei n.º 55/2020, de 12 de Agosto, foram, por deliberação camarária datada de 21 de Outubro de 2021, delegadas no Presidente da Câmara e por despacho do Presidente da Câmara, datado de 24 de Novembro de 2021, delegadas na Vereadora do Pelouro, Exma. Senhora Dra. D.
Não houve despacho de delegação destas competências para algum Director de Departamento ou Chefe de Divisão.
D- A douta Sentença, incorreu em erro de aplicação de direito, na medida em que aplicou analogicamente um dispositivo legal, cujos elementos essenciais não se assemelham aos do caso a decidir, não existindo qualquer semelhança entre a situação não contemplada e a outra regulada na lei.
Não se encontrando o Maior internado e não existindo, na estrutura organizativa do Município de Cascais, um cargo com as competências inerentes ao cargo de “director de um estabelecimento”, não poderá ser aplicado, por analogia, o disposto no art. 1962º do CC.
E- As decisões judiciais não podem contribuir para a instabilidade e incerteza no que respeita ao Acompanhamento do Maior como a sentença do tribunal a quo determina, nem podem decidir em desrespeito pelos Pps. da justiça, da equidade, e da razoabilidade.
F- Face ao vertido, a medida de acompanhamento decretada pelo tribunal a quo não é a mais adequada perante os factos.
Nestes termos, e nos demais de direito deve o presente recurso jurisdicional ser julgado procedente, com todas as legais consequências, revogando-se a decisão recorrida na parte em que designa a pessoa que exerce o cargo de Director do Centro de Atendimento Integrado Vida Cascais como Acompanhante do Maior.
Assim será feita a costumada JUSTIÇA»
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Apresentou o Magistrado do Ministério Público contra-alegações concluindo:
«CONCLUSÕES:
1. Por sentença, proferida a 21 de junho de 2024, foi declarado o acompanhamento de R., com aplicação de medidas de acompanhamento com conteúdo de representação especial (art. 145.º, n.º 2, alínea b) do Código Civil) e nomeado para exercer o cargo de acompanhante o Diretor do Centro de atendimento integrado vida Cascais da Divisão de Intervenção comunitária da Câmara Municipal de Cascais, na pessoa de quem desempenhar o cargo.
2. Discordando de tal decisão, o Município de Cascais, entidade com legitimidade, veio interpor o presente recurso, insurgindo-se quanto à nomeação do acompanhante, que entende padecer de erro nos pressupostos de factos e erro de aplicação do direito, concluindo no sentido de, julgado o mesmo procedente, ser a decisão revogada na parte em que nomeia o diretor do centro de atendimento integrado vida Cascais para exercer o cargo de acompanhante.
3. Nos termos do art. 900.º do Código de Processo Civil, no processo de maior acompanhado cumpre ao tribunal decidir quem é que designa para exercer o cargo de acompanhante, quais as medidas de acompanhamento que cumpre aplicar, nos termos do art. 145.º do Código Civil e, quando possível, fixar a data a partir da qual as referidas medidas se tornaram convenientes.
4. A sentença proferida nos autos e ora posta em crise, após fixar os factos dados como provados e a motivação a eles subjacente, aferiu sobre se se mostravam ou não preenchidos os pressupostos legais para determinar a aplicação ao beneficiário de medidas de acompanhamento e, subsequentemente, concluindo em sentido afirmativo, fixou as medidas a aplicar e quem devia exercer o cargo de acompanhante.
5. Dúvidas não são suscitadas pelo recorrente sobre a verificação dos pressupostos para aplicação de medidas de acompanhamento ao beneficiário, nem sobre qual o âmbito das mesmas, pelo que, necessariamente, o beneficiário deverá ser declarado como acompanhado.
6. O recorrente apenas se insurge quanto à nomeação do acompanhante, afirmando inexistir a figura de ‘diretor’ do centro de atendimento integrado vida Cascais e por não poderem os funcionários do mesmo a assumir tais funções, alegando questões de justiça e razoabilidade.
7. Se, por um lado, não tem o tribunal o conhecimento sobre a orgânica do centro de atendimento integrado vida Cascais, razão pela qual a identificação da pessoa a assumir as referidas funções de acompanhante deverá a equiparada ao diretor, isto é, uma pessoa de chefia, por outro lado, apenas as pessoas identificadas no art. 1934.º do Código Civil é que podem escusar-se a exercer as funções de acompanhante, não sendo os fundamentos invocados aí enquadráveis.
8. No mais, como se afirma na sentença, ‘face à inexistência de familiares, e numa perspetiva de salvaguarda do interesse imperioso do Requerido, não existe alternativa senão atribuir o cargo de acompanhante a pessoa idónea, que neste caso será à instituição onde o Requerido recebe aconselhamento’, decisão tomada após inúmeras diligências realizadas tendo em vista a identificação de acompanhante.
9. Ora, inexistindo familiar, e não tendo sido indicada pessoa idónea para exercer o cargo, o tribunal, a quem compete a tomada de uma decisão que vise a proteção do beneficiário, concluiu no sentido de que a pessoa que devia nomear como acompanhante devia ser aquela que vinha assumindo, na prática, tais funções, razão pela qual indicou o diretor do centro de atendimento integrado vida Cascais.
10. Não violou a sentença quaisquer normas, nem por erro nos pressupostos de facto, nem por erro de aplicação de direito, tendo o tribunal decidido em conformidade com os princípios legais que enformam o regime de maior acompanhado e visando as finalidades estabelecidas, de salvaguarda e proteção do bem-estar do beneficiário.
11.Resulta claro que o tribunal pautou a sua decisão pela salvaguarda do interesse do beneficiário e do seu bem-estar, em cumprimento das normas em vigor, pelo que deverá ser integralmente mantida a sentença proferida, que não merece qualquer censura ou reparo.
Pelo exposto, entende-se que o presente recurso não merece provimento, devendo ser mantida integralmente a sentença proferida.
Contudo, V.as Ex.as decidirão como for de Justiça»
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O recurso foi devidamente admitido em 1ª instância e mostrando-se cumpridos os vistos legais, cabe apreciar e decidir.
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2. Objecto do recurso
O objecto do recurso é delimitado pelas suas conclusões, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cf. arts. 635º, nº 4, 639º, nº 1, e 662º, nº 2, todos do Código de Processo Civil), sendo que o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes e é livre na interpretação e aplicação do direito (cf. art.º 5º, nº3 do mesmo Código).
In casu importa decidir se o Tribunal nomeou para acompanhante pessoa titular de um cargo inexistente e, existindo, se poderia ter nomeado.
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3. Fundamentação
3.1. Fundamentação de Facto
Os factos a considerar para a decisão do recurso são os constantes do  relatório que acima se deixaram expressos.
3.2. Fundamentação de Direito
O novo regime de maior acompanhado, aprovado pela Lei 49/2018, de 14 de Agosto, que entrou em vigor no dia 10 de Fevereiro de 2019, determinou alterações substantivas e processuais de enorme relevância no nosso ordenamento jurídico.
No plano substantivo, definiram-se tipos de actos para cuja prática válida o maior, considerado capaz de gozo e de exercício, necessita da intervenção de um acompanhante porque, por razões de saúde, de deficiência ou de comportamento, não está em condições de exercer devidamente, por si só, os seus direitos ou deveres, de forma plena e consciente. Aqui se abrangem mais situações do que as que, no regime anteriormente vigente, possibilitavam a interdição ou a inabilitação.
No plano processual, para além de outros aspectos, passou a ser considerado um processo urgente e de jurisdição voluntária quanto aos poderes do juiz (art. 986º), ao critério de julgamento, conveniência e oportunidade (art. 987º), e ao valor das resoluções (art. 988º).
No âmbito deste novo regime, o Juiz já não está “espartilhado”, como acontecia até aqui, entre o regime da inabilitação ou da interdição, cabendo-lhe ponderar em concreto os actos que o beneficiário visado deve deixar de praticar por si ou só por si devendo decidir-se, na perspectiva da menor limitação possível à capacidade do maior que necessita de acompanhamento.
O processo civil português consagra o dever de gestão processual (art. 6º, n.º 1), atribuindo ao juiz o poder de adequação formal (art. 547º). O regime do processo de acompanhamento de maiores atribui, especificamente, poderes de gestão processual ao juiz do processo, podendo decidir sobre a publicidade a dar ao início e ao decurso do processo e à decisão final (art.º 153º, n.º 1, CCivil; art. 893º, n.º 1, e 902º, n.º 3), as comunicações e ordens a dirigir a instituições e entidades (art.º 894º e 902.º, n.º 3), o meio de proceder à citação do beneficiário (art.º 895º, n.º 1), a nomeação de um ou vários peritos (art. 897º, n.º 1, e 899º, n.º 1) e ainda o exame do beneficiário numa clínica da especialidade (art.º 899º, n.º 2).
O juiz pode, também, nos termos gerais (art. 6.º, n.º 1, e 547.º), adoptar, depois de ouvir as partes, qualquer medida de gestão processual que considere conveniente para a boa apreciação da causa.
No termos do art. 140º, do CCivil, na redacção da Lei n.º 49/2018, «O acompanhamento do maior visa assegurar o seu bem-estar, a sua recuperação, o pleno exercício de todos os seus direitos e o cumprimento dos seus deveres, salvo as exceções legais ou determinadas por sentença» (n.º 1) sendo que, «A medida não tem lugar sempre que o seu objetivo se mostre garantido através dos deveres gerais de cooperação e de assistência que no caso caibam».
Daqui decorre que devendo ser reconhecido à pessoa acompanhada o poder para decidir da sua protecção, escolhendo o seu representante, porém, apenas intervindo o Estado quando este não tenha condições para tanto.
Nos termos do disposto no art.143, nº1 do CCivil, «O acompanhante, maior e no pleno exercício dos seus direitos, é escolhido pelo acompanhado ou pelo seu representante legal, sendo designado judicialmente».
No caso dos autos, não vem posta em causa a impossibilidade do beneficiário indicar pessoa que possa desempenhar as funções de acompanhante.
Assim, chamado o Estado a decidir, por força do art. 143º, n.º 2, impõe-se deferir tal cargo à pessoa se encontre em melhor posição para acautelar o superior interesse do beneficiário, elencando a lei as pessoas que podem ser designadas como acompanhantes: a) Cônjuge não separado, judicialmente ou de facto; b) Unido de facto; c) Pais; d) Pessoa designada pelos pais ou pela pessoa que exerça as responsabilidades parentais, em testamento ou em documento autêntico ou autenticado; e) Filhos maiores; f) Avós; g) Pessoa indicada pela instituição em que o acompanhado esteja integrado; h) Mandatário a quem o acompanhado tenha conferido poderes de representação; i) Outra pessoa idónea.
Prevenindo a hipótese de nenhuma pessoa com vínculo familiar e que por isso, na generalidade das situações manteria com o beneficiário uma relação mais estreita, prevê-se a nomeação de pessoa indicada pela instituição em que o acompanhado esteja integrado ou pessoa idónea.
A pessoa idónea será aquela que se apresentar como a que tem melhores condições para prosseguir o imperioso interesse do beneficiário, devendo exercer um conjunto de poderes-deveres de cuidado e diligência, dirigidos a promover, nos termos do art. 146.º, n.º 1, do CCivil, o bem-estar e a recuperação do acompanhado, na concreta situação considerada.
A este respeito, alega o Município de Cascais que a sentença incorreu em erro nos pressupostos de facto, na medida em que designou como Acompanhante, a pessoa que desempenhar o cargo, o Director do Centro de Atendimento Integrado Vida Cascais, sendo que na estrutura organizativa, do Município de Cascais, não existe o cargo de Director do Centro de Atendimento Integrado Vida Cascais.
Ora, a existência ou não de tal cargo, a nosso ver, não carece sequer de ser analisada se atentarmos no disposto no art.143º, nº2, als. g) e i) do CCivil. Na verdade, a lei não prevê a nomeação para acompanhante de titular de cargos profissionais em si mesmo considerados mas, apenas, de pessoas individuais e concretas.
Sendo assim, nunca a nomeação de acompanhante, nos termos em que foi feita, poderia subsistir, ainda que se enveredasse pelo caminho propugnado pelo Ministério Público, em contra-alegações, quando defende que « Se, por um lado, não tem o tribunal o conhecimento sobre a orgânica do centro de atendimento integrado vida Cascais, razão pela qual a identificação da pessoa a assumir as referidas funções de acompanhante deverá ser a equiparada ao director (…)».
Por tudo, impõe-se revogar a decisão recorrida na parte em que nomeou como acompanhante o «Director do Centro Atendimento Integrado Vida Cascais da Divisão de Intervenção Comunitária da Câmara Municipal de Cascais, na pessoa de quem desempenhar o cargo» devendo o tribunal a quo encetar as diligência necessárias com vista à nomeação como acompanhante de pessoa concreta.
4. Decisão
Em face do exposto, o tribunal decide julgar o presente recurso de apelação procedente por provado e, consequentemente, decide:
Revogar a decisão recorrida na parte em que nomeou como acompanhante o «Director do Centro Atendimento Integrado Vida Cascais da Divisão de Intervenção Comunitária da Câmara Municipal de Cascais, na pessoa de quem desempenhar o cargo» devendo o tribunal nomear, como acompanhante, pessoa singular, concretamente individualizada.
Sem custas.
Notifique.
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Lisboa,  12-09-2024,
Ana Paula Nunes Duarte Olivença
Marília dos Reis Leal Fontes
Maria do Céu Silva