Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
965/2007-1
Relator: CARLOS MOREIRA
Descritores: APOIO JUDICIÁRIO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 03/13/2007
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: AGRAVO
Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO
Sumário: Em processo executivo, o montante das custas devidas tem de ser considerado em sede de elaboração da respectiva conta, de sorte a ser garantido no processo pelo responsável das mesmas, mesmo que a este tenha sido concedido o benefício do apoio judiciário na modalidade de dispensa total do seu pagamento.
(C.M.)
Decisão Texto Integral: ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA
1.
M, SA, instaurou contra J e mulher Maria, com os sinais dos autos, acção executiva para pagamento de quantia certa.
Aos executados foi concedido o benefício do apoio judiciário, na modalidade de dispensa total de taxa de justiça e demais encargos com o processo.
Na tramitação do processo foi penhorado saldo de conta bancária dos executados e foram efectuados descontos no vencimento da executada.
Foi proferido despacho de sustação da execução e os autos foram remetidos à conta.
Nesta constatou-se que, designadamente por virtude das custas liquidadas aos executados, o valor cativo não era ainda suficiente, pelo que foi ordenado o prosseguimento da execução com continuação dos descontos no ordenado da executada.

2.
Inconformados agravaram os executados.

Rematando as suas alegações com as seguintes conclusões:

1ª Aos recorrentes foi concedido, por despacho transitado em julgado, o benefício do apoio judiciário, consistente na dispensa de pagamento de taxas de justiça e demais encargos com o processo.
2ª Consequentemente não lhe podem ser exigidas as custas do presente processo e apensos.
3ª Assim, tendo a quantia exequenda sido fixada no montante de 4.549,69 euros…a totalidade das quantias penhoradas deverão ser aplicadas no pagamento daquela quantia exequenda.
4ª Embora o artº 455º do PC determine que as custas da execução saem precípuas do produto dos bens penhorados, trata-se obviamente das custas que sejam exigíveis, já que, de outro modo, estaria a violar-se o benefício do apoio judiciário concedido.
5ª Deve, assim …determinar-se que a totalidade das quantias penhoradas seja aplicada no pagamento da quantia exequenda, com reembolso dos exequentes das eventuais sobras, ou prosseguindo a execução apenas para completar aquele valor, se eventualmente faltar.

3.
O Sr. Juiz sustentou o despacho.

4.
Sendo que, por via de regra de que o presente caso não constitui excepção, o teor das conclusões define o objecto do recurso, a questão essencial decidenda é a seguinte:
Deve, ou não, em processo executivo, o montante das custas devidas ser considerado em sede de elaboração da respectiva conta, de sorte a ser garantido no processo pelo responsável das mesmas, apesar de a este ter sido concedido o benefício do apoio judiciário na modalidade de dispensa total do seu pagamento.

5.
Os factos a considerar são os resultantes do relatório supra.

6.
Apreciando.
O pedido de isenção do pagamento de custas foi efectuado e concedido aos executados ao abrigo do disposto no DL 387-B/87 de 29/12.
É, pois, a este diploma que, para além do mais, se deve atender, pois que o regime em tal matéria introduzido pelos diplomas posteriores, apenas se aplica aos pedidos de apoio judiciário formulados a partir de 01.01.2001 ( artº 57º da Lei nº30-E/2000 de 20/12 ) e a partir de 01.09.2004 (artº51º das Lei 34/2004 de 29/07).
Nos termos do artº 1º nº1 daquele diploma:
«O sistema de acesso ao direito e aos tribunais destina-se a promover que a ninguém seja dificultado ou impedido, em razão da sua condição social ou cultural, ou por insuficiência de meios económicos, de conhecer, fazer valer ou defender os seus direitos».
Ora no caso vertente a concessão do apoio judiciário na modalidade referida visou a concretização deste desiderato. O qual efectivamente se mostra cumprido, pois que ao longo deste processo e restantes apensos, os executados puderam certamente exercitar plenamente o princípio do contraditório e pugnar pelos seus direitos e interesses, sem que para tal estivessem impedidos ou condicionados pelas suas dificuldades económicas.
A concessão de tal benefício significa apenas uma suspensão do dever de pagar os encargos processuais, pois que, a qualquer momento, se se concluir pela possibilidade de os beneficiários puderem cumpri-lo, o deverão fazer.
Tal entendimento emerge com maior clareza e acuidade no processo executivo, maxime quando nele são penhorados bens aos executados beneficiários do apoio judiciário.
Estando neste processo os direitos e deveres já declarados e definidos, se ao beneficiário forem encontrados bens devem estes responder pelo pagamento das custas.
O que tem consagração legal nos artºs 455º, 917º e 919 do CPC, pois que atento o seu teor, as custas saem precípuas do produto dos bens penhorados -artigo 455°- e a execução só poderá ser julgada extinta quando se mostre efectuado o depósito da quantia liquidada, mas, em qualquer caso, só depois de pagas as custas e a quantia exequenda - artigos 917° 919°, n°1 – cfr. Ac. da Relação de Lisboa de 12.07.2006, p.4698/2006-2 e Ac. do STJ de 28.05.1992, p.082442, ambos em dgsi.pt
Aliás, a regra da precipuidade das custas, que na redacção anterior do artº 455º apenas se reportava à acção executiva, foi, com a actual redacção, introduzida pelo DL 38/2003 de 08.03, alargada à acção declarativa onde foi proferida a decisão exequenda – cfr. Abílio Neto, Breves notas ao CPC, 2005, p.131.
Efectivamente se o direito do credor comum é satisfeito sem que tal inculque a ideia de que o devedor fica afectado na satisfação das suas necessidades básicas – o que é obviado através da regra da impenhorabilidade: artºs 823º e 824º do CPC - não faria sentido que o crédito do Estado, contrapartida da prestação de um serviço comunitário essencial, eivado de cariz eminentemente social, qual seja a administração da justiça, ficasse por satisfazer.

7.
Decisão.
Termos em que e sem necessidade de mais considerações, se acorda desatender o recurso e, consequentemente, confirmar a decisão.

Custas pelos recorrentes.
Lisboa, 2007.03.13
Carlos Moreira
Isoleta Almeida Costa
Rosário Gonçalves