Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
132/18.9PFBRR.L1-3
Relator: NUNO COELHO
Descritores: CONDUÇÃO SOB O EFEITO DE ÁLCOOL
PENA ACESSÓRIA
DIREITO AO TRABALHO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 12/11/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: PARCIALMENTE PROVIDO
Sumário: Sendo a pena acessória uma pena, a determinação da medida concreta da sanção inibitória, há-de de efectuar-se segundo os critérios orientadores gerais contidos no Art.º 71.º do Código Penal, não olvidando que a sua finalidade (diferentemente da pena principal que tem em vista a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade) reside na censura da perigosidade, embora a ela não seja estranha a finalidade de prevenção geral.
A suspensão da pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor condicionada à prestação de caução de boa conduta, é inadmissível segundo aquela que é o melhor entendimento jurisprudencial.
A pena acessória prevista no Art.º 69.º, n.º 1, do Código Penal constitui uma pena criminal, que se norteia pela ideia de culpa, sem esquecer os fins das penas, enquanto que, a sanção de inibição de conduzir está prevista no Código da Estrada, tem natureza administrativa e baseia-se pelas regras do ilícito de mera ordenação social e pela atinente perigosidade na infracção de tais regras.
O regime da sanção acessória de natureza administrativa e da pena acessória de natureza penal apresenta diferenças de relevo.
A sanção acessória de inibição de conduzir é aplicável às contra-ordenações graves e muito graves (Art.º 147.º do Código da Estrada), e pode ser reduzida para metade no caso das segundas, e a aplicável às contra-ordenações graves pode ser suspensa na sua execução como resulta dos Art.ºs 140.º e 141.º do Código da Estrada.
Pelo contrário, a pena acessória de proibição de conduzir prevista no Art.º 69.º do Código Penal não pode ser atenuada especialmente, nem substituída por caução de boa conduta, nem suspensa na sua execução, uma vez que não existe nenhuma norma no Código Penal que preveja tais faculdades.
O que está em causa com a proibição de conduzir veículos com motor é a restrição de um direito civil, só podendo atingir colateralmente o seu direito ao trabalho ou ao desenvolvimento de uma actividade profissional. Este, no entanto, não constitui um direito absoluto, podendo ser legalmente constrangido, desde que este se mostre justificada, proporcional e adequada à preservação de outros direitos ou garantias constitucionais  como o direito à vida, à liberdade e à segurança da pessoa.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, na 3.ª Secção Criminal deste Tribunal da Relação de Lisboa:

I. RELATÓRIO
Nos presentes autos de processo sumário o arguido GF…, foi condenado, pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punível pelo Art.º 292.º, n.º 1 do Código Penal, na pena de 70 (setenta) dias de multa, à taxa diária de € 5,00 (cinco Euros), perfazendo um total de € 350,00 (trezentos e cinquenta Euros) e na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 5 (seis) meses, nos termos do Art.º 69.º, n.º 1, al. a) do Código Penal.
Não se conformando com a decisão, o arguido recorreu para este tribunal.
Nas suas alegações, o mesmo recorrente conclui a sua motivação nos seguintes termos:
1. O Recorrente foi condenado, por factos praticados em 21-15-2018, em autoria material e na forma consumada, pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelo artigo 292.°, n.° 1 e 69.°, n.° 1, al. a) do Código Penal, na pena de 70 (setenta) dias de multa, à taxa diária de 5,00€ (cinco euros), o que perfaz um montante global de € 350,00 (trezentos e cinquenta euros).
2. Foi também condenado na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados por um período de 5 (cinco) meses.
3. Verifica-se insuficiência da matéria de facto, relativamente à Sentença recorrida.
4. O Tribunal recorrido deveria ter considerado provado que o Arguido está a desenvolver um projecto junto do centro de emprego, que é um cabeleireiro móvel e que, no âmbito do referido projecto, está a tirar a carta de condução, de tipos B e D, por tais factos terem resultado das declarações por si prestadas.
5. Tal factualidade deverá passar a constar dos factos provados.
6. A sanção acessória de inibição de conduzir, por um período de 5 (cinco) meses, revela-se manifestamente excessiva, de acordo com os elementos da ilicitude e culpabilidade e o disposto nos arts. 71.° e 47 e 49.° do C.P..
7. Resultou da factualidade considerada assente, que: o arguido é cabeleireiro, encontrando-se desempregado, sendo beneficiário de um subsídio de desemprego diário, no valor de € 14,30 (catorze euros e trinta cêntimos); vive com a esposa, também desempregada e dois filhos de 18 (dezoito) e 12 (doze) anos de idade; suporta uma renda mensal, no valor de € 350,00 (trezentos e cinquenta euros); tem de habilitações literárias o 9.° (nono) ano de escolaridade; e não tem antecedentes criminais registados.
8. A carta de condução se afigura necessária ao futuro desenvolvimento do projecto que está a desenvolver junto do centro de emprego, o qual consiste num cabeleireiro móvel, acrescido do facto de necessitar da carta de condução, para o futuro exercício da sua futura actividade profissional.
9. Como o próprio Arguido referiu nas suas declarações, o projecto do “cabeleireiro móvel”, junto do centro de emprego, passa por ter um cabeleireiro numa roulotte, puxada pela viatura do Arguido, acrescido do facto de o Arguido estar a tirar duas cartas de condução, no âmbito do referido projecto (categorias B e D)
10. Deve ser aplicada ao Recorrente, uma sanção acessória de inibição de conduzir, inferior à aplicada pelo Tribunal recorrido, em concreto, não superior a 3 (três) meses e 15 (quinze) dias, atenta a confissão integral e sem reservas dos factos, a primariedade do Arguido e a necessidade da carta de condução para o desempenho do seu projecto profissional junto do centro de entrego, acrescido de se encontrar a tirar, adicionalmente, duas categorias de carta de condução.
11. Foram violadas as disposições legais constantes dos arts.° 47.°, 69.°, n.° 1, al.a), 70.°, 71.° e 292.°, n.° 1 - todos do Código Penal.
Termos em que,
Deve o presente recurso ser julgado procedente e
a) ser determinada a transcrição da Sentença recorrida, para melhor apreciação das questões ora suscitadas e
b) deve passar a constar da factualidade assente - por referência ao que resultou das declarações prestadas pelo Arguido - que: i) pese embora desempregado, está a desenvolver um projecto junto do centro de emprego, que é um cabeleireiro móvel; e ii) no âmbito do referido projecto, está a tirar a carta de condução, de duas categorias diferentes;
c) ser revogada a sentença recorrida, sendo substituída por outra, em que a sanção acessória da inibição de conduzir a ser-lhe aplicada, seja substituída por outra, de quantum manifestamente inferior à resultante da decisão recorrida e não superior a 3 (três) meses e 15 (quinze) dias.
Na resposta ao recurso o Ministério Público pugna pela improcedência do recurso, mediante as seguintes conclusões:
1. Resulta do Acórdão da Relação de Lisboa de 29 de Março de 2011, publicado na página web, www.dgsi.pt, que “o vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada (art.410, n°2, al. a), CPP), verifica-se quando o tribunal não tiver considerado provado ou não provado um facto alegado pela acusação ou pela defesa ou de que possa e deva conhecer, nos termos do art.358, n°1, CPP, se esse facto for relevante para a decisão da questão da culpabilidade, ou quando, podendo fazê-lo, não tiver apurado factos que permitam uma fundada determinação da sanção”.
2. Ora, para além do facto relativo ao projecto que o arguido pretende desenvolver não ter sido alegado pela defesa do arguido, o mesmo não releva para efeitos de culpabilidade nem tão pouco para determinação da sanção.
3. O arguido mostra-se condenado pela prática de um crime de condução em estado de embriaguez, por ter conduzido veículo apresentando uma TAS de 2,24 g/l, a qual se apresenta de grau muito elevado.
4. Ora, o estado em que o arguido conduziu o seu veículo automóvel revela um grau de culpa muito elevado, já que o risco de sinistralidade rodoviária é exponenciado em situações como a descrita.
5. O arguido não tem averbado antecedentes criminais e admitiu a prática dos factos, elementos que contribuíram para a formação da convicção deste tribunal quanto à medida da pena a aplicar.
6. A condenação do arguido na pena inibição de conduzir pelo período de 5 (cinco) meses mostra-se adequada às necessidades de prevenção geral e especial que a situação reclama, não compatíveis com a sua condenação numa pena acessória próxima dos limites mínimos.
7. Em consequência, entendemos que o presente recurso ser declarado improcedente.
Nesta instância o Ministério Público apôs o visto a que alude o Art.º 416.º do CPPenal.
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II. QUESTÕES A DECIDIR
Tendo em conta o teor da resposta do M.ºP.º e das conclusões efectuadas pelo arguido/recorrente, as questões a decidir passarão por saber: 1. da impugnação estrita da matéria facto por insuficiência para a decisão da matéria de facto provada; e 2. da eventualidade de redução da pena acessória de inibição de conduzir.
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III. FUNDAMENTAÇÃO
Importa, num primeiro momento, atentar na decisão recorrida e na factualidade dada como provada pelo Tribunal, bem como na sua fundamentação jurídica apenas circunscrita às questões em discussão – insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e a determinação e medida da pena acessória de inibição de conduzir.  
Assim, na decisão recorrida apresenta-se a seguinte fundamentação, considerando-se também nesta sede, os seguintes factos provados e a demais fundamentação jurídica:
1. Por sentença de 01 de Junho de 2018, o arguido, GF…, foi condenado pela prática em autoria material, de um crime de prática do crime de Condução de veículo em estado de embriaguez p. e p. pelo art° 292° n°1 e 69° n°1 al. a) do C.P., praticado em 14-06-2017, na pena de 70 (setenta) dias de multa, à taxa diária de € 5,00 (cinco Euros), perfazendo um total de € 350,00 (trezentos e cinquenta Euros) e na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 5 (seis) meses.
2. Consta da gravação o seguinte enunciado da sentença:
"Realizado que está o julgamento no processo sumário n.° …/… em que é arguido GF…, melhor identificado nos autos, resultaram provados todos os factos constantes da acusação, resultando ainda provado que: o arguido é cabeleireiro, encontrando-se desempregado, sendo beneficiário de um subsídio de desemprego diário, no valor de € 14,30 (catorze euros e trinta cêntimos), vive com a esposa, também desempregada e dois filhos de 18 (dezoito) e 12 (doze) anos de idade; suporta uma renda mensal, no valor de € 350,00 (trezentos e cinquenta euros), tem de habilitações literárias o 9.° (nono) ano de escolaridade e não tem antecedentes criminais registados.
Factualidade não provada inexiste.
Quanto à provada, assim o foi, desde logo em face da confissão livre integral e sem reservas do Arguido, também das suas declarações quanto às suas condições económicas que se entenderam por sinceras e espontâneas e por isso mesmo se tiveram por verdadeiras; conjugados com o teor do auto de notícia de folhas 5 (cinco) e 6 (seis), no que à data, hora e local respeita, o talão de alcoolímetro de folhas 12 (doze) e o certificado de registo criminal de folhas 30 (trinta).
A factualidade dada como provada preenche os elementos objectivos e subjectivos do crime pelo qual o arguido se mostrava acusado, uma vez que conduziu um veículo numa via pública, com uma taxa de álcool no sangue superior a 1,20 (um vírgula vinte), havia ingerido bebidas alcoólicas e sabia que as mesmas eram aptas a determinar uma taxa de álcool no sangue, tendo decidido, ainda assim, conduzir nessas circunstâncias, pelo que, cumpre determinar qual a pena a aplicar, tendo presente que em abstracto, a este crime corresponde uma pena de prisão até 1 (um) ano ou uma pena de multa até 120 (cento e vinte) dias. A primeira escolha a fazer será quanto à natureza da pena a aplicar, se de prisão, se de multa; esta escolha deverá ser feita, tendo em atenção as exigências de prevenção geral e especial; as exigências de prevenção geral mostram-se muito elevadas. Este crime é praticado diariamente por todo o território nacional e também com grande incidência nesta Comarca. São consabidos os índices de sinistralidade rodoviária, que se tentam desde há várias décadas combater, sem sucesso, sendo ainda bastante elevado o número de cidadãos que perde a vida em acidentes de viação, na sua maioria também relacionados com o consumo excessivo de bebidas alcoólicas, consumo esse que não é compatível com o exercício de uma actividade, já por perigosa, como a condução Quanto às exigências de prevenção especial, as mesmas encontram-se num patamar reduzido; o arguido confessou os factos, mostrando ter interiorizado o desvalor da sua conduta; encontra-se socialmente inserido; não tem antecedentes criminais, pelo que a natureza da pena a aplicar, deverá ser de multa. Na sua determinação em concreto, terá que se atender ao dolo, à ilicitude, que se considera já elevada, em face da taxa superior a 2 (dois) gramas e à artéria urbana por onde conduzia, mas também a sua confissão denotando interiorização do desvalor da conduta, a ausência de antecedentes criminais e a sua inserção social, pelo que, tudo ponderado, se entende como adequada a pena de 70 (setenta) dias de multa, com um quantitativo diário que, em face das condições do arguido, que se consideram precárias, se fixa pelo mínimo, ou seja, em 5€ (cinco euros).
Este crime é ainda punível, em abstracto, com uma pena acessória de proibição de conduzir, todo e qualquer veículo a motor, por um período mínimo de 3 (três) meses a um máximo de 3 (três) anos. A determinação da sanção acessória deverá ser feita, não por uma correspondência aritmética da pena principal, mas sim atendendo aos objectivos específicos de aplicação da mesma que, no que têm finalidades de prevenção rodoviária, tentando-se que, através da aplicação da mesma, o arguido enquanto condutor, paute, no futuro, o seu comportamento de acordo com as regras rodoviárias. É então determinante para a determinação, em concreto, desta pena acessória, a taxa de álcool que o arguido detinha, já superior a 2 (dois) gramas por litro, também o facto de não ser possuidor de antecedentes criminais, estar socialmente inserido e de ter confessado os factos, pelo que, tudo ponderado, por adequado, fixar esta pena acessória em 5 (cinco) meses de proibição de conduzir todo e qualquer veículo a motor
Em face da sua condenação, é o arguido também responsável pelas custas do processo, que se fixam em 1/2 UC (meia unidade de conta) e se reduzem a metade, atendendo à confissão.
Por todo o exposto, julgo então procedente a acusação pública deduzida e em consequência, condeno o arguido GF…, pela prática de um crime de condução de veículo, em estado de embriaguez, previsto e punível pelos artigos 192.°, n.° 1 e 69.°, n.° 1, a), ambos do Código Penal, na pena de 70 (setenta) dias de multa, à taxa diária de € 5,00 (cinco euros), na pena acessória de proibição de conduzir, todo e qualquer veículo a motor, por um período de 5 (cinco) meses e nas custas do processo, que se fixam em meia unidade de conta e se reduzem a metade, em face da confissão
Adverte-se o arguido de que, para o cumprimento da pena acessória em que foi condenado, tem o prazo de 10 (dez) dias a contar do trânsito em julgado da sentença, que são 30 (trinta); portanto, 30 (trinta) dias mais 10 (dez), para proceder à entrega da carta de condução, aqui no Tribunal ou em qualquer posto policial, sob pena de não o fazendo, praticar um crime de desobediência e o Tribunal ordenar a apreensão da sua carta de condução, devendo o arguido ficar ciente que, não vai voltar a receber nenhuma carta, nem a ser notificado para fazer esta entrega; está agora a ser informado do prazo de que dispõe para o efeito e deve ficar ciente de que, se não o fizer, incorre na prática de um crime Caso seja surpreendido a conduzir, enquanto estiver em execução esta pena, ou seja, enquanto a carta estiver apreendida no Tribunal, poderá incorrer na prática de um crime de violação de imposições e proibições Após trânsito, remeta boletim e comunique ao IMTe à ANSR Por ora, notifique e deposite."
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Importa analisar, agora, sobre os fundamentos suscitados pelo arguido/recorrente, em atenção à questão de fundo suscitada.
Como é sabido, o âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente, como vem sendo reafirmado, constante e pacificamente, pela doutrina e jurisprudência dos tribunais superiores (neste sentido, por todos, consulte-se o Ac. do STJ de 24/3/1999, in CJSTJ, Ano VII, Tomo I, pp. 247), sem prejuízo, contudo, das questões de conhecimento oficioso.
1. O recorrente impugnou a matéria de facto dada como provada pelo tribunal recorrido, suscitando insuficiência para a decisão da matéria de facto dada como provada para a sua condenação ou para o completo conhecimento da causa.
No que respeita ao conhecimento do recurso a que se refere o Art.º 410.º, n.º 2, do CPPenal, importa referir que aqueles vícios, em todas as suas alíneas (insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, erro notório na apreciação dos meios de prova e contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão) têm que resultar da própria decisão/sentença, como documento único, embora essa conjugação possa ser referente às regras da experiência.
Assim a insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, a contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão, a que se alude no Art.º 410.º, n.º 2, alínea b), e o erro notório na apreciação da prova, consubstanciam, respectivamente, a inexistência de factos provados suficientes, a incompatibilidade, insusceptível de ser ultrapassada através da própria decisão recorrida, entre os factos provados, entre estes e os não provados ou entre a fundamentação e a decisão e o erro notório da apreciação da prova efectuada pelo tribunal. Tudo isto, repete-se, desde que resulte do próprio texto da sentença, por si só ou conjugada com as regras da experiência.
A insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, que no caso está em causa, consubstancia a eventual inexistência de factos provados suficientes, insusceptível de ser ultrapassada através da própria decisão recorrida, para proferir a decisão de direito isto porque o Tribunal deixou de apurar ou de se pronunciar relativamente a factos relevantes para a decisão da causa, alegados pela acusação ou pela defesa ou que resultaram da audiência ou nela deveriam ter sido apurados por força da referida relevância para a decisão – cf. neste sentido o Acórdão do STJ de 20/4/2006 processo n.º 06P363, in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/bfaf1cea93ab75fb8025716200388d89?OpenDocument&Highlight=0,cipriano.
Ora no caso dos autos importa começar por referir que a sentença proferida nos autos seguiu-se à audiência de julgamento que decorreu com a presença do arguido que prestou declarações confessórias (integral e sem reservas) quanto aos factos de que estava acusado, sendo entendido dispensar a produção da restante prova relativa aos factos que lhe são imputados, nos termos dos n.ºs 1 e 4 do Art.º 344.º do CPPenal.
O mesmo arguido foi ainda ouvido relativamente às suas condições pessoais, sociais e económicas, sendo que relativamente a elas considerou o tribunal provado:
“O arguido é cabeleireiro, encontrando-se desempregado, sendo beneficiário de um subsídio de desemprego diário, no valor de € 14,30 (catorze euros e trinta cêntimos), vive com a esposa, também desempregada e dois filhos de 18 (dezoito) e 12 (doze) anos de idade; suporta uma renda mensal, no valor de € 350,00 (trezentos e cinquenta euros), tem de habilitações literárias o 9.° (nono) ano de escolaridade e não tem antecedentes criminais registados”.
Na sua motivação de recurso o arguido alega que apesar de ter considerado assente que o arguido é cabeleireiro, encontrando-se desempregado, sendo beneficiário de um subsídio de desemprego diário, no valor de € 14,30 (catorze euros e trinta cêntimos), o tribunal recorrido deveria ainda ter considerado como assente que, embora desempregado, ele encontra-se a desenvolver um projecto junto do centro de emprego, que é um cabeleireiro móvel e que no âmbito do referido projecto, está a tirar a carta de condução, de tipos B e D.
E, na verdade, pensamos que em face do pressuposto de que partiu o tribunal a quo face à credibilidade e ao teor das declarações do arguido, sobretudo nos esclarecimentos tomados no decurso das instâncias de defesa, o mesmo deveria ter incluído nos factos provados os enunciados especificados pelo mesmo arguido no seu recurso, tal como resultantes da audiência de julgamento e que poderiam vir a ter relevância para o julgamento da causa (em qualquer das suas teses ou hipóteses decisórias).
Por conseguinte, dando por consubstanciado o respectivo vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto delimitada pelo tribunal a quo, nos termos do vertido no Art.º 410.º, n.º 2, alínea a), do CPPenal, determina-se desde já a sanação desse vício determinando-se a modificação da matéria de facto considerada provada nos termos conjugados do n.º 3 do Art.º 410.º e da alínea a) do Art.º 431.º, ambos do CPPenal, com o adicionamento dos factos provados sugeridos pelo recorrente:  
“- Pese embora desempregado, o arguido está a desenvolver um projecto junto do centro de emprego, que é um cabeleireiro móvel.
- No âmbito do referido projecto, o arguido encontra-se inscrito numa escola de condução para a carta de condução tipos B e D”.
Pelo que se considera procedente este primeiro fundamento de recurso, relativo à insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, determinando-se, a final, a sanação desse vício com a modificação da sentença recorrida com o complemento factual acima descrito.
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2. Importa analisar, agora, os fundamentos suscitados pelo recorrente, em atenção à questão formulada da eventualidade de redução da pena acessória de inibição de conduzir.
Assente que se considera estar a supra descrita matéria de facto, importa desde já dizer que a condenação do recorrente como autor de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo Art.º 292.º, n.º 1, do Código Penal, não merece reparo, pois que, “quem, pelo menos por negligência, conduzir veículo, com ou sem motor, em via pública ou equiparada, com uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1,2g/l, é punido com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal”
Contudo, é este crime também punível com a pena acessória de “proibição de conduzir veículos com motor”, por força do disposto no Art.º 69.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, na redacção introduzida pela Lei n.º 77/2001, de 13/07, nos termos do qual “é condenado na proibição de conduzir veículos com motor por um período fixado entre três meses e três anos quem for punido: a) - Por crime previsto nos artigos 291º ou 292º”.
O n.º 2 do referido Art.º 69.º, por sua vez, diz que “a proibição produz efeitos a partir do trânsito em julgado da decisão e pode abranger a condução de veículos com motor de qualquer categoria”.
O recorrente, não pondo em causa a condenação, já se insurge, contudo, contra a proibição de conduzir que considera excessiva ou injusta, devendo a mesma ser reduzida para um período não superior a 3 (três) meses e 15 (quinze) dias, atenta a confissão integral e sem reservas dos factos, a sua primariedade e a necessidade da carta de condução para o desempenho do seu projecto profissional junto do centro de entrego, acrescido de se encontrar a tirar, adicionalmente, duas categorias de carta de condução.
Pergunta-se, pois, se se demonstra excessiva e desajustada a sanção de inibição de conduzir fixada pelo tribunal  a quo em cinco meses.
Diz o Art.º 40.º do Código Penal que “a aplicação de pena se de medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade”.
Por outro lado, dispõe o Art.º 71.º do mesmo Código que a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, devendo ainda o tribunal, na determinação concreta daquela, atender a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele, designadamente as referidas nas várias alíneas do seu n.º 2.
Na concretização da pena, a efectuar em função da culpa do agente, deverá ter-se em conta, na verdade, o disposto nesses preceitos legais.
Dentro da moldura abstracta consagrada e observados os factores referentes à culpa e as considerações de tipo preventivo, deverá ser encontrada um quantum concreto conforme às exigências de prevenção, de preservação da pessoa no livre desenvolvimento da sua personalidade e da censurabilidade da ordem jurídica.
Quanto à execução do facto (pensada em termos globais - Art.º 71.º/2, a), b) e c)), assumirá especial importância neste tipo de casos: - a forma dolo directo (a intensidade da vontade no dolo), o grau de ilicitude dos factos, onde se considerará a taxa de álcool no sangue registada pelo arguido de 2,242 g/l);
- o grau de violação dos deveres estradais impostos ao arguido; e
- os estímulos externos que determinaram a situação que levou ao crime.
Quanto à personalidade do agente (Cfr. Art.º 71.º/2, alíneas d) e f)) teremos de levar em conta: o seu comportamento estradal, o seu contexto profissional e pessoal e a sua idade.
Quanto aos factores relativos à conduta do agente anterior e posterior ao facto (Art.º 71.º/2, e)), aponta-se a ausência de antecedentes criminais e a sua confissão integral e sem reservas.
Como se diz no Acórdão do STJ de 15/2/1995, in CJSTJ, Ano III, Tomo I, pp. 217, “as disposições do artigo 72° (hoje 71°) são afloramentos do princípio da culpa, que através das mesmas disposições se manifesta na medida da pena. O direito criminal é estruturado com base na culpa do agente, e este princípio é indispensável, exercendo uma função fundamentadora e limitadora da mesma pena. Só depois é que intervêm as exigências do fim da prevenção especial e da prevenção geral”.
Diz-se ainda no citado Acórdão que o procedimento tendente à determinação da pena é considerado como um conjunto complexo de operações que exige em medida variável uma estreita cooperação - mas, também, por outro lado, uma separação de tarefas e de responsabilidades tão nítidas quanto possível entre o legislador e o juiz, e que apresenta especialidades notáveis face ao procedimento comum de aplicação do direito. Não enquanto o juiz é nele necessariamente reenviado para normas jurídicas não escritas, conceitos normativos e indeterminados, e mesmo puras valorações, mas já sim na medida em que se vê obrigado a traduzir os critérios jurídicos de determinação numa certa quantidade de pena, em que ele não pode, por outras palavras, furtar-se a uma quantificação exacta das suas valorações.
Contudo, como também se reconhece no Ac. do STJ de 4/3/2004, in CJSTJ, Ano XII, Tomo I, pp. 220, “observados os critérios legais de dosimetria concreta da pena, nomeadamente os do artº 71º do Código Penal, há uma margem de actuação do juiz dificilmente sindicável, se não mesmo impossível de sindicar. Como demonstrar, por exemplo, numa pena aplicada de 365 dias que, mais correcta seria a de 360 ou 370?
Só perante «a violação das regras da experiência, ou a sua desproporção da quantificação efectuada» (...)”.
Por outro lado, no que às penas acessórias diz respeito, entendeu-se no Ac. do Tribunal Constitucional n.º 667/94, de 14 de Dezembro, in BMJ 446 (suplemento), 102 que “a ampla margem de discricionaridade facultada ao juiz na graduação da sanção de inibição da faculdade de conduzir permite-lhe perfeitamente fixá-la, em concreto, segundo as circunstâncias do caso, desde logo as conexionadas com o grau de culpa do agente, nada na Lei Fundamental exigindo que as penas acessórias tenham de ter, no que respeita à sua duração, correspondência com as penas principais”.
Em termos processuais dir-se-á que o processo contra-ordenacional procura satisfazer interesses da Administração na acção conformadora da vida social eticamente indiferentes, sendo, em regra, promovido pela própria administração, que aplica a respectiva sanção, sendo um processo jurisdicionalizado, como é óbvio, aquele que conduz à punição à luz do Art.º 69.º do Código Penal.
Porém, e porque é a mesma materialidade fáctica que neste tipo de infracções está em causa, isto é, a condução sob o efeito do álcool, sejam elas puníveis a título de crime, sejam-no a título de contra-ordenação, na similitude de procedimentos que haverá de ser prosseguida na determinação das respectivas sanções, justifica-se fazer também relevar o circunstancialismo previsto no Art.º 139.º do Código da Estrada – “determinação da medida da sanção” - nos termos do qual a mesma “se determina em função da gravidade da contra-ordenação e da culpa, tendo ainda em conta os antecedentes do infractor relativamente ao diploma legal infringido ou aos seus regulamentos (...) a situação económica do infractor, quando for conhecida e quando a contra-ordenação for praticada no exercício da condução (...), deve atender-se, como circunstância agravante, aos especiais deveres de cuidado que recaem sobre o condutor...”.
Deste modo, e reportando-nos ao caso dos autos, foi dado como comprovado que o recorrente, conduzindo com uma taxa de álcool de 2,242 g/l, fazia-o de forma voluntária, livre e conscientemente, sabendo ainda que a sua conduta era proibida por lei.
Esta taxa de 2,242 g/l situa-se algo acima do limite mínimo a partir do qual a conduta integra a prática de crime (TAS de 1,20 g/l).
Porém, também se considerou ser o mesmo primário.
Por outro lado, a condução de veículos sob a influência do álcool é um comportamento moral e socialmente condenável, pela diminuição da segurança rodoviária, com notórios efeitos na sinistralidade dos nossos dias. Aliás, a perigosidade e a ilicitude deste comportamento são tanto maiores quanto maior for o álcool ingerido. Daí que esta conduta seja sancionada em três níveis diferentes, sendo dois deles de natureza contra-ordenacional e o outro de natureza criminal.
Como se disse, este crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo Art.º 292.º, n.º 1, do Código Penal, é também punível com a pena acessória de proibição de condução de veículos com motor, por força do disposto no Art.º 69.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, nos termos do qual, “é condenado na proibição de conduzir veículos com motor por um período fixado entre três meses e três anos quem for punido: a)- Por crime previsto nos artigos 291º ou 292º”.
Esta sanção reveste a natureza de pena acessória como directamente flui do próprio normativo e decorre ainda da inserção sistemática do mesmo no Capítulo III sob a epígrafe “Penas acessórias e efeitos das penas”.
Como refere Figueiredo Dias, visa a pena acessória em apreço prevenir a perigosidade do agente. Trata-se de uma censura adicional pelo facto que ele praticou (cfr. acta nº 8 da Comissão de Revisão do Código Penal).
Corresponde a uma necessidade de política criminal por motivos óbvios e consabidos que se prendem com a elevada sinistralidade que ocorre na rede viária nacional.
Porque se trata de uma pena, a determinação da medida concreta da sanção inibitória, há-de de efectuar-se segundo os critérios orientadores gerais contidos no mencionado Art.º 71.º do Código Penal, não olvidando que a sua finalidade (diferentemente da pena principal que tem em vista a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade) reside na censura da perigosidade, embora a ela não seja estranha a finalidade de prevenção geral.
Entende o recorrente que deverá revogar-se a decisão recorrida na parte em que condena o recorrente na sanção acessória de inibição de condução pelo período de 5 meses e reduzir essa sanção para o valor perto do mínimo de 3 meses, isto é, nos 3 meses e 15 dias. Tudo isto na invocação dos fundamentos preditos.
Uma referência prévia a uma hipotética suspensão desta pena acessória, que não foi pedida, mas que poderia eventualmente ser equacionada. Mas uma referência à especial atenuação desta pena acessória mencionada expressamente na motivação de recurso.
Mas sabe-se que a suspensão da pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor condicionada à prestação de caução de boa conduta, é inadmissível segundo aquela que é o melhor entendimento jurisprudencial.
A pena acessória a que aludimos está prevista no Art.º 69.º, n.º 1, do Código Penal e por isso, constitui uma pena criminal, que se norteia pela ideia de culpa, sem esquecer os fins das penas, enquanto que, a sanção de inibição de conduzir está prevista no Código da Estrada, tem natureza administrativa e baseia-se pelas regras do ilícito de mera ordenação social e pela atinente perigosidade na infracção de tais regras.
O regime da sanção acessória de natureza administrativa e da pena acessória de natureza penal apresenta diferenças de relevo.
A sanção acessória de inibição de conduzir é aplicável às contra-ordenações graves e muito graves (Art.º 147.º do Código da Estrada), e pode ser reduzida para metade no caso das segundas, e a aplicável às contra-ordenações graves pode ser suspensa na sua execução como resulta dos Art.ºs 140.º e 141.º do Código da Estrada.
Pelo contrário, a pena acessória de proibição de conduzir prevista no Art.º 69.º do Código Penal não pode ser atenuada especialmente, nem substituída por caução de boa conduta, nem suspensa na sua execução, uma vez que não existe nenhuma norma no Código Penal que preveja tais faculdades - cfr., verbi gratia, os Acs. da Relação desta Lisboa de 30/10/2003, CJ, Ano XXVIII, Tomo IV, pp. 143, de 21/11/2006, CJ, Ano XXXI, Tomo V, pp. 129; e de 20/3/2007, proc. nº 1093/2007-5, acessível em www.dgsi.pt/jtrl; da Relação de Coimbra de 17/1/2001, CJ, Ano XXVI, Tomo I, pp. 50; da Relação do Porto de 28/1/2004, CJ, Ano XXIX, Tomo I, pp. 206, e de 16/6/2004, proc. nº 0412791, acessível em www.dgsi.pt/jtrp; da Relação de Évora de 9/7/2002, CJ, Ano XXVII, Tomo IV, pp. 252, e de 20/1/2004, proc. nº 1880/03-1, acessível em www.dgsi.pt/jtre.
E quanto à medida da inibição de conduzir?
Em vista dos elementos de facto que o tribunal considerou provados, designadamente os factores acima relevados, que o próprio recorrente não contestou, julgamos como adequado o tempo de inibição fixado, nos 5 meses, numa moldura que vai de 3 meses a 3 anos. Os 5 meses situam-se não muito acima do limite mínimo, o que se encontra em concordância com o caso em presença.
A T.A.S. revelada pelo arguido, cifrando-se em 2,242 g/l, quando o mínimo legal do crime de condução de veículo em estado de embriaguez se situa em 1,2g/l, patenteia uma ilicitude acima do normal, o que foi considerado na sentença condenatória.
No que respeita à prevenção geral, dita positiva ou de integração, dir-se-á que se verifica uma exigência acrescida de tutela dos bens jurídicos e de preservação das expectativas comunitárias decorrente das ingentes necessidades de travar a acentuada sinistralidade que se verifica nas nossas estradas e para a qual a condução em estado de embriaguez contribui em larga medida, o que também foi considerado na sentença.
Também foi tido em consideração na sentença, a culpa do agente que se revelou na sua forma mais grave, o dolo.
A seu favor foi ponderada a sua inserção social, familiar e económica, ausência de antecedentes criminais e a ausência de lesões ou danos para terceiros em face da prática do crime. Mais se releva, agora, com o complemento factual, o contexto profissional específico do arguido e o seu projecto empresarial ou laboral (cabeleireiro itinerante).
Ora o tribunal ponderado os factores que se referiram e a moldura abstracta aplicou ao arguido 5 meses de proibição de condução, quando o mínimo é de 3 meses, o que até se pode considerar benevolente.
Pelo que se considera que o tribunal  a quo não violou o disposto nos Art.ºs 65.º, n.º 1, e 58.º, n.º 1, da CRP.
O que está em causa com a proibição de conduzir veículos com motor é a restrição de um direito civil, só podendo atingir colateralmente o seu direito ao trabalho ou ao desenvolvimento de uma actividade profissional. Este, no entanto, não constitui um direito absoluto, podendo ser legalmente constrangido, desde que este se mostre justificada, proporcional e adequada à preservação de outros direitos ou garantias constitucionais.
Tal como refere a jurisprudência constitucional “(…) admitindo que a faculdade de conduzir veículos automóveis é um direito civil, é certo que a perda desse direito é uma medida que o juiz aplica e gradua dentro dos limites mínimo e máximo previstos, em função das circunstâncias do caso concreto e da culpa do agente, segundo os critérios do artigo 71.º do Código Penal. Poder-se-á, assim, dizer que o juiz não se limita a declarar a inibição como medida decorrente de forma automática da aplicação da pena, com mero fundamento na lei (...).A circunstância de ter sempre de ser aplicada essa medida, ainda que pelo mínimo da medida legal da pena, desde que seja aplicada a pena principal de prisão ou multa, não implica, ainda assim, neste caso, colisão com a proibição de automaticidade das penas. A adequação da inibição de conduzir a este tipo de ilícitos revela que a medida de inibição de conduzir se configura como uma parte de uma pena compósita, como se de uma pena principal associada à pena de prisão se tratasse, em relação à qual valem os mesmos critérios de graduação previstos para esta última” – assim, no acórdão do TC n.º 53/97, acessível em http://www.tribunalconstitucional.pt; e também com referência aos acórdãos subsequentes n.ºs 251/99, 149/2001, 440/2002 e 630/2004, todos acessíveis no mesmo sítio electrónico. Assim também, o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 18/4/2013, processo n.º 242/11.3PQLSB.L1.9, publicado em http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/3080182d80a1312080257b820038ff06?OpenDocument&Highlight=0,%C3%A1lcool,inibi%C3%A7%C3%A3o,trabalho.
E no citado acórdão n.º 440/02 o mesmo Tribunal Constitucional considerou a propósito de eventual colisão com o direito ao trabalho que a pena acessória de proibição de conduzir tem plena justificação "se apresentar como um meio de salvaguarda de outros interesses constitucionalmente protegidos, nomeadamente, quer, por um lado, na perspectiva do arguido recorrente a quem é imposta e destinada a pena aplicada, quer, por outro lado, na perspectiva da sociedade - a quem, reflexamente se dirige também aquela medida, na medida em que se visa proteger essa sociedade e, simultaneamente compensá-la do risco a que os seus membros foram sujeitos com a prática de uma condução sob o efeito do álcool".
Mais se acrescentou que "o conteúdo essencial do direito ao trabalho que aquele vê ofendido com a aplicação da sanção acessória da inibição de condução (...) não é atingido, na medida em que a ponderação que resulte do confronto deste direito do trabalho com a protecção de outros bens - que fundamentam a sua limitação, através da aplicação das penas principal e acessórias infligidas - não redunda na aniquilação ou, sequer, na violação desproporcionada de qualquer direito fundamental ao trabalho".
Pelas mesmas razões o Art.º 23.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, que consagra um direito ao trabalho, pode ser restringido para a salvaguarda de outros direitos humanos, como o direito à vida, à liberdade e à segurança da pessoa, estabelecido no Art.º 3.º, desta mesma Declaração Universal.
Certo é que o direito ao trabalho, pode ser restringido para a salvaguarda de outros direitos humanos, como o direito à vida, à liberdade e à segurança da pessoa.
Considerando a gravidade dos factos apurados, a culpa do arguido e as exigências de prevenção, mostra-se justificada a medida (de cinco meses) da pena acessória encontrada pelo tribunal a quo a qual situou, de forma equilibrada, perto do limite mínimo da sua moldura abstracta.
Improcedem assim, neste ponto, os demais fundamentos do recurso interposto.
                                                   ***
IV. DECISÃO
Pelo exposto acordam os Juízes desta Relação em julgar parcialmente provido o recurso apresentado pelo arguido GF…, e, em face disso, 
1. considerar verificado o vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto delimitada pelo tribunal a quo, nos termos do vertido no Art.º 410.º, n.º 2, alínea a), do CPPenal, e determinar a revogação parcial da sentença recorrida com a sanação deste vício e a modificação da matéria de facto considerada provada nos termos conjugados do n.º 3 do Art.º 410.º e da alínea a) do Art.º 431.º, ambos do CPPenal, com o adicionamento à mesma dos factos provados sugeridos pelo recorrente:  
“Pese embora desempregado, o arguido está a desenvolver um projecto junto do centro de emprego, que é um cabeleireiro móvel.
No âmbito do referido projecto, o arguido encontra-se inscrito numa escola de condução para a carta de condução tipos B e D”; e
2. manter, no mais, a sentença recorrida e a condenação do mesmo arguido/recorrente.
                                                    ***    
Sem custas, em face da procedência parcial do recurso (cfr. Art.ºs 513.º, n.º 1, do CPPenal).
Notifique-se.
                                                   ***
Processado por computador e revisto pelo primeiro signatário (cfr. Art.º 94.º, n.º 2, do CPPenal).

Lisboa, 11 de Dezembro de 2018

Nuno Coelho

Ana Paula Grandvaux