Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
796/17.0T8OER-A.L1-2
Relator: ANTÓNIO MOREIRA
Descritores: EXECUÇÃO
EMBARGOS DE EXECUTADO
ABUSO DE DIREITO
LITISPENDÊNCIA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 11/15/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: 1- Não constitui abuso de direito a instauração pela exequente de acção executiva contra a executada, com apresentação (como título executivo) de documento autenticado que contém um acordo entre as partes, nos termos do qual a executada se confessa e declara ser devedora à exequente da quantia de € 190.000,00, a pagar em três prestações iguais, mensais e sucessivas de € 63.333,33, já vencidas, e apesar de constar desse mesmo documento que “as partes comprometem-se a diligenciar e a envidar todos os esforços de modo a resolver por acordo qualquer litígio ou dúvidas de interpretação que possam eventualmente resultar ou emergir deste ACORDO ou de qualquer uma das respectivas cláusulas nele previstas”, uma vez que a executada não alega que se tenha manifestado qualquer controvérsia entre as partes sobre qualquer questão relacionada com a força executiva desse documento.
2- Não há litispendência quando o credor, depois de instaurar execução hipotecária, reclama o seu crédito numa outra execução movida por um terceiro, em que foi penhorado o imóvel sobre o qual dispõe da referida garantia hipotecária.
3- Não constitui fundamento de embargos de executado a circunstância do agente de execução, em execução hipotecária, não ter iniciado a penhora pelo imóvel hipotecado, antes tendo tentado a penhora de direitos de crédito da executada.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo assinados:
Lara V. intentou contra C., S.A. execução para pagamento da quantia de € 126.666,66, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, indicando e apresentando como título executivo documento autenticado correspondente a um acordo reduzido a escrito e assinado por ambas as partes, de cujo teor decorre que a executada “reconhece, confessa e declara ser devedora a LBV [a exequente] no valor total de € 190.000,00 (…)”, mais declarando que tal montante “será pago pela [C., S.A.] do seguinte modo: a) o montante de € 63.333,33 (…) será liquidado até ao dia 18/08/2015; b) o montante de € 63.333,33 (…) será liquidado até ao dia 18/09/2015; c) o montante de € 63.333,33 (…) será liquidado até ao dia 18/10/2015”.
Mais alegou a exequente nesse requerimento executivo:
6. Para garantia do pagamento da quantia total de € 190.000,00 (…), a Executada constituiu, em 06 de Agosto de 2015, hipoteca em segundo grau a favor da Exequente, sobre a fração autónoma individualizada pela letra F, correspondente ao segundo andar B (piso dois), destinado a habitação, com um estacionamento designado pelo n.º 16 e uma arrecadação designada pelo n.º 12, ambos na cave (piso –dois), integrada no prédio urbano em regime de propriedade horizontal denominado “J...”, sito na Rua P..., inscrito na respetiva matriz sob o artigo 6... da União das freguesias de Carcavelos e Parede, descrito na Primeira Conservatória do Registo Predial de Cascais sob o n.º 2..., conforme cópias da escritura de constituição de hipoteca, certidão predial e caderneta predial que se juntam como docs. 2, 3 e 4 e que aqui se dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais.
7. Cumpre referir que, supostamente para pagamento da primeira prestação acordada, a Executada entregou à Exequente um cheque, identificado pelo n.º 5966751032, no valor de € 63.333,33 (…) o qual, apresentado a pagamento junto instituição bancária “Banco BIC Português, S.A.”, foi devolvido com a menção de “extraviado”.
8. Face ao supra exposto, e na falta de prestação de informações por parte da referida entidade bancária sobre o alegado extravio do mencionado cheque – que, como a Executada bem sabe, não foi extraviado -, a ora Exequente viu-se forçada a intentar contra o “Banco BIC Português” a competente ação judicial, a qual, sob o n.º de processo 2955/17.7T8LSB, corre termos pelo Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, Juízo Central Cível - Juiz 16.
9. Cumpre relevar que, face à pendência da supra identificada ação judicial contra o “Banco BIC Português”, a quantia exequenda nos presentes autos não inclui o montante que deveria ter sido pago pelo cheque acima indicado, mas tão só o valor total correspondente às segunda e terceira prestações acordadas, vencidas e não pagas pela Executada”.
Citada a executada, veio deduzir oposição por embargos de executado, aí alegando, em síntese, que:
· Não entregou à exequente o cheque aludido no requerimento executivo com o nº 5966751032, no valor de € 63.333,33, apresentado a pagamento junto do Banco BIC Português, SA, já que tal cheque pertence à conta bancária da sociedade S., SA;
· O comportamento da exequente, ao intentar a acção principal de execução, é abusivo, nos termos do disposto no art.º 334º do Código Civil, já que o contrato apresentado como título executivo impunha que a resolução do litígio entre as partes fosse alcançada mediante entendimento, o que não foi observado pela exequente;
· A execução deve começar pela penhora do imóvel hipotecado à exequente, só podendo penhorar-se outros bens se for reconhecida a insuficiência da garantia;
· No âmbito da execução que corre termos sob o nº 6536/17.7T8LSB do Juízo de Execução de Lisboa, Juiz 8, a exequente reclamou o mesmo crédito cuja cobrança pretende na acção principal de execução, e com base nos mesmos factos, verificando-se uma situação de litispendência.
Recebidos os embargos, foi a exequente notificada para contestar, não o tendo feito, tendo então sido proferido despacho em que se julgaram confessados os factos que não se encontrassem em oposição com os expressamente alegados no requerimento executivo e tendo, na sequência desse despacho, sido apresentadas alegações, mas apenas pela exequente, aí sustentando que os embargos de executado constituem um expediente dilatório, já que nenhum facto relevante para a decisão da causa é apresentado, pelo que inexistem factos admitidos por ausência de contestação.
Foi então proferida sentença onde se conclui pela improcedência dos embargos de executado, sendo determinado o prosseguimento da execução.
A executada recorre desta sentença, terminando a sua alegação com as seguintes conclusões, que aqui se reproduzem:
A) A Embargante, ora Recorrente, alegou, nos embargos de executado deduzidos, duas situações distintas: (i) a de que não existiu qualquer contacto prévio da Exequente no sentido da resolução amigável de litígio emergente do não cumprimento tempestivo das obrigações pecuniárias assumidas pela Executada no mencionado “Acordo de Cessação do Contrato de Associação em Participação”, e (ii) a de que era falso que a Exequente tivesse realizado tentativas no sentido de lhe ser paga a quantia em dívida.
B) Não tendo a Embargada contestado os embargos de executado, o Tribunal “a quo” deveria ter considerado ambas as alegadas situações como provadas, no âmbito do despacho proferido a julgar confessados os factos.
C) Sendo que o litígio em que se funda a exceção de abuso do direito invocada nos embargos de executado corresponde precisamente à instauração direta da presente execução, com o inerente exercício ilegítimo de cobrança coerciva do crédito por parte da Exequente, sem a existência de uma prévia tentativa no sentido de lhe ser paga extrajudicialmente a quantia em dívida.
D) Termos em que o comportamento da Exequente, ao intentar a presente execução, traduz-se numa conduta manifestamente desleal face ao fim estabelecido naquele acordo e das obrigações nele assumidas, atentatória do mais elementar dever de boa-fé negocial, constituindo o exercício da exigibilidade do respetivo direito de crédito um manifesto abuso do direito, nos termos previstos no artigo 334º do Código Civil, o que torna ilegítima a presente atuação processual executiva e correspondente pretensão da Exequente sobre a Executada – exceção de deveria ter sido julgada procedente.
E) A prioridade com que deve ser realizada a diligência de penhora, encontrando-se a dívida exequenda garantida por hipoteca, deve começar, segundo estabelecem os artigos 697º do Código Civil e 752º, nº 1 do Código de Processo Civil, pelo imóvel sobre que incide tal garantia real, só podendo recair noutros bens quando se reconheça a respetiva insuficiência para conseguir o fim da execução.
F) Contudo, a sentença recorrida não tomou em consideração os factos que foram julgados confessados, por falta de contestação da Embargada aos embargos de execução, e que por isso deveriam ter sido dados como provados, até porque documentalmente demonstrados, nomeadamente as tentativas da Exequente lograr obter a penhora de créditos pertencentes à Executada no âmbito de dois outros processos judiciais, designadamente os Processos nºs 244/14.8T8AMT e 715-AS/1999.
G) Termos em que devia a sentença recorrida ter julgado procedente, por provada, a alegada violação dos artigos 697º do Código Civil e 752º, nº 1 do Código de Processo Civil, atendendo à conduta processual da Exequente.
H) Em face da penhora do mesmo bem imóvel dado neste autos em garantia, realizada anteriormente noutra execução, em relação à penhora que seria de realizar no âmbito da presente ação executiva, e sobre a qual foram reclamados créditos pela Exequente para precisamente poder obter, pelo produto daquele, o pagamento do seu crédito, entende-se estarem preenchidos os requisitos legais da litispendência, na medida em que estamos perante a repetição de uma causa, havendo identidade de sujeito credor, de pedido (obtenção do mesmo efeito jurídico) e identidade de causa de pedir uma vez que a pretensão deduzida procede do mesmo facto jurídico, nos termos dos artigos 580º a 582º do Código de Processo Civil.
I) Termos em que devia a sentença recorrida ter julgado procedente, por provada, a alegada exceção dilatória de litispendência, com todas as consequências legais.
A exequente apresentou alegação de resposta, aí defendendo a manutenção do decidido.
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Sendo o objecto do recurso balizado pelas conclusões do apelante, as questões submetidas a recurso, delimitadas pelas aludidas conclusões, prendem‑se com:
· A verificação da excepção do abuso de direito, correspondente ao exercício do recurso à cobrança coerciva sem prévia tentativa de obtenção do pagamento por via extrajudicial;
· A verificação da excepção da litispendência;
· A violação do disposto no art.º 697º do Código Civil e no art.º 752º, nº 1, do Novo Código de Processo Civil.
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A materialidade com relevo para o conhecimento do objecto do presente recurso é a que decorre das ocorrências e dinâmica processual expostas no relatório que antecede, havendo apenas que acrescentar, por decorrer implicitamente da sentença recorrida, que no documento autenticado apresentado como título executivo, que corresponde a um acordo subscrito por ambas as partes, consta do nº 1 da cláusula sexta que “As partes comprometem-se a diligenciar e a envidar todos os esforços de modo a resolver por acordo qualquer litígio ou dúvidas de interpretação que possam eventualmente resultar ou emergir deste ACORDO ou de qualquer uma das respectivas cláusulas nele previstas”.
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Da verificação da excepção do abuso de direito
Nos termos do disposto no art.º 334º do Novo Código de Processo Civil “é ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito”.
O excesso manifesto dos limites impostos pela boa-fé ocorre quando o titular do direito viola o princípio da confiança que nele foi depositada pela contraparte, através da prévia aquisição da expectativa de uma conduta de sinal contrário à que se mostra adoptada.
Este sentido interpretativo é aquele que é seguido pela jurisprudência do S.T.J., como no acórdão de 12/2/2009 (relatado por Azevedo Ramos e disponível em www.dgsi.pt), aí se referindo que “no âmbito da fórmula “manifesto excesso” cabe a figura da conduta contraditória (venire contra factum proprium), que se inscreve no contexto da violação do princípio da confiança, que sucede quando o agente adopta uma conduta inconciliável com as expectativas adquiridas pela contraparte, em função do modo como antes actuara”. E no mesmo acórdão refere-se ainda que “o abuso do direito só deve funcionar em situações de emergência, para evitar violações chocantes do direito e da justiça”.
Ou seja, e tendo presente o caso concreto, a propositura da acção executiva só se pode classificar como abusiva, nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 334º do Código Civil, na medida em que da conduta das partes, aquando da outorga do acordo pelo qual a executada se declarou devedora à exequente da quantia de € 190.000,00, a pagar em três prestações mensais, iguais e sucessivas, com vencimento em 18/8/2015, 18/9/2015 e 18/10/2015, decorra que a exequente criou na executada a expectativa de que não poderia lançar mão da acção executiva para a realização coactiva da obrigação pecuniária em questão, sem que antes diligenciasse e envidasse “todos os esforços de modo a resolver por acordo” a questão do incumprimento da referida obrigação pecuniária.
Mas a contradição entre o conceito de direito à acção executiva (que pressupõe e prevê a existência de título executivo, e que no caso de se tratar de título extrajudicial há-de corresponder ao documento autêntico ou autenticado que importe a constituição ou reconhecimento de uma obrigação perante o credor, como emerge do art.º 703º, nº 1, al. b), do Novo Código de Processo Civil) e o conceito de litígio a resolver por acordo, é patente, afastando a interpretação pretendida pela executada.
É que a referência ao litígio pressupõe a existência de uma controvérsia sobre o direito, só assim sendo possível terminar o mesmo por transacção, através de concessões recíprocas (como decorre da noção de transacção de emerge do art.º 1248º do Código Civil).
Mas estando em causa a constituição de uma obrigação pecuniária pela executada, em documento que reveste todas as características de título executivo, a expectativa de confiança criada para cada uma das partes é que o litígio previsto nesse documento, relativamente ao qual as partes assumem o compromisso de “diligenciar e envidar todos os esforços” para a sua resolução, não pode ser o respeitante a qualquer controvérsia sobre o cumprimento da obrigação pecuniária (ou falta desse cumprimento), e do consequente direito à acção executiva (que assiste à exequente), para realização coactiva da obrigação em questão.
Assim, apresentando a exequente tal documento como título executivo, e não estando alegado pela executada que se tenha manifestado entre as partes qualquer controvérsia sobre qualquer questão relacionada com a sua força executiva (e desde logo não correspondendo à verdade a afirmação constante no ponto (i) da conclusão A) da sua alegação, no sentido de ter alegado na P.I. dos embargos que “não existiu qualquer contacto prévio da Exequente no sentido da resolução amigável de litígio emergente do não cumprimento tempestivo das obrigações pecuniárias assumidas pela Executada no mencionado “Acordo de Cessação do Contrato de Associação em Participação””), não se vê como é que a conduta da exequente é susceptível de ser caracterizada como excedendo manifestamente os limites impostos pela boa-fé, desde logo porque não se assume como violadora de qualquer princípio da confiança que haja sido em si depositada pela executada, no sentido de não haver lugar à demanda executiva em caso de incumprimento da obrigação pecuniária constituída no referido documento autenticado (sem que antes a exequente dialogasse consigo).
E sendo, para tanto, irrelevante, a existência (ou não) de tentativas da exequente no sentido da quantia exequenda lhe ser paga pela executada, não só porque tal não demonstra a existência de qualquer controvérsia sobre o direito de acção (executiva) da exequente, como porque as características da obrigação pecuniária constituída pela executada (designadamente o prazo certo de cada uma das prestações) dispensavam qualquer interpelação para cumprimento.
O que equivale a afirmar que, nesta parte, improcedem as conclusões do recurso da executada, não havendo que fazer qualquer censura à sentença recorrida, na parte em que afirmou não se verificar a invocada excepção do abuso no exercício do direito de acção da exequente.
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Da verificação da excepção da litispendência
Como decorre dos nº 1 e 2 do art.º 580º do Novo Código de Processo Civil, a excepção da litispendência pressupõe a repetição de uma causa, estando a anterior ainda em curso, e tem por fim evitar que o tribunal seja colocado na alternativa de contradizer ou de reproduzir uma decisão anterior.
No que respeita às acções executivas, não está em causa a tomada de uma decisão, no sentido e com o alcance que decorre dos nº 2 e 3 do art.º 10º do Novo Código de Processo Civil, mas antes a realização das providências adequadas à realização coactiva de uma obrigação devida ao credor, como decorre do nº 4, do mesmo art.º 10º.
Por outro lado, e no que respeita à pendência de mais de uma execução sobre os mesmos bens, dispõe o art.º 794º do Novo Código de Processo Civil, que é sustada aquela em que a penhora tiver sido posterior, podendo o exequente reclamar o crédito respectivo no processo em que a penhora seja mais antiga.
Como já ficou dito no acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 1/4/2008 (relatado por Rodrigues Pires e disponível em www.dgsi.pt):
A questão que então se coloca (…) é a de saber se a figura da litispendência é transponível para a reclamação de créditos em processo executivo.
Função que desapareceria se se desse relevância, nesta fase, ao instituto da litispendência.
Com efeito, credores com maiores garantias reais, afastados pela litispendência, assistiriam ao desaparecimento de parte do património do devedor, sem nada poderem fazer, perante o exercício de direitos por parte de credores com menores garantias.
Deste modo, estando-se na fase da realização coactiva da prestação, o critério que preside às reclamações de créditos é o da existência de garantias reais sobre os bens penhorados, de forma a que não se verifiquem atropelos aos direitos dos credores que tenham tais garantias.
Ora, como a existência de garantias reais pode ocorrer quanto a bens que tenham sido penhorados em processos diversos e como em relação a todos se verifica a cessação dessas garantias pela eventual venda dos bens, a reclamação simultânea em diversos processos é sempre legítima, excepto quando o crédito for pago em algum deles, porque então verificar-se-á facto extintivo ou modificativo (no caso de pagamento parcial) da obrigação”.
Assim, e como também aí se concluiu, não há litispendência quando o credor, depois de instaurar execução, vem reclamar o seu crédito numa outra execução movida por um terceiro em que foram penhorados bens sobre os quais dispõe de garantia real.
No caso concreto dos presentes autos o crédito exequendo está garantido por hipoteca. E o imóvel hipotecado foi penhorado numa outra acção executiva. Sendo que a exequente foi aí reclamar o crédito que aqui dá à execução, tendo em atenção a garantia real (hipoteca) de que goza, e para ser paga do mesmo pelo produto desse imóvel hipotecado.
Pelo que não se verifica a excepção dilatória da litispendência entre a referida reclamação de créditos e a execução à qual foram opostos os embargos, para efeitos de declarar extinta a mesma execução.
Aliás, e ainda que se pudesse afirmar a verificação da litispendência, como decorre do art.º 582º do Novo Código de Processo Civil a mesma só constituiria excepção a opor na execução onde a exequente foi (em 16/6/2017) reclamar o seu crédito, e nunca à execução intentada em 24/2/2017, à qual foram opostos estes embargos de executado.
O que equivale a afirmar que, também nesta parte, improcedem as conclusões do recurso da executada, não havendo que fazer qualquer censura à sentença recorrida, na parte em que afirmou não se verificar a invocada excepção dilatória da litispendência.
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Da violação do disposto no art.º 697º do Código Civil e no art.º 752º, nº 1, do Novo Código de Processo Civil
Do art.º 752º, nº 1, do Novo Código de Processo Civil, decorre que, sendo executada dívida provida de garantia real que onere bens pertencentes ao devedor, a penhora inicia-se pelos bens sobre que incide a garantia, só podendo recair em outros bens quando for reconhecida a insuficiência dos primeiros para conseguir o fim da execução (a realização coactiva da obrigação).
E o art.º 697º do Código Civil dispõe que o devedor que for dono da coisa hipotecada tem o direito de se opor não só a que outros bens sejam penhorados enquanto se não reconhecer a insuficiência da garantia, mas ainda a que, relativamente aos bens onerados, a execução se estenda além do necessário à satisfação do direito do credor.
Por outro lado dispõe a al. b) do nº 1 do art.º 784º do Novo Código de Processo Civil que é fundamento da oposição à penhora a imediata penhora de bens que só subsidiariamente respondem pela dívida exequenda.
E do nº 6 do art.º 785º do Novo Código de Processo Civil resulta que a procedência da oposição à penhora determina que o agente de execução proceda ao levantamento da penhora (e ao cancelamento de eventuais registos).
Por último, decorre do art.º 731º do Novo Código de Processo Civil que constituem fundamentos da oposição à execução baseada noutro título (que não sentença ou requerimento de injunção com aposição de fórmula executória), para além daqueles especificados no art.º 729º, todos os demais que possam ser invocados como defesa no processo de declaração. Ou seja, aqueles que decorrem do art.º 571º do Novo Código de Processo Civil.
Todavia, percorrendo as diversas alíneas do art.º 729º do Novo Código de Processo Civil, bem como o disposto no art.º 571º do Novo Código de Processo Civil, não se vê que a circunstância de se ter procedido à imediata penhora de bens que só subsidiariamente respondam pela dívida exequenda, constitua fundamento para a oposição à execução por embargos de executado.
Com efeito, a oposição à execução (por embargos de executado) e a oposição à penhora (através do incidente a que alude o art.º 785º do Novo Código de Processo Civil) são meios processuais distintos e que não se confundem.
E pretendendo a exequente obter a procedência dos embargos de executado, com o efeito típico que decorre do nº 4 do art.º 732º do Novo Código de Processo Civil (a extinção da execução, no todo ou em parte), nunca o alcançará através da invocação de fundamentos para a oposição à penhora.
O que equivale a dizer que, ainda que se verifiquem as circunstâncias de facto que a alude o art.º 697º do Código Civil e o art.º 752º, nº 1, do Novo Código de Processo Civil, daí não decorre a procedência dos embargos de executado, com a consequente extinção, no todo ou em parte, da execução.
Por outro lado, e no caso concreto dos autos, a exequente não promoveu qualquer penhora de outros bens ou direitos que não o imóvel hipotecado para garantia do cumprimento da obrigação exequenda (como decorre do requerimento para penhora apresentado com o requerimento executivo)
Antes resulta dos autos da acção executiva que foi o agente de execução que, por sua iniciativa, procurou concretizar a penhora de créditos invocada pela executada.
Pelo que, ainda que tivesse sido realizada pelo agente de execução a penhora de créditos invocada pela executada, tal circunstância não constituiria fundamento da oposição à execução por embargos de executado, mas tão só de oposição à penhora.
Assim, acompanha-se a sentença recorrida, quando afirma que “compulsados os autos principais verifica-se que, até ao momento, nenhuma penhora se encontra concretizada, sendo o reparo feito pela executada, por conseguinte, destituído de fundamento, pelo que não estão reunidos os pressupostos que permitiriam considerar ultrapassado o disposto nos referidos preceitos legais”.
E, nesta medida, também quanto a esta questão improcedem as conclusões do recurso da executada.

DECISÃO
Em face do exposto julga-se improcedente o recurso, mantendo-se a sentença recorrida.
Custas pela recorrente.
Lisboa, 15 de Novembro de 2018

António Moreira

Magda Geraldes

Farinha Alves