Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
19859/16.3T8LSB.L1-2
Relator: JORGE LEAL
Descritores: NOTIFICAÇÃO JUDICIAL AVULSA
COMPETÊNCIA INTERNACIONAL
REGULAMENTO CE
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 12/15/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Sumário: I.A notificação judicial avulsa é um ato-fim e independente, isto é, toda a atividade que nela se exerce é conducente à notificação, distinguindo-se das notificações relativas a processos pendentes, as quais são atos-meio e dependentes, porque servem de instrumento ou de meio num processo em curso, cujo fim nada tem que ver com o objetivo direto da notificação.
II.O art.º 79.º do CPC, que dispõe que “as notificações avulsas são requeridas no tribunal em cuja área resida a pessoa a notificar” é uma norma que cuida da competência do tribunal em razão do território, não obstando à competência dos tribunais portugueses para tramitarem notificações judiciais avulsas de requeridos localizados no estrangeiro.
III.O Regulamento (CE) n.º 1393/2007 do Parlamento Europeu e do Conselho de 13 de novembro de 2007 relativo à citação e à notificação dos atos judiciais e extrajudiciais em matéria civil e comercial nos Estados-Membros e a Convenção de Haia Relativa à Citação e à Notificação no Estrangeiro de Atos Judiciais e Extrajudiciais em Matérias Civil e Comercial são aplicáveis às notificações judiciais avulsas.
(Sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes, do Tribunal da Relação de Lisboa.


RELATÓRIO:


Em 29.7.2016.
1.MARIA e JOSÉ MANUEL, casados, residentes em Bombarral;
2.ANTÓNIO e ILÍDIA, casados, residentes na Suíça;
3.CELESTE e MANUEL, casados, residentes na Suíça;
4.ELSA, residente em Vila Nova de Gaia;
5.JOSÉ ANTÓNIO, residente no Porto;
6.B LIMITED, sociedade de direito maltês, com morada em Malta;
7.GRUPO S SL, sociedade de direito espanhol, com sede em Espanha;
apresentaram na Secção Cível da Instância Central do Tribunal de Comarca de Lisboa requerimento de notificação judicial avulsa de
1.BANCO E, S.A. com sede em Lisboa;
2.BANCO N, S.A., (NIPC 513 204 016), com sede em Lisboa;
3.H BANK, S.A. (NIPC 501385932), com sede em Lisboa;
4.ALBERTO, com residência em Lisboa;
5.BRUNO, com residência em França,
6.ANTÓNIO JOSÉ, com residência em Lisboa;
7.MANUEL FERNANDO, com residência em Lisboa;
8.JOSÉ MARIA, com residência em Lisboa;
9.RUI, com residência em Lisboa;
10.JOAQUIM, com residência em Lisboa;
11.RICARDO, com residência no Brasil;
12.AMÍLCAR, com residência em Lisboa;
13.NUNO, com residência em Lisboa;
14.JOÃO EDUARDO, com morada em Lisboa;
15.PEDRO, com residência em Lisboa;
16.MARC, com morada em França;
17.STANISLAS, com residência em França;
18.PEDRO, com residência em Lisboa;
19.XAVIER, com residência em França;
20.S INTERNATIONAL, S.A. en faillite, com sede em Luxemburgo;
21.E S.A., en faillite, com sede no Luxemburgo;
22.ESF S.A., en faillite, com sede no Luxemburgo;
23.T (EUROPE) S.A., com sede no Luxemburgo;
24.MANUEL ANTONIO, com morada em Lisboa;
25.JOSE PEDRO, com morada em Londres;
26.PATRÍCIO, com residência em Londres;
27.MARTIM, com residência em Lisboa;
28.BERNARDO, com morada em Lisboa;
29.JOÃO, com residência no Brasil;
30.DOMINGOS, com residência no Brasil;
31.RUI MANUEL, com residência no Brasil;
32.FRANCISCO, com morada na Suíça;
33.K S.à.r.l., com sede no Luxemburgo;
34.KP S.A, com sede em Lisboa.

Os requerentes alegaram que enquanto clientes do 1.º requerido, o BES (sendo o 7.º requerente adquirente de produtos e direitos a eles inerentes de que era titular um anterior cliente do BES), e por sugestão dos gestores de conta, subscreveram junto do BES produtos alegadamente de baixo risco e com uma rentabilidade superior a depósitos a prazo, produtos esses que, afinal e na realidade, eram títulos de dívida de diversas entidades integradas no Grupo Espírito Santo, com identidades e responsabilidades totalmente distintas do BES, os quais não só não pagaram os juros devidos como também o respetivo capital não foi reembolsado. Os requerentes não foram devidamente esclarecidos pelos intermediários financeiros e pelos seus colaboradores e funcionários acerca das características dos aludidos produtos financeiros, tendo sofrido prejuízos cujo ressarcimento pretendem exigir dos requeridos em ação que tencionam instaurar. Os requerentes pretendem, nos termos do art.º 323.º do Código Civil, interromper os prazos de prescrição que porventura se apliquem à responsabilidade civil dos requeridos perante si.

Os requerentes concluíram nos seguintes termos:

Termos em que se requer a notificação judicial avulsa de cada um dos Requeridos, para que os mesmos fiquem cientes da intenção dos Requerentes em propor ação judicial contra eles destinada à declaração da responsabilidade civil dos Requeridos pelos danos emergentes da violação das normas e dos deveres de intermediação financeira na subscrição de títulos de dívida emitido pelas sociedades referidas e desconformidade/inexistência do conteúdo dos prospetos/notas informativas e a sua condenação no pagamento de uma indemnização correspondente ao valor investido nos referidos títulos de dívida acrescida de juros contratados e dos juros de mora, à taxa legal para as obrigações comerciais, contados desde a data de vencimento da emissão dos títulos de dívida em causa nestes autos e até efetivo e integral pagamento.
Os Requerentes declaram, ainda, que pretendem que esta notificação seja efectuada por Agente de Execução, ao abrigo dos artºs 256.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, indicando, para este efeito a Exma. Senhora Dra. Adelaide, portador da Cédula Profissional n.º, com domicílio profissional na Av D, Sintra.
Os Requerentes requerem ainda que sejam notificados os Requeridos com sede no estrangeiro nos termos do Regulamento 1393/2007 do Parlamento Europeu e do Conselho de 13 de Novembro de 2007 e da Convenção de Haia, nos termos aplicáveis dos respetivos diplomas.”

Distribuídos os autos ao Juiz 24 da Secção Cível da Instância Local de Lisboa do Tribunal da Comarca de Lisboa, em 02.8.2016 foi proferido o seguinte despacho:

A presente Notificação Judicial Avulsa foi apresentada relativamente a 34 Requeridos, melhor identificados no Requerimento de Notificação Judicial Avulsa, nos termos e fundamentos que constam do mesmo.
Compulsado o expediente, temos que alguns dos Requeridos têm sede ou domicílio fora do território nacional; quanto a estes, os Requerentes pretendem a sua notificação nos termos do Regulamento 1393/2007 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de Novembro, e da Convenção de Haia, nos termos aplicáveis.
Suscita-se, antes do mais, a questão da competência deste Tribunal quanto à notificação judicial avulsa desses Requeridos.
*

A notificação judicial avulsa é um procedimento integrado por uma sucessão de actos jurídicos praticados em juízo, como referido no Assento n.º 3/98 do Supremo Tribunal de Justiça de 26.3.1998, Diário da República, I Série A, de 12.05.1998, e consiste numa interpelação com força probatória de documento autêntico, para obtenção de diversos efeitos jurídicos.
Destina-se, em regra, à comunicação a outrem de determinado facto, por via judicial, podendo também destinar-se a revogar mandato ou procuração – artigo 258.º do Código de Processo Civil.
São situações em que se justifica a notificação judicial avulsa a notificação para interrupção do prazo de prescrição extintiva ou aquisitiva (artigo 323.º, n.º 4 do Código Civil), para exercício extrajudicial do direito de preferência (artigo 416.º do Código Civil), interpelação do devedor (artigo 805.º, n.º 1 do Código Civil), anatocismo de juros (artigo 560.º, n.º 1 do Código Civil), notificação da cessão de créditos (artigo 583.º, n.º 1 do Código Civil), interpelação admonitória (artigo 808.º do Código Civil), notificação do arrendatário nos termos do disposto no artigo 9.º, n.º 7, alínea a) do Novo Regime do Arrendamento Urbano, notificação especial para revogação de mandato ou procuração (artigo 258.º do Código de Processo Civil) (vd. António Santos Abrantes Geraldes, Temas Judiciários, I Volume, Almedina, 1998, páginas 151-152).
Nos termos do artigo 256.º do Código de Processo Civil, as notificações avulsas dependem de despacho prévio que as ordene.
As notificações avulsas não admitem oposição, devendo os direitos respectivos ser exercidos nas acções próprias, conforme determina o artigo 257.º, n.º 1 do Código de Processo Civil.
Dispõe o artigo 79.º do Código de Processo Civil que as notificações avulsas são requeridas no tribunal em cuja área resida a pessoa a notificar.
A notificação judicial avulsa caracteriza-se pelo contacto pessoal do agente de execução, designado pelo requerente ou pela secretaria, ou por oficial de justiça, com a própria pessoa a notificar, pelo que lhe subjaz o pressuposto da proximidade geográfica do Requerido, sendo esse o critério determinante da competência, sob pena aliás da inviabilidade prática da realização da diligência de notificação.
Assim, o Tribunal competente para a tramitação da notificação judicial avulsa é o tribunal da residência do Requerido.
A circunstância de existir uma pluralidade de Requeridos não permite afastar a norma especial do artigo 79.º do Código de Processo Civil, cabendo não esquecer que a notificação judicial avulsa é um acto judicial que não se inscreve em qualquer processo pendente e não configura uma acção declarativa, em que existam partes ou pedido.
Assim, ainda que se pretenda a notificação judicial avulsa para o mesmo fim de várias pessoas residentes em circunscrições diversas, a notificação deve ser requerida separada e autonomamente em cada uma dessas circunscrições (por todos, vd. Prof. Alberto dos Reis, Comentário ao Código de Processo Civil, volume I, 2.ª edição, Coimbra Editora, 1960, página 240 – anotação ao artigo 84.º).
Do exposto resulta que não pode ser requerida neste Tribunal a notificação judicial avulsa de Requeridos que não tenham sede/residência na circunscrição deste Tribunal.
Pela mesma ordem de razões, inexiste competência do Tribunal Português para a notificação dos Requeridos com sede no estrangeiro, uma vez que a própria norma de competência interna territorial a afasta (artigo 79.º do Código de Processo Civil), cabendo reiterar que não estamos no âmbito de uma acção judicial.
Não há, assim, lugar à notificação nos termos previstos no Regulamento 1393/2007 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de Novembro, e da Convenção de Haia.
Assim, uma vez que é inadmissível a notificação judicial avulsa dos Requeridos que não têm sede em território nacional por este Tribunal ser internacionalmente incompetente, cabe indeferir a mesma nesta parte, determinando-se a notificação judicial avulsa apenas dos Requeridos com domicílio ou sede em Lisboa.
*

Nestes termos e pelo exposto, defiro parcialmente o requerido e determino que se proceda à notificação judicial dos Requeridos com sede ou domicílio em Lisboa.
A notificação deverá ser realizada por Agente de Execução, indicada pelos Requerentes.
*

Custas do incidente pelos Requerentes, que fixo em uma UC, nos termos do artigo 527.º, n.º 1 e 2 do Código de Processo Civil e 7.º, n.º 4 do Regulamento das Custas Processuais.”

Os requerentes apelaram desta decisão, tendo apresentado alegações em que formularam as seguintes conclusões:

I.Os Recorrentes apresentaram uma notificação judicial avulsa no Tribunal a quo para transmitir expressamente aos Recorridos que pretendiam promover uma ação judicial contra os mesmos com base na responsabilidade por intermediação financeira e desconformidade de prospeto (art.º 323.º e 149.º CVM) com intuito de interromper os prazos de prescrição que estivessem a correr;
II.No entanto, o Tribunal a quo indeferiu a notificação dos Recorridos que tivessem domicílio fora do território português por considerar que o Regulamento (CE) n.º 1393/2007, de 13 de Novembro, e a Convenção da Haia de 1965 não são aplicáveis quando estejam em causa notificações judiciais avulsas;
III.Isto porque, nas suas palavras, a aplicabilidade desses diplomas não se encontra prevista para as notificações judiciais avulsas, as quais pressupõem um contacto pessoal com o notificando;
IV.Todavia, os Recorrentes não podem admitir tal decisão, na medida em que, por um lado, ambos esses diplomas, relativos à citação e à notificação no estrangeiro de atos judiciais em matéria civil e comercial, vinculam o Estado Português e os restantes Estados partes;
V.Ora, decorre do art.º 8.º da Constituição da República Portuguesa o princípio do primado do Direito Europeu e a receção automática das normas do direito internacional particular em que participe o Estado português, as quais são diretamente aplicáveis pelos Tribunais apenas condicionando a sua eficácia interna à publicação oficial no seguimento de ratificação ou aprovação;
VI.Mais, as normas de fonte interna deverão sempre ceder perante o que se estabeleça em normas de fonte supraestadual;
VII.Assim, em matéria de citação e notificação dos atos judiciais e extrajudiciais em matéria civil e comercial nos Estados-Membros aplicar-se-á com primazia o Regulamento (CE) n.º 1393/2007, de 13 de Novembro de 2007, no que se refere aos Estados-Membros da União Europeia, com exceção da Dinamarca, sendo aplicável a Convenção de Haia de 1965 a Portugal e aos Estados signatários da referida Convenção;
VIII.Dos n.ºs 1 e 2 do art.º 1.º do Regulamento (CE) n.º 1393/2007, de 13 de Novembro de 2007, não resulta, de todo, que a notificação judicial avulsa esteja excluída do âmbito de aplicação do Regulamento (CE) n.º 1393/2007, de 13 de Novembro de 2007, nem da Convenção de Haia de 1965, bem pelo contrário;
IX.Em primeiro lugar porque a notificação judicial avulsa é um ato judicial,
X.E, também, porque servindo a notificação para chamar alguém a juízo ou dar conhecimento de um facto, é evidente que a notificação judicial avulsa se encontra abrangida naquele conceito.
XI.Este é, alias, o entendimento da jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia;
XII.Assim, não tendo o legislador excluído do âmbito de aplicação do mencionado Regulamento e da Convenção de Haia de 1965 a notificação judicial avulsa, não deverá o intérprete excluí-las do seu âmbito de aplicação;
XIII.Também o entendimento doutrinal que se pronuncia à cerca do âmbito de aplicação do Regulamento (CE) n.º 1393/2007, de 13 de Novembro de 2007 entende que a notificação judicial avulsa se enquadra no âmbito de aplicação do mencionado diploma legal,
XIV.A título de exemplo, o Autor José Fernando Salazar de Casanova considera que não é pelo facto de a notificação judicial avulsa ser prévia a um ato judicial que se encontra excluída “do âmbito do Regulamento sob pena de privação de direitos que só podem fazer valer nas acções competentes”.
XV.Também não pode valer o fundamento, utilizado pelo Tribunal a quo, de que tais diplomas não poderão ser aplicáveis pois não permitirão que a notificação seja pessoalmente realizada na pessoa dos notificandos,
XVI.Na medida em que para a transmissão da citação ou notificação dos atos entre Estados-Membros, deverão ser utilizados os formulários constantes dos anexos do referido Regulamento;
XVII.Constando nesses formulários a indicação expressa de que a forma de notificação será através de contacto pessoal, o mesmo se verificando no preenchimento dos formulários relativos à Convenção de Haia;
XVIII.Assim, o recurso à notificação judicial avulsa deverá ser aceite nos termos dos instrumentos legais internacionais pertinentes por tudo quanto foi exposto, o que tem sido, aliás, esse o entendimento jurisprudencial seguido noutros tribunais, que aplicaram, naturalmente, os referidos diplomas para a remessa da notificação judicial avulsa aos requeridos com domicílio no estrangeiro;
XIX.Perante o exposto deve entender-se aplicável ao caso os diplomas legais internacionais e por esse motivo efetuar-se a notificação judicial avulsa nos devidos termos.

Os apelantes terminaram pedindo que o despacho recorrido fosse revogado na parte objeto do presente recurso, procedendo-se à notificação judicial avulsa dos Requeridos residentes fora do território português.

Foram colhidos os vistos legais.

FUNDAMENTAÇÃO.

As conclusões do presente recurso mostram-se decalcadas de um outro que foi recentemente apreciado por esta mesma secção (embora com intervenção de outro coletivo de juízes) – apelação no processo 20092/16.0T8LSB-L1 (e porventura outros penderão). Note-se, porém, que enquanto no processo 20092/16.0 a decisão recorrida efetivamente centrara a apreciação da admissibilidade da requerida notificação judicial avulsa à luz da (in)aplicabilidade à mesma do Regulamento (CE) n.º 1393/2007 de 13.11.2007, a decisão destes autos situou-se mais a montante, ou seja, indeferiu o requerido quanto aos notificandos residentes ou sediados no estrangeiro, por ter considerado que o tribunal carecia de competência internacional quanto a eles.

De todo o modo, sendo a questão da competência internacional do tribunal de conhecimento oficioso (art.º 97.º n.º 1 do CPC), e tendo sido expressamente apreciada na decisão recorrida, nada obsta a que esta Relação a analise, apesar de escamoteada pelos apelantes (artigos 608.º n.º 2, parte final, e 663.º n.º 2 do CPC).

A questão a apreciar neste recurso é, assim, se o tribunal a quo tem competência internacional para a notificação judicial avulsa de requeridos residentes ou sediados no estrangeiro. Embora, na génese da resposta a dar-lhe, também tenha relevo a apreciação do Regulamento (CE) n.º 1393/2007 de 13.11.2007.

O factualismo a levar em consideração é o supra descrito no Relatório supra.

O Direito.

Os requerentes pretendem interromper a prescrição dos direitos que entendem ter contra os requeridos. Com efeito, nos termos do n.º 1 do art.º 323.º do Código Civil, “a prescrição interrompe-se pela citação ou notificação judicial de qualquer acto que exprima, directa ou indirectamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que o acto pertence e ainda que o tribunal seja incompetente”. Sendo que, no termos do n.º 4 do mesmo artigo, “é equiparado à citação ou notificação, para efeitos deste artigo, qualquer outro meio judicial pelo qual se dê conhecimento do acto àquele contra quem o direito pode ser exercido.”

A notificação judicial avulsa pela qual se manifesta a intenção do exercício de um direito é, conforme uniformização de jurisprudência levada a cabo pelo STJ em julgamento ampliado de revista, no acórdão n.º 3/98, datado de 26.3.1998 e publicado no D.R. I-A, de 12.5.1998, meio adequado à interrupção da prescrição desse direito, nos termos do n.º 1 artigo 323.º do Código Civil.
As notificações judiciais avulsas (atualmente reguladas nos artigos 256.º a 258.º e 79.º do CPC) são, conforme pondera o Professor Alberto dos Reis (Comentário ao Código de Processo Civil, vol. 1.º, pág. 238; idem, volume 2.º, páginas 586 a 588), atos-fim, porque toda a atividade que nelas se exerce é conducente à notificação. Distinguem-se das notificações relativas a processos pendentes, as quais são atos-meio, porque servem de instrumento ou de meio num processo cujo fim nada tem que ver com o objetivo direto da notificação. Daí que também se possam classificar, respetivamente, como notificações independentes e notificações dependentes (A. dos Reis, Comentário, 2.º vol, pág. 587, nota 1).

Pese embora a sua natureza de ato-fim a notificação judicial avulsa não deixa de constituir um procedimento, um encadeado de atos destinados a produzirem um efeito útil, in casu, a desejada interrupção da prescrição, podendo subsumir-se ao disposto no n.º 2 do art.º 2.º do CPC (neste sentido, cfr. o mencionado acórdão do STJ, de 26.3.1998 e, também, o acórdão da Relação do Porto, de 16.12.2015, processo 742/13.0TTMTS.P1). Note-se que, aquando dos trabalhos preparatórios do CPC de 1939, Alberto dos Reis propôs que a notificação judicial avulsa se processasse sem intervenção do juiz, podendo ser efetuada sem necessidade de prévio despacho judicial. Alberto dos Reis alegava que a intervenção do juiz era inútil, pois não lhe competia exercer qualquer espécie de fiscalização ou apreciação sobre a forma ou o conteúdo do requerimento, nada mais sendo a notificação do que um aviso, sem que o tribunal atribuísse ao requerente o direito que se arrogava. Por outro lado, tinha o inconveniente de poder inculcar que o juiz, ordenando a notificação, reconhecia o direito do requerente (Comentário, 2.º volume, páginas 589 a 592). Porém, tal proposta defrontou forte oposição, por se entender que, embora a notificação avulsa fosse como que um “recado” do tribunal, haveria que garantir que o mesmo não encobria um ato “malsino ou imoral”, pelo que deveria o juiz intervir, para verificar a legalidade ou moralidade do que se requeria.

Daí deduzia Alberto dos Reis que o despacho do juiz, proferido em apreciação do requerimento da notificação judicial avulsa, era, à semelhança do despacho que ordenava a citação, não um despacho de simples expediente, mas um despacho de caráter jurisdicional (Comentário, 2.º vol, pág. 591).

Temos, assim, um processado que contém um requerimento, um despacho do qual, se for de indeferimento, cabe recurso para a Relação (art.º 257.º n.º 2), o ato da notificação propriamente dita (efetuado na própria pessoa do notificado por agente de execução ou por funcionário de justiça, que lavram certidão do ato) e a entrega do requerimento e da certidão do ato ao requerente. Sendo certo que, embora a notificação não admita oposição, poderá ser arguida a sua invalidade formal (possibilidade admitida, desde logo, no n.º 3 do art.º 323.º do Código Civil, que salvaguarda o efeito interruptivo da prescrição no caso de anulação da citação ou da notificação; vide, também, Alberto dos Reis, Comentário, 2.º vol., pág. 743).

Põe-se a questão de se saber se os tribunais portugueses têm competência para tramitar notificação judicial avulsa cujo requerido resida ou esteja sediado no estrangeiro.

À partida, não se vê razão que tal impeça.

Se, verificados que estejam os relevantes elementos de conexão, é possível demandar perante um tribunal português um cidadão ou uma entidade que estejam localizados no estrangeiro, procedendo-se à respetiva citação e, depois, a eventuais subsequentes notificações, no estrangeiro, ao abrigo dos instrumentos internacionais existentes para o efeito ou através da cooperação individual solicitada às autoridades judiciais estrangeiras diretamente ou pela via diplomática, não se antevê porque razão os tribunais portugueses não poderiam receber um requerimento de notificação avulsa de pessoa localizada no estrangeiro, deferir o requerido, solicitar às autoridades competentes no estrangeiro a adequada notificação pessoal do ato (notificação da declaração emitida pelo requerente) e, chegada a respetiva certidão ao tribunal, tudo restituir ao requerente.

É certo que no art.º 79.º do CPC se dispõe que “as notificações avulsas são requeridas no tribunal em cuja área resida a pessoa a notificar.”

Mas, conforme aliás decorre da inserção sistemática do preceito (Secção IV, atinente à “competência em razão do território”, por sua vez integrada no Capítulo III, regulador da “competência interna”), esta norma cuida da competência do tribunal em razão do território (conforme se ponderou no acórdão desta Relação e secção supra citado, datado de 10.11.2016 – processo n.º 20092/16.0T8LSB-L1), justificando-se a solução nesse plano consignada, atenta a finalidade do procedimento.

Não se encontra norma no CPC que recuse a competência internacional dos tribunais portugueses para apreciarem requerimentos de notificação judicial avulsa de requeridos residentes ou sediados no estrangeiro (cfr. artigos 59.º e 62.º do CPC). Assim como não se encontra, ao nível do direito da União Europeia, norma que a tal obste, nomeadamente no Regulamento (EU) n.º 1215/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho de 12 de dezembro de 2012 relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial.

Pelo contrário, a jurisprudência do TJUE, emitida sobre os instrumentos comunitários que têm regulado a citação e notificação dos atos judiciais e extrajudiciais em matéria civil e comercial nos Estados-Membros aponta para a admissibilidade, conveniência e até, porventura, obrigatoriedade desta competência alargada do tribunal para o referido procedimento.

Referimo-nos, em particular, ao acórdão do Tribunal de Justiça, de 25.6.2009, proferido no processo C-14/08 (Roda Golf & Beach Resort SL) em sede de reenvio prejudicial que, embora incidindo sobre o art.º 16.º do Regulamento (CE) n.º 1348/2000 do Conselho, relativo à citação e à notificação dos atos judiciais e extrajudiciais em matéria civil e comercial nos Estados-Membros, que foi revogado pelo atualmente vigente Regulamento (CE) n.º 1393/2007 do Parlamento Europeu e do Conselho de 13 de novembro de 2007, mantém todo o interesse, face à manutenção da redação desse preceito no art.º 16.º do atual Regulamento e bem assim das linhas fundamentais do Regulamento (no mesmo sentido, citando este acórdão, Carlos Marinho, “As citações e notificações no espaço europeu comum”, Julgar, 14, páginas 33 e 34; também, RELATÓRIO DA COMISSÃO AO PARLAMENTO EUROPEU, AO CONSELHO E AO COMITÉ ECONÓMICO E SOCIAL EUROPEU sobre a aplicação do Regulamento (CE) n.º 1393/2007 do Parlamento Europeu e do Conselho, datado de 04.12.2013, pág. 5).

O referido acórdão reporta-se à seguinte situação:

Roda Golf & Beach Resort SL, sociedade de direito espanhol, outorgou, num notário de San Javier, Espanha, um ato notarial de notificação e interpelação a comunicar a resolução unilateral, pela Roda Golf, de dezasseis contratos de compra e venda de um imóvel que tinha celebrado com cada um dos destinatários da notificação, todos estabelecidos no Reino Unido e na Irlanda. Seguidamente, em 2 de Novembro de 2007, a Roda Golf solicitou ao secretário do Tribunal de Primeira Instância de San Javier que, nos termos do Regulamento (CE) n.°1348/2000, notificasse às entidades requeridas competentes do Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte e da Irlanda dezasseis cartas dirigidas aos destinatários estabelecidos nesses dois Estados‑Membros, contendo o aludido ato notarial de notificação e interpelação. O aludido secretário era a autoridade indicada por Espanha para intervir como “entidade de origem” na transmissão dos pedidos de citação e notificação abrangidos pelo Regulamento (também Portugal indicou, como “entidade de origem”, o “Tribunal de Comarca na pessoa do secretário de justiça”). Porém, o aludido secretário recusou proceder à notificação do ato em causa, alegando que pelo facto de essa mesma notificação não ocorrer no quadro de um processo judicial, não estava, consequentemente, abrangida pelo âmbito de aplicação do Regulamento n. 1348/2000. A Roda Golf reclamou dessa decisão para o juiz do tribunal alegando, nomeadamente, que os atos extrajudiciais podiam, ao abrigo do Regulamento n.° 1348/2000, ser notificados à margem de um processo judicial.

O juiz suspendeu a instância e submeteu ao TJUE as seguintes questões prejudiciais:

1)O Regulamento n. 1348/2000 abrange a notificação de documentos exclusivamente extrajudiciais e entre privados, com utilização dos meios materiais e humanos dos tribunais da União Europeia e previstos na legislação europeia, sem se dar início a um processo judicial? Ou, pelo contrário,
2)O Regulamento n.° 1348/2000 aplica-se exclusivamente à cooperação judicial entre Estados-Membros e no âmbito de um processo judicial em curso?
Antes de aceitar apreciar as referidas questões o TJ ponderou que, embora o direito da União não sujeite o recurso ao Tribunal de Justiça ao carácter contraditório do processo no decurso do qual o juiz nacional formula uma questão prejudicial, os órgãos jurisdicionais nacionais só podem recorrer ao Tribunal de Justiça se perante eles se encontrar pendente um litígio e se forem chamados a pronunciar-se no âmbito de um processo que deva conduzir a uma decisão de carácter jurisdicional. Assim, quando desempenha funções de autoridade administrativa, sem, ao mesmo tempo, ser chamado a decidir um litígio, não se pode considerar que o organismo de reenvio exerce uma função de natureza jurisdicional. É o que sucede com o secretário chamado a conhecer de um pedido de citação ou de notificação de atos judiciais ou extrajudiciais, nos termos do Regulamento n.°1348/2000. Atua como autoridade administrativa, sem ser chamado a resolver um litígio. Porém, o mesmo não se pode dizer do juiz que tem de se pronunciar sobre uma reclamação de uma recusa desse secretário em proceder à citação ou à notificação solicitadas. Com efeito, o objeto dessa reclamação é a anulação da referida recusa, que alegadamente lesa um direito do requerente, a saber, o seu direito de citar ou de notificar determinados atos pelas vias previstas no Regulamento n.° 1348/2000. Consequentemente, o juiz de reenvio é chamado a pronunciar-se sobre um litígio e, portanto, exerce uma função jurisdicional.

Aceite a competência para apreciar as questões prejudiciais enunciadas, o TJ acabou por proferir a seguinte decisão:
A citação e a notificação, à margem de um processo judicial, de um acto notarial como o que está em causa no processo principal estão abrangidas pelo âmbito de aplicação do Regulamento (CE) n.° 1348/2000 do Conselho, de 29 de Maio de 2000, relativo à citação e à notificação dos actos judiciais e extrajudiciais em matérias civil e comercial nos Estados‑Membros.

Para aí chegar o TJ pronunciou-se sobre a questão de saber se o conceito de ato extrajudicial, mencionado no art.º 16.º do Regulamento (“Os actos extrajudiciais podem ser transmitidos para citação ou notificação noutro Estado-Membro nos termos do presente regulamento”), é um conceito de direito comunitário ou, pelo contrário, um conceito de direito nacional.

A conclusão do TJ foi que o conceito de “ato extrajudicial”, na aceção do artigo 16.° do Regulamento n.° 1348/2000, deve ser considerado um conceito de direito comunitário.

Para tal, o TJ ponderou que o “objectivo do Tratado de Amesterdão, de criar um espaço de liberdade, de segurança e de justiça, dando com isso uma dimensão nova à Comunidade, e a transferência, do Tratado UE para o Tratado CE, do regime que permite a adopção de medidas que se incluem no domínio da cooperação judiciária em matéria civil com efeitos transfronteiriços atestam a vontade dos Estados-Membros de ancorar essas medidas na ordem jurídica comunitária e de consagrar o princípio da sua interpretação autónoma.” “Além disso, a escolha da forma de regulamento, em vez da forma de directiva inicialmente proposta pela Comissão (…), mostra a importância que o legislador comunitário atribuiu à aplicabilidade directa das disposições do Regulamento n.° 1348/2000 e à sua aplicação uniforme.”

Relativamente à questão de saber se a citação e a notificação de atos extrajudiciais à margem de um processo judicial estavam abrangidas pelo âmbito de aplicação do Regulamento n.° 1348/2000 (e, portanto, estão abrangidos pelo Regulamento que lhe sucedeu, o Regulamento (CE) n.º 1393/2007), o TJ recordou que “o artigo 61.°, alínea c), CE é a base jurídica do Regulamento n.° 1348/2000. Esta disposição, a fim de criar progressivamente um espaço de liberdade, de segurança e de justiça, permite que se adoptem as medidas previstas no artigo 65.° CE. Essas medidas, que se incluem no domínio da cooperação judiciária em matéria civil com efeitos transfronteiriços, visam nomeadamente, de acordo com o referido artigo 65.° CE, melhorar e simplificar o sistema de citação e de notificação transfronteiriça dos actos judiciais e extrajudiciais na medida do necessário ao bom funcionamento do mercado interno.” Mais realçou que o segundo considerando do Regulamento n.º 1348/2000 “enuncia que o bom funcionamento do mercado interno exige que se melhore e torne mais rápida a transmissão, entre os Estados-Membros, dos actos judiciais e extrajudiciais em matéria civil ou comercial, para efeitos de citação e notificação.” Portanto, acrescenta o TJ, “o artigo 65.° CE e o Regulamento n.° 1348/2000 têm, assim, por objectivo criar um sistema de citação e de notificação intracomunitário, com vista ao bom funcionamento do mercado interno.” E, continuando, afirmou que “tendo em conta este objectivo, a cooperação judiciária visada por esse artigo e por este regulamento não se pode limitar apenas aos processos judiciais. Com efeito, esta cooperação é susceptível de se manifestar quer no quadro de um processo judicial quer à margem desse processo, na medida em que a referida cooperação tem efeitos transfronteiriços e é necessária ao bom funcionamento do mercado interno.” Para concluir que “o acto em causa no processo principal, que foi transmitido ao secretário do órgão jurisdicional de reenvio com vista à sua notificação, foi lavrado por um notário, como decorre do n.° 20 do presente acórdão, e, como tal, constitui um acto extrajudicial na acepção do artigo 16.° do Regulamento n.° 1348/2000.”

No que concerne à preocupação que no processo de reenvio havia sido manifestada pelo governo espanhol e pelo governo polaco, de que uma conceção ampla do conceito de ato extrajudicial imporia uma carga excessiva para os meios dos órgãos jurisdicionais nacionais, o TJ salientou que as obrigações em matéria de citação e de notificação que decorrem do Regulamento não incumbem forçosamente aos órgãos jurisdicionais nacionais. Com efeito, a designação das entidades de origem e das entidades requeridas, que, nos termos do artigo 2.°, n. 1 e 2, do referido regulamento, podem ser “os funcionários, as autoridades ou outras pessoas”, é da competência dos Estados-Membros. Consequentemente, os Estados-Membros podem designar como entidades de origem ou entidades requeridas, para efeitos da citação e da notificação dos atos judiciais ou extrajudiciais, outras entidades que não sejam órgãos jurisdicionais nacionais. E poderão também, conforme admite o Regulamento, proceder à citação ou à notificação por outros meios, ou seja, diretamente, por via postal, por diligência de oficiais de justiça, funcionários ou outras pessoas competentes do Estado-Membro requerido.

Ou seja, o objetivo do Direito da União é que as fronteiras não constituam barreiras entre os povos da União. As comunicações de atos jurídicos devem poder fazer-se dentro da União com rapidez, facilidade e segurança, independentemente da localização dos respetivos emitentes e destinatários, através de um sistema simples e alargado de cooperação.

Daí que simples notificações como a destes autos, atos-fim independentes de um processo em curso, possam e devam poder ser requeridas no tribunal da área onde se encontra o requerente e serem transmitidas a um tribunal ou outra entidade situada na área onde se localiza o destinatário dessa comunicação, independentemente do Estado-Membro onde se encontrem uns e outros.

Tanto mais que, esteja em causa a notificação de ato judicial ou de ato extrajudicial, a entidade de origem poderá solicitar à entidade requerida que a notificação seja efetuada de uma forma que considere ser a mais adequada à comunicação em causa, nomeadamente através de contacto pessoal, a menos que essa particular forma seja incompatível com a lei do Estado-Membro requerido (vide artigos 7.º n.º 1, 11.º n.º 2 alíneas a) e b) e 16.º do Regulamento (CE) n.º 1393/2007).

No sentido da admissibilidade de notificação judicial avulsa requerida perante tribunal português e concretizada noutro país europeu por aplicação do Regulamento n.º 1348/2000 pronunciou-se também José Fernando de Salazar Casanova, em “Regulamento (CE) N.° 1348/2000 do Conselho, de 29 de Maio de 2000. - Princípios e Aproximação à Realidade Judiciária”, na Revista da Ordem dos Advogados, ano 62, volume III, Dezembro de 2002. Para este autor, “o facto de o acto pretendido ser prévio ou de alguma forma independente da efectiva instauração de um procedimento (v.g. notificação judicial avulsa requerida pelo senhorio visando a denúncia de contrato de arrendamento de duração limitada: artigo 101.° do R.A.U.) não o exclui do âmbito do Regulamento sob pena de privação de direitos que só se podem fazer valer nas acções competentes (o despejo do local arrendado para o qual a certidão de notificação judicial avulsa constitui título executivo: artigo 101.° do R.A.U.). É claro que se suscita, neste domínio, um problema prévio que é o de saber em que termos um interessado pode pedir, no Estado em que se proponha instaurar a acção, a notificação judicial avulsa de quem deixou de residir nesse Estado (ver artigo 84.° do CPC [de 1961]) mas não parece que se lhe deva impor a realização de um acto no território de outro Estado-Membro que pode mesmo não prever para o caso esta figura processual.” Acrescentando, em nota (nota 4) que “Justificando-se a notificação judicial avulsa à luz do direito nacional e permitindo-a o Regulamento, o reconhecimento da competência dos tribunais portugueses para a realizar implica que, em sede de competência territorial, se recorram aos critérios supletivos do artigo 85.° do CPC” (ou seja, art.º 80.º n.º 3 do atual do CPC: “se o réu tiver o domicílio e a residência em país estrangeiro, é demandado no tribunal do lugar em que se encontrar; não se encontrando em território português, é demandado no do domicílio do autor, e, quando este domicílio for em país estrangeiro, é competente para a causa o tribunal de Lisboa.”)

Igual entendimento (aplicabilidade do atual Regulamento (CE) à notificação judicial avulsa, requerida em Portugal, tendo como requerido cidadão residente em Estado-Membro) se propugnou no citado acórdão desta Relação, de 10.11.2016.

Iguais preocupações, razão de ser e possibilidades, se encontram na Convenção de Haia, Relativa à Citação e à Notificação no Estrangeiro de Actos Judiciais e Extrajudiciais em Matérias Civil e Comercial, de 15 de novembro de 1965, ratificada por Portugal e que também é aplicável na Suíça (onde reside um dos requeridos) . E, relativamente aos requeridos residentes no Brasil (país que não ratificou a Convenção de Haia), poderá expedir-se carta rogatória ou ofício precatório dirigido a cônsul português, conforme for adequado (artigos 172.º n.º 1, 177.º, 239.º n.º 3 do CPC).

Note-se que a competência internacional do tribunal português para a apresentação do requerimento de notificação judicial avulsa justifica-se pelo facto de diversos requerentes e requeridos residirem em Portugal e de os factos de que alegadamente derivam os direitos a que se arrogam os requerentes na sua comunicação terem, pelo menos parcialmente, conexão com Portugal (cfr. art.º 62.º alíneas a) e b) do CPC).

Conclui-se, pois, que a apelação merece provimento.

DECISÃO:

Pelo exposto, julga-se a apelação procedente e consequentemente revoga-se a decisão sub judice, na parte recorrida, e em sua substituição defere-se à requerida notificação, também, dos requeridos sediados ou residentes no estrangeiro, devendo a primeira instância diligenciar em conformidade.
Sem custas pela apelação.



Lisboa, 15.12.2016



Jorge Leal
Ondina Carmo Alves
Pedro Martins