Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
692/07-2
Relator: EZAGÜY MARTINS
Descritores: PROVIDÊNCIA CAUTELAR
OPOSIÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 03/29/2007
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: AGRAVO
Decisão: PROVIDO
Sumário: I- Em caso de revogação, após contraditório, da decisão inicial proferida em procedimento cautelar, que, sem audição da parte contrária, havia decretado a providência, é de aplicar ao recurso interposto daquela última decisão o regime estabelecido no art.º 738º, n.º 1, al. a), do Código de Processo Civil, por resultar aquela assim absolutamente equiparável ao despacho que não ordene a providência.
II- A oposição à providência, após o decretamento da mesma, deduzida apenas por alguns dos Requeridos, não pode ter, em sede impugnatória, efeitos diversos dos que teria se a dita oposição, tendo tido lugar a “prévia” audição dos Requeridos, houvesse sido deduzida antes do decretamento da providência.
III- Nada posterga a inclusão, no elenco fáctico considerado provado, na sequência de oposição posterior ao decretamento de providência cautelar, de factos já anteriormente como tal considerados na decisão proferida sem contraditório, e que, depois de observado este, sejam de manter”.
IV- IV- Deduzida oposição à decretada providência cautelar, e mantida a essencialidade do quadro fáctico inicialmente dado por assente, não pode a decisão que julgar a oposição enveredar por um enquadramento jurídico-normativo distinto do operado na decisão inicial.
(E.M)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Agravo n.º 692/07-2
43
Acordam na 2ª Secção (cível) deste Tribunal da Relação


I- TT P, A F L S e A N C, requereram providência cautelar não especificada contra AD, P, I, L , I A F. e CMV, pedindo:
“A- que sejam imediatamente intimadas as Reqdas:
1 – 5ª, a abster-se de publicar qualquer anúncio preliminar de "aquisição potestativa" das acções que não adquira até ao dia 24 de Outubro de 2000, de fazer qualquer depósito bancário destinado a servir de contrapartida dessas mesmas acções, e a requerer a perda da qualidade de sociedade aberta que a 4ª Reqda tem;
2 – 6ª, a não enviar à 3ª, quaisquer informações destinadas a permitir-lhe as transferências de contas relativas a acções Lque afecte as contas das 1ª e 2ª, em que essas acções se encontram relevadas, e a não satisfazer qualquer pedido de retirada da qualidade aberta de que a 4ª goza;
3 – 3ª, a não violar o bloqueio que sobre estas acções impendem, a não operar qualquer transferência de contas relativas a acções L de que é mero "Cofre Forte", que lhe hajam sido confiadas pela 1ª e 2ª, e não criar quaisquer obstáculos à movimentação que estas queiram fazer das mesmas acções para satisfazerem ordens dos seus depositantes ora Reqtes;
4 – 4ª, abster-se de emitir quaisquer novos títulos representativos das acções de que a 5ª pretende apoderar-se sem consentimento dos seus donos e possuidores legítimos;
5 – 1ª e 2ª, a manterem os bloqueios a que se encontram sujeitas os títulos e cautelas de acções L que lhe foram confiados em custódia; a não receberem quaisquer importâncias destinadas a servir de contrapartida das acções de que a 5ª pretende apoderar-se contra vontade dos Reqtes, e a continuarem a emitir todos os certificados previstos na lei, relativos às acções L, que estes lhes peçam;
B - que sejam as mesmas Reqdas condenadas na sanção prevista nos art°s 384º-2 do CPC, 829°-A, n° 1, e 1276° do Cod. Civil, em montante não inferior ao do valor da presente providência, por cada infracção que cometam ao ora requerido;
C - que, atenta a urgência da notificação das 5ª, 6ª e 3ª Reqdas, para as medidas requeridas, seja ordenada a notificação das mesmas para os seguintes faxes, respectivamente: 5ª - 234; 6ª 213; 3ª - 226, sem prejuízo da notificação de todas nos termos legais.”.

Alegando, para tanto, que cada um dos requerentes é dono e possuidor das acções tituladas ao portador, representativas de participação no capital da 2ª Requerida, e dos títulos provisórios representativos de subscrição de igual número de acções representativas de aumento de capital da 4ª Requerida, que discriminam.
Sendo as 1ª e 2ª Requerida depositárias dos sobreditos títulos dos 2º e 1º e 3º Requerentes, respectivamente, os quais nela se encontram bloqueados ao abrigo do art.º 72º do CVM.
Tendo a 5ª Requerida publicitado no suplemento do B relativo à sessão de 06-10-2000, o lançamento de uma OPAG sobre acções representativas do capital social da 4ª Requerida.
Escondendo, no dito anúncio, a real intenção de recorrer ao mecanismo de aquisição do art.º 194º do CVM.
Certo dispor a 5ª Requerida – directa ou indirectamente, através do Dr. L P e da sua própria participação no capital da 4ª Requerida – de cerca de 91,40 do capital social da 4ª Requerida, do que tem conhecimento desde 30 de Julho de 1999.
Não tendo utilizado a faculdade de aquisição potestativa nos seis meses subsequentes, previstos na lei.
E vindo agora, no sobredito anúncio, para voltar a poder fazer uso da precludida “faculdade”, publicitar falsamente que só controla 88,696% da totalidade dos votos correspondentes ao capital social da 4ª Requerida.
O que tudo assim revelaria o aproveitamento do novo regime estabelecido no CVM – que entendem violador do disposto nos art.ºs 62º, 200º, n.º 5, e 2º, da Constituição da República Portuguesa – para a 5ª Requerida se considerar dona das acções dos Requerentes, logo que feito o registo contemplado no n.º 2 do art.º 194º do CVM.
E, na sequência disso, projecta, serão enviadas pela CMV à 3ª Requerida – à qual as 1ª e 2ª requeridas dizem ter confiado na totalidade ou em parte a detenção dos títulos dos Requerentes – as informações necessárias para a transferência entre contas.
Procedendo então a 3ª Requerida de imediato à transferência entre contas de intermediários financeiros do que lhe foi confiado a título de mera detentora.
Ficando a 4ª Requerida habilitada, caso alguns dos títulos ainda não sejam detidos pela 3ª Requerida, a emitir novos títulos representativos das acções esbulhadas.
Na acção ordinária a instaurar, têm os Requerentes a possibilidade de ver decretado o respeito pelos seus direitos de propriedade sobre as partes de capital da 4ª Requerida de que são donos e legítimos possuidores.
Mas, até lá, os seus direitos de participação nas respectivas assembleias gerais de fiscalização, dentro e fora daquelas, o direito de votar, de inquirir e até de accionar serão coarctados irremissivelmente, o que constitui lesão grave e irreparável.
Mais alegando que o 3º Requerente impugnou as deliberações de alguns accionistas (da L) tomadas em reunião havida em 23 de Março de 1993 e em 5 de Maio de 1993, e duas dessas deliberações já foram, uma declarada nula e outra anulada. Mas quanto às restantes, relativas às contas individuais e consolidadas da mesma, julgadas improcedentes em 1ª instância, foi a decisão desta vez anulada, pelo Tribunal da Relação de Coimbra e pelo Supremo Tribunal de Justiça, "nada do processado tendo subsistido desde a especificação e o questionário".
E não tendo a L apresentado ainda contas consolidadas relativamente ao exercício de 1991, foi requerido inquérito judicial ao abrigo do disposto no art.° 67° do CSC.
Obtidas as decisões finais em tais processos, impõe-se pedir a declaração de nulidade de todas as deliberações sociais tomadas desde 1993.
Mas o efeito útil daquelas ficará completamente esterilizado se as Requeridas não forem atempadamente intimadas nos termos requeridos.
A ameaça de esbulho das acções e “cautelas” dos Requerentes só é possível com o concurso da 6ª, 3ª, 4ª e , finalmente, das 1ª e 2ª Requeridas.

Sem audição da Requerida, foi proferida decisão que, considerando o “desapossamento forçado” dos requerentes, julgou o procedimento sumariamente provado, e ordenou:
a) que a requerida I se abstenha de publicar qualquer anúncio preliminar de oferta de aquisição das acções da requerida Luzostela, que não adquira até ao dia 24 de Outubro de 2000, de fazer qualquer depósito bancário destinado a servir de contrapartida dessas mesmas acções, e de requerer a perda da qualidade de sociedade aberta que a L tem;
b) que a CMV se abstenha de enviar à requerida Interbolsa quaisquer informações destinadas a permitir-lhe as transferências de contas relativas a acções L detidas pelos requerentes, que afecte as contas dos requerentes na 1ª requerida A D e na 2ª requerida P;
c) E ainda que não satisfaça qualquer pedido de retirada da qualidade aberta de que a 4ª requerida (L) goza;
d) à 3ª requerida I que se abstenha de violar o bloqueio que sobre as acções dos requerentes impendem, a não operar qualquer transferência de contas relativas às acções L detidas pelos mesmos, e que lhe hajam sido confiadas pela 1ª requerida A D e 2ª requerida P, e a não impedir a movimentação que os requerentes queiram fazer das mesmas acções;
e) Ordenar à requerida L que se abstenha de emitir quaisquer novos títulos representativos das acções dos requerentes;
f) Ordenar às 1ª requerida A D e à 2ª requerida P, que mantenham os bloqueios a que se encontram sujeitas os títulos e cautelas de acções L que lhe foram confiados pelos requerentes e que se abstenham de receber quaisquer importâncias destinadas à aquisição das mesmas;

Advertindo as requeridas de que incorrem no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória, de montante equivalente ao valor da providência, se infringirem alguma das proibições ora decretadas;

Inconformada, recorreu a CMV, sendo tal recurso admitido como de agravo, com subida imediata e em separado, por despacho de folhas 200.
E deduziram oposição as Requeridas A D, L e IA F.

Dizendo a A D não estar em condições de poder cumprir o ordenado na al. f) da decisão proferida, por caber à Central de Valores Mobiliários a efectivação de qualquer bloqueio de títulos e cautelas.

E sustentando a L e a IAF ser bem menor o n.º de acções de que os Requerentes são efectivamente titulares, e aquelas insusceptíveis de posse.
Para além de se não justificar que seja suficiente para conceder a tutela provisória destinada a paralisar a eventual prática de um acto em estrita consonância com os pressupostos de um determinado preceito legal que os requerentes se limitem a invocar a titularidade de um certo n.º de acções da sociedade visada e manifestem a sua discordância com a constitucionalidade dessa mesma disposição.
Questionando também a equiparação entre as situações previstas no art.º 393º do Código de Processo Civil e aqueles outros casos em que apenas se alega o receio de que, no futuro, venham a ser praticados actos que possam consubstanciar ofensa aos pretensos direitos de propriedade e posse.
E relativamente aos quais caberá providência cautelar não especificada, cujo decretamento não prescinde da probabilidade séria da existência do direito tutelando, que se não verificará, no caso dos autos.
Rejeitando a pretendida desconformidade dos referenciados preceitos do CVM com a Constituição da República Portuguesa.
E impugnando a verificação do risco de lesão iminente, bem como, em qualquer caso, a natureza grave e dificilmente reparável de uma tal lesão.
Sustentando, por outro lado, que a manutenção da providência, implicando inevitavelmente a extinção do direito de aquisição potestativa e a perda das vantagens económicas que lhe são inerentes, causaria às Requeridas significativos prejuízos.
E que nem a percentagem de acções de que “dispõe” a IAFII nos termos e para os efeitos do art.º 490º do C.S.C., é a que alegam os Requerentes.
Para além de o bloqueio de acções invocado por aqueles não impedir as formas de transmissão da titularidade daquelas que operam independentemente da vontade do anterior titular, como será o caso do mecanismo previsto nos art.ºs 194 e seguintes do CVM.
E, por não ter termo certo ou fixo, tal bloqueio seria sempre ilegal.
Também não sendo exacto que a pendência dos processos judiciais aludidos obstem à fixação do valor das acções da 4ª Requerida.
Sendo falso que as acções resultantes de aumento de capital sejam insusceptíveis de transmissão, por enquanto, mostrando-se já aquele efectivamente executado por escritura pública de 21-01-2000, e registado na C R Predial respectiva, sendo as acções emitidas em resultado desse aumento admitidas à negociação no mercado sem cotações.
Finalmente, também não invocam os Requerentes que a perda de qualidade de sociedade aberta por parte da L lhes possa acarretar algum prejuízo.

Rematam com a revogação da providência cautelar decretada.

Por despacho de folhas 356 a 364, considerando não se encontrarem preenchidos todos os requisitos exigidos por lei para que seja decretado um procedimento cautelar, determinou-se o levantamento dos procedimentos ordenados antes da oposição das requeridas IAF, e L.

Inconformados, recorreram os Requerentes, requerendo a atribuição de efeito suspensivo ao recurso,

Arguindo ainda, a folhas 408 a 411, a nulidade do dito despacho de folhas 356 a 364 e a sua ineficácia, e invocando a ocorrência de crime de desobediência qualificada e o imperativo levantamento do auto de notícia, requerendo ainda diversas “medidas adequadas à execução coerciva das medidas cautelares constantes do despacho do folhas 97 e 98”.

Sobre o que recaiu o despacho de folhas 412, referindo que “deverá ser dado cumprimento às medidas ordenadas a folhas 97 e 98, até ser prestada caução”.

Contra tal despacho interpondo recurso as Requeridas L e IAF, recebido por despacho de folhas 752.

Por despacho de folhas 469-470, fixou-se ao recurso da decisão de folhas 356 a 364 o efeito suspensivo, “pelo que não há que cumprir as medidas ordenadas a folhas 97 e 98 uma vez que esta decisão constitui um todo com a decisão de folhas 356-354…”.

A folhas 476-478, vieram os Requerentes arguir omissão de pronúncia relativamente às questões suscitadas no seu requerimento de folhas 408 a 411, requerendo o seu suprimento.
E, à cautela, interpuseram recurso do despacho de folhas 470, na parte em que nele se decidiu “não há que cumprir as medidas ordenadas a folhas 97 e 98”, que recebido foi por despacho de folhas 752.

Mais interpondo recurso, a folhas 485, também à cautela, do despacho de folhas 475, na medida em que se entenda que contém uma decisão dirigida aos respondentes de folhas 464-468
O qual recebido foi por despacho de folhas 598.

Do referido despacho de folhas 752, e enquanto nele se considerou não ocorrer inutilidade superveniente da lide, foi interposto, a folhas 768, recurso pelas Requeridas L e IAF, admitido por despacho de folhas 849.

Foi proferido, a folhas 826-834, o despacho previsto no art.º 744º, do Código de Processo Civil, sustentando duas das decisões impugnadas, e, quanto ao agravo interposto do despacho de folhas 412, reparando o mesmo, decidindo não terem as medidas inicialmente decretadas que ser cumpridas.

Por requerimento de folhas 843 insistiram os Requerentes no pedido de suprimento de nulidades anteriormente arguidas, requerendo ainda que o processo de agravo relativa à decisão proferida a folhas 412 suba, “tal como está”.

Pelo já referido despacho de folhas 849 e v.º foi também indeferida a arguição de nulidades e pedido de desentranhamento de folhas 547-558, deduzidos no requerimento de folhas 843.

Contra tal despacho interpondo os Requerentes recurso, recebido por despacho de folhas 884.
A folhas 907 vieram os Requerentes requerer a anulação do despacho de folhas 834 (2º), por haver sido proferido antes de notificados aqueles das alegações das Requeridas relativas ao recurso por elas interposto do despacho de folhas 412.

Vindo tal despacho a ser “reiterado”, por despacho de folhas 983 e v.º.

A que os Requerentes, em requerimento de folhas 989-990 – e sustentando a subsistência do despacho de folhas 834 (2º) – assacaram nulidade, por omissão de pronúncia.

Por despacho de folhas 996 foi anulado o despacho de folhas 834 (ponto 2) “e também a parte do despacho de folhas 983 que diz que reitera o despacho de folhas 834 (2º).”.
Mantendo-se “todo o despacho de folhas 983 na restante parte”.

Finalmente remetidos os autos a esta Relação, foi proferido Acórdão, a folhas 1013 a 1026, com o seguinte teor decisório:
“Nestes termos e pelos fundamentos expendidos, anula-se a decisão recorrida e todos os actos processuais a esta subsequentes, devendo o Sr. Juiz a quo elencar, com obediência aos ditames legais, a matéria fáctica e prolatar em conformidade nova decisão à adequada subsunção, de jure, dessa factualidade, com o que fica prejudicado o conhecimento dos demais agravos”.

Remetidos os autos à 1ª instância, nela foi proferida decisão, a folhas 1031 a 1032, que “considerando que não se encontram preenchidos todos os requisitos exigidos por lei para que seja decretado um procedimento cautelar”, determinou “o levantamento dos procedimentos cautelares ordenados antes da oposição das requeridas IAF e L.

Logo vindo os Requerentes, a folhas 1046-1050, arguir a nulidade de falta de notificação da baixa dos autos, e omissão de decisão sobre o regime de processamento do “incidente” de oposição.
Requerendo a anulação dos “termos subsequentes à omissão do despacho” sobre o regime de processamento do incidente, “incluindo o despacho de 3.5.2006, a folhas 1031-1038.”.

E, em subsequente requerimento, interpuseram recurso da decisão de folhas 1031-1038.

Por despacho de folhas 1068 e 1069 foi indeferida a arguição da sobredita nulidade e admitido o recurso antecedentemente interposto, como de agravo, com subida imediata, nos próprios autos e no efeito (meramente) devolutivo.

De tal despacho, quanto à parte relativa ao indeferimento do requerimento de folhas 1046-1050, interpondo os Requerentes recurso, que admitido foi por despacho de folhas 1120, com subida imediata, nos próprios autos e no efeito suspensivo.

Formulando os Recorrentes, nas alegações do agravo primeiramente interposto, as seguintes conclusões:
“1ª - O despacho de 23.6.2006, a fls 1069, é conscientemente contra direito ao fixar efeito devolutivo ao recurso interposto do despacho de 3.5.2006, a fls 1031-1038, porque viola a lei aplicável, contraria o despacho do mesmo decisor, de 11.7.2001, a fls 469v, e a própria disposição legal nele invocada, pelo que, impõe-se a revogação de tal decisão, e seja expedido ofício à 1ª instância para que seja lavrado o correspondente termo no processo principal.
2ª - O processamento do incidente de oposição nos próprios autos do procedimento é objecto de impugnação em recurso cuja apreciação antecede, logicamente, o presente – pedido que aqui se deixa exarado.
3ª - O impugnado despacho de 3.5.2006 é conscientemente contra direito, porque viola as normas dos art°s 156° n° 1, e 388°, n° 1, ah b), do CPC, por:
• não haver elencado os factos e os meios de prova indispensáveis à decisão proferida,
• haver reproduzido os factos relevantes já invocados no requerimento inicial, e no despacho de 16.10.2000 - não todos - e
• haver omitido factos de que o tribunal tem conhecimento por virtude das suas funções.
4ª - O impugnado despacho de 3.5.2006 viola as normas dos art°s 388°, n° 1, ah b), e 666°, n°s 1 e 3, do CPC, ao fazer "reapreciação" das razões de direito por que o despacho de 16.10.2000 decretou as providências requeridas, mas ignorando o fundamento do art° 395° do CPC, nele aplicado -- com o que se revela conscientemente contra direito.
5ª - O impugnado despacho de 3.5.2006 assume-se como decisão de tribunal superior de reapreciação do despacho de 16.10.2000, com fundamento nos mesmos factos; e, ao decretar o "levantamento dos procedimentos cautelares ordenados antes da oposição das requeridas IAF e L decretados contra os outros requeridos, viola as normas dos art°s 26°, n°s 1 e 3, 388°, n° 1, e 661, n° 1 do CPC.
6ª - O impugnado despacho de 3.5.2006 é acto proibido por lei violador das normas do art° 3°-A do CPC, e da tutela da posse decretada ao abrigo do art° 395° do CPC.
Pelo que, impõe-se:
a) a sua anulação por razões acrescidas às que serviram de fundamento ao acordão de 16.3.2006,
b) se declare, definitivamente, como improcedente a Oposição acolhida.”

Contra-alegaram as Recorridas, IAF, L. e A D, pugnando pela manutenção do julgado e, as 1as, do efeito atribuído ao recurso.
Sustentando aquelas que, caso se anule a decisão recorrida, por se entender que não foram aduzidos factos novos na oposição das agravadas nem foram produzidos novos meios de prova, então deverá a oposição deduzida pelas agravadas ser tida como alegação de recurso de agravo, devendo este ser “apreciado e decidido” por esta Relação, como, a título subsidiário requerem.
E dizendo a 2ª que caso se não confirme a decisão recorrida, “subsidiariamente, deveria ampliar-se os fundamentos para o indeferimento, nos termos do art.º 684-A do Código de Processo Civil…Na verdade, a providência requerida é ainda inadmissível quanto à Requerida A D por, alegadamente, visar o cumprimento de providência cautelar inadmissível por não depender da vontade da requerida, mas da Central de valores Mobiliários.”.

Nas alegações do recurso interposto do despacho de folhas 1068-1069, concluem os Requerentes:
“1º - O conhecimento do presente recurso emergente de arguição de nulidade processual deduzida por requerimento de 15.5.2006, tem de anteceder o conhecimento do recurso interposto por requerimento de 18.5.2006, por força do disposto nos art°s 156°, n° 1, 302°, 384º, n° 3, 660°, n° 2, e 668°, n° 1, al. d), do CPC, e da antecedência dos factos sindicados, ao despacho também recorrido, de fls 1031-1038.
2º - O despacho ora impugnado é nulo por
a) não haver conhecido da decisão final do acordão de 16.3.2006, em toda a sua extensão, nem ter retirado da parte omitida, todos os seus efeitos legais,
b) ter feito aplicação da norma do art° 229° do CPC, com sentido diametralmente oposto ao que nela se encontra consignado, e atento o disposto nos art°s 286°, 294° e 295° do CC, e 3°, n° 3, da C
c) ter conhecido dos efeitos previstos no art° 388°, n° 2, do CPC, para decidir questões relativas à natureza e à forma de tramitação do incidente de oposição posterior à notificação das medidas cautelares decretadas,
d) se haver pronunciado sobre citação inexistente, e omitido conhecimento sobre notificação verificada,
e) ser incongruente com as normas legais nele invocadas, e efectivamente aplicáveis, tudo conforme determinação das normas dos art°s 660°, n° 2, e 668°, n° 1, als c) e d), do CPC.
3ª - O despacho ora impugnado viola as normas dos art°s 302° e 384°, n° 3, do CPC, que têm de ser interpretadas em consonância com o pensamento legislativo a que se refere o preâmbulo do Dec. Lei n° 329-A/95, de 10.12.
4ª - O dito despacho viola a norma do art° 686°, n° 1, do CPC, interpretado em conformidade com o disposto nos art°s 9°, n° 1, 10° e 11° do CC, e atenta a maior densidade das infracções previstas no art° 201° do CPC, relativamente aos vícios a que se referem os art°s 667° e 669°, n° 1, do mesmo código.

Pelo que, impõe-se:
a) Seja declarado nulo e revogado o despacho de 23.6.2006, a fls. 1068/9,
b) Sejam anulados todos os actos subsequentes à nulidade de conhecimento oficioso, arguida por requerimento de 15.5.2006, a fls 1046-1050,
c) Seja ordenada a autuação em separado do incidente de oposição deduzido pelas requeridas L / lAF, com aproveitamento dos respectivos articulados e requerimentos.”

Também aqui contra-alegando as recorridas IAF e L, sustentando dever confirmar-se, na íntegra, o despacho recorrido.

Por requerimento de folhas 1138 a 1142, vieram os Recorrentes pronunciar-se sobre as “questões novas” suscitada nas contra-alegações das Recorridas Le Indasa, a que se referem as suas conclusões 12ª e 13ª, e sobre as “Falsas contra alegações da Requerida A D.
Pedindo a condenação das primeiras como litigantes de má-fé, em multa e indemnização aos Recorrentes “atentas as despesas” a que a oposição por aquelas deduzida “deu e dará lugar, e os prejuízos sofridos com a desobediência às medidas cautelares contra elas decretadas em 16.10.2000”.
E a condenação, pelo mesmo título, da Requerida A D, em multa e indemnização a favor do Recorrente A F L S, reportando tal indemnização “a cada mês ou fracção de actividade processual” a que aquele “se encontra obrigado por força do incumprimento das ditas injunções judiciais, por parte daquela”.

Àquele respondendo a IAF e a L, por requerimento de folhas 1164 a 1167.

Por despacho de folhas 1174 foram mantidas as decisões recorridas, rejeitando-se a ocorrência das nulidades assacadas aos mesmos.

Nesta Relação foi proferido pelo relator despacho, a folhas 1189 a 1191, indeferindo a requerida alteração do efeito atribuído ao 1º agravo.

Requerendo os recorrentes a reforma de tal despacho, considerando que existe um lapso manifesto na percepção dos elementos constantes do processo, pois que por força da lei, art.ºs 738º, n.º 1 al. a) e 740º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, “sempre o efeito da sua impugnação recursória seria suspensivo”.
E, subsidiariamente, reclamando para a conferência.
Responderam as Recorridas IAF e L, propugnando o indeferimento da reclamação.

Por despacho de folhas foi indeferida a requerida reforma.

II- Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
Como questões prévias, porém, importará definir:
A- o efeito do 1º agravo.
B- a precedência dos agravos entre si.

E assim:
A-1. Quanto ao efeito do 1º agravo, insurgem-se os Recorrentes contra o decidido pelo relator do processo, no sentido da manutenção do atribuído efeito meramente devolutivo.
Considerando, na sua reclamação para a conferência, e para lá da invocação do disposto nos art.ºs 738º, n.º 1 al. a) e 740º, n.°s 1 e 2, do Código de Processo Civil, que o recurso interposto da decisão de 3.5.2006, a folhas 1038, na parte em que exorbita o âmbito da legitimidade da L e da IAF, proferida em incidente de oposição em que os outros requeridos não são parte, tem por objecto decisão juridicamente inexistente ou nula, e, “de acordo com a lei vigente”, “efeito manifestamente suspensivo”.
Também, enfermando o despacho reclamado de nulidade, por haver deixado de pronunciar-se sobre o outro requerimento constante das ditas alegações, a saber, “pedido de prévio conhecimento do recurso interposto a fls 1076, e admitido a fls 1120…e de fixação de regime de processamento em separado do incidente de oposição, com o consequente efeito suspensivo do respectivo recurso”.
Finalmente, o mesmo despacho consubstancia ainda ofensa a caso julgado, formado “pelas decisões proferidas em 16.10.2000, a fls 97-98”.
E, assim, por isso que “A decisão de 3 de Maio de 2006 que contra elas atentou, ofende caso julgado. O recurso interposto de decisão que ofende caso julgado tem, obviamente, efeito suspensivo. Ao negar a declaração de tal efeito, o despacho reclamado, ofende, ipso facto, caso julgado”.
Acrescendo que, “nestes autos, já esse Venerando tribunal decidiu, sobre despacho da mesma natureza, e igualmente exorbitante, que o recurso dele interposto tem efeito suspensivo”.

2. A inaplicabilidade do disposto nos art.ºs 738º, n.º 1 al. a) e 740º, n.°s 1 e 2, do Código de Processo Civil, resulta de quanto se considerou já no sobredito despacho do relator, de folhas 1189 a 1191.
Sendo assim – e quanto ao recurso interposto da decisão determinativa do levantamento do procedimento cautelar, na sequência da audição do requerido – que Abrantes Geraldes, considerando que “no normativo do art.º 738º o segmento que mais se aproxima da realidade constante do art.º 388º, n.º 2, é o que regula os recursos de decisões determinativas do levantamento de medidas cautelares”, e “não tendo a matéria sido especificamente regulada na recente revisão da lei adjectiva”, conclui que “será aí que se deve enquadrar o regime do recurso…Por isso, um tal recurso deva subir em separado e, em regra, com efeito meramente devolutivo”.(1)
Tendo para nós, porém, e com Amâncio Ferreira, (2) que o normativo do art.º 738º, n.º 2, do Código de Processo Civil, se reporta apenas às si......tuações contempladas no art.º 389º, do mesmo Código, a saber, os casos em que a medida cautelar caduca ou é julgado extinto o procedimento cautelar, e que, na letra da lei, implicam o levantamento da providência.
Enquanto o art.º 388º, n.º 2, do Código de Processo Civil, se reporta à decisão de “revogação da providência”…
…Que, recorda-se, “constitui complemento e parte integrante da inicialmente proferida”.
O que nos conduz à incontornável conclusão de que, em caso de revogação da decisão inicial, será de aplicar ao recurso o regime estabelecido no art.º 738º, n.º 1, al. a), do Código de Processo Civil.
E por isso que a decisão de revogação resulta assim absolutamente equiparada ao despacho que não ordene a providência.

Sendo pois a subida do recurso respectivo, imediata e nos próprios autos.

Mas no efeito meramente devolutivo, que não suspensivo, como em apressada leitura inculcaria o disposto no art.º 740º, n.º 1, do Código de Processo Civil.
Pois como referem Lebre de Freitas. A. Montalvão Machado. Rui Pinto,83(3) “este recurso, sendo de agravo, sobe nos termos do art.º 738-1, ou seja:
a) sendo a decisão de manutenção, sobe imediatamente, em separado e com efeito meramente devolutivo (art.ºs 738-1-b e 740-1, a contrario), salvo, quanto a este último aspecto, se se verificar algum dos casos do art.º 740-2…;
b) sendo a decisão de revogação, sobe imediatamente nos autos de procedimento cautelar, sendo que teria efeito suspensivo (art.º 740) se houvesse algo a suspender, o que não acontece, visto que as duas decisões são tratadas pela lei como uma só, e nesta, negando a providência, nada há para executar;
c) …”.

3. Também não colhendo a alegada exorbitância, no despacho reclamado, “do âmbito da legitimidade da L e da IAF, proferida em incidente de oposição em que os outros requeridos não são parte.”.
Desde logo, não acompanhamos Abrantes Geraldes quando aquele se refere à oposição subsequente ao decretamento da providência, como “incidente”,(4) para, e em consonância, com a natureza que assim pretende atribuir àquela, defender “a admissibilidade de um articulado de resposta”.(5)
Posição que já não sustenta, porém, relativamente ao “articulado de oposição”, apresentado antes do decretamento da providência.
Admitindo apenas que “se for deduzida matéria de excepção, o princípio do contraditório amplamente apoiado no art.º 3º, n.º 4, permite que, no início da diligência (audiência final), seja dada resposta por parte do requerente”.(6)
Assim estabelecendo uma diversidade de soluções para que se não lobriga justificação bastante.

Preferindo-se a posição aparentemente adoptada por Lopes do Rego(7) quando, em comentário ao art.º 388º, do Código de Processo Civil, refere que «…a tramitação da oposição “superveniente”, prevista neste preceito, obedece estritamente ao estatuído acerca do formalismo da oposição que teria sido pertinente deduzir no momento próprio, se tivesse ocorrido prévia audição do requerido”.
E que é também a de José Lebre de Freitas. A. Montalvão Machado. Rui Pinto, (8) expressa na anotação ao mesmo art.º : “se pretender alegar novos factos ou produzir novos meios de prova, o requerido deduzirá oposição (em que, acessoriamente, poderá invocar fundamento que, a não haver oposição, constituiria fundamento de agravo), nos termos dos art.ºs 303 n.ºs 1 e 2, e 304, n.ºs 1, 2ª parte, e 4, ex vi art.º 384-3…aplicando-se ao seu processamento os art.ºs 386, n.ºs 1 a 3, 387 e, subsidiariamente, 304, n.ºs 1, 1ª parte, 2, 3, e 5, ex vi art.º 384-3, de onde resulta, além do mais, que não há articulado de resposta” (o negrito é nosso).

Mas, isto posto, temos que – e tanto quanto é possível falar de “partes” em procedimento cautelar – o são todos os Requerentes daquele, como todos os Requeridos no mesmo, independentemente de haverem ou não deduzido oposição “superveniente”.

Ora, a circunstância de a oposição “superveniente” apenas haver sido apresentada por alguns dos requeridos, não pode ter efeitos diversos, relativamente aos não “oponentes”, dos que teria se a dita oposição, tendo tido lugar a “prévia” audição dos requeridos, houvesse sido deduzida antes do decretamento da providência.
Sob pena, uma vez mais, de se adoptar soluções diversas para situações afins, com desequilíbrio da posição das partes.
É que a circunstância de alguns dos requeridos, citados para o procedimento, antes da audiência final, não deduzirem oposição, traz à colação o disposto no art.º 485º, al. a), do Código de Processo Civil.
Aproveitando-lhes a impugnação de factos que os requeridos “oponentes” hajam deduzido.
E isto, assim, independentemente de os Requeridos o serem em litisconsórcio necessário ou voluntário (cfr. n.º 4 do requerimento de reclamação para a conferência).
Deste modo, a decisão recorrida – proferida nos quadros do art.º 388º, n.º 2, do Código de Processo Civil – considerando não se encontrarem preenchidos “todos os requisitos exigidos por lei para que seja decretado um procedimento cautelar” e ordenando o levantamento das providências cautelares anteriormente decretadas, não podia deixar de se estender a todos os Requeridos.
De resto, embora a literalidade legal refira, indistintamente, que a nova decisão constitui complemento e parte integrante da inicialmente proferida, ponto é que, em caso de revogação (total) daquela, como assim é o caso, melhor caberá dizer que a nova decisão “se lhe substitui”.(9)
Não se vislumbrando como conjugar a subsistência da 1ª quanto a alguns dos Requeridos, com a vigência daquela outra (apenas) quanto aos que apresentaram oposição.

Não procedendo pois a invocação da inexistência jurídica ou a nulidade da decisão recorrida, de 3.5.2006, a folhas 1038, por alegada exorbitância do âmbito da legitimidade da L e da IAF.
Nem se antolhando, em qualquer caso, porque razão deveria o recurso interposto com um tal fundamento ter efeito “manifestamente suspensivo”.

4. Por igual não se concedendo que o despacho reclamado consubstancie ainda ofensa a caso julgado, e designadamente nos termos desenhados pelos Recorrentes.
Começa porque como resulta de quanto se expendeu já, “as decisões proferidas em 16.10.2000, a fls 97-98”, não formaram caso julgado.
O que logo prejudica a conclusão de que “A decisão de 3 de Maio de 2006 que contra elas atentou, ofende caso julgado.”.
Para além de nada na lei permitir formular a suposta regra de que o recurso interposto de decisão que ofende caso julgado “tem, obviamente, efeito suspensivo”.
Não se percebendo como a negação de efeito suspensivo a um recurso interposto de decisão que ofende caso julgado, “ofende, ipso facto, caso julgado”…
Finalmente, a circunstância de relativamente ao recurso interposto da decisão de 19-03-2001, ter sido mantido, nesta Relação, o efeito suspensivo que foi atribuído, na 1ª instância, nada implica, em matéria de efeito, relativamente ao recurso interposto da ulterior decisão de 2003-05-06.

5. E quanto à invocada nulidade do despacho reclamado, por, está implícito, “omissão de pronúncia”.
Equacionam os Requerentes aquela, relativamente ao “pedido de prévio conhecimento do recurso interposto a fls 1076, e admitido a fls 1120…e de fixação de regime de processamento em separado do incidente de oposição, com o consequente efeito suspensivo do respectivo recurso”.

Quanto ao primeiro ponto, logo cabe referir que a decisão quanto à pretendida precedência do conhecimento do objecto de um dos agravos relativamente ao outro, sempre teria de ser tomada em sede de julgamento daqueles.
E que, assim, não tendo sido caso de decisão liminar do objecto do recurso, pelo relator, nos termos do art.º 705º do Código de Processo Civil, não cabia ao mesmo tomar posição a propósito.
Nada tendo, de resto, tal questão a ver com a da fixação do efeito ao recurso.

Pelo que concerne ao regime de processamento do incidente de oposição, que os Recorrentes pretendem ser em separado – aliás renovando questão já definitivamente resolvida no Acórdão desta Relação, de 2006-03-16, a folhas 1013-1026, maxime a folhas 1022-1023 – trata-se de matéria cujo conhecimento transcende claramente, e na mesma circunstância antecedentemente assinalada, as atribuições do relator definidas no art.º 700º, n.º 1, do Código de Processo Civil.
Interessando ao próprio objecto do recurso de agravo interposto do despacho de 2006-06-23, a folhas 1068-1069.
*
Tendo-se, pelo exposto, que não enfermando o despacho do relator destes autos de nulidade, é de confirmar o mesmo, mantendo-se pois o efeito meramente devolutivo atribuído ao recurso, de agravo, interposto da decisão de 2006-05-03, a folhas 1031-1038.
*
B- Quanto à pretendida precedência do conhecimento do objecto do agravo interposto do despacho de 2006-06-23, relativamente ao do agravo interposto da decisão de 2006-05-03.
Consideram os Recorrentes que “uma das razões de arguição de nulidade processual, indeferida pelo despacho recorrido, é a omissão de decisão sobre o regime de processamento do incidente de oposição às medidas cautelares decretadas em 16.10.2000, a folhas 87-98.”.
E que “é a arguição de nulidade que determina a ordem por que hão-de ser conhecidos os recursos interpostos – como se requer”.

Não tem porém razão.

É que por força de lei expressa, que os Recorrentes ignoram, “Os agravos que tenham subido conjuntamente”, como assim foi o caso, “são apreciados pela ordem da interposição…”, cfr. art.º 752º, n.º 2, do Código de Processo Civil.
Ora o agravo do despacho de 2006-06-23, a folhas 1068-1069, que os Recorrentes pretendem ver julgado em 1º lugar foi interposto depois do agravo da anterior decisão de 2006-05-03, a folhas 1031-1038.
E nem a omissão de pronúncia assim assacada…respeita à decisão da oposição…que sim a despacho ulterior àquela.
*
Sendo assim de conhecer dos agravos pela ordem da sua interposição.
*
Isto posto:
II-1- Face às conclusões de recurso, que como é sabido, e no seu reporte à fundamentação da decisão recorrida, definem o objecto daquela – vd. art.ºs 684º, n.º 3, 690º, n.º 3, 660º, n.º 2 e 713º, n.º 2, do Cód. Proc. Civil – são, pela ordem da sua precedência lógica, questões propostas à resolução deste Tribunal:
No 1º agravo:
- Se a decisão de 2006-05-03, omitiu a elencação dos factos e meios de prova indispensáveis à decisão.
- se essa decisão omitiu factos de que o tribunal tem conhecimento por virtude das suas funções.
- se a referida decisão, operando “reapreciação” das razões de direito do despacho de 2000-10-16, e ignorando o fundamento do art.º 395º do Código de Processo Civil, é violador das normas dos art.ºs 388º, n.º 1, al. b), e 666º, n.ºs 1 e 3, do mesmo Código.
- se a mesma decisão, ao decretar o “levantamento dos procedimentos cautelares…” decretados contra os outros requeridos além da IAF e L, viola as normas dos art.ºs 26º, n.º 1 e 3, 388º, n.º 1 e 666º, n.º 1, do Código de Processo Civil.
- se tal despacho é violador do art.º 3º-A do Código de Processo Civil, e da tutela da posse “decretada ao abrigo do art.º 395º do Código de Processo Civil”.

No 2º agravo:
- se o despacho impugnado não teve presente, em toda a sua extensão, o decidido no Acórdão de 2006-03-16.
- se foi cometida nulidade, consistente na omissão da notificação aos Recorrentes da baixa dos autos à primeira instância, na sequência do dito Acórdão.
- se o eventual conhecimento, no despacho impugnado “dos efeitos previstos no art.º 388º, n.º 2, do CPC, para decidir questões relativas à natureza e à forma de tramitação do incidente de oposição posterior à notificação das medidas cautelares decretadas”, importa nulidade processual.
- se ocorreu “pronúncia”, no mesmo despacho, sobre citação inexistente, e omissão de conhecimento sobre notificação verificada, importando nulidade processual
- se é incongruente com as normas legais nele invocadas, e efectivamente aplicáveis, tudo conforme determinação das normas dos art°s 660°, n° 2, e 668°, n° 1, als c) e d), do CPC.
- se o referido despacho viola as normas dos art°s 302° e 384°, n° 3, do Código de Processo Civil.
- se o mesmo despacho viola a norma do art° 686°, n° 1, do Código de Processo Civil.
*
Vejamos:
II-2- Quanto ao 1º agravo.
1.Da pretendida omissão, na decisão de 2006-05-03, da elencação dos factos e meios de prova indispensáveis à decisão.

Recorde-se que, no Acórdão de folhas 1013 a 1026 se considerou que “Não se achando discriminada a factualidade tida por assente, no segmento apontado, não pode este tribunal exercer esse poder censório”.
E, “Nestes termos e pelos fundamentos expendidos, anula-se a decisão recorrida e todos os actos processuais a esta subsequentes, devendo o Sr. Juiz a quo elencar, com observância dos ditames legais, a matéria fáctica e prolatar em conformidade nova decisão à adequada subsunção, de jure, dessa factualidade, com o que fica prejudicado o conhecimento dos demais agravos”.

Ora, na nova decisão, assim recorrida, consignou-se:
“Da prova produzida nos autos, consideram-se indiciariamente provados os seguintes factos:
1- De acordo com o certificado de fls.21 e 22 emitido em 09 de Outubro de 2000 por P, a Requerente T tem depositados naquela 1400 acções tituladas ao portador, do valor nominal de mil escudos cada, emitidas pela Requerida Le 3.098 cautelas representativas de acções ao portador, da mesma Requerida, ficando as mesmas bloqueadas durante o prazo de vigência do certificado. Do certificado consta que é válido até que se encontre definitivamente julgada a acção judicial, a cuja instrução se destina o certificado.
2- De acordo com o certificado de fls. 24, emitido por A D, em 08.10.99, o Eng. A S tem depositadas em seu nome naquela 4.986 acções a portador do valor nominal de mil escudos cada emitidas pela L, ficando as mesmas bloqueadas durante o prazo de vigência do certificado. Do certificado consta que é válido até que se encontre definitivamente julgada a acção judicial, a cuja instrução, o certificado se destina.
3- Conforme certificado de fls. 25, emitido por A D, em 08.09.2000, o Eng. A S em carta existente naquela tinha registadas 1.967 acções tituladas ao portador, emitidas pela L, que ficam bloqueadas até ao termo de validade do referido certificado. Do certificado consta que é válido até ao julgamento definitivo da acção judicial a instaurar e que a A D comunicou à C V M à guarda da qual se encontram fisicamente os títulos o registo de bloqueio e a sua validade.
4- Conforme certificado de fls. 26, emitido pela P, em 09.102000, o Requerente Dr. N C, é titular de 4.990 acções ao portador, tituladas e fungíveis, com o valor nominal unitário de 1.000$00 (mil escudos) depositadas naquela, ficando as mesmas bloqueadas durante o prazo de vigência do presente certificado. Do certificado consta que é válido até que se encontre definitivamente julgada a acção judicial, a cuja instrução do processo o certificado se destina.
5- O Requerente Dr. N C tem depositadas em seu nome na Requerida P 4.990 acções ao portador, com o valor nominal unitário de 1.000$00 (mil escudos) que de acordo com o certificado emitido em 09.10.2000 estão bloqueadas "até que se encontre definitivamente julgada a acção judicial, a cuja instrução do processo presente se destina."
6- A Requerida IAF fez publicar no suplemento ao Boletim da Bolsa de Valores de Lisboa, de 6 de Outubro de 2000, o anúncio de uma Oferta Pública de Aquisição Geral sobre acções representativas do capital social da L (sociedade aberta), ao preço de 8,73€ por acção.
7- Consta do mesmo anúncio que a oferente diz ter directamente 241.729 acções, representativas de 80,383% do capital social da L, e que, os seus direitos de voto na mesma atingem aproximadamente 88,696%, correspondendo às acções anteriormente referidas e a 25.000 outras detidas pelo Dr. F J L, administrador da L;
8- O prazo de oferta é de duas semanas e termina às quinze horas de 24 de Outubro de 2000.
9- Segundo tal anúncio, "Caso venha a ultrapassar 90% dos direitos de voto correspondentes ao capital social da Sociedade Visada, por efeito da Oferta, o Oferentes admite recorrer, no prazo máximo de seis meses após o apuramento do resultado da oferta, ao mecanismo de aquisição potestativa previsto no art. 194° do Código de Valores Mobiliários".
10- O Dr. F J L P havia adquirido 182.250 acções da L e foi cooptado para o cargo de administrador da mesma em 26.04.99;
11- A IAF adquiriu os direitos de voto representativos de 47,59%, correspondentes a 449.797 acções detidas por accionistas da L e adquiriu os direitos de voto 25,71% correspondentes a 243.022 acções detidas pela Eng. C A A B F S da L
12- Anteriormente, a IAF lançou outra OPA sobre as acções L, cuja cessão de apuramento se efectuou a 30.07.99, e através da qual adquiriu 259.032 acções ao preço de 200$00 cada uma;
13- Em 25.10.2000 a A D tinha registadas nos seus livros 1.697 acções da L, em nome do Eng., A F S.
14- Por inscrição n°32 relativa à L, matriculada sob o n° ... na Conservatória do Registo Predial de Aveiro foi reduzido o capital da sociedade seguido de aumento, passando o capital a ser de 300.723.000$00., divido em 300.723 acções. Pelo averbamento n°1 à referida inscrição consta que se encontra pendente de rectificação quanto à qualificação.
Fundamentação: A matéria considerada indiciariamente provada resulta do confronto dos documentos juntos aos autos a fls. 21 a 26, 27, 28, 29, 30, 31, 32 a 34, 35, 36, 129, 130, 211,227 a 238.”.

Assim, e desde logo, uma coisa é certa: não foi omitida a elencação dos factos relevantes considerados assentes.
Como também não a dos fundamentos da correspondente decisão quanto à matéria de facto.
Assinalando-se, quanto a este último ponto, que quando porventura hajam pretendido os Recorrentes reportar-se a insuficiente fundamentação da decisão quanto à matéria de facto, apenas prevê a lei que a Relação, “a requerimento da parte”, determine que o tribunal de 1ª instância proceda à fundamentação conforme, vd. art.º 712º, n.º 5, do Código de Processo Civil.
Sendo que não foi apresentado um tal requerimento.

1.1. E nem se diga que a reprodução de factos relevantes “já invocados no requerimento inicial, e no despacho de 16.10.2000”, é “contra direito”.
Nada posterga a inclusão, no elenco fáctico considerado provado, na sequência de oposição posterior ao decretamento de providência cautelar, de factos já anteriormente como tal considerados na decisão proferida sem contraditório, e que, depois de observado este, sejam de manter.
Do mesmo modo que, sendo fundamento da oposição “superveniente” a alegação de factos ou a produção de meios de prova não tidos em conta pelo tribunal, também é possível/”normal, que, na sequência daquela, o elenco fáctico inicial se apresente alterado.
Cabendo observar que efectivamente as agravadas, com a sua oposição, juntaram diversos documentos, de que alguns foram valorados na decisão quanto à matéria de facto, vd. folhas 129, 130.
Como também assim relativamente aos próprios Recorrentes, com requerimentos de 29-11-2000, e de 20-12-2000 – vd. vol. 2º, folhas 211 e 227 a 238.
Sendo uma tal alteração – e independentemente da substancialidade da mesma, a analisar infra – constatável, na medida em que se verifica insubsistir provado o facto constante da al. K) da inicial decisão, tendo sido aditado o facto consignado no ponto n.º 14 da decisão recorrida.

2. Da alegada omissão de factos de que o tribunal tem conhecimento, por virtude das suas funções.

Querendo impugnar a decisão da 1a instância quanto à matéria de facto não observaram os Recorrentes, nas suas conclusões – que, como refere Alberto dos Reis,(10) se traduzem "pela enunciação abreviada dos fundamentos do recurso" – o ónus de especificação dos concretos pontos da matéria de facto que consideram incorrectamente julgados, estabelecido no art.º 690°-A, n.º 1, al. a), do Cód. Proc. Civil.
Sendo que o correspondente ónus, como se considerou no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 08-03-2006,(11) se actua concretizando "um a um quais os pontos de factos que considera mal julgados, seja por terem sido dados como provados, seja por não terem sido considerados como tal.".
Ou, como também refere Lopes do Rego,(12) II- O ónus imposto ao recorrente que impugna a decisão proferida sobre a matéria de facto traduz-se, deste modo: a) na necessidade de circunscrever ou delimitar o âmbito do recurso, indicando claramente qual a parcela ou segmento – o "ponto" ou "pontos" da matéria de facto – da decisão proferida que considera viciada por erro de julgamento;".
Pois como se consignou no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 39/95, de 15/2, "A garantia do duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto nunca poderá envolver, pela própria natureza das coisas, a reapreciação sistemática e global de toda a prova produzida em audiência - visando apenas a detecção e correcção de pontuais, concretos e seguramente excepcionais erro de julgamento, incidindo sobre pontos determinados da matéria de facto, que o recorrente sempre terá o ónus de apontar claramente... na sua minuta de recurso.".

Como, assim, também naquela sede não procederam os Recorrentes à especificação – prevista no mesmo n.º 1, al. b) – dos concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que imponham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da recorrida.

Sendo porém que no corpo das suas alegações já é feita indicação de documentos que provariam factos não carentes “de alegação nem prova nos procedimentos cautelares apensos, por força do disposto no art.º 514º, n.º 2, do C.P.C.”
“Na verdade, sendo o objecto do recurso delimitado pelas respectivas conclusões e sendo o erro de julgamento da matéria de facto um dos fundamentos invocados no recurso…compreende-se que os concretos pontos de facto sobre que recaiu o alegado erro de julgamento tenham de ser devidamente especificados nas conclusões do recurso.".(13)
Tal exigência deixa de ter razão de ser no que diz respeito à indicação dos meios de prova, uma vez que estes mais não são do que os argumentos invocados pelo recorrente para que a questão da impugnação da matéria de facto seja resolvida no sentido por ele pretendido.

Sem prejuízo do que se deixa exposto, e que logo conduziria à rejeição da de uma tal impugnação da decisão da 1ª instância quanto à matéria de facto, mas porque a questão é colocada em sede de factos de conhecimento do tribunal por virtude do exercício das suas funções, sempre se dirá:
Pretendendo os Recorrentes colocar sob crítica a omissão de factos alegadamente resultantes de documentos juntos “na acção principal”, caber-lhes-ia ter, oportunamente, requerido a instrução do agravo com aqueles.
O que não fizeram.
Quanto ao documento junto “a fls 240-248”, no 2º volume dos presentes autos, corresponde o mesmo a texto conforme a uma petição inicial, subscrita pelo Dr. N C, enquanto advogado em causa própria.
Ponto sendo, no entanto, que se não mostra aposto no rosto de tal p. i. qualquer carimbo de entrada no tribunal a que se mostra endereçada, ou em qualquer outro.
Ou seja, trata-se de mera fotocópia de um texto articulado, configurado como petição inicial, mas sem qualquer indício da efectiva propositura da acção correspondente.

Não sendo pois sindicável, perante a documentação concretamente trazida aos presentes autos, a alegada “omissão de factos” de que o tribunal teria conhecimento por virtude das suas funções.

3. Da violação, pela decisão recorrida, das normas dos art.ºs 388º, n.º 1, al. b), e 666º, n.ºs 1 e 3, do Código de Processo Civil.

Concluem os Recorrentes tal violação, da alegada circunstância de se proceder, na dita decisão à “reapreciação” das razões de direito do despacho de 2000-10-16, e ignorando o fundamento do art.º 395º do Código de Processo Civil”, com o que faria a mesma decisão censura ao despacho de 2000-10-16, incumprindo o ordenado pelo Acórdão de 2006-03-16.
Ora, acrescentam, ao assim fazer “o impugnado despacho” assume-se como decisão de tribunal superior ao “levantar” as providências cautelares decretadas por despacho de 16-10-2000, uma vez que não elenca nenhum facto ou meio de prova que não tenha sido tido em conta pelo juiz da 16ª Vara, 3ª Secção.

E, desde já se dirá, têm razão.

Na verdade, as pontualíssimas alterações do elenco fáctico considerado na decisão de 2000-10-16, pela decisão ora recorrida, nada tiram ou põem relativamente ao núcleo do sustentáculo fáctico da decisão inicial do procedimento cautelar.
Como resulta da correspondência, quase total, constatável entre aqueles, de que também se dá nota nas alegações dos Recorrentes:
E assim:
1. A matéria do n.º 1, da decisão recorrida corresponde à da al. a) da decisão inicial;
2. A do n.º 2 corresponde à da al. b);
3. A dos n.ºs 4 e 5 corresponde à da al. c);
4. A do n.º 6 corresponde à da al. d);
5. A do n.º 7 corresponde à da al. e);
6. A do n.º 8 corresponde à da al. f);
7. A do n.º 9 corresponde à da al. g);
8. A do n.º 10 corresponde à da al. h);
9. A do n.º 11 corresponde à da al. i);
10. A do n.º 12 corresponde à da al. j);

A matéria do n.º 3 da decisão recorrida traduz um “aproveitamento” do teor do documento de folhas 25, junto pelos Recorrentes para prova do alegado no art.º 6º do seu requerimento inicial, que na decisão inicial havia pura e simplesmente sido dado como não provado.
A matéria do n.º 13 é efectivamente posterior à decisão inicial, e, em qualquer caso, não prejudica a tese dos Recorrentes.
E a supressão do facto anteriormente referido sob a al. k), não sendo valorada na decisão recorrida, também não tem como reverso a ponderação de tal facto, na sua anterior formulação positiva, na decisão inicial.
Por outro lado, a consideração, na decisão recorrida, do facto “novo” n.º 14 (facto que está na sequência do já alegado pelos Requerentes no seu requerimento inicial) quando nela se refere que, “Quanto ao n.º de acções que os requerentes detêm da sociedade L, face à prova indiciariamente feita nos autos, não é possível apurar concretamente o seu montante dado que não se mostra que tenha transitado em julgado a decisão que permitiu a redução e aumento de capital da L.”, não implicando, por qualquer forma, o infirmar dos pressupostos fácticos essenciais da decisão inicial, também não afasta os fundamentos de direito daquela.
Reportando-se, basicamente, a uma eventualidade, que não dá por verificada.
E repare-se que na decisão de 2000-10-16, se considerou já que os Requerentes “são detentores cada um de uma participação ultraminoritária no capital da L;”.
Mas que “Sem embargo dos requerentes, legitimamente, poderem dispor dos seus direitos sociais, é manifesto que desse exercício não resulta qualquer intervenção relevante ao nível da gestão corrente da sociedade.
Logo, a demora na definição do direito não é susceptível de lhes causar maiores danos que aqueles que ocorreriam em circunstâncias normais…”.
E “A razão que leva a decretar a providência requerida…radica noutro pressuposto.
A lei processual civil concede ao possuidor que foi esbulhado violentamente o direito de ser restituído à sua posse (art.º 393º do C.P.C.)…E por violência entende-se…”.
Neste aspecto a lei abstrai de discutir os fundamentos do direito do titular; basta-lhe que ocorra essa situação de desapossamento. Mas esta defesa da posse abrange não só o desapossamento como também as perturbações no exercício do direito, conforme resulta do art.º 395º do C.P.C., que prevê precisamente o recurso à providência cautelar não especificada como forma de defesa contra o mero esbulho ou perturbação.
Ora, mais do que a impossibilidade do exercício de direitos sociais…é o desapossamento forçado, nos termos do art.º 490º, n.º 2, do CSC, que justifica a providência”.

Assim, a eventualidade de, em consequência da redução e subsequente aumento de capital, ter sofrido alteração o número de acções que os requerentes detêm da sociedade L – não estando, como não está, em causa, que tenham deixado, pura e simplesmente, de deter qualquer acção – deixa intocado o cerne da fundamentação da decisão inicial.
Que se identifica com a tutela possessória estabelecida no art.º 393º do Código de Processo Civil, a que também reporta o citado art.º 395, do mesmo Código.

Ora, isto visto, não podia a decisão recorrida decidir como decidiu, enveredando por um enquadramento jurídico-normativo distinto do operado na decisão inicial, para concluir pela falência dos “requisitos exigidos por lei para que seja decretado um procedimento cautelar”, ordenando o levantamento dos “procedimentos” anteriormente decretados.

Repare-se que a alteração da decisão da 1ª instância quanto à matéria de direito, mantendo-se o quadro fáctico inicialmente considerado assente, apenas pode ter lugar em via de recurso de agravo, que não de oposição.
Como decorre da circunstância de a mera impugnação da aplicação do direito aos factos dados como provados apenas poder ter lugar em via de recurso, de agravo, cfr. art.º 388º, n1, alíneas a) e b), do Código de Processo Civil, e José Lebre de Freitas. A. Montalvão Machado. Rui Pinto.(14)
E sob pena, a consentir-se tal reapreciação de direito, em julgamento de oposição superveniente, sem alteração do quadro fáctico essencial, de se permitir a subversão do regime estabelecido no sobredito normativo.
Como também refere Abrantes Geraldes,(15) não se trata, com a oposição, de “facultar ao mesmo tribunal a reapreciação da decisão, a partir dos mesmos elementos, mas de conferir a possibilidade de revisão da convicção anteriormente formada, através de novos meios de prova ou de novos factos com que o tribunal não pôde contar.”.

Verificando-se pois a invocada violação, pela sentença recorrida, do disposto nos art.ºs 388º, n.º 1, do Código de Processo Civil.
*
Mas, isto visto, assim procedendo, nesta parte, as conclusões de recurso, impõe-se – com prejuízo do conhecimento da matéria das demais conclusões – a revogação da decisão recorrida, datada de 2003-06-05, que ordenou o levantamento das providências anteriormente decretadas, pela decisão de 2000-10-16.
*
Isto alcançado, impõe-se então considerar o requerimento, apresentado, a título subsidiário, pelas agravadas IAFII e L, nas suas contra-alegações, no sentido de a oposição por elas deduzida “ser tida como alegação de recurso de agravo”, assim se corrigindo o configurável erro na forma de processo, devendo aquele “ser apreciado e decidido por esse Venerando Tribunal”.
Para logo se dizer do improcedente do mesmo.

Sendo o próprio art.º 388º, n.º 1, do Código de Processo Civil, que, ao estabelecer a alternativa de meios ao dispor do requerido para se opor à providência decretada sem contraditório, exclui a consideração da indevida opção por uma delas como caso de erro na forma de processo.
O que ocorre é o naufrágio da oposição à providência decretada – porque assim optaram os Recorridos – na circunstância da ausência de contra prova da factualidade considerada na decisão inicial, e, ou, de alegação e prova de factos novos, essenciais, que obstassem, na coerência decisão inicial, à subsistência da solução de direito alcançada na mesma.
Não podendo ter sido intenção do legislador que, não obtendo os Requeridos em procedimento cautelar, ganho de causa na oposição deduzida, pudessem, e ademais já em sede de julgamento de recurso interposto pelos Requerentes, lograr a “convolação” de tal oposição em “alegações” de recurso pelo qual NÃO optaram, oportunamente.
Seria elevar o princípio da sanação do erro na forma de processo a patamares indefensáveis, na perspectiva do funcionamento do mecanismo alternativo plasmado no citado art.º 388º, n.º 1.

II-3- Quanto ao 2º agravo.
Aquele vem interposto do despacho de 2006-06-23, que recaiu sobre o requerimento dos Recorrentes, de 2006-05-15, folhas 1046-1050.
Requerimento no qual, arguindo-se, e “apenas”, as nulidades de falta de “notificação da baixa dos autos” – na sequência do Acórdão desta Relação de folhas 1031-1038 – e de omissão de decisão sobre o regime de processamento do incidente de…oposição, se requeria a anulação dos “termos subsequentes à omissão do despacho acima sindicado”, neles se incluindo “o despacho de 3.5.2006, a folhas 1031-1038”.
Sendo que no sobredito despacho, se indeferiu tal arguição de nulidades.
E que as conclusões de tal 2º agravo, como visto já, são rematadas com o pedido de que:
“a) Seja declarado nulo e revogado o despacho de 23.6.2006, a fls. 1068/9,
b) Sejam anulados todos os actos subsequentes à nulidade de conhecimento oficioso, arguida por requerimento de 15.5.2006, a fls 1046-1050,
c) Seja ordenada a autuação em separado do incidente de oposição deduzido pelas requeridas L / lAF, com aproveitamento dos respectivos articulados e requerimentos.
Assim, como resulta meridiano, desde que, em julgamento do 1º agravo, se revoga a decisão que julgou a “oposição” – ou seja, o aludido “despacho de 3.5.2006 – resulta prejudicado o conhecimento do objecto de tal 2º agravo, que de forma mediatizada, visava ainda, ao fim e ao cabo, a revogação da decisão que julgou a oposição.

Na circunstância, conquanto apenas marginalmente, dir-se-á:
É certo que, em sede de alegações deste segundo recurso de agravo, se alude também à omissão do conhecimento, oficioso, “das consequências da anulação decretada, para efeito do disposto no art.º 242º, n.º 1, al. b), do Código de Processo Penal, relativamente aos factos documentados a fls…todos posteriores à decisão anulada, de 19.3.2001 e geradores de responsabilidade civil e criminal dos seus agentes”.

Desde logo, não encontra, o assim alegado, qualquer correspondência nas conclusões do agravo respectivo.
Depois, perante o teor do requerimento a que se reporta o despacho impugnado, e que se deixou já analisado, não é configurável qualquer omissão de pronúncia, a propósito.
Pois concedida a oficiosidade do conhecimento de matérias que tais, então continuaria, como continua, a ser possível, na 1ª instância, onde o requerimento de 2006-05-15 nada havia suscitado a propósito, a pronúncia sobre aquelas.
Anotando-se que se trata de integrar crime de desobediência qualificada, relativamente a actos a que se referem documentos reportados ao período de 2001-04-24 a 2001-11-20, quando era já proferida a decisão de 2001-03-19, ordenando o levantamento das anteriormente decretadas providências cautelares, e que, anulada aquela decisão pelo Acórdão de 2006-03-16, se lhe seguiu a decisão de 2006-05-03, novamente determinando o levantamento das providências cautelares decretadas antes da oposição das Requeridas IAF, e L.
E que, nas palavras dos próprios Recorrentes, o comportamento das agravadas L e IAF, é objecto “dos processos crime que se encontram a correr por cometimento dos crimes de desobediência qualificada…”, cfr. n.º 3, do requerimento de 2006-10-16, a folhas 1138 a 1142.

II-4- Da requerida condenação das agravadas L, IAF e A D, como litigantes de má-fé.
Tal sorte de litigância ilustrar-se-ia, para as Recorrentes, na circunstância de haverem as 1as referidas agravadas, ao suscitarem, nas suas contra-alegações, as “questões novas” referenciadas, deduzido pretensão cuja falta de fundamento não ignoram e, do mesmo passo, pretendem apenas, “e em desespero de causa, impedir que o comportamento dos seus agentes seja correctamente apreciado no âmbito dos processos crime que se encontram a correr por cometimento dos crimes de desobediência qualificada…”
Sendo, quanto à A D, e pelo que respeita à instância de recurso – única que aqui poderia estar em causa – traduzir-se a sua má fé no uso manifestamente reprovável que faz das apresentadas contra-alegações, pois estando ciente de que as pretensões constantes de tal peça, “não têm fundamento nem cabimento legal”, têm por fim conseguir dificultar o apuramento da responsabilidade criminal dos representantes dos vários requeridos, por violação de injunções judiciais”.

Pedindo a condenação das primeiras como litigantes de má-fé, em multa e indemnização aos Recorrentes “atentas as despesas” a que a oposição por aquelas deduzida “deu e dará lugar, e os prejuízos sofridos com a desobediência às medidas cautelares contra elas decretadas em 16.10.2000”.
E a condenação, pelo mesmo título, da Requerida A D, em multa e indemnização a favor do Recorrente A F L S, reportando tal indemnização “a cada mês ou fracção de actividade processual” a que aquele “se encontra obrigado por força do incumprimento das ditas injunções judiciais, por parte daquela”.
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Nada nos autos sustenta a intencionalidade do comportamento processual das referidas agravadas no sentido pretendido pelos Recorrentes.
Nem, sendo certo que a litigância de má fé se basta, actualmente, com a negligência grosseira – caracterizada em Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2001/12/06, (16) como a “imprudência grosseira, sem aquele mínimo de diligência que lhe teria permitido facilmente dar-se conta da desrazão do seu comportamento, que é manifesta aos olhos de qualquer um” – se pode concluir pela verificação da mesma.

Repare-se que contemplando-se na lei, relativamente ao despacho que retém o recurso, a reclamação para o presidente do tribunal ad quem, se prevê igualmente que se a parte, em vez de reclamar, impugnar por meio de recurso um tal despacho, se mandarão “seguir os termos próprios da reclamação”, cfr. art.º 688º, n.º 5, do Código de Processo Civil.
Decisões havendo a sustentar, com apelo à aplicação analógica de tal preceito, que, interpondo-se recurso de despacho do relator…deverá ser o requerimento respectivo convolado em reclamação para a conferência, vd. art.º 700º, n.º 3, do mesmo Código.

E, no tocante à A D, menos se compreende a imputação de litigância de má fé.
Tendo aquela, oportunamente, deduzido oposição ao procedimento – e, mesmo que não fosse esse o caso, na circunstância de o haverem feito as suas co-requeridas IAF e L– era sua faculdade – independentemente da procedência dos fundamentos de tal oposição – contra-alegar no recurso da decisão que ordenou o levantamento da providência.
Não estando reunidos elementos que permitam concluir estar aquela ciente de que as pretensões constantes de tal peça, “não têm fundamento nem cabimento legal”.

Não deixará de se referir que negligente, pelo menos, será o retomar, pelos Recorrentes, de questão, como a da tramitação da oposição ao procedimento cautelar, sobre a qual esta Relação se havia já pronunciado, no seu anterior Acórdão de 2006-03-16, a folhas 1013-1026, transitado em julgado.
No qual ler-se pode: “…conhecendo do recurso primeiramente interposto…temos que nas conclusões das respectivas alegações…questionam, nuclearmente, os recorrentes, a conformidade às leis de processo do incidente de oposição…
No entender dos agravantes, o processamento da oposição deduzida pelas agravadas inquina de vários vícios formais…não ter sido processado por apenso…
Independentemente de termos para nós que – ao contrário do que acontecia na lei adjectiva anterior à reforma processual de 95… – a tramitação da oposição actualmente prevista na al. b), do n.º 1 do art.º 388º do C.P.C. deve apenas obedecer ao estatuído acerca do formalismo da oposição que é deduzida nos casos em que, previamente à decisão da providência, ocorre a audição do requerido, as apontadas irregularidades processuais poderão configurar-se, quando muito, como nulidades do art.º 201º do C.P.C…
Deveriam ter sido arguidas e apreciadas no tribunal em que ocorreram…
Assim sendo, escoado está e há muito o prazo em que os recorrentes, no tribunal próprio, as poderiam ter arguido…”.
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IV- Nestes termos, acordam em conceder provimento ao agravo interposto da decisão de 2003-05-06, que ordenou o levantamento das providências anteriormente decretadas,-----------------------------------------------------
revogando a mesma, com manutenção, assim, da decisão inicial,-----------------
quedando prejudicado o conhecimento do objecto do 2º agravo, interposto do despacho de 2006-06-23,----------------------------------------------------------------------
e indo indeferida a requerida condenação das agravadas contra-alegantes como litigantes de má fé.

Custas pelas agravadas IAF, L e A D.
Lisboa, 2007-03-29
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(Ezagüy Martins)
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(Maria José Mouro)
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(Neto Neves)
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1 In “Temas da Reforma do Processo Civil”, III Vol. (2ª Ed.), Almedina, 2000, pág. 266.
2 Neste expresso sentido podendo ver-se Amâncio Ferreira, in “Manual dos Recursos em Processo Civil”, 3ª
3 In “Código de Processo Civil, Anotado”, Vol. 2º, Coimbra Editora, 2001, pág. 45.
4 In op. cit. supra, pág. 256.
5 Op. cit. pág. 259.
6 In op. cit. pág. 180.
7 In “Comentários ao Código de Processo Civil”, Almedina, 1999, pág. 284.
8 In “Código de Processo Civil, Anotado”, Vol. 2º, Coimbra Editora, 2001, pág. 31.
9 José Lebre de Freitas. A. Montalvão Machado. Rui Pinto, in op. cit. pág. 45.
10 In "Código de Processo Civil, Anotado", (reimpressão), Vol. V, pág. 359
11 Proc. 05S3823, in www.dgsi.pt/jstj.nsf.
12 In “Comentários ao Código de processo Civil”, Almedina, 1999, pág. 465.
13 Ibidem.
14 In op. cit. págs. 42-43.
15 In op. cit. pág. 256.
16 In rec. n.º 01A36092, aliás citado por Menezes Cordeiro, in op. cit. supra, pág. 26-