Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
1008/12.9TYLSB.L1-8
Relator: ISOLETA COSTA
Descritores: INSOLVÊNCIA
PROCESSO ESPECIAL DE REVITALIZAÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 05/09/2013
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: 1. O processo especial de revitalização, introduzido no CIRE pela Lei 16/2012, de 20 de Abril tem por fim a obtenção de um acordo entre o devedor e uma maioria de credores, que seja capaz de suportar a viabilização da empresa e cuja eficácia pressupõe a respectiva aprovação por uma maioria qualificada de créditos que torne o acordo vinculativo para a generalidade dos credores.
2. A intervenção do juiz está reservada à verificação da situação de facto do devedor (estar numa das situações previstas no nº2 do art. 1º do CIRE ) e das condições necessárias para a sua recuperação ( cfr. arts. 17º-A, 17º-B e 17º-C, nº3, al. a) e nº4), à decisão de impugnações de reclamações de créditos; ao julgamento da acção referida no nº 11 do citado art. 17º-D; ao controlo do cumprimento das normas aplicáveis como requisito da homologação do plano de recuperação por forma a assegurar a legalidade do acordo alcançado pelos intervenientes ( cfr. art. 17º-F, nºs 3 e 5) ou à declaração de insolvência após a conclusão do “processo negocial”, sem a aprovação de qualquer plano de recuperação ( cfr. art. 17º-G).
3. A regra é a de privilegiar tudo o que não contrarie o interesse público, ligado ao funcionamento da economia e à satisfação dos interesses do colectivo de credores, de evitar a liquidação de patrimónios e o desaparecimento de agentes económicos e, consequentemente, de propiciar o êxito da revitalização do devedor.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam do Tribunal da Relação de Lisboa:

“N – Industrias da Avicultura, SA”, pessoa colectiva nº (…), com sede (…) Lisboa, matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa, veio ao abrigo do disposto no art.º 17-A do Código da Insolvência e de Recuperação de Empresas intentar o presente processo especial de revitalização.

Concluídas as negociações foi aprovado - por mais de dois terços da totalidade dos votos expressos emitidos, correspondendo mais de metade dos votos emitidos a créditos não subordinados (cfr. art. 212 nº1 ex vi art. 17-F nº2 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas) – um plano de recuperação conducente à revitalização da Requerente, que foi remetido ao Tribunal juntamente com a documentação mencionada no art. 17º F.

Pelo credor “B Bank, PLC” foi requerida a não homologação do plano aprovado, nos termos do disposto nos arts. 215 e 216 ex vi art. 17-F nº5 do Código da  Insolvência e da Recuperação de Empresas, por violação não negligenciável de regras procedimentais e de normas aplicáveis ao conteúdo do plano, e com fundamento em que a situação da credora, ao abrigo do plano aprovado, resulta ser menos favorável o que a que existiria na ausência de qualquer plano.

O Sr. Administrador da Insolvência, a Requerente e a “EDP Comercial – Comercialização de Energia, SA” pronunciaram-se, defendendo em síntese a improcedência do pedido formulado pelo “B” e a homologação do plano de recuperação aprovado.

A final foi proferida decisão homologatória do plano de recuperação, tendo o B recorrida da mesma.

Lavrou as conclusões ao adiante:  

É patente a violação do disposto no artº 17-D nº 10 do CIRE e bem assim dos princípios consagrados na Resolução do Conselho de Ministros 43/2011 de 25.10 pois que o comportamento processual/negocial adoptado pela devedora durante o período negocial não é legalmente admissível.

Não pode decorrer apenas três dias úteis entre o dia do envio do plano de revitalização aos credores e o dia da votação, constituindo esta conduta violação não negligenciável das regras procedimentais, nos termos e para os efeitos do artº 215º do CIRE.

Os créditos sobre a insolvência são apenas os definidos legalmente no nº 4 do artº 47º do CIRE a saber: os créditos «garantidos e privilegiados», os créditos «subordinados» e os créditos «comuns».

No plano são misturados créditos «comuns» e «privilegiados» e atribui-se diferente tratamento aos créditos comuns sem consentimento de visados, constituindo tal conduta violação do nº1 do artº 195º do CIRE e do princípio da igualdade previsto no artº 194º do mesmo diploma.

Foram aprovadas condições de pagamento distintas entre os credores mormente a V, SA e a EDP.

 O consentimento que a lei refere maxime o artº 192º nº 2 é o consentimento do credor afectado, e tal consentimento não ocorreu, tendo havido outros credores como a COSEC e CEMOPOL Lda.

Sempre teria o plano de revitalização de referir a expressa derrogação do princípio, cfra al c) do artº 195º nº 2 do CIRE

O pagamento de 40% do capital ficou quanto às concretas condições de pagamento, a saber taxas de juro, prazos, montante das prestações, redefinir e como tal relegado para o final do plano que ocorrerá daqui a 14 anos,

O Plano aprovou o financiamento obrigatório da devedora pela Instituições Financeiras de Garantia Mutua em que se inclui a recorrente, com uma abertura de crédito de 600.000,00 euros a financiar de forma pro rata ao valor de crédito reconhecido.

Esta medida é flagrantemente violadora da liberdade contratual dos credores em causa ao que acresce que a obrigação de refinanciamento coloca a recorrente numa posição previsivelmente menos favorável, violando deste modo o disposto no artº 192º nº 2 e 195 do CIRE, pelo que preenche os requisitos do artº 216º nº 1 a) do mesmo diploma.

Prescreve ainda o plano que os credores I.F.G.M., se comprometem a não executar quaisquer garantias avales e penhores durante o período do PER sobre a N e avalistas, o que constitui, não uma moratória de execução, mas uma derrogação inadmissível de uma norma imperativa do (CIRE art 216º nº1 a) uma vez que deste modo a recorrente ficará numa posição mais desfavorável do que aquela que ocorreria na ausência de plano.

Foram juntas contra alegações da recorrida a sustentar o acerto da decisão homologatória.  

               

Objecto do recurso

São as conclusões que delimitam a matéria a conhecer por este Tribunal que é de recurso sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso que cumpra apreciar, por imperativo do art.º 660, n.º 2., “ex vi” do art.º 713, nº 2, do mesmo diploma legal e 684º nº 3 e 685-A do CPC.

Não haverá, contudo, que conhecer de questões cuja decisão se veja prejudicada pela solução que tiver sido dada a outra que antecedentemente se haja apreciado, salientando-se que, com as “questões” a resolver se não confundem os argumentos que as partes esgrimam nas respectivas alegações e que, podendo, para benefício da decisão a tomar, ser abordados pelo Tribunal, não constituem verdadeiras questões que a este cumpra solucionar (Cfr., entre outros, Ac. do STJ de 13/09/2007, proc. n.º 07B2113 e Ac. do STJ de 08/11/2007, proc. n.º 07B358 (artº 684 e 685 -A do CPC)

O recurso coloca duas questões a saber:

Se no PER e na aprovação do plano ocorreu violação não negligenciável das regras procedimentais e bem assim das normas aplicáveis ao conteúdo do plano de revitalização.

Conhecendo:

Fundamentação de facto:

Dá-se aqui por reproduzida a factualidade supra.

Fundamentação de direito:

O PER (Programa Especial de Revitalização) introduzido no nosso ordenamento jurídico pela Lei 16/2012 de 20.04 que alterou o CIRE, insere-se num objectivo mais vasto de recuperação do tecido económico em que se encontra por exemplo o SIREVE Sistema de Recuperação de Empresas por Via Extrajudicial- (este promovido catalisado e medeado pelo IAPMEI) e positivado na nossa ordem jurídica pelo DL 178/2012).

Trata-se sempre de um processo negocial em que o fim é a obtenção de um acordo entre o devedor e uma maioria de credores, que seja capaz de suportar a viabilização da empresa sendo certo que a eficácia do acordo para lá da esfera dos que nele intervieram, pressupõe sempre a respectiva aprovação por uma maioria qualificada de créditos (artº 17º F), que ocorrendo torna o acordo vinculativo para a generalidade dos credores. (sem prejuízo da imperatividade de outros requisitos que condicionam a homologação judicial).

Daí que seja lícito no âmbito do PER que as entidades em causa adoptem quaisquer medidas que a lei não exclua e se adequem aos fins de recuperação da devedora.    

O PER tem como destinatários os devedores que comprovadamente se encontrem em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente mas que ainda sejam susceptíveis de recuperação (artº 2º nº1 e 17º nº 1-A do CIRE.

O financiamento ao devedor nesta fase representa sempre um risco contratual acrescido, sendo por isso fundamental que existam estímulos.

O problema não pode pôr-se exclusivamente no plano do confronto entre interesses privados (de que são titulares os dois grupos de credores).

Dever-se-à ainda atender á necessidade de promover a recuperação de empresas, que consubstancia o interesse publico e este interesse é fundamental na interpretação e aplicação da recente Lei nº 16/2012, de 20 de Abril, que procedeu à sexta alteração do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (aprovado pelo Decreto-Lei nº 53/2004, de 18/03 e alterado pelos Decretos-Leis nº 200/2004, de 18/09, nº 76-A/2006, de 29 de Março, 282/2007, de 7 de Agosto, 116/2008, de 4 de Julho e 185/2009, de 12 de Agosto), e que reorientou este código para a promoção da recuperação.

É essencial atentar que esta lei representa uma verdadeira mudança de paradigma do regime insolvencial com vista à prossecução do interesse público de defesa da economia, assente na filosofia de que “cada agente que desaparece representa um custo apreciável para a economia, contribuindo para o empobrecimento do tecido económico português, uma vez que gera desemprego e extingue oportunidades comerciais que, dificilmente, se podem recuperar pelo surgimento de novas empresas” [Cfr a Proposta de lei 39/XII da Presidência do CM] .

Assim, privilegiando a manutenção do devedor no giro comercial e relegando para segundo plano a liquidação do seu património sempre que se mostre viável a sua recuperação, veio a referida lei introduzir, na matéria com interesse para a resolução do presente litígio, alterações fundamentais (idem)

Por um lado, instituiu, no art.1º, nº 2 do CIRE, o processo especial de revitalização, destinado a permitir a qualquer devedor que, comprovadamente, se encontre em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente mas que ainda seja susceptível de recuperação, estabelecer negociações com os respectivos credores de modo a concluir com estes acordo conducente à sua revitalização económica ( cfr. nº1 do art. 17º-A do mesmo código).

Consagrou, nos artigos 17º-A a 17º-I, (CIRE) um regime de cariz marcadamente voluntário e extrajudicial, deste processo por forma a fomentar o recurso ao procedimento extrajudicial de recuperação do devedor bem como a contribuir para o aumento do número de negociações concluídas com sucesso dando primazia à vontade dos intervenientes (devedor e credores), limitada esta nos termos do nº 10º do art. 17º-F, (CIRE) a limitações decorrentes do dever de respeito dos seguintes princípios orientadores aprovados pela Resolução do Conselho de Ministros nº 43/2011, de 25 de Outubro a saber:

 “Primeiro princípio - o procedimento extrajudicial corresponde a um compromisso assumido entre o devedor e os credores envolvidos e (e não a um direito) e apenas deve ser iniciado quando as dificuldades financeiras do devedor possam ser ultrapassadas e haja uma forte probabilidade de este manter-se em actividade após a conclusão do acordo alcançado com os seus credores;

Segundo princípio - durante todo o procedimento, as partes devem actuar de boa fé, na busca de uma solução construtiva que satisfaça todos os envolvidos;

Terceiro princípio - deve ser garantida uma abordagem unificada por parte dos credores, que melhor sirva os interesses de todas as partes;

Quarto princípio- os credores envolvidos devem cooperar entre si e com o devedor de modo a concederem a este um período de tempo suficiente para obter e partilhar toda a informação relevante e para elaborar e apresentar propostas para resolver os seus problemas financeiros;

Quinto princípio- durante o período de suspensão, os credores envolvidos não devem agir contra o devedor, comprometendo-se a abster-se de intentar novas acções judiciais e a suspender as que se encontrem pendentes;

Sexto princípio- durante o período de suspensão, o devedor compromete-se a não praticar qualquer acto que prejudique os direitos e as garantias dos credores, ou que, de algum modo, afecte negativamente as perspectivas dos credores de verem pagos os seus créditos, em comparação com a sua situação no início do período de suspensão;

Sétimo princípio- o devedor deve adoptar uma postura de absoluta transparência durante o período de suspensão, partilhando toda a informação relevante sobre a sua situação, nomeadamente a respeitante aos seus activos, passivos, transacções comerciais e previsões da evolução do negócio;

Oitavo princípio - toda a informação partilhada pelo devedor, incluindo as propostas que efectue, deve ser transmitida a todos os credores envolvidos e reconhecida por estes como confidencial, não podendo ser usada para outros fins, excepto se estiver publicamente disponível;

Nono princípio- As propostas apresentadas e os acordos realizados durante o procedimento, incluindo aqueles que apenas envolvam os credores, devem reflectir a lei vigente e a posição relativa de cada credor;

Décimo princípio- As propostas de recuperação do devedor devem basear-se num plano de negócios viável e credível, que evidencie a capacidade do devedor de gerar fluxos de caixa necessários ao plano de reestruturação, que demonstre que o mesmo não é apenas um expediente para atrasar o processo judicial de insolvência, e que contenha informação respeitante aos passos a percorrer pelo devedor de modo a ultrapassar os seus problemas financeiros;

Décimo primeiro princípio- Se durante o período de suspensão ou no âmbito da reestruturação da dívida for concedido financiamento adicional ao devedor, o crédito resultante deve ser considerado pelas partes como garantido.”

Do mesmo modo privilegiou o controlo pelos credores da conduta do devedor e do seu administrador (sendo a falta ou incorrecção das comunicações ou informações a estes prestada susceptível de gerar responsabilidade civil - cfr. nº11 do citado art. 17º-D), restringindo o controlo jurisdicional à gestão processual.

Daí ter reservado a intervenção do juiz à sindicância da justeza da instauração do processo especial de revitalização, ou melhor dizendo, à verificação da situação de facto do devedor (estar o mesmo “comprovadamente” numa das situações previstas no nº2 do art. 1º do CIRE) e das condições necessárias para a sua recuperação (cfr. arts. 17º-A, 17º-B e 17º-C, nº3, al. a) e nº4); à decisão de impugnações de reclamações de créditos; ao julgamento da acção referida no nº 11 do citado art. 17º-D; ao controlo do cumprimento das normas aplicáveis como requisito da homologação do plano de recuperação por forma a assegurar a legalidade do acordo alcançado pelos intervenientes ( cfr. art. 17º-F, nºs 3 e 5) ou à declaração de insolvência após a conclusão do “processo negocial”, sem a aprovação de qualquer plano de recuperação ( cfr. art. 17º-G).

Por outro lado, não deixou de impor ao juiz a observância dos trâmites a seguir quanto à aprovação do plano de recuperação conducente à revitalização.

Com efeito, nesta matéria e na parte que interessa para a resolução do presente litígio, estabelece o art. 17º-F, nº5 que o juiz decide se deve homologar o plano de recuperação aprovado ou recusar a sua homologação, nos 10 dias seguintes à recepção da documentação mencionada nos números anteriores, ou seja, nos dez dias seguintes à recepção do plano de recuperação aprovado ( cfr. nº2 do mesmo artigo) e de documento com o resultado da votação   ( cfr. nº4 do citado artigo)

Neste particular aspecto, dispõe o nº3 do citado art. 17º-F que “considera-se aprovado o plano de recuperação que reúna a maioria dos votos prevista no nº1 do artigo 212, sendo o quórum deliberativo calculado com base nos créditos relacionados contidos na lista de créditos a que se referem os nºs 3 e 4 do artigo 17º-D, podendo o juiz computar os créditos que tenham sido impugnados se considerar que há probabilidade séria de tais créditos deverem ser reconhecidos, caso a questão ainda não se encontre decidida”.

Dito, por outras palavras, considera-se aprovado o plano de recuperação que recolher mais de dois terços da totalidade dos votos emitidos e mais de metade dos votos emitidos correspondentes a créditos não subordinados, não se considerando como tal as abstenções, sendo o quórum deliberativo calculado com base nos créditos relacionados contidos na lista de créditos.

Os nºs 4  e 5 do citado art. 17º-F impõem a aplicação, ao caso dos autos, do disposto nos arts. 211º, 215º e 216º do C.I.R.E., “com as necessárias adaptações”, o que vale por dizer em tudo o que não contrarie o interesse público, ligado ao funcionamento da economia e à satisfação dos interesses do colectivo de credores, de evitar a liquidação de patrimónios e o desaparecimento de agentes económicos e, consequentemente, de propiciar o êxito da revitalização do devedor.

É dentro deste quadro legislativo e de interesses que nos movemos, pois.

Isto posto, e quanto às concretas questões do recurso:

 Invoca o recorrente a violação não negligenciável das regras procedimentais quando se procedeu á notificação do projecto do plano concedendo aos credores apenas três dias úteis até a deliberação do mesmo princípios orientadores que decorrem da Resolução do Conselho de Ministros e violação dos princípios contidos na Resolução do Conselho de Ministros nº 43/2011 de 25.10, a que a actuação dos intervenientes durante as negociações deve obedecer (artº 215º do CIRE).

Na sentença apelada, convocou-se para a decisão tomada de fazer improceder este vício, os seguintes factos:

-o  B aceitou em 29.06.2012  participar nas negociações do PER da devedora.

Estas resumiram-se a dois contactos, em 17 e 26 de Outubro.

Foi fornecida uma versão do plano de recuperação para análise em 29 de Outubro.

Em 30 de Outubro foi -lhe enviada uma adenda a esse plano

Foi fixado o dia 5 de Novembro como data para o exercício do direito de voto pelos credores.

Ainda que conforme informação prestada pelo Sr. Administrador judicial provisório, (não contraditada pelo recorrente) existiram duas rondas de negociações com os principais credores tendo em vista a adesão às soluções do plano gizado pela devedora

Do conjunto das primeiras resultou a não adesão às soluções propostas e a segunda teve início, depois de introduzidas alterações ao plano, no final de Setembro, princípio de Outubro

O B, não esteve disponível nas datas propostas para reunir, tendo a primeira data aceite sido a de 17.10. e manifestou desde sempre não ter interesse em negociar ou contribuir para o desfecho das negociações, antes e apenas em que fosse encontrada uma entidade interessada em adquirir o seu crédito.

Sustenta ainda o Sr administrador que o período a considerar é o decorrente entre 29.10(data do primeiro envio da proposta e o de 5.11).

 Quid iuris?

Não se vislumbra a pretensa violação dos alinhados princípios da Resolução de Conselho de Ministros que terão sido violadas com esta conduta da devedora, porquanto, como na própria Resolução do C.M. se fez constar a mesma destina-se «a fomentar o recurso ao procedimento extrajudicial de recuperação de empresas, bem como a contribuir para o aumento do número de negociações concluídas com sucesso (…) Uma negociação extrajudicial bem-sucedida tem, assim, como resultado final um plano de reestruturação da dívida acordado entre devedor e credores, assente na redefinição dos prazos de pagamento ou até no perdão de parte da dívida, e que permite ao devedor manter-se em actividade sem interrupções.

O essencial é a vontade «Que a empresa se mantenha em actividade sem necessidade de intervenção de terceiros (nomeadamente, o administrador da insolvência), contribuindo para que esta ultrapasse as suas dificuldades económicas; Que os credores reduzam as suas perdas (os dados estatísticos apontam para uma maior recuperação de créditos nos casos de recuperação extrajudicial de empresas, quando comparada com os casos de insolvência e liquidação do património do devedor); Evitar os efeitos sociais e económicos negativos que advêm da liquidação de uma empresa, traduzindo-se num procedimento benéfico, também, para trabalhadores, clientes, fornecedores e investidores;

- A adopção de mecanismos informais mais céleres, eficientes e eficazes que, quando aplicados correctamente, permitem resoluções mais rápidas dos processos, com mais elevadas taxas de recuperação das empresas;

Fundamental é que, tratando-se de um procedimento voluntário, os credores entendam que o mesmo se baseia na sua vontade de ajudar o devedor e, com isso, obterem, também, benefícios a longo prazo»

É francamente privilegiada a obtenção de um acordo, o que «in casu» foi conseguido. Finalmente, entende-se que a não concessão de um prazo maior para a discussão do plano deveria ter sido arguida de imediato perante o Administrador para que pudesse este, em tempo, ponderar as razões de tal invocação e adequar o formalismo a seguir.

Não se atende pois nesta parte ao recurso.

Pretende ainda a apelante que alegadamente houve violação não negligenciável das normas aplicáveis ao conteúdo do plano de recuperação, a saber:

Vem o recorrente sustentar a ofensa ao princípio da igualdade quando no plano se introduziu uma classificação de créditos não coincidente com a classificação legal constante do artº 47º misturou-se créditos comuns com outros e distinguiram-se os créditos comuns em estratégicos e não estratégicos, com o que se violou a posição relativa do recorrente e como tal o princípio da igualdade.

Na sentença apelada sustentou-se que «nada impede que a devedora e os seus credores acordem num plano de revitalização que diferencie os credores, a propósito das condições de pagamento, da forma como foi feita.

Quanto aos fornecedores é com efeito feita uma distinção entre estratégicos e não estratégicos. Pela própria denominação empregue se percebe que existiu de facto uma razão para a distinção: serem ou não estratégicos (essenciais para alcançar o objectivo pretendido) para o prosseguimento da actividade e a revitalização da devedora, objectivo último do plano»

Quid iuris?

Alinhamos com o entendimento constante da sentença.

O processo actual (PER) destina-se sobretudo a viabilizar a prossecução da actividade comercial e empresarial apoiando o devedor, por acordo dos credores relevantes, sendo que este acordo deve obter pelo menos maioria qualificada dos votos.

Daí e na medida em que o plano foi aprovado com os votos legalmente exigidos, nada obsta cremos nós, aos tipos de acordo encontrados.

A igualdade aqui é garantida pela formação de uma vontade maioritária. Não se trata de uma igualdade absoluta no tratamento dos credores, permitindo-se diferenciações no tratamento, desde que fundamentadas em razões objectivas.

De todo o modo o plano de insolvência, segundo dispõe o art. 194 do CIRE (aplicável aqui ao plano de recuperação), obedece ao princípio da igualdade dos credores da insolvência (aqui, da devedora requerente do PER), “sem prejuízo das diferenciações justificadas por razões objectivas que no caso surgem fundamentadas na importância que para a devedora tem a EDP e Vodafone pela especificidade do serviço que prestam.

Na verdade o art. 194 nº2 refere que o tratamento mais desfavorável relativamente a outros credores em idêntica situação depende do consentimento do credor afectado.

Ora nem os demais credores (já que os que votaram contra a aprovação do plano, não significa que tenham votado contra esta medida em concreto, nem o recorrente invoca no que a si respeita a violação do princípio da igualdade por ter sido incluído ou não ter sido incluído em determinada categoria, tão pouco reclama diferença de tratamento em relação às restantes instituições de crédito grupo em que se inclui.

A alegada violação do disposto no art. 195 do CIRE

No que respeita às IFSCGM, por não conter todos os elementos relevantes e necessários para efeitos de apreciação da medida proposta, como deixa sem resposta questões óbvias (v.g. em quantos anos depois do final do PER irão ser pagos os 40% de capital, em quantas prestações, de que montante e a que taxa de juro), ficando o plano, nessa parte, sujeito a uma verdadeira condição suspensiva legalmente inadmissível (violadora do art. 201).

Também aqui a sentença explica e bem o teor do decidido.

Relativamente às instituições financeiras e sociedades de garantia mútua consta de fls. 58 e 59 do plano que será, além do mais, considerada uma dívida “estrutural” de 40% (o que corresponde, na prática, a um perdão de 60%) do valor total, “a ser regularizado em condições a definir no final do período de vigência do PER (168 meses) e a vencer juros nas mesmas condições do capital a ser regularizado no período do PER (…)”. E, nos “termos e condições de reembolso para a dívida “estrutural” (40%) a acordar após o termo do período de carência, tendo em consideração (i) o desempenho da N, SA no decurso daquele período e (ii) as circunstâncias económico-financeiro da N, SA e dos mercados, à data da negociação por forma a manter o regular funcionamento da empresa.”

A lei não diz concretamente o que entende por “elementos relevantes”, estes, serão, em cada caso, resultado de uma ponderação de todos os factores em apreço.

Essa ponderação está concretizada na fórmula encontrada e que foi votada favoravelmente pela maioria exigida na lei, a justificar que em face do entendimento negocial havido não haja interferência.

É que, aqui predomina o entendimento negocial que deve ser salvaguardado em face do interesse público que representa

Nem se vislumbra putativa condição suspensiva, reclamada pelo apelante.

O acordo quanto às convencionadas no que às instituições financeiras respeita, que se mantêm as garantias, avales e penhores durante o período de existência do PER sobre a devedora e os seus avalistas, com o compromisso de não execução dos mesmos pelo credor enquanto se mantiver o cumprimento do PER pela N, SA está salvaguardado pelo disposto no artº 17-H e 17-E do CIRE, nada obstando ao mesmo pois.

Pretende finalmente o apelante que houve violação do princípio da liberdade contratual, sem razão já que os termos da sua vinculação ao plano resultam directamente do disposto no artº 17-F nº  6 do CIRE,  que prescreve , que a decisão do juiz é vinculativa para todos os credores, mesmo que “não hajam participado nas negociações” e da própria regulamentação legal desta forma de processo especialíssima, (artº 17º- F nº 3).

Tão pouco desta situação decorre qualquer prejuízo para a apelante uma vez que está consagrado no nº 2 do art 17º H privilégio mobiliário geral que prefere mesmo aos créditos dos trabalhadores.

Segue deliberação:

Na improcedência da apelação mantém-se a sentença homologatória do PER.

Custas pela apelante.

Lisboa, 9 de Maio de 2013

Isoleta  Almeida Costa

Carla Mendes

Octávia Viegas