| Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:
I. Relatório
1. R. […] S.A. requereu a declaração de falência de F.[…] Lda..
2. Por sentença, transitada em julgado, veio a ser decretada a falência de F.[…]Lda.
3. O liquidatário judicial nomeado veio informar que os bens móveis pertencentes à falida que foram encontrados não funcionavam e se apresentavam em elevado estado de deterioração, não tendo qualquer valor venal, sendo que o único bem susceptível de ser apreendido seria o direito de crédito emergente do pedido reconvencional formulado na acção ordinária que corre termos pelo 2º Juízo Cível […].
Mais informou que alguns membros da Comissão de Credores sugeriram a possibilidade de desistência do pedido reconvencional.
4. Os credores R.[…]S.A. e Ov. […] S.A. vieram requerer, em requerimentos distintos – que o liquidatário judicial, ou outro advogado, elabore um relatório no qual esclareça de forma independente quais os fundamentos e a probabilidade de êxito dos pedidos reconvencionais deduzidos e, em caso de manifesta improcedência material dos pedidos deve ser deduzida a desistência dos pedidos; se assim se não entender que sejam notificados todos os credores para se pronunciarem sobre a desistência do pedido reconvencional, devendo ser homologado no caso da maioria se pronunciar favoravelmente.
5. Por despacho proferido em 10/10/2006, foram indeferidos os requerimentos apresentados.
6. Inconformadas com esta decisão, as requerentes interpuseram, individualmente, recurso, que foram recebidos como de agravo, a subir imediatamente, em separado e com efeito meramente devolutivo, tendo, nas suas alegações de recurso, apresentado as seguintes (transcritas) conclusões:
- R.[…], S.A. –
1ª. - O presente recurso é interposto na sequência do douto despacho de fls., que indeferiu o requerimento da ora Recorrente com vista a habilitar o Liquidatário Judicial a agir em consonância com as deliberações adoptadas de forma maioritária, pelos membros da Comissão de Credores da Massa Falida da sociedade F.[…] Lda.
2ª. - A questão que, com o presente recurso, se pretende ver esclarecida, resume-se, unicamente a saber se o Liquidatário Judicial tem poderes para desistir dos pedidos reconvencionais deduzidos no âmbito do processo […] que corre termos pelo 2.º Juízo do Tribunal[…], e relativamente aos quais a Comissão de Credores, deliberou no sentido da sua desistência.
3ª. - Não é lógico nem processualmente admissível, que o processo de falência, atenta a inexistência de bens, fique pendente até à resolução do Processo Judicial de […] – onde foram deduzidos os pedidos reconvencionais – que se encontra paralisado, e dessa forma, com base em pedidos reconvencionais infundandados, contrariar todas as regras do CPREF no que respeita à celeridade processual.
4ª. - A ora Recorrente, R.[…] SA., em 24.07.2003 veio requerer a declaração de falência da sociedade comercial por quotas F.[…] Lda., decretada por sentença em 13.05.2004.
5ª. Após o pedido de falência e antes da audiência de discussão e julgamento com vista ao decretamento da falência, foi o processo suspenso, a pedido da devedora F.[…] Lda., na perspectiva de se apresentar um acordo entre a ora Recorrente e a sociedade Falida.
6ª. - Pelo que a falência, nesse pressuposto, esteve suspensa desde Dezembro de 2003 até, pelo menos, Fevereiro de 2004.
7ª. - Tais diligências, em manifesto abuso de direito, foram manobras dilatórias, perpetradas pela Falida, com o objectivo de adiar o decretamento da falência, possibilitando a apresentação de contestação a Acção movida por OV.[…] (também credora) e deduzir pedidos reconvencionais contra a Autora e contra a ora Recorrente na qualidade de chamada (Incidente de Intervenção Principal Provocada), os quais mantém o seu estado processual inalterável, desde essa data.
8ª. - Autos que a falida deliberada e intencionalmente complicou, com os pedidos reconvencionais, os incidentes de intervenção, que motivaram contestações, réplicas, oposições, um Arresto e vários recursos.
9ª. - Conseguindo, com tal actuação, paralisar o processo judicial e, aparentemente, os presentes autos de falência e liquidação de activo.
10ª. - Conseguindo ainda, alienar todos os bens da massa falida e, acautelar os bens dos sócios,
11ª. - Tentando, por outro lado, com a dedução precipitada e infundada de pedidos reconvencionais contra os dois maiores credores, evitar o decretamento da Falência. O que não logrou conseguir, dado que a falida em abstracto preenchia qualquer das alíneas ao art.º 8º do CPEREF:
12ª. - O insucesso da tentativa de evitar o decretamento da falência, contrastou contudo com o sucesso da estratégia de delapidação e alienação rápida do património a terceiros, uma vez que a massa falida não possui quaisquer bens.
13ª. - Acresce que, o facto de Douto Tribunal a quo, ao negar a possibilidade de desistência dos pedidos reconvencionais e da extinção da falência por inutilidade superveniente da lide, nos termos do art.º 186º do CPEREF., possibilita que a falida venha, lograr os seus intentos, traduzidos, em primeiro lugar na alienação de património a terceiros e em segundo lugar na paralisação do processo de falência, até à resolução do processo onde foram deduzidos os referidos pedidos.
14ª. - Por tais factos pretende o liquidatário promover a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide nos termos do disposto no art.º 186º do CPEREF,
15ª. - E ainda, no âmbito dos poderes conferidos pelo CPEREF, nomeadamente art.ºs 141º, 143º, 147º e ainda 134.º n.º 4, pretendendo promover a desistência dos pedidos reconvencionais, no âmbito da Acção supra referida,
16ª. - Para tanto, apesar de se poder entender que a desistência dos pedidos se encontra no domínio da Administração Ordinária do liquidatário, previamente, solicitou parecer da Comissão de Credores, a qual, por maioria, concordou com a pretensão do Liquidatário Judicial.
17ª. - No sentido de que a desistência de processos instaurados previamente à declaração de falência, destaca-se, a titulo meramente exemplificativo, Acórdão do TRP, in www.dgsi.pt, proc. n.º 0534957 “Um liquidatário Judicial em processo de falência pode desistir de um agravo anteriormente interposto pela executada depois de declarada falida.”
18ª. - Veio contudo, o Douto Tribunal a quo opor-se, invocando, não razões substanciais ou materiais, mas antes razões de índole formal, com sejam, razões de transparência, por entender que a Comissão de Credores inclui no seu quórum dois credores reconvindos na supra referida acção e, como tal, com interesse directo na desistência pretendida e deliberada.
19ª. - Com o devido respeito e salvo melhor opinião, o Douto Tribunal a quo errou na sua apreciação,
20ª. - A ora Recorrente integrou a Comissão de Credores, por nomeação, pelo Tribunal a quo, na Douta sentença, em momento posterior à dedução do já referido pedido reconvencional o qual, já era do conhecimento do Tribunal a quo, aquando da referida nomeação.
21ª. - O pedido reconvencional deduzido em processo autónomo, a correr noutro Tribunal, não obstou, pois, à nomeação da Recorrente para Presidente da Comissão de Credores,
22ª. - Dado que o CPEREF não impõe a obrigatoriedade do maior credor ser o Presidente da Comissão, mas o Tribunal a quo assim o entendeu. (Cfr. N.º 1 do art.º 139 do CPEREF)
23ª. - Sequer o Tribunal obstou à posterior nomeação – apesar da oposição da Recorrente – pelo Tribunal, da credora Ov.[…], Autora e reconvinda na Acção que corre seus termos no Tribunal Judicial […].
24ª. - Tais factos, inequívocos, são por si só suficientemente indiciadores de que a Comissão de Credores, porque legitimamente nomeada pelo Tribunal, não pode ser limitada nos seus poderes dispositivos,
25ª. - Não existindo qualquer capitis diminutio quanto aos seus poderes de fiscalização e de decisão. “1 - À comissão compete, para além de outras tarefas que lhe sejam especialmente cometidas, fiscalizar a actividade do liquidatário judicial e prestar-lhe colaboração.
26ª. - 2 - No exercício das suas funções, pode a comissão examinar livremente os elementos da contabilidade do devedor e solicitar ao liquidatário judicial as informações e a apresentação dos elementos que considere necessários.
27ª. - 3 - É aplicável à comissão de credores, no processo de falência, o disposto nos n.os 3, 4 e 5 do artigo 41.º, relativamente à comissão de credores no processo de recuperação.” Cfr. Art.º 140º do CPEREF.
28ª. - Tanto mais que a ora Recorrente sugere que, os pedidos reconvencionais, no que alude à sua viabilidade, sejam apreciados por entidade independente, ou pelo Liquidatário – cujo entendimento a favor da desistência, tacitamente discorre do pedido nesse sentido já efectuado.
29ª. - Obviamente, e não é isso que se pretende, não é ao Douto Tribunal a quo que compete analisar a viabilidade ou não das acções (neste caso contestação com pedido reconvencional) intentadas pela Falida em momento prévio à sua declaração, embora posteriores ao Requerimento Inicial de Falência.
30ª. - Mas já o Liquidatário, porque inclusivamente possui formação em Direito, tem poderes e competência para averiguar da viabilidade ou não dos pedidos efectuados, até porque é ao Liquidatário que compete representar a massa falida em juízo, nos termos do disposto no n.º 4 do art.º 134.º do CPEREF, já supra transcrito.
31ª. - E o processo que corre seus termos em […], do qual ainda não existe requerimento de prova e despacho saneador, será acompanhado pelo Liquidatário Judicial que, perante a manifesta improcedência dos pedidos reconvencionais, se vê a braços com a manutenção e defesa de um processo, votado, desde o seu início, ao fracasso.
32ª. - Em bom rigor, o Tribunal a quo apenas está a adiar o inadiável e inevitável e, com tal actuação, a violar todos os princípios processuais inerentes ao CPEREF como sejam o princípio da celeridade processual.
33ª. - O papel do liquidatário judicial é administrar a massa falida no interesse dos credores daquela, norteando-se pelo princípio da legalidade, da economia processual, porquanto as alterações do CPEREF têm como fito principal entregar a condução destes processos aos credores.
34ª. - Pelo que o Juiz do Douto Tribunal a quo não pode, autonomamente e ao arrepio da Lei, limitar as decisões da Comissão de Credores.
35ª. - Impõe-se, perante a actuação do Tribunal a quo, saber, no caso em concreto, em que condições ou situações pode a Comissão de Credores, livremente deliberar?
36ª. - O CPEREF é claro, a Comissão de Credores, fiscaliza a actuação do Liquidatário Judicial, participando nas actuações e decisões deste quando para tal a Lei impõe, já ao Tribunal, cumpre desempenhar o papel de garante da legalidade, tendo em conta o objectivo do CPEREF e dos processos de falência em concreto, a satisfação dos credores da massa falida.
37ª. - Foi o liquidatário que sugeriu a desistência dos pedidos reconvencionais e não a Comissão de Credores ou os seus membros com interesse directo na desistência, como indicia o Tribunal a quo, esta apenas conferiu o seu parecer favorável à pretensão deduzida pelo liquidatário e,
38ª. - Perante o requerimento apresentado para inutilidade superveniente da lide, nos termos do art.º 186º do CPEREF veio a Recorrente sugerir que, a manutenção dos pedidos reconvencionais, atenta a manifesta improcedência dos mesmos, não seria viável, sugerindo, inclusive, que sobre os mesmos se viesse a debruçar entidade competente, por forma a atestar, inequivocamente tal improcedência latente.
39ª. - Não podendo obviamente concordar com o douto Tribunal a quo ao indeferir tal pretensão.
40ª. - É o liquidatário que diligentemente deve administrar a massa falida, impendendo sobre aquele, em caso de violação dos deveres de diligência a que está obrigado, a responsabilização por actos que prejudiquem os credores. (Cfr. Art.º 145º n.º 1 do CPEREF).
41ª. - E a desistência dos pedidos reconvencionais, além de não prejudicar os credores, também não beneficia a ora recorrente, atenta a inexistência de quaisquer bens na massa falida.
42ª. - O prejuízo dos credores já existe porque a falida, antes da sua declaração de falência, através das suas manobras dilatórias, transmitiu para terceiros todo o seu património social e dos sócios.
43ª. - E os pedidos reconvencionais, como o próprio Liquidatário Judicial reconhece – caso contrário não sugeria a desistência – são infundados e manifestamente improcedentes.
44ª. - Não se pode invocar interesse directo por parte dos membros da comissão de credores, quando foi o próprio Tribunal a quo, já conhecedor dos pedidos reconvencionais deduzidos, que nomeou a ora Recorrente presidente da Comissão de Credores e,
45ª. As deliberações desta Comissão são conjuntas em respeito pelas regras impostas pelo CPEREF. Se assim os nomeou para a Comissão de Credores, o Douto Tribunal, não pode agora imiscuir-se nas suas deliberações, alegando interesse directo em deliberar no sentido da desistência dos pedidos.
46ª. - Conferindo, ao arrepio das regras do processo de falência, insegurança jurídica, para a qual não existe justificação legal que o permita.
47ª. - Desvirtuando o papel da Comissão de Credores que, para umas decisões tem poderes e, para outras aparentemente não!!.
48ª. - Reitera-se que a massa falida não possui quaisquer bens e, arrastar o processo da falência, associando-se o mesmo, à decisão que venha a ser tomada numa acção que, ainda, nesta fase, não conhece qualquer desenvolvimento processual, nomeadamente meios de prova, despacho saneador, admissão dos diversos recursos interpostos é beneficiar os devedores relapsos.
49ª. - Encontrando-se o Processo no qual se encontram deduzidos os pedidos reconvencionais paralisado, a decisão do Tribunal a quo, também paralisa o processo de falência,
50ª. - O qual, reitera-se, por não existirem quaisquer bens, carece de prosseguir.
51ª. - Com esta actuação o Tribunal a quo permite que um processo falimentar, sem bens, se arraste por período que à data não é possível concretizar, atenta a fase processual do processo que corre em […], violando, nomeadamente, os art.ºs. 134.º nº 4, 140º, 141º, 143º, 145º e 147º todos do CPEREF.
Conclui pela revogação do despacho e substituído por outro que, “cumprindo o requerido pela recorrente venha a possibilitar a execução do solicitado pelo liquidatário judicial e sufragado pela deliberação da comissão de credores”.
- Ov.[…] S.A. –
1ª. - O processo de falência está, segundo o despacho em crise dependente da solução a dar ao processo que corre termos na Comarca de […], onde foram deduzidos pedidos reconvencionais que no entender da recorrente são manifestamente infundados;
2ª. - E isto sucede pelo facto da devedora F.[…] , Lda antes do julgamento e decisão da falência, a mesma, a seu pedido, ter solicitado uma suspensão com vista a um acordo entre a mesma e a credora R.[…] SA, vindo a instância a ficar suspensa desde 10.12.2003 até Fevereiro de 2004 e foi durante esse período que a mencionada F.[…] Lda contestou a mencionada acção ordinária que corre termos em […] e deduziu os respectivos pedidos reconvencionais, chamando a essa acção a também recorrente R.[…] SA.
3ª. - Não fez o dito acordo com as R.[…] SA e por isso conseguiu no mencionado período da Contestação deliberada e intencionalmente deduzir os pedidos reconvencionais e entravou o presente processo judicial e o processo judicial que corre termos em […] e faz crer que tem créditos perante os seus credores. Digamos: actuou com má fé. O sublinhado é nosso.
4ª. - Quando o Tribunal nega a possibilidade de desistência dos pedidos reconvencionais, o processo de falência vai ficar parado até à resolução do processo que corre termos na Comarca […] e onde foram deduzidos esses pedidos, como é evidente.
5ª. - Ora nos poderes do Sr. Liquidatário Judicial compete a este representar a massa em juízo activa e passivamente e com a cooperação e fiscalização da Comissão de Credores, sendo-lhe aplicáveis os preceitos do mandato, sendo que ao liquidatário lhe compete a representação do falido de todos os interesses de carácter patrimonial que interesse à falência – artigos 134.º, 141.º. 143.º e 147.º do CPERF
6ª. - Ora o Tribunal a quo veio opor-se a que o Sr. Liquidatário Judicial possa desistir dos pedidos reconvencionais, por entender que na Comissão de Credores, dois dos seus membros são partes interessadas no caso, reconvindos na acção ordinária […] que corre termos pelo 2.º Juízo Cível […].
7ª. - Mas, salvo o devido respeito, a recorrente discorda que assim possa ser, pois sabendo e bem o Tribunal a quo que a recorrente R.[…] SA era parte interessada no dito processo, bem como a aqui recorrente Ov.[…] SA, nem por isso o Tribunal deixou de nomear a mesma membro da Comissão de Credores e nenhum obstáculo houve a que a Ov.[…] SA também o fosse.
8ª. - Inexiste assim qualquer obstáculo ou qualquer capitis diminutio que afecta a existência e os poderes da Comissão de Credores, tendo até proposto que o Sr. Liquidatário Judicial, ele mesmo ou alguém independente e nomeado por ele aprecie a viabilidade da desistência dos pedidos reconvencionais.
9ª. - Nada na Lei existe que nos diga que o Sr. Liquidatário está impedido ou não tenha poderes para analisar a viabilidade dos pedidos reconvencionais feitos, pois representa a massa em juízo e com esta posição o Tribunal a quo interfere no princípio da celeridade processual, sujeita o liquidatário à defesa num processo […] em que vai tentar provar o improvável e ofendendo os interesses dos credores.
10ª. - Até porque a massa não é assim administrada no interesse dos credores, arredando o despacho em crise essa administração. Veja-se que um Liquidatário Judicial em processo de falência pode desistir de um agravo interposto pela executada depois de declarada falida – Acordão TRP, in www.dgsi.pt – Processo 0534967.
11ª. - A Comissão de Credores deu o seu aval à pretensão querida pelo Liquidatário que reconhece serem os pedidos infundados e inconsistentes e que portanto poderia desistir dos mesmos.
12ª. - Por outro lado a desistência dos pedidos reconvencionais nem prejudica os credores, mas também os não beneficia, pois a massa falida está desprovida de bens e isto porque a F.[…], Lda. e os seus sócios antes da declaração de falência fizeram desaparecer todo o património que tinham em seu nome.
13ª. - O despacho a quo e em crise permite que se pense que a Comissão de Credores umas vezes tenha poderes e outras os não tenha sem que essa falta de poderes esteja associada a qualquer comando e obrigação legal.
14ª. - Os autos que correm termos na Comarca de […] estão a aguardar despacho saneador e sabe-se lá quando verão o seu termo e o processo falimentar terá de aguardar pelo mesmo, quando nem sequer neste existem quaisquer bens, violando-se deste modo todas as normas que importam celeridade processual, como é evidente.
15ª. - Atento o despacho em recurso o Tribunal permite que um processo falimentar se arraste definitivamente e suporte indefinidamente os efeitos de todas as fases e vicissitudes de um outro que corre termos em […], violando-se o princípio processual da celeridade, designadamente os artigos 134,º, n.º 4, 140.º, 141.º, 143.º, 145.º e 147º, todos do C. P. E. R. F.
Conclui pela revogação do despacho e que seja “substituído por um outro que permita a execução do pretendido pelo Sr. Liquidatário judicial e sufragado pela maioria da Comissão de Credores”
7. Foi proferido despacho de sustentação.
8. Efectuado exame preliminar e colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
II - Delimitação do objecto do recurso
Conforme resulta do disposto nos artigos 684º, nº 3, e 690º, nºs 1 e 2, ambos do Código de Processo Civil, o âmbito de intervenção do tribunal ad quem é delimitado em função do teor das conclusões com que o recorrente remata a sua alegação (aí indicando, de forma sintética, os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida), só sendo lícito ao tribunal de recurso apreciar as questões desse modo sintetizadas, sem prejuízo das que importe conhecer oficiosamente.
Dentro dos preditos parâmetros, emerge das conclusões da alegação recursória apresentada que o objecto do presente recurso está circunscrito - apenas - às questões de saber se o liquidatário judicial tem poderes para desistir dos pedidos reconvencionais deduzidos no âmbito do processo […] que corre termos pelo 2º Juízo […], e relativamente aos quais a Comissão de Credores deliberou, por maioria, no sentido da sua desistência, sendo que os pedidos reconvencionais estão formulados contra os membros da Comissão de Credores que votaram favoravelmente.
III. Fundamentação
1. Do contexto processual relevante:
1.1. R.[…] S.A. requereu a declaração de falência de F.[…] Lda..
1.2. Por sentença, transitada em julgado, foi decretada a falência de F.[…] Lda..
1.3. E, nessa decisão, foram nomeados liquidatário judicial e a comissão de credores.
1. 4. A comissão de credores era constituída por R.[…] S.A. (que presidia), BNC – Banco Nacional de Crédito, S.A. e BANIF – Sociedade Europeia de Leasing – SEL, S.A..
1.5. O liquidatário judicial nomeado veio informar que os bens móveis pertencentes à falida que foram encontrados não funcionavam e se apresentavam em elevado estado de deterioração, não tendo qualquer valor venal, sendo que o único bem susceptível de ser apreendido seria o direito de crédito emergente do pedido reconvencional formulado na acção ordinária que corre termos pelo 2º Juízo Cível […].
Mais informou que alguns membros da Comissão de Credores sugeriram a possibilidade de desistência do pedido reconvencional.
1. 6. A referida acção foi intentada pela credora Ov.[…] S.A. contra a F.[…] Lda. e outros.
1. 7. F.[…] Lda. deduziu pedido reconvencional contra Ov.[…] S.A. e R.[…] S.A. (e após ter suscitado o incidente de intervenção principal desta), sendo que a contestação apresentada por aquela deu entrada em juízo em 14/11/2003.
1.8. A comissão de credores, agora constituída por R.[…] S.A. (que preside), Ov.[…] , S.A. e BNC – Banco Nacional de Crédito, S.A., pronunciou-se, por maioria, pela desistência do pedido reconvencional na acção ordinária que corre termos pelo 2º Juízo Cível […], sob o nº […] – votos favoráveis das duas primeiras e voto contrário da última.
1. 9. Os credores R.[…] S.A. e Ov.[…] S.A. vieram requerer, em requerimentos distintos – que o liquidatário judicial, ou outro advogado, elabore um relatório no qual esclareça de forma independente quais os fundamentos e a probabilidade de êxito dos pedidos reconvencionais deduzidos e, em caso de manifesta improcedência material dos pedidos deve ser deduzida a desistência dos pedidos; se assim se não entender que sejam notificados todos os credores para se pronunciarem sobre a desistência do pedido reconvencional, devendo ser homologado no caso da maioria se pronunciar favoravelmente.
1.10. Sobre os requerimentos apresentados pelas agravantes recaiu o despacho de 10 de Outubro de 2006, ora sob recurso, do seguinte teor:
“Os credores R.[…] SA e Ov.[…] vêem aos autos – em requerimentos distintos – requerer:
a) que seja o Sr liquidatário – ou outro jurista – a apreciar os fundamentos dos pedidos reconvencionais que a falida deduziu contra os citados credores, no âmbito do processo […] do 2º Juízo Cível do Tribunal Judicial […] , com vista às desistências dos mesmos;
b) que sejam os credores notificados para se pronunciarem sobre a homologação das desistências dos pedidos reconvencionais.
Sobre esta questão já nos pronunciámos anteriormente (cfr. fls. 683 dos apenso principal). Tendo o Sr. Liquidatário submetido o assunto à comissão de credores, nesta não houve unanimidade quanto à atitude a adoptar: os credores R.[…] e Ov.[…] votaram pela desistência dos pedidos reconvencionais; o credor BNC opôs-se à desistência. Na ocasião, invocámos um imperativo de transparência para não autorizarmos o Sr. liquidatário a formalizar as desistências, afinal os credores que votaram a favor têm nelas um interesse directo – são parte na acção que corre no Tribunal […] e as desistências traduzem-se, para eles, numa vantagem efectiva.
Quanto à primeira pretensão deduzida pelos credores ela carece manifestamente de base legal, mesmo que se opine, de forma legítima, que os pedidos reconvencionais são “dilatórios”, ou até “juridicamente ineptos”, nenhum juízo (externo) de jurista – mesmo que portador de elevada autoridade – pode sobrepor-se, ou equiparar-se, ao juízo definitivo que o Tribunal irá emitir.
Por outro lado, convocar credores que não estão representados na comissão para se pronunciarem sobre esta questão, implica o exercício por aqueles de uma competência exclusiva da comissão de credores, logo um desvio ao preceituado no artº42º nº1 do CPEREF”
2. Apreciação do mérito do agravo.
2.1. Algumas considerações preliminares.
As recorrentes indicam como normas violadas: os artigos 134.º nº 4, 140º, 141º, 143º, 145º e 147º todos do CPEREF, referindo, ainda, a violação do princípio processual de celeridade.
Prescrevem as citadas disposições:
Artigo 134º:
1 – Ao liquidatário judicial, com a cooperação e fiscalização da comissão de credores, cabe o encargo de preparar o pagamento das dívidas do falido à custa do produto da alienação, que lhe incumbe promover, dos bens que integram o património dele.
2 – O liquidatário judicial exerce pessoalmente as competências do seu cargo, não podendo substabelecê-las em ninguém, sem prejuízo dos casos de recurso obrigatório ao patrocínio judiciário ou de necessidade de prévia concordância da comissão de credores.
3 – O liquidatário judicial pode, no exercício das respectivas funções, ser coadjuvado sob a sua responsabilidade por técnicos ou outros auxiliares, remunerados ou não, incluindo o próprio falido, mediante prévia concordância da comissão de credores.
4 – Ao liquidatário judicial compete ainda:
a) Representar a massa em juízo, activa e passivamente;
b) Prestar oportunamente à comissão de credores e ao tribunal todas as informações necessárias sobre a administração e a liquidação da massa falida;
c) Exercer, relativamente aos trabalhadores do falido, todas as competências decorrentes do regime jurídico da cessação do contrato individual de trabalho, pelas formas de cessação aí previstas a que concretamente houver lugar.”
Artigo 140º
“1 – À comissão compete, para além de outras tarefas que lhe sejam especialmente cometidas, fiscalizar a actividade do liquidatário judicial e prestar-lhe colaboração.
2- No exercício das suas funções, pode a comissão examinar livremente os elementos da contabilidade do devedor e solicitar ao liquidatário judicial as informações e a apresentação dos elementos que considere necessários.
3 – É aplicável à comissão de credores, no processo de falência, o disposto nos nos 3, 4 e 5 do artigo 41º, relativamente à comissão de credores no processo de recuperação.”
Artigo 141º
“A administração dos bens que compõem a massa falida, durante o período da liquidação, compete ao liquidatário judicial, sob a direcção do juiz e com a cooperação e fiscalização da comissão de credores.”
Artigo 143º
“O liquidatário judicial pode praticar, em relação à massa falida, todos os actos de administração ordinária, sendo-lhe aplicáveis, com as necessárias adaptações, os preceitos do contrato de mandato.”
Artigo 145º
“1 – Ao liquidatário judicial, que deve agir como gestor diligente, cabe especialmente:
a) Prover à conservação e frutificação dos direitos do falido, evitando quanto possível o agravamento da situação económica dele;
b) Promover, mediante prévia concordância da comissão de credores, a venda imediata dos bens da massa falida que não possam ou não devam conservar-se por estarem sujeitos a deterioração ou depreciação, ou por haver manifesta vantagem na antecipação da venda;
c) Diligenciar, quando nisso haja conveniência e mediante prévia concordância da comissão de credores, pelo imediato cumprimento de obrigação do falido submetida a direito de retenção ou munida da garantia especialmente onerosa;
d) Determinar, ouvida a comissão de credores, o encerramento temporário ou definitivo de qualquer dos estabelecimentos do falido.
2 – São aplicáveis aos bens da massa falida entregues ao liquidatário, com as necessárias adaptações, as normas do depósito em geral e, em especial, as que regem o depósito judicial de bens penhorados.
3 – As somas recebidas em dinheiro pelo liquidatário, ressalvadas as estritamente indispensáveis às despesas correntes de administração, devem ser imediatamente depositadas na Caixa Geral de Depósitos ou em outra instituição de crédito escolhida pelo liquidatário, com a concordância da comissão de credores”.
Artigo 147º
“1- A declaração de falência priva imediatamente o falido, por si, ou, no caso de sociedade ou pessoa colectiva, pelos órgãos que o representem, da administração e do poder de disposição dos seus bens presentes ou futuros, os quais passam a integrar a massa falida, sujeita à administração e poder de disposição do liquidatário judicial.
2 – O liquidatário judicial assume a representação do falido para todos os efeitos de carácter patrimonial que interessem à falência.”
Como se sabe, e vem referido pelas recorrente, com o CPEREF, o processo de falência ficou na dependência, no essencial, dos credores, sendo que ao Tribunal tem essencialmente a função de controlo da legalidade dos actos destinados à liquidação do património do falido.
No dizer de Carvalho Fernandes e João Labareda, “dá-se, por assim dizer, uma privatização do processo de falência, libertando-o da intervenção de um poder institucional e sobranceiro aos interesses dos credores, representado pelo síndico, para se atribuir àqueles um papel determinante na condução do processo e na realização dos actos destinados à sua satisfação” (in Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e de Falência Anotado, 1994, pág.330).
Por outro lado, e tendo presente o nº1 do artigo 134º do CPEREF, a actividade do liquidatário destina-se a preparar o pagamento aos credores, devendo proceder à cobrança de créditos sobre terceiros e proceder à alienação do património do falido.
O liquidatário judicial pode ser coadjuvado por técnicos ou outros auxiliares, no exercício das suas funções.
Compete, ainda, ao liquidatário judicial representar a massa em juízo, activa e passivamente e prestar todas as informações necessárias sobre a administração e a liquidação da massa falida. Estas informações são prestadas quer à comissão de credores quer ao Tribunal.
O liquidatário judicial pode, também, praticar, em relação à massa falida, todos os actos de administração ordinária (artigo 143º).
A Comissão de Credores, por seu lado, tem um papel relevante ao longo de todo o processo, e os poderes que lhe são concedidos visam a defesa de todos os credores e não apenas dos que estão representados na comissão, e tem como finalidade o controlo da actividade do liquidatário.
Para além dos poderes genéricos indicados no artigo 140º do citado diploma, outras intervenções e poderes são atribuídos à Comissão de Credores, como os previstos nos artigos 136º, 137º, 144º, 145º, nº1, alíneas b), c) e d), 180º, 181º, nº2, 184º, 195º, 210º, nº1, e 220º, nº2, do mesmo diploma.
Para a cobrança de créditos do falido, que constitui um acto de administração ordinária, o liquidatário judicial carece da prévia concordância da comissão de credores (artigo 146º, nº1); o liquidatário judicial tem o dever de informar a comissão de credores das diligências realizadas para obter o pagamento e sugerir diligências para alcançar o recebimento, sendo da competência da comissão de credores dar as instruções (nº2 do artigo 146º).
O liquidatário está vinculado às instruções da comissão de credores, que deve cumprir.
Na função de controlo da legalidade dos actos destinados à liquidação do património do falido, o juiz decide a impugnação dos actos do liquidatário judicial, com fundamento na sua ilegalidade ou na sua inconveniência para os interesses da massa falida (artigo 136º), pode destituir o liquidatário, ouvida a comissão de credores.
E, também de forma relevante, conceder a autorização à prática de actos previstos no artigo 144º, que prescreve “O liquidatário judicial pode ser autorizado pelo juiz, ouvida a comissão de credores e, se necessário, o próprio falido, a conceder reduções de créditos, realizar transacções, aceitar liberalidades, celebrar convenções de arbitragem e extinguir penhores, hipotecas ou outras garantias a favor do falido.”
Ora, como escrevem Carvalho Fernandes e João Labareda, “a enumeração contida no preceito não deve considerar-se exaustiva.
Qualquer acto que esteja para além da esfera de poderes conferidos ao liquidatário judicial, mas cuja prática se mostre de interesse para a massa falida, pode ser autorizado pelo tribunal, precedendo audição da comissão de credores e, quando necessário o próprio falido.
Neste preceito estão somente indicadas as categorias de actos mais correntes, e que se revelam amiudadamente úteis à defesa dos interesses da massa falida. O sentido do preceito é, porém, o de permitir a realização de qualquer acto análogo, desde que devidamente autorizado. De resto, a atribuição de carácter exaustivo à enumeração do preceito redundaria na negação da possibilidade da prática de outros actos, uma vez que a ninguém mais no processo, para além do liquidatário, estão atribuídas funções de liquidação.
(…) Embora a comissão de credores tenha de ser ouvida, o seu parecer não é vinculativo para o tribunal. Não obstante, tendo em consideração as finalidades do processo de falência e as funções da comissão de credores, o juiz só deve afastar-se do sentido do parecer quando, em razão dos dados disponíveis, de uma decisão em conformidade com a posição assumida pela comissão de credores possa razoavelmente esperar-se prejuízo para a massa. Os poderes do juiz nesta matéria, apesar de não vinculados à orientação sugerida pela comissão, não são, todavia, arbitrários.
(…) Uma vez que toda a redução e, por maioria de razão, a extinção de créditos está condicionada a autorização do tribunal…” (in obra atrás citada, págs.345 e 346).
2.2. O caso dos autos.
Tendo presente que toda a actividade do liquidatário visa preparar o pagamento dos credores (sendo que para esse fim deve proceder à cobrança de créditos de que a massa falida é titular e proceder à venda do património existente), que a actividade da comissão de credores tem como finalidade a defesa de todos os credores e não apenas dos que estão representados na comissão, procedendo ao controlo da actividade do liquidatário e que o juiz tem a função de controlo da legalidade dos actos destinados à liquidação do património do falido e de autorizar a prática de determinados actos que sejam úteis para o fim último de proceder ao pagamento dos credores e em montante o mais próximo possível dos seus créditos, vejamos se no caso dos autos deveria o Tribunal deferir a pretensão das recorrentes.
As recorrentes pretendem que o liquidatário (ou outro jurista contratado pelo liquidatário judicial) elabore um relatório no qual esclareça de forma independente quais os fundamentos e a probabilidade de êxito dos pedidos reconvencionais deduzidos no processo nº […], a correr termos pelo 2º Juízo Cível […], e caso entenda que ser manifesta a improcedência material dos pedidos seja deduzida a desistência dos pedidos ou, caso assim se não entenda devem ser notificados todos os credores para se pronunciarem sobre a desistência do pedido, devendo ser homologado no caso da maioria se pronunciar favoravelmente.
Como resulta das disposições atrás referidas, o liquidatário judicial pode pronunciar-se sobre a questão elaborando um relatório que deve colocar à apreciação da comissão de credores e, posteriormente, submetê-lo à decisão do juiz do processo, porquanto está em causa a desistência do pedido, isto é, em princípio, deixar de cobrar um crédito, embora litigioso.
Nesta averiguação da situação, o liquidatário judicial pode ser coadjuvados por técnicos, sob a sua responsabilidade.
Desta forma, nenhum impedimento existe a este procedimento do liquidatário judicial; contudo, o liquidatário judicial deve ter presente que a sua actividade visa a cobrança de todos os créditos da massa falida, e com o intuito de se proceder ao pagamento dos credores (em montante o mais próximo possível dos seus créditos).
Também a comissão de credores tem poderes para fiscalizar esta actividade do liquidatário judicial e também sugerir algumas medidas que visem o melhor desempenho deste.
Nesta sua actividade, a comissão de credores deve ter presente que deve actuar no sentido do interesse de todos os credores.
Assim, perante o que se refere, em princípio, são aceitáveis as diligências do liquidatário judicial, no sentido de se apurar se existe viabilidade no pedido reconvencional formulado no processo que corre termos no 2º Juízo Cível […].
Também temos como não ofendendo qualquer princípio, que além da comissão de credores fiscalizar a actividade do liquidatário judicial, todos os credores se pronunciem sobre algum acto em concreto, praticado pelo liquidatário judicial, e do qual possa resultar a possibilidade da perda da possibilidade de satisfazer total ou parcialmente os seus créditos.
Mas, na situação colocada nos presentes autos, e em termos objectivos, a pretensão das requerentes consiste na possibilidade de se lhes conceder um benefício, isto é, o pedido reconvencional encontra-se deduzido contra elas e a sua desistência, em termos abstractos, porque impeditiva da cobrança de um crédito de que são, hipoteticamente, devedoras à massa falida, só às requerentes/recorrentes trás vantagens.
Directamente desta desistência não resulta qualquer benefício para os restantes credores.
Assim, não estamos em presença de um pedido formulado contra terceiros, em que objectivamente se poderia considerar que as recorrentes (para além de defender os seus interesses) estavam a ter em consideração os interesses de todos os credores.
Aliás, desde logo, e perante a possibilidade de desistência do pedido reconvencional, a comissão de credores aprovou a proposta com os votos das ora recorrentes, formando maioria, porquanto o terceiro membro da comissão de credores votou contra essa possibilidade de desistência.
Desta forma, encontrando-se pendente o processo – no 2º Juízo Cível […] – e por existir um manifesto conflito de interesses entre a massa falida e as oras recorrentes, membros da comissão de credores, só se tornaria possível a desistência do pedido se todos os credores aceitassem essa desistência, o que não ocorre, porquanto, e desde logo, o terceiro membro da comissão de credores votou contra essa proposta.
Este conflito de interesses inviabiliza o deferimento da pretensão das requerentes.
Por fim, importa referir a algumas questões referidas nas conclusões de recurso.
Apesar de existir a possibilidade de a massa falida ser credora das ora recorrentes não é obstáculo à sua nomeação para a comissão de credores, atenta a natureza desta e os seus poderes, bem como a possibilidade que existe de os restantes credores suscitarem as questões que entenderem por pertinentes se verificarem que os interesses da totalidade dos credores não estão a ser salvaguardados, e a possibilidade de intervenção do juiz sempre que existe decisão ilegal e violadora dos direitos da totalidade dos credores, como ocorreu no caso presente.
Contudo, sempre se poderia referir seria conveniente, para que não existissem situações que poderiam ser consideradas dúbias, que existindo situações de potenciais conflitos de interesses, como no caso presente, que esses credores não compusessem a comissão de credores ou que não se pronunciassem sobre as questões relacionadas com esses conflitos.
Quanto ao facto de algumas vezes serem aceites as decisões da comissão de credores e outras vezes não, também não releva, sendo uma possibilidade legal, pois é admissível que algumas sugestões da comissão de credores não sejam aceites pelo Tribunal, o que, salvo o devido respeito, não coloca em crise os poderes da comissão de credores e o seu funcionamento.
No que concerne ao comportamento da falida aquando da propositura da acção, com um comportamento que visou o desfazer-se dos bens, não releva para a apreciação do caso presente porquanto encontramo-nos numa outra fase, em que foi decretada a falência e se diligencia por averiguar da existência de créditos e a sua cobrança.
Por fim, refere-se que foi o liquidatário judicial que sugeriu a desistência dos pedidos reconvencionais.
Segundo os elementos que existem nestes autos de recurso, “alguns membros da comissão de credores sugeriram a possibilidade de desistência deste pedido” (refere-se ao pedido reconvencional deduzido no processo […] e tenha-se presente que a comissão de credores é composta por três membros: as ora recorrentes e o BNC – que votou contra a desistência -) – cfr. requerimento do liquidatário judicial de fls.93.
Desta forma, verificando-se a pendência do processo judicial em que se encontra formulado um pedido reconvencional contra as ora recorrentes, que são membros da comissão de credores, a existência de um conflito de interesses entre as ora requerentes e a massa falida e a oposição desde logo deduzida por credor, terceiro membro da comissão de credores, o indeferimento proferido na 1ª instância não merece censura, pelo que os recursos não podem ter provimento.
IV. Decisão
Posto o que precede, nega-se provimento aos agravos e, consequentemente, mantém-se o despacho sob recurso.
Custas pelas recorrentes.
Lisboa, 10 de Maio de 2007
(Processado e integralmente revisto pelo relator, que assina e rubrica as demais folhas)
(A. P. Lima Gonçalves)
(António Valente)
(Ilídio Sacarrão Martins) |