Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
643/11.7TXEVR-G.L1-5
Relator: JOÃO CARROLA
Descritores: PENA DE EXPULSÃO
EXECUÇÃO DE PENAS
CASAMENTO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 07/07/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Sumário: I - Decorre da Lei da Nacionalidade - Lei n.º 37/81, de 03 de Outubro na redacção da Lei n.º 43/- 2013, de 03/07 - que o casamento constitui modo de aquisição de nacionalidade nos termos do seu art.º 3º, independentemente da possibilidade de oposição à mesma aquisição, baseada no seu art.º 9º al. b) “ condenação, com trânsito em julgado da sentença, pela prática de crime punível com pena de prisão de máximo igual ou superior a 3 anos, segundo a lei portuguesa;”
II - A aquisição de nacionalidade em função de casamento contraído com cidadã portuguesa não opera ope legis, antes se encontra sujeita a processo administrativo próprio, constante no Regulamento da Nacionalidade Portuguesa do Decreto-Lei 237-A/2006 de 14 de Dezembro, mais propriamente nos seus art.ºs 14º (com a exigência de o casamento ser há mais de três anos, o que ainda não sucede com o recorrente) e 31º e seguintes, perante a Conservatória dos Registos Centrais.
III - A questão posta pelo recorrente relativa à permanência de toda a sua família em Portugal, enquanto elemento obstativo da execução da expulsão, não pode ser atendida, uma vez que esse facto apenas poderia relevar para a decisão que decretou a pena acessória de expulsão do território nacional - tal como se dispõe no art.º 151º n.º 2 da Lei 23/2007, de 04 de Julho, na versão introduzida pela Lei n.º 29/2012, de 09/08, momento que se mostra ultrapassado pois a condenação na pena acessória de expulsão já se mostra transitada em julgado, estando em causa apenas a efectiva execução dessa pena.
IV - A execução efectiva desta pena acessória não agrava a posição do recorrente mais do que a compressão dos seus direitos na exacta medida das limitações de liberdade decorrentes da condenação penal consentidas no art.º 27º n.º 2 CRP.
V - No caso, sendo a factualidade integradora dos limites à expulsão posterior à sentença condenatória, a mesma, uma vez judicialmente reconhecida, constitui causa atípica subsequente de extinção da pena acessória correspondente, sendo o meio processual idóneo para dela conhecer o previsto nas disposições conjugadas dos artigos 470º, nº 1, 474º, nº 1, e 475º do Código de Processo Penal.
VI - Se, posteriormente à condenação, veio a verificar-se qualquer das situações previstas nas alíneas b) e c) do artigo 135º da Lei nº 23/200, deverá declarar-se, por tal motivo, extinta a pena acessória de expulsão, na medida em que ainda não haja sido cumprida, comunicando, para efeito de registo autónomo.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferência, na 5.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa:

I.
No processo 643/11.7TXEVR do Tribunal de Execução de Penas de Lisboa, o arguido E veio interpor recurso do despacho, datado de 23.03.2015, que determinou, com fixação da respectiva data, a execução da pena acessória de expulsão do território nacional em que havia sido condenado por acórdão de 19.07.2012, transitado em julgado a 14.02.2013, com os fundamentos constantes da respectiva motivação que aqui se dá por reproduzida e as seguintes conclusões:
“I-O Arguido foi condenado numa pena acessória de expulsão do território português, pena essa, ordenado executar em 23 de março do corrente ano.
II-Sucede que o Arguido é casado com uma cidadã portuguesa, sendo que nos termos da Constituição da República Portuguesa a decisão é inconstitucional por violação dos seus artigos;
III-A expulsão do Arguido do território português viola diretamente o disposto nos artigos 36.9, 67.9, 68.9, 69.9, não podendo a decisão do Excelentíssimo Juiz ser considerada por inconstitucional;
IV-Nestes termos, pede-se a anulação da decisão do Meritíssimo Juiz, e a revogação da aplicação da medida de expulsão do Arguido do território português.”

O Digno Magistrado do Ministério Público respondeu concluindo:
“3.1 O recurso tem por objecto a douta decisão da Mma. Juíza de Execução de Penas proferida a (fls. 74-75), que, nos termos do art., 188.° - A, al. b), do CEPMPL, ordenou que cumpridos dois terços da pena, isto é, em 26/05/2015, fosse executada a pena acessória de expulsão.
3.2 O recorrente foi condenado em douto acórdão, datado de 19/07/2012, proferido no Proc. 18/11.8GALLE, do 2.° Juízo de Competência Criminal de Loulé, confirmado por douto acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 29/01/2013, pela prática, em autoria material, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21.°, n.° 1, do D.L. n.° 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de 5 anos e 6 meses de prisão e na sanção acessória de expulsão do território nacional, interditando-o de entrar em território nacional por um período de 5 (cinco) anos.
3.3 Como consta expressamente da douta decisão, e é entendimento corrente, a pena acessória nada tem a ver com o efeito da pena, enquanto consequência automática e necessária do crime. O STJ, no seu Acórdão de Fixação de Jurisprudência n.º 14/96, de 07/11/1996, in DR, I Série, de 27/11/96, centrou o seu objecto afirmando o seu carácter não automático pela condenação por crime, devendo ser sempre avaliada em concreto a sua necessidade e justificação, em conformidade com o art. 30.° da CRP (vd. Ac. STJ, Rec. n.° 2/10.9SHLSB-A.S1).
3.4 E, sabiamente, o douto acórdão condenatório, tendo em conta que o arguido tinha autorização de residência em Portugal, valorou não só os princípios gerais da necessidade e justificação, como ainda os pressupostos previstos no art. 151.°, n.° 2, da lei dos estrangeiros, isto é, a gravidade dos factos praticados pelo arguido, a sua personalidade, eventual reincidência, o grau de inserção na vida social, a prevenção especial e o tempo de residência em Portugal.
3.5 O casamento é um facto jurídico novo, na medida em que era inexistente aquando da decisão do tribunal.
3.6 Este facto não constitui de per si, ao contrario do alegado pelo recorrente, nenhum dos limites/restrições à aplicação da pena acessória de expulsão previstos no art. 135.° da Lei n.° 23/2007, de 4 de Julho, republicada pela Lei n.° 29/2012, de 9 de Agosto. Nem o casamento de um estrangeiro com pessoa de cidadania portuguesa o faz automaticamente adquirir a nacionalidade portuguesa, como resulta do art. 3.°, da lei da nacionalidade. Mas, sem dúvida alguma, que é um facto novo a ponderar dentro dos parâmetros definidos no n.° 2, do art. 151.° da citada lei.
3.7 Constituindo o casamento um facto novo, e, em princípio, relevante para avaliar do grau de inserção do arguido em Portugal, incumbe ao STJ, por via do recurso de revisão (vd. art. 449.º, n.° 1, al. d), do CPP), autorizar a revisão limitada à pena acessória de expulsão, reenviando o processo para o tribunal de referência no art. 457.º, n.º 1, do CPP, suspendendo-se a execução da pena acessória.
3.8 Não incumbe ao TEP modificar ou extinguir a pena acessória de expulsão.
3.9 Incumbe-lhe dar-lhe execução, como resulta do art. 188.° - A, do CEPMPL. Nesta execução, o tribunal não faz juízos de mérito sobre a decisão. Verificados os pressupostos formais, decreta a expulsão. No TEP só poderá estar em causa a execução daquela decisão e não a própria decisão.
3.10 Pode entender-se, e há jurisprudência nesse sentido, que de acordo com o art. 138.°, n.° 4, al. d), do CEPMPL, compete ao TEP determinar a execução da pena acessória de expulsão e, se na altura dessa decisão, se verificar a existência de um impedimento à sua execução, decorrente de facto superveniente, não determinará a expulsão, por impossibilidade legal. Seria o caso de se verificar algum facto impeditivo previsto no art. 135.° da lei dos estrangeiros.
3.11 Mas não é esta seguramente a situação dos autos. Nesta, caso o TEP se achasse competente para aquilatar da efectiva expulsão ou, ao invés, da modificação do decidido quanto à pena acessória de expulsão, violaria necessariamente o caso julgado, na medida em que o facto superveniente — casamento com cidadã portuguesa - não é de per si um limite legal à expulsão (nem é facto atributivo de forma automática da nacionalidade portuguesa), e a sua apreciação intrinca com os demais factores previstos no art. 151.°, n.° 2, da lei dos estrangeiros, e que já foram ponderados pelo tribunal da condenação e, a haver facto modificativo, só por ele poderiam ser de novo apreciados.
3.12 Nem o casamento com cidadã portuguesa é equiparável aos outros limites à expulsão, sendo que os previstos nas als. a) e c), do art. 135.° da lei dos estrangeiros assentam numa particular ligação da pessoa a expulsar ao território nacional e, a prevista na al. b), em razões de unidade e integração familiar e, especialmente, de salvaguarda dos interesses do menor, quer a nível de preservação dos laços afectivos próprios da filiação quer do seu sustento e educação.
3.13 E, indo mais longe, ainda que se entenda (o que para nós é juridicamente inadmissível por violação do caso julgado) que o TEP possa ponderar a nova circunstância e decidir livremente se a sanção de expulsão deve ser revista ou extinta, sempre se dirá que se deu como provado no tribunal da condenação que o ora recorrente encontrava-se em Portugal há cerca de 3 anos, sendo portador de autorização de residência válida até 22/05/2013, que era solteiro e não tinha mulher nem filhos em Portugal e, embora tenha vindo integrar o agregado familiar dos pais e irmãos, àquela data os pais e irmãos tinham fixado residência em França. Ainda que não trabalhava. Ora, o recorrente não alega factos suficientemente fortes de inserção capazes de abalar o quadro que esteve na base do decretamento da expulsão.
3.14 Já no que respeita à inconstitucionalidade da decisão, importa realçar que, a inconstitucionalidade se reporta a normas jurídicas (art. 70.° da LTC). Prosseguindo, não nos parece que a decisão viole o direito fundamental de constituir família (art. 36.°, n.° 1, da CRP), que, por força do art. 15.º, n.° 1, da constituição, é igualmente reconhecido ao estrangeiro residente em Portugal (princípio da equiparação), porquanto a partir do momento que o estrangeiro pratica um crime de certa gravidade, como foi o caso, quebra o laço de solidariedade recíproca que o liga ao país de acolhimento, sendo assim legítimo que esses direitos sofram restrição por força da aplicação de pena acessória de expulsão (princípio da concordância prática entre bens jurídicos contrapostos – direito de realização pessoal vs direito à segurança), sem prejuízo, obviamente, de nessa decisão se terem em conta os critérios da necessidade, proporcionalidade e justo equilíbrio entre o direito da pessoa a expulsar por um lado e por outro a protecção da ordem pública e a prevenção de infracções penais.
3.15 Conclui-se assim que, no caso concreto, (!) o TEP carece da necessária competência material para apreciar e decidir sobre a matéria respeitante à eventual derrogação da pena acessória de expulsão do território nacional; (!!) ainda que se entenda que cabe ao TEP decidir sobre a existência de algum facto impeditivo da expulsão de natureza superveniente, a mera alegação, como facto superveniente, d) casamento de per si, não constitui impedimento legal à execução da expulsão (não está previsto no art. 135.° da lei dos estrangeiros, nem há argumentos de ordem teleológica e sistemática que levem a considerar haver aqui uma previsão incompleta que justificasse uma analogia in bonam partem, nem é atributivo de forma automática de nacionalidade portuguesa); (!!!), por fim, condescendendo que o TEP (o que para nós é juridicamente inadmissível por violação do caso julgado), possa ponderar a nova circunstância e decidir livremente se a sanção de expulsão deve ser revista ou extinta, sempre se dirá que o recorrente rio alega factos suficientemente fortes de inserção capazes de abalar o quadro que esteve na fase do decretamento da expulsão, o qual obedeceu aos ditames constitucionais da necessidade e proporcionalidade e da justa ponderação dos critérios ínsitos no n.° 2 do art. 151.º da lei dos estrangeiros.” Termina no sentido da improcedência do recurso.

Neste Tribunal, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta teve vista nos autos, elaborando parecer em que concorda com o entendimento seguido na resposta ao recurso.
Foi dado cumprimento ao artigo 417.º n.º 2 do C.P.Penal, tendo surgido resposta em que mantém o que afirmara em sede de recurso.

II.
Colhidos os vistos legais, cumprindo agora apreciar e decidir.
O despacho recorrido apresenta o seguinte teor:
E está preso, à ordem do P. 18/11, a cumprir uma pena de 5 anos e 6 meses de prisão.--
Foi ainda condenado na pena acessória de expulsão.--
*
Encontra-se ininterruptamente preso, para efeitos de cumprimento desta pena, desde 26.09.2011.--
Assim:
- os 2/3 da pena ocorrem em: 26.05.2015;
- o termo final da pena ocorre em: 26.03.2017.--
*
Dispõe o art. 188° A n.º 1 al. a) do C.E.P.M.P.L. (com a redacção introduzida pela Lei 21/2013 de 21 de Fevereiro) que:
" Tendo sido aplicada pena acessória de expulsão, o juiz ordena a sua execução logo que:
a) Cumprida metade da pena, nos usos de condenação em pena igual ou inferior a 5 anos de prisão... ".--
b) Cumpridos dois terços da pena, nos casos de condenação em pena superior a 5 anos de prisão... ".--

O Recluso cumpre os 2/3 da pena em que foi condenado no dia 26.05.2015.
Assim, deve nessa data ser executada a pena acessória de expulsão.—
*
Pelo exposto, determino que seja executada no dia 26.05.2015 a pena acessória de expulsão, sendo o Recluso E, entregue ao Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, para cumprimento da pena acessória de expulsão do território nacional, salvo se tiver de ficar preso à ordem de outro Processo.--
O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação, sendo apenas as questões aí sumariadas as que o tribunal de recurso tem de apreciar, conforme jurisprudência uniforme do STJ (cfr. Ac. STJ de 28.04.99, CJ/STJ, ano de 1999, p. 196 e jurisprudência ali citada), sem prejuízo das de conhecimento oficioso, designadamente os vícios indicados no art. 410º nº 2 do C.P.P. (cfr. Ac. STJ para fixação de jurisprudência nº 7/95, de 19/10/95, publicado no DR, série I-A de 28/12/95).
No caso dos autos, face às conclusões da motivação do recurso, a questão suscitada resume-se a saber se a execução da ordem de expulsão do recorrente deve ser anulada.

Impõe-se a formulação de uma nota prévia traduzida na constatação de que os argumentos trazidos ao recurso por parte do recorrente, com vista à não execução da pena acessória de expulsão determinada no despacho recorrido, não foram levados ao tribunal recorrido em termos de o mesmo, apreciando-os, manter aquela execução ou não.
A limitação do despacho recorrido à ordem executiva daquela pena acessória transitada em julgado determinaria que o recurso estivesse no limite da manifesta improcedência dado que o recurso só poderia apreciar o despacho recorrido nos exactos termos que no mesmo se mostram exarados.

Apesar disso, sempre diremos.
Conforme se mostra, de certo modo, resumido no despacho recorrido e na resposta do M.º P.º ao recurso, está em questão apenas a decisão que determinou a execução da pena acessória de expulsão aplicada ao recorrente concomitantemente com a condenação na pena de 5 anos e 6 meses de prisão, condenações essas que se mostram transitadas em julgado.
Como fundamento do recurso e da pretensão formulada no mesmo, invoca o recorrente dois argumentos: i) casou civilmente em 3 de Junho de 2013 (por lapso, dizia 2003) com cidadã portuguesa o que, no seu entendimento, permite que a decisão de expulsão seja anulada, por ilegal e inconstitucional e ii) tem em Portugal toda a sua família.
Tal como dispõe o n.º 4 do art.º art.º 188º-C do Código de Execução das Penas e Medidas Privativas de Liberdade, na redacção introduzida pela Lei 21/2013 de 21.02, “O recurso interposto da decisão que decrete ou rejeite a execução da pena acessória de expulsão é limitado à questão da concessão ou recusa da execução da pena acessória de expulsão.”
Da limitação do recurso legalmente fixada temos como consequência que a questão posta pelo recorrente relativa à permanência de toda a sua família em Portugal, enquanto elemento obstativo da execução da expulsão, não pode ser atendida uma vez que esse facto apenas poderia relevar para a decisão que decretou a pena acessória de expulsão do território nacional - tal como se dispõe no art.º 151º n.º 2 da Lei 23/2007, de 04 de Julho, na versão introduzida pela Lei n.º 29/2012, de 09/08, “…pena pode ser imposta a um cidadão estrangeiro residente no País, condenado por crime doloso em pena superior a um ano de prisão, devendo, porém, ter-se em conta, na sua aplicação, a gravidade dos factos praticados pelo arguido, a sua personalidade, eventual reincidência, o grau de inserção na vida social, a prevenção especial e o tempo de residência em Portugal.” - momento que se mostra ultrapassado pois a condenação na pena acessória de expulsão já se mostra transitada em julgado, estando em causa apenas a efectiva execução dessa pena. De resto, tal como consta da decisão condenatória, o arguido não tinha quaisquer familiares próximos em Portugal.
Por relação ao argumento decorrente do casamento com cidadã portuguesa, também o mesmo não tem a virtualidade de obstar à execução dessa pena acessória nos moldes pretendidos pelo recorrente na medida em que a celebração do mesmo não determina, ope legis, a aquisição de nacionalidade portuguesa por parte do recorrente, nacionalidade esta que, essa sim e uma vez obtida, constituiria obstáculo à expulsão por imperativo constitucional decorrente do art.º 33º n.º 1 CRP.
Tal como decorre da Lei da Nacionalidade - Lei n.º 37/81, de 03 de Outubro na redacção da Lei n.º 43/2013, de 03/07 - o casamento constitui modo de aquisição de nacionalidade nos termos do seu art.º 3º, isto independentemente da possibilidade de oposição à mesma aquisição baseada no seu art.º 9º al. b) “ condenação, com trânsito em julgado da sentença, pela prática de crime punível com pena de prisão de máximo igual ou superior a 3 anos, segundo a lei portuguesa;”, ou seja, exactamente o caso em que o recorrente se encontra.
De qualquer modo e como já se mencionou, a aquisição de nacionalidade em função de casamento contraído com cidadã portuguesa não opera ope legis, antes se encontra sujeita a processo administrativo próprio, constante no Regulamento da Nacionalidade Portuguesa do Decreto-Lei 237-A/2006 de 14 de Dezembro, mais propriamente nos seus art.ºs 14º (com a exigência de o casamento ser há mais de três anos, o que ainda não sucede com o recorrente) e 31º e seguintes, perante a Conservatória dos Registos Centrais.
Não demonstra o recorrente que tal procedimento tenha sido requerido e que tenha obtido decisão favorável concedendo-lhe a nacionalidade.
Avança ainda o recorrente que a execução da pena acessória seria inconstitucional por violação dos art.ºs 36º e 67º a 69º, disposições constitucionais que têm, a primeira, por escopo garantir os direitos relativos à família, ao casamento e à filiação.
Não existe um direito dos estrangeiros a entrarem e fixarem-se em Portugal - direito de imigração -, como não gozam de um direito absoluto de permanecerem em território nacional, podendo ser extraditados e, verificadas certas condições, expulsos; os direitos dos estrangeiros são apenas o direito de asilo e o direito de não serem arbitrariamente extraditados ou expulsos – Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, I, Coimbra Editora, 2007, pág. 531.
Como referem Vital Moreira e Gomes Canotilho, in Constituição da República portuguesa Anotada, Coimbra Editora, “São de quatro ordens esses direitos: (a) direito das pessoas a constituírem família e a casarem-se (nºs 1 e 2); (b) direitos dos cônjuges, no âmbito familiar e extra-familiar (n° 3); (c) direitos dos pais, em relação aos filhos (n°s 5 e 6); (d) direitos dos filhos (n°s 4, 5, 2ª parte, e 6). Estão assim contemplados todos os titulares dos vários «papéis» que integram a referência familiar.”
Por sua vez, os art.ºs 67º a 69º, dizem os mesmos autores, “ …reconhecem «direitos sociais» cujos titulares são aparentemente comuns. Todavia, no art. 67° é a própria família, enquanto tal (e não as pessoas), que aparece como sujeito do direito à protecção da sociedade e do Estado; no art. 68° já os titulares são também os pais e as mães, mas o destinatário desse direito é a sociedade e o Estado (e não os próprios filhos, como aqui). Simultaneamente com o reconhecimento de direitos individuais, estes preceitos reconhecem e garantem também a família e o casamento como instituições em si mesmas, sendo repositórios de típicas garantias institucionais, que por isso não podem ser legalmente suprimidas ou desqualificadas.”
Ora, retomando o caso concreto, a pena acessória de expulsão foi decretada e transitou em julgado bem antes do casamento do recorrente. Quando o recorrente celebrou o casamento já era sabedor das limitações que para si decorriam em virtude da situação de cumprimento de pena em que se encontrava e da condenação na pena acessória de expulsão transitada.
A execução efectiva desta pena acessória não agrava a posição do recorrente mais do que a compressão dos seus direitos na exacta medida das limitações de liberdade decorrentes da condenação penal consentidas no art.º 27º n.º 2 CRP.
Por relação aos argumentos decorrentes dos projectos de parentalidade, os mesmos não se mostram por ora actuantes na medida em que, tal como o próprio recorrente reconhece, se trata de mero projecto, não constituindo, portanto, qualquer facto que pudesse constituir entrave à determinada execução da pena acessória.
Nenhuma afronta constitucional se mostra feita com o despacho recorrido.

Antes de concluir, importa tecer algumas considerações a um aspecto suscitado na resposta ao recurso em que o M.º P.º manifesta o entendimento na sua conclusão 3.7 “Constituindo o casamento um facto novo, e, em princípio, relevante para avaliar do grau de inserção do arguido em Portugal, incumbe ao STJ, por via do recurso de revisão (vd. art. 449.º, n.° 1, al. d), do CPP), autorizar a revisão limitada à pena acessória de expulsão, reenviando o processo para o tribunal de referência no art. 457.º, n.º 1, do CPP, suspendendo-se a execução da pena acessória.”
Com o devido respeito pelo entendimento do M.º P.º acima referido, já o STJ no acórdão de 27.10.2011, em que foi relator o Exmo. Conselheiro Manuel Braz, disponível em www.gde,mj,pt/jstj, embora tirado acerca da existência de filhos do casamento, entendeu que essa não seria a via legal adequada tal como se infere do que argumenta a final do mesmo “Como se diz no falado parecer nº 2/2011 do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, o artº 135º da Lei nº 2372007 não restringe os limites à expulsão de estrangeiros à fase da aplicação da pena, abarcando a sua previsão «as situações em que a factualidade respectiva vier a ocorrer em momento posterior, embora antes do cumprimento da pena», até porque outra interpretação contenderia com normas constitucionais.
Também não tem que decidir-se aqui sobre qual a via a seguir, nestes casos, sendo que, enquanto o acórdão deste Supremo Tribunal de 17/02/2011, proferido no proc. 66/06.0PJAMD-A.S1 da 5ª secção, acima citado, considera que, ao abrigo do artº 138º, nº 4, alínea d), da Lei 115/2009 de 15 de Outubro, «o TEP não poderá determinar a expulsão, se verificar que na altura em que a mesma vier a ter lugar o menor é português, e está efectivamente a cargo do arguido, ou o menor é estrangeiro, reside em Portugal e é o arguido que assegura o seu sustento e educação, exercendo sobre ele o poder paternal», tendo, obviamente, em conta «o condicionalismo decorrente da situação de reclusão a que o recorrente esteve sujeito», aquele parecer aponta a seguinte solução:
«Uma vez que a factualidade integradora dos limites à expulsão é posterior à sentença condenatória, a mesma, uma vez judicialmente reconhecida, constitui causa atípica subsequente de extinção da pena acessória correspondente, sendo o meio processual idóneo para dela conhecer o previsto nas disposições conjugadas dos artigos 470º, nº 1, 474º, nº 1, e 475º do Código de Processo Penal.
Assim, o juiz, oficiosamente, ou a requerimento do interessado ou do Ministério Público, deverá, face aos elementos probatórios disponíveis, e realizando para o efeito, as diligências que se mostrem indispensáveis, apurar se, posteriormente à condenação, veio a verificar-se qualquer das situações previstas nas alíneas b) e c) do artigo 135º da Lei nº 23/2007. Na afirmativa, deverá declarar, por tal motivo, extinta a pena acessória de expulsão, na medida em que ainda não haja sido cumprida, comunicando, para efeito de registo autónomo» (loc. cit, página 16805).” (sublinhado nosso)
Ainda por ligação a esta temática e como decorre do parecer da PGR referido naquele aresto (2/201, disponível em http://www.ministeriopublico.pt/iframe/pareceres-do-conselho-consultivo-da-pgr) a não execução da pena acessória de expulsão apenas poderia ser impedida nas situações de efectiva aquisição de nacionalidade portuguesa por parte do condenado (em que o impedimento resultaria do art.º 3º n.º 1 CRP) ou nas situações previstas no art.º 135º da Lei 23/2007, de 04 de Julho, o que não se verifica no caso em apreciação.
De resto, a opção pelo recurso de revisão foi concretamente feita pelo próprio recorrente vindo-lhe a ser negada a mesma por Acórdão do STJ de 21.05.2015 proferido no P.º 18/11.8GALLE.B.S1 a que tivemos acesso.

Finalmente e também como questão nova posta na resposta do M.º P.º ao recurso, suscitada foi a questão da competência material do TEP para apreciar e decidir sobre a matéria respeitante à eventual derrogação da pena acessória de expulsão do território nacional, ainda que entenda o M.º P.º que cabe ao TEP decidir sobre a existência de algum facto impeditivo da expulsão de natureza superveniente.
Os tribunais de execução das penas são de competência especializada (art.º 78.º, al. i) da LOFTJ), pelo que, de harmonia com o preceituado no art.º 64.º, n.º 2 do mesmo diploma, conhecem de matérias determinadas, independentemente da forma de processo aplicável.
Dispõe o art.º 18.º do CPP que a competência do tribunal de execução das penas é regulada por lei especial.
Essa lei especial é agora o Código de Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade, aprovado pela Lei n.º 115/2009, de 12 de Outubro, em vigor desde o dia 10 de Abril de 2010, que, no art.º 138.º estabelece a competência material do TEP, nos seguintes termos:
1 - Compete ao tribunal de execução das penas garantir os direitos dos reclusos, pronunciando-se sobre a legalidade das decisões dos serviços prisionais nos casos e termos previstos na lei.
2 - Após o trânsito em julgado da sentença que determinou a aplicação de pena ou medida privativa da liberdade, compete ao tribunal de execução das penas acompanhar e fiscalizar a respectiva execução e decidir da sua modificação, substituição e extinção, sem prejuízo do disposto no artigo 371.º-A do Código de Processo Penal.
3 - Compete ainda ao tribunal de execução das penas acompanhar e fiscalizar a execução da prisão e do internamento preventivos, devendo as respectivas decisões ser comunicadas ao tribunal à ordem do qual o arguido cumpre a medida de coacção.
4 - Sem prejuízo de outras disposições legais, compete aos tribunais de execução das penas, em razão da matéria:
(…)
e) Determinar a execução da pena acessória de expulsão, declarando extinta a pena de prisão, e determinar a execução antecipada da pena acessória de expulsão;
(…).” (destaque nosso)
No mesmo sentido dispõe o art.º 91.º da Lei n.º 3/99, de 3 de Janeiro (Lei da Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais), na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 115/2009, de 12 de Outubro, alterada pela Lei n.º 40/2010, de 3 de Setembro, bem como a Nova Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais – Lei n.º 52/2008, de 28 de Agosto aplicável em algumas circunscrições judiciais, no seu art.º 124.º, n.º2, al. g).
Como refere o Exmo. Juiz Desembargador da Relação de Lisboa, Nuno Gomes da Silva, no âmbito da decisão de conflito negativo de competência proferida no processo n.º 102/06.0PFPDL-B.L1-5, acessível in www.dgsi.pt/jtrl, “a Lei 115/2009, de 12 de Outubro, introduziu alterações significativas em matéria de competências dos tribunais da condenação e de execução de penas privativas de liberdade.
Pode ler-se no ponto 15 da Proposta de Lei nº 252/X (Diário da Assembleia da República, Série II-A, n.279, de 5.3.2009), que originou a Lei 115/2009 e o CEPMPL:

"No plano processual e no que se refere à delimitação de competências entre o tribunal que aplicou a medida de efectiva privação da liberdade e o Tribunal de Execução das Penas, a presente proposta de lei atribui exclusivamente ao Tribunal de Execução das Penas a competência para acompanhar e fiscalizar a execução de medidas privativas da liberdade, após o trânsito em julgado da sentença que as aplicou. Consequentemente, a intervenção do tribunal da condenação cessa com o trânsito em julgado da sentença que decretou o ingresso do agente do crime num estabelecimento prisional, a fim de cumprir medida privativa da liberdade. Este um critério simples, inequívoco e operativo de delimitação de competências, que põe termo ao panorama, actualmente existente, de incerteza quanto à repartição de funções entre os dois tribunais e, até, de sobreposição prática das mesmas. Incerteza e sobreposição que em nada favorecem a eficácia do sistema."
Daí que, em materialização dessa intenção, a Proposta da Lei, na decorrência do regime que se visava instituir pelo CEPMPL (...), contivesse alterações aos artigos 91º da Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro, e 124º da Lei n.º 52/2008, de 28 de Agosto, (...) e ainda ao artigo 470º, n.º 1, do CPP, que também vieram a ser acolhidas, nos seus precisos termos, no texto final da Lei 115/2009.
Decisiva, no sentido da clarificação operada, é a alteração ao n.º 1 do art.º 470º do CPP que, mantendo a regra segundo a qual a execução corre nos próprios autos perante o presidente do tribunal de 1ª instância em que o processo tiver corrido, a restringiu fortemente no que se refere à execução de penas privativas de liberdade, estabelecendo, por aditamento do actual segmento final daquele preceito, que tal regra vale "sem prejuízo do disposto no artigo 138º do Código de Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade".
Do confronto do preceituado no art.º 470.º, n.º1, do CPP e do art.º 138.º, n.º2 e 4.º do CEPMPL, ressalta, à primeira vista, que, tendo transitado em julgado a decisão que decretou a pena acessória de expulsão e verificando-se os demais requisitos do art.º 188°-A n.º 1 al. a) do C.E.P.M.P.L, competiria sempre ao TEP determinar aquela execução e, em caso de afectiva apresentação dos argumentos, agora trazidos ao recurso, perante aquele tribunal, apreciar a pretensão formulada pelo condenado.
Esta conclusão será ainda mais impressiva uma vez que não se trata de revogar ou alterar a pena acessória em questão, mas apenas a de constatar, quando muito, impedimento legal à respectiva e efectiva execução.

III.
Pelo exposto, nega-se provimento ao recurso, confirmando-se o despacho recorrido.
Custas a cargo do recorrente, fixando a taxa de justiça em 5 UC.
Lisboa, 7 de Julho de 2015.
João Carrola
Luis Gominho