Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
7102/18.5P8LSB-A.L1-5
Relator: LUÍSA MARIA DA ROCHA OLIVEIRA ALVOEIRO
Descritores: PERDÃO
CRIME DE ROUBO
EXCLUSÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 11/28/2023
Votação: MAIORIA COM * VOT VENC
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECURSO PENAL EM SEPARADO
Decisão: PROCEDENTE
Sumário: Está excluído do benefício do perdão previsto na Lei n.º 38-A/20023, de 2 de agosto, o crime de roubo na sua forma de consumação simples, tipificada pelo art.º 210º, nº 1 do Código Penal, por se enquadrar no círculo de crimes cujas vítimas são, sempre e independentemente da respetiva condição, idade ou proveniência, “especialmente vulneráveis” e por isso se encontrar abrangido pela alínea g) do nº 1 do art.º 7º da Lei.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordaram, em conferência, os Juízes Desembargadores da 5ª secção criminal do Tribunal da Relação de Lisboa:

I. RELATÓRIO
Por despacho proferido a 07.08.2023 foi declarado perdoado 1 ano de prisão à pena em que o arguido … foi condenado nestes autos, sob condição resolutiva de o arguido, até ao dia 1 de setembro de 2024, não incorrer na prática de infração dolosa, nos termos conjugados do disposto nos art.º 3º nº 1 e 8º nº 1 da Lei nº 38-A/2023, de 2 de agosto, e foi declarada extinta a pena, quer pelo seu cumprimento, quer pelo perdão (sem prejuízo da sua revogação por violação da condição), nos termos do art.º 127º do C.Penal.
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O Ministério Público veio recorrer do despacho, formulando as seguintes conclusões:
“1. Por despacho de 07 de Agosto de 2023 foi aplicado o perdão de um ano à pena em que o arguido … foi condenado e determinada a sua libertação, tendo por referência que com tal perdão o mesmo atinge o termo da sua pena a 01 de Setembro de 2023.
2. O despacho sob recurso na verificação dos pressupostos da aplicação da Lei 38 A/2023 de 02 de Agosto conclui que o arguido tinha 27 anos à data da prática dos factos (nasceu a 20.06.1991 e os factos foram praticados a 30.06.2018 e 03.07.2018) estando assim verificado o âmbito decorrente do art.º 2º nº1.
3. Todavia o despacho em causa decide que: Assim, verifica-se que arguido se encontra dentro do âmbito de aplicação da referida Lei sendo que o crime pelo qual foi condenado não se encontra previsto nas excepções contempladas no artigo 7º da mesma; nomeadamente na excepção prevista na alínea b) relativa ao âmbito dos crimes contra o património e que exclui apenas o roubo agravado previsto no artigo 210º nº2 do Código Penal.
4. O que manifestamente decorre de uma errada aplicação da norma, omitindo-se a verificação da excepção prevista na alínea g) do art.º 7º conjugada com o disposto no art.º 67ºA, do qual decorre o seu número 3, do Código de Processo Penal (para o qual expressamente remete) e do art.º 1º al. j) do Código de Processo Penal que define criminalidade especialmente violenta.
5. Da conjugação de tais normas decorre que as vítimas de crime de roubo, no qual se inclui o previsto no art.º 210º nº1 do Código Penal são vítimas especialmente vulneráveis, não podendo as penas aplicadas pela prática do crime de roubo serem perdoadas.
6. Nos presentes autos o arguido … foi condenado por acórdão transitado em julgado a 15 de Abril de 2019 pela prática de cinco crimes de roubo previstos e punidos pelo art.º 210º nº1 do Código Penal, pelo que praticou cinco crimes cujas vítimas se enquadram sempre na noção de vítima especialmente vulnerável, pois o crime de roubo comporta uma conduta dolosamente dirigida contra (nomeadamente) a integridade física e a liberdade pessoal, pelo que, estamos perante a classificação legal de criminalidade violenta e é também especialmente violenta por a pena máxima aplicável ser igual a oito anos (cfr. Art.ºs 1.º, alíneas j) e l), do Código de Processo Penal).
7. Motivo pelo qual, nunca poderia ter sido aplicado o perdão de um ano na pena única em que o arguido foi condenado nos presentes autos e ao fazê-lo o despacho sob recurso violou manifestamente o disposto no art.º 7º al. g) da Lei 38-A/2023 de 02 de Agosto.
8. Face a todo o exposto deverá o despacho sob recurso ser revogada e substituído por outro que conclua pela não aplicação do perdão à pena em que o arguido foi condenado sendo emitidos os competentes mandados de detenção para cumprimento do remanescente da pena em que foi condenado, nos exatos termos em que se encontrava até o despacho de 07 de Agosto de 2023 declarando-se nulo o processado posterior”.
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O recurso foi admitido para este Tribunal da Relação de Lisboa, por despacho datado de 13 de setembro de 2023, com subida imediata, em separado e com efeito meramente devolutivo.
Nesta Relação, a Ex.ma Senhora Procuradora-geral Adjunta emitiu parecer no sentido da “procedência do recurso, e subscrevendo-se a argumentação da Exmª Magistrada do Ministério Público junto da 1ª instância, pugna-se pela revogação do despacho recorrido e pela sua substituição por outro que conclua pela não aplicação do perdão à pena em que o arguido foi condenado, com emissão dos competentes mandados de detenção para cumprimento do remanescente da pena, nos exatos termos em que se encontrava até o despacho de 07 de Agosto de 2023 declarando-se nulo o processado posterior”.
Foi cumprido o estabelecido no artigo 417º, n.º 2 do C.P.Penal.
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Proferido despacho liminar e colhidos os “vistos”, teve lugar a conferência.
Cumpre apreciar e decidir.
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II. OBJETO DO RECURSO
Conforme é jurisprudência assente (cfr. Acórdão do STJ, de 15/04/2010, acessível em www.dgsi.pt: “… é pelas conclusões extraídas pelo recorrente na motivação apresentada, em que resume as razões do pedido que se define o âmbito do recurso. É à luz das conclusões da motivação do recurso que este terá de apreciar-se, donde resulta que o essencial e o limite de todas as questões a apreciar e a decidir no recurso, estão contidos nas conclusões (…)”, o âmbito do recurso delimita-se pelas conclusões extraídas pelo recorrente (das quais devem constar de forma sintética os argumentos relevantes em sede de recurso) a partir da respetiva motivação.
Pelo que “[a]s conclusões, como súmula da fundamentação, encerram, por assim dizer, a delimitação do objeto do recurso. Daí a sua importância. Não se estranha, pois, que se exija que devam ser pertinentes, reportadas e assentes na fundamentação antecedente, concisas, precisas e claras” (Pereira Madeira, Art.º 412.º/ nota 3, Código de Processo Penal Comentado, Coimbra: Almedina, 2021, 3.ª ed., p. 1360 – mencionado no Acórdão do STJ, de 06.06.2023, acessível em www.dgsi.pt).
Isto, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer (artigo 412º, nº 1 do C.P.Penal).
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Face às conclusões extraídas pelo recorrente da motivação apresentada, cumpre apreciar se estão reunidos os pressupostos para que o arguido/condenado beneficie do perdão previsto na Lei nº 38-A/2023, de 2 de agosto.
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III. FUNDAMENTAÇÃO
1. Por Acórdão proferido em 14.03.2019, transitado em julgado em 15.04.2019, o tribunal decidiu:
 “a) Absolver o arguido, …, da prática de dois crimes de roubo agravado (previstos e punidos pelo artigo 210.º, n.ºs 1 e 2, al. b), com referência ao artigo 204.º, n.º 2, al. f), ambos do Código Penal) que lhe foram imputados pelo Ministério Público;
b) Condenar o arguido, …, pela prática de três crimes de roubo simples (previstos e punidos pelo artigo 210.º, n.º 1, do Código Penal) nas penas de 2 (dois) anos e 3 (três) meses de prisão por cada um deles;
c) Condenar o arguido, …, pela prática de um outro crime de roubo simples (previsto e punido pelo artigo 210.º, n.º 1, do Código Penal) na pena de 2 (dois) anos e 9 (nove) meses de prisão;
d) Condenar o arguido, …, pela prática de um outro crime de roubo simples (previsto e punido pelo artigo 210.º, n.º 1, do Código Penal) na pena de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de prisão;
e) Condenar o arguido, …, operando o cúmulo jurídico das penas aplicadas em b) a d), na pena única de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão;
f) Condenar cada o arguido no pagamento de 3 U.C. de taxa de justiça, acrescida das demais custas do processo, tudo conforme o disposto nos artigos 513º e 514º do Código de Processo Penal e os artigos 8º/5 e 16º do Regulamento das Custas Processuais;
g) Determinar a notificação de … para levantar o telemóvel que lhe pertence e se encontra apreendido nos autos, nos termos do artigo 186.º, n.º 3, do Código de Processo Penal;
h) Declarar perdidos a favor do Estado os objectos identificados a fls. 36, determinando a entrega da pistola à PSP, em conformidade com o disposto no artigo 78º da Lei nº 5/2006, de 23/02 (na sua actual redacção)”.
2. Por despacho proferido em 26.04.2019 foi homologada a seguinte liquidação da pena efetuada pelo Ministério Público:
“LIQUIDAÇÃO DA PENA DO ARGUIDO
…………..
Acórdão: 14.03.2019 (cfr. fls. 380 a 399).
Trânsito em julgado: 15.04.2019. (cfr. fls. 412)
Pena: 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão.
Detenção: detido ininterruptamente desde 10-07-2018 (cfr. fls. 60 a 61 e 90 a 98)
Assim, os marcos relevantes da sua pena, para efeitos de apreciação da liberdade condicional e termo da mesma, caso não venham a ser apurados outros descontos a efectuar, serão atingidos nas seguintes datas:
Meio da pena = 10.04.2021
Dois Terços da pena = 10.03.2022
Termo da Pena = 10.01.2024”.
3. O arguido nasceu em 20.06.1991 e praticou os factos objeto do presente processo em 30.06.2018 e em 03.07.2018;
4. Despacho recorrido proferido em 07.08.2023 (que se transcreve totalmente):
“A Lei nº 38-A/2023, de 2 de Agosto, vem estabelecer um perdão de penas e uma amnistia de infracções por ocasião da realização em Portugal da Jornada Mundial da Juventude; entrando em vigor no próximo dia 1 de Setembro de 2023.
Estabelece a referida Lei, no seu artigo 2º nº1, que “Estão abrangidas pela presente lei as sanções penais relativas aos ilícitos praticados até às 00:00 horas de 19 de Junho de 2023, por pessoas que tenham entre os 16 e 30 anos de idade à data da prática do facto, nos termos definidos nos artigos 3º e 4º”.
Por seu turno estabelece o artigo 3º, com a epígrafe “Perdão de penas” que:
1 - Sem prejuízo do disposto no artigo 4.º, é perdoado 1 ano de prisão a todas as penas de prisão até 8 anos.
2 - São ainda perdoadas:
a) As penas de multa até 120 dias a título principal ou em substituição de penas de prisão;
b) A prisão subsidiária resultante da conversão da pena de multa;
c) A pena de prisão por não cumprimento da pena de multa de substituição; e
d) As demais penas de substituição, exceto a suspensão da execução da pena de prisão subordinada ao cumprimento de deveres ou de regras de conduta ou acompanhada de regime de prova.
3 - O perdão previsto no n.º 1 pode ter lugar sendo revogada a suspensão da execução da pena.
4 - Em caso de condenação em cúmulo jurídico, o perdão incide sobre a pena única.
5 - O disposto no n.º 1 abrange a execução da pena em regime de permanência na habitação.
6 - O perdão previsto no presente artigo é materialmente adicionável a perdões anteriores.”
Compulsados os presentes autos, constata-se que o arguido …, por acórdão proferido em 14.3.2019, transitado em julgado em 15.4.2019, foi condenado pela prática de cinco crimes de roubo, previsto e punido pelo artigo 210º nº1 do Código Penal, na pena única de 5 anos e 6 meses de prisão.
O arguido encontra-se presentemente detido à ordem dos presentes autos, como melhor resulta de fls. 474 e seguintes.
O arguido nasceu em 20.6.1991 tendo praticado os factos objecto do presente processo em 30.6.2018 e em 3.7.2018, ou seja, quando contava 27 anos de idade.
Assim, verifica-se que arguido se encontra dentro do âmbito de aplicação da referida Lei sendo que o crime pelo qual foi condenado não se encontra previsto nas excepções contempladas no artigo 7º da mesma; nomeadamente na excepção prevista na alínea b) relativa ao âmbito dos crimes contra o património e que exclui apenas o roubo agravado previsto no artigo 210º nº2 do Código Penal.
A Lei nº 38-A/2023, de 2 de Agosto, prevê, contudo, no artigo 8º nº 1 que o perdão é concedido sob condição resolutiva de o beneficiário não praticar infracção dolosa no ano subsequente à sua entrada em vigor, ou seja até 1.09.2024, caso em que à pena aplicada à infracção superveniente acresce o cumprimento da pena ou parte da pena perdoada.
Assim, em face do exposto, com efeitos a produzir no dia 1 de Setembro de 2023, declara-se perdoado 1 ano de prisão à pena em que foi condenado nestes autos, sob condição resolutiva de o arguido até ao dia 1 de Setembro de 2024 não incorrer na prática de infração dolosa; nos termos conjugados do disposto nos artigos 3º nº 1 e 8º nº 1 da Lei nº38-A/2023, de 2 de Agosto.
Mais se declara extinta a pena, quer pelo seu cumprimento, quer pelo perdão (sem prejuízo da sua revogação por violação da condição), nos termos dos Artigos 127º do Código Penal.
Notifique de imediato o arguido, o Ilustre Defensor e o Ministério Público.
Após, emita os competentes mandados de libertação, os quais deverão ser remetidos ao EP antes do dia 1.9.2023, por forma a que, nesse dia, sejam de imediato cumpridos”.
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Apreciação do recurso
O arguido … foi condenado, por Acórdão proferido em 14.03.2019, transitado em julgado em 15.04.2019, pela prática, em 30.06.2018 e 03.07.2018, de cinco crimes de roubo previsto e punido pelo art.º 210º, nº 1 do C.Penal, na pena única de cinco anos e seis meses de prisão.
Por despacho proferido em 07.08.2023, o Tribunal a quo considerou que a situação processual do arguido se encontra abrangida pelo âmbito de aplicação da Lei nº 38-A/2023, de 2 de agosto (uma vez que, à data da prática dos factos objeto do presente processo contava com 27 anos de dade  e o crime pelo qual foi condenado não se encontra previsto nas exceções contempladas no art.º 7º do mencionado diploma legal nomeadamente na exceção prevista na alínea b) relativa ao âmbito dos crime contra o património, a qual exclui apenas o roubo agravado previsto no art.º 210º, nº 2 do C.Penal) e, consequentemente, declarou perdoado um ano de prisão à pena em que o arguido foi condenado nestes autos, sob condição resolutiva de o arguido, até ao dia 1 de setembro de 2024, não incorrer na prática de infração dolosa (nos termos conjugados do disposto nos artigos 3º nº 1 e 8º nº 1 da Lei nº38-A/2023, de 2 de agosto).
O recorrente entende que não poderia ter sido aplicado o perdão de um ano na pena única em que o arguido foi condenado nos presentes autos por se verificar a exceção prevista na alínea g) do art.º 7º do mencionado diploma legal.
Vejamos se assiste razão ao recorrente.
No dia 1 de setembro de 2023 entrou em vigor a Lei nº 38-A/2023, de 2 de agosto, que estabelece um perdão de penas e uma amnistia de infrações por ocasião da realização em Portugal da Jornada Mundial da Juventude (art.º 1º).
Nos termos do art.º 2º, nº 1 “estão abrangidas pela presente lei as sanções penais relativas aos ilícitos praticados até às 00:00 horas de 19 de junho de 2023, por pessoas que tenham entre os 16 e 30 anos de idade à data da prática do facto, nos termos definidos nos artigos 3º e 4º” e nos termos do art.º 3º, nº 1 e 4 “1 - Sem prejuízo do disposto no artigo 4.º, é perdoado 1 ano de prisão a todas as penas de prisão até 8 anos; 4 - Em caso de condenação em cúmulo jurídico, o perdão incide sobre a pena única”.
No caso vertente, considerando que à data da prática dos factos objeto do presente processo o arguido tinha 27 anos de idade, encontram-se indubitavelmente preenchidos os pressupostos consagrados no supra referido art.º 2º, nº 1.
Impõe-se, então, analisar se os crimes de roubo p. e p. pelo art.º 210º, nº 1 do CPenal estão, ou não, abrangidos pelas variadíssimas exceções constantes do art.º 7º.
Efetivamente, da leitura de tal artigo conclui-se que o seu nº 1, al. b) exclui do perdão e da amnistia previstos na referida Lei nº 38-A/2023, de 2 de agosto, no âmbito dos crimes contra o património, os condenados por roubo previsto no nº 2 do art.º 210º do C.Penal.
Analisados os trabalhos parlamentares prévios à aprovação da referida Lei da Amnistia e do Perdão (disponíveis em https://www.parlamento.pt/ActividadeParlamentar/Paginas/DetalheIniciativa.aspx?BID=173095) verificamos que a proposta inicial do Governo excluía do perdão e da amnistia o crime de roubo “em residências ou na via pública cometido com arma de fogo ou arma branca, previsto no art.º 210º do Código Penal”.
Posteriormente, em 10 de julho de 2023, o Grupo Parlamentar do PSD apresentou proposta de alteração que excluía do perdão e da amnistia os condenados por crime de roubo previsto no art.º 210º do Código Penal. Já a Proposta de alteração apresentada pelo Grupo Parlamentar do PS, em 14 de julho de 2023, apenas excluía do perdão e da amnistia os condenados pela prática do crime de roubo agravado, previsto no nº 2 do art.º 210º do Código Penal, tendo sido esta proposta que acabou por ficar consagrada no texto final do art.º 7º, al. b), subalínea i)., da Lei nº 38-A/2023, de 2 de agosto.
Assim e face à redação definitiva que fez vencimento quanto a esse dispositivo e considerado apenas o bem jurídico protegido e os elementos constitutivos do particular tipo de crime (in casu, no que respeita ao catálogo de exclusões respeitante aos crimes contra o património), há que concluir que os condenados por crime de roubo previsto no nº 1 do art.º 210º do CPenal não estão excluídos do benefício do perdão e da amnistia previstos na presente lei na medida em que a mencionada subalínea i) da alínea b) do nº 2 do art.º 7º apenas exclui os condenados por crime de roubo previsto no nº 2 do art.º 210º do C.Penal (tendo sido intencional o concreto âmbito dessa exclusão do nº 1, isto se considerado o chumbo da proposta de alteração apresentada pelo Grupo Parlamentar do PSD) .
Porém, “o facto de um crime não constar no elenco daqueles que, por si só, determinam a exclusão das medidas estabelecidas na Lei em análise, não impede que o respetivo agente possa, ainda assim, não beneficiar destas por força das demais exceções igualmente previstas”, como bem refere Pedro Brito no seu estudo “Notas práticas referentes à Lei n.º 38-A/20023, de 2 de agosto, que estabelece um perdão de penas e uma amnistia de infrações por ocasião da realização em Portugal da Jornada Mundial da Juventude”, in JULGAR Online, agosto de 2013, pág. 30.
Com efeito, é de ponderar que o art.º 7º, al. g), focalizado nas vítimas dos crimes (e já não no concreto tipo de crime), exclui do perdão e da amnistia previstos na presente lei “os condenados por crimes praticados contra crianças, jovens e vítimas especialmente vulneráveis, nos termos do art.º 67º-A do Código de Processo Penal, aprovado em anexo ao Decreto-Lei nº 78/87, de 17 de fevereiro”.
Ora, dos já referidos trabalhos parlamentares prévios à aprovação da referida Lei da Amnistia e do Perdão (disponíveis em https://www.parlamento.pt/ActividadeParlamentar/Paginas/DetalheIniciativa.aspx?BID=173095) verifica-se que também esta alínea g). acabou por ter uma redação distinta da inicialmente contante da proposta de lei apresentada pelo Governo.
Com efeito, esta proposta inicial do Governo excluía do perdão e da amnistia “g) Os condenados por crimes praticados contra vítimas especialmente vulneráveis, incluindo as crianças e os jovens, as mulheres grávidas e as pessoas idosas, doentes, pessoas com deficiência e imigrantes”, mas a redação final que fez vencimento resultou de uma proposta de alteração apresentada pelo Grupo Parlamentar do PS que excluía do perdão e da amnistia “g) Os condenados por crimes praticados contra crianças, jovens e vítimas especialmente vulneráveis, nos termos do artigo 67.º-A do Código de Processo Penal”.
Tendo ambas as referidas alterações resultado da mesma proposta de alteração do mesmo grupo parlamentar, não poderá argumentar-se que se pretendeu incluir o crime de roubo na sua forma simples de consumação no âmbito das situações passíveis de beneficiar do perdão, antes haverá que presumir a congruência de tais propostas e consequentemente considerar que visaram conferir maior rigor jurídico ao texto da lei (não obstante, ainda assim, não constituir um texto legislativo exemplar) com vista à definição o mais precisa possível das várias situações em que se exclui a aplicação do perdão e da amnistia.
Por conseguinte, não obstante a situação em apreço não se mostrar incluída no art.º 7º, nº 1, al. b), subalínea i). é forçoso concluir que a mesma encontra acolhimento na alínea g) do nº 1 do art.º 7º, na medida em que a vítima do crime de roubo previsto e punido pelo artº 210º, nº 1 do C.Penal é considerada uma vítima especialmente vulnerável, pelo que o seu agente não poderá beneficiar do perdão da pena aplicada por tal crime, por força da mencionada al. g) do nº 1 do preceito em análise.
Efetivamente, nos termos do disposto no art.º 67º-A, nº 1, al. b) do C.P.Penal considera-se “Vítima especialmente vulnerável, a vítima cuja especial fragilidade resulte, nomeadamente, da sua idade, do seu estado de saúde ou de deficiência, bem como do facto de o tipo, o grau e a duração da vitimização haver resultado em lesões com consequências graves no seu equilíbrio psicológico ou nas condições da sua integração social” e prevê o nº 3  que “as vítimas de criminalidade violenta, de criminalidade especialmente violenta e de terrorismo são sempre consideradas vítimas especialmente vulneráveis para efeitos do disposto na alínea b) do n.º 1”.
O mencionado preceito legal remete-nos, por conseguinte, para o disposto no art.º 1º, als. j) e l) do C.P.Penal que consideram como “Criminalidade violenta as condutas que dolosamente se dirigirem contra a vida, a integridade física, a liberdade pessoal, a liberdade e autodeterminação sexual ou a autoridade pública e forem puníveis com pena de prisão de máximo igual ou superior a 5 anos” e como “Criminalidade especialmente violenta as condutas previstas na alínea anterior puníveis com pena de prisão de máximo igual ou superior a 8 anos”.
Ora, sendo o crime de roubo previsto no artº 210º, nº 1 do C.Penal punido com uma pena de prisão igual ou superior a 5 anos (mais concretamente até 8 anos), o mesmo integra indubitavelmente o conceito de criminalidade especialmente violenta, como resulta expressamente do disposto no art.º 1.º, al. l), do C.P.Penal, e vem sendo defendido na jurisprudência.
A título de exemplo, veja-se o Ac. STJ 13-12-2017, proc. 1239/09.9TAFIG.S1, onde se refere que o crime de “roubo é, hoje, um crime temível, sobretudo quando emergente de grupos, sempre de difícil controle, imprevisibilidade de acção, usando os seus agentes, por vezes, meios de actuação sofisticados, deslocalizando-se com facilidade, tornando mais complexa a sua neutralização, com o  que a  pertinência a essa forma de  acção  traz um “plus” de culpa e de ilicitude, de censura e antijuridicidade, antinormativismo. No conceito de violência se integram, por ex.º, o bater, entravar, agarrar, amarrar, deitar ao chão e o retirar da mão, com força, um telemóvel, esclarece, José Hurtado  Pozo –Droit Penal, Parte  Spécial, 2009, 290. Actualmente a perigosidade da criminalidade violenta contra o património tende a esbater-se,  para dar-se mais relevo à percepção do desvalor do valor social do roubo, visto como uma grave forma de ataque às pessoas, cujas vítimas preferidas são os idosos, doentes, crianças e mulheres, justamente os mais desprotegidos do tecido social, escreveram Giovanni Fiandaca e Enzo Musco , Diritto Penale , Parte Speciale, vol. II, II, 5.ª ed. , 2012, 160”[1].
Nessa medida, mesmo na sua forma de consumação simples, tipificada pelo artº 210º, nº 1 do C.Penal, o crime de roubo, por se integrar no círculo de crimes cujas vítimas são, sempre e independentemente da respetiva condição, idade ou proveniência, “especialmente vulneráveis”, está excluído do benefício do perdão previsto na Lei n.º 38-A/20023, de 2 de agosto.
Neste sentido se pronuncia, aliás, Pedro Brito no já citado escrito (págs. 31 e 32) quando refere que “apesar de o crime de roubo, previsto e punido pelo art.º 210.º, n.º 1, do C.P., não constar elencado no n.º 1, al. b), i), da Lei em análise, onde apenas se faz referência, na parte que agora interessa, ao roubo agravado, p. e p. pelo art.º 210.º, n.º 2, do C.P., o certo é que a vítima daquele será sempre uma vítima especialmente vulnerável, pelo que o seu agente também não poderá beneficiar do perdão da pena aplicada por tal crime por força do n.º 1, al. g), do preceito em análise. Na verdade, cumpre salientar que o crime de roubo, previsto no art.º 210.º, n.º 1, do C.P., punido com uma pena de prisão até 8 anos, integra o conceito de criminalidade especialmente violenta (cfr. art.º 1.º, al. l), do C.P.P.). Na verdade, o crime de roubo traduz-se numa conduta dolosa dirigida contra, pelo menos, a integridade física da pessoa que é vítima do assalto, sendo a violência típica do roubo a violência específica do ato apropriativo, sob a forma de emprego de força física, maior ou menor, pelo que sempre terá que se considerar verificado o requisito que determina a sua integração em tal conceito. Assim, pelas mesmas razões, também o crime de roubo, na forma tentada, previsto no art.º 210.º, n.º 1, do C.P., punido com uma pena de prisão superior a 5 anos, integra o conceito de criminalidade violenta (cfr. art.º 1.º, al. j), do C.P.)”.
Nestes termos e considerando que os crimes de roubo p. e p. pelo artigo 210º nº 1 do CPenal, pelos quais o arguido foi condenado, ofendem vítimas legal e expressamente qualificadas como “especialmente vulneráveis”, é de concluir pela verificação da exceção constante da al. g) do nº 1 do art.º 7º da Lei nº 38º-A2023, de 2 de agosto, pelo que não pode o arguido beneficiar de qualquer  perdão relativamente à pena em que o foi condenado.
Consequentemente, julga-se o presente recurso totalmente procedente.
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IV. DECISÃO
Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação de Lisboa, após conferência, em julgar o recurso procedente e, em consequência, revogar a decisão recorrida, julgando não ser aplicável o perdão à pena em que o arguido … foi condenado no âmbito dos presentes autos.
Sem tributação.

Lisboa, 28 de novembro de 2023.
Luísa Maria da Rocha Oliveira Alvoeiro
Sara André dos Reis Marques
Ana Cláudia Nogueira (com voto de vencido)

Voto de vencido
Fiquei vencida na questão objeto do acórdão de saber se o crime de roubo previsto pelo art.º 210º/1 do Código Penal, não excecionado da aplicação da Lei do Perdão de Penas e Amnistia de Infrações aprovada pela L. 38-A/2023, de 02/08 (diploma a que pertencem todas as normas citadas doravante sem indicação de proveniência) por via do disposto no art.º 7º/1, b), i), deve considerar-se excecionado dessa aplicação por via do preceituado no mesmo art.º 7º/1, g), enquanto crime que é sempre praticado contra vítimas especialmente vulneráveis nos termos do art.º 67º-A/1,b) e 3, do Código de Processo Penal, já que integra a categoria da criminalidade violenta ou da criminalidade especialmente violenta, segundo o art.º 1º/j) e l), do Código de Processo Penal.
Pois bem.
Entendo que, por um lado, o legislador não quis excecionar da aplicação da Lei do Perdão e Amnistia, os condenados por crime de roubo simples, com previsão no nº 1 do art.º 210º do Código Penal, deixando-o expresso no texto da lei ao indicar no art.º 7º/1,b),i) apenas o nº 2 desse normativo; por outro lado, afigura-se-me que não pode atribuir-se à previsão da alínea g) um efeito de derrogação do assim expressamente consagrado, devendo outrossim dela efetuar-se interpretação que seja compatível com aqueloutra norma.
E essa interpretação da previsão contida na alínea g), que aparece reportada ao tipo de vítima do crime, em vez de ao tipo de crime, como sucede nas alíneas anteriores, até pela sua inserção sistemática, indicativa de que é menos específica e residual em relação às anteriores previsões relativas a concretos tipos legais de crime, terá necessariamente que passar por afastar a sua aplicação aos crimes violentos e especialmente violentos (cujas vítimas são legalmente consideradas vítimas especialmente vulneráveis), que não constem excecionados nas alíneas anteriores.
Explicando.
A interpretação sufragada no acórdão e que fez vencimento corresponde, na prática, a eliminar do texto do art.º 7º/1,b) i) a indicação do nº 2 do art.º 210º do Código Penal, como se aí devesse constar apenas a referência ao art.º 210º, por forma a terem-se por excecionados da aplicação da Lei do Perdão e Amnistia todos os roubos, seja na forma agravada, prevista no nº 2, seja na forma simples, com previsão no nº 1; e isso corresponde a derrogar a lei.
Na verdade, quisera o legislador excecionar da aplicação da Lei do Perdão e Amnistia o crime de roubo em qualquer das suas previsões, simples e agravada, e não havia qualquer razão para não o ter feito logo quando da previsão do nº 1, b), i) do citado art.º 7º.
Mais.
Esta é a meu ver a única interpretação que, além de respeitar a letra da lei, respeita também o espírito da lei.
Com efeito, os trabalhos preparatórios da Lei do Perdão e Amnistia permitem reconstituir o pensamento e vontade do legislador no sentido que preconizamos, como, de resto, resulta evidenciado no acórdão [transcrição]:
«(…)
Analisados os trabalhos parlamentares prévios à aprovação da referida Lei da Amnistia e do Perdão […] verificamos que a proposta inicial do Governo excluía do perdão e da amnistia o crime de roubo “em residências ou na via pública cometido com arma de fogo ou arma branca, previsto no art.º 210º do Código Penal”.
Posteriormente, em 10 de julho de 2023, o Grupo Parlamentar do PSD apresentou proposta de alteração que excluía do perdão e da amnistia os condenados por crime de roubo previsto no art.º 210º do Código Penal. Já a Proposta de alteração apresentada pelo Grupo Parlamentar do PS, em 14 de julho de 2023, apenas excluía do perdão e da amnistia os condenados pela prática do crime de roubo agravado, previsto no nº 2 do art.º 210º do Código Penal, tendo sido esta proposta que acabou por ficar consagrada no texto final do art.º 7º, al. b), subalínea i)., da Lei nº 38-A/2023, de 2 de agosto.
Assim e face à redação definitiva que fez vencimento quanto a esse dispositivo e considerado apenas o bem jurídico protegido e os elementos constitutivos do particular tipo de crime (in casu, no que respeita ao catálogo de exclusões respeitante aos crimes contra o património), há que concluir que os condenados por crime de roubo previsto no nº 1 do art.º 210º do CPenal não estão excluídos do benefício do perdão e da amnistia previstos na presente lei na medida em que a mencionada subalínea i) da alínea b) do nº 2 do art.º 7º apenas exclui os condenados por crime de roubo previsto no nº 2 do art.º 210º do C.Penal (tendo sido intencional o concreto âmbito dessa exclusão do nº 1, isto se considerado o chumbo da proposta de alteração apresentada pelo Grupo Parlamentar do PSD).».
De resto, a proposta de alteração do grupo parlamentar do PSD que viria a ser chumbada, ia ao encontro do contributo do Conselho Superior da Magistratura que sugeria a aplicação da Lei da Amnistia a “todos os condenados por crimes de roubo previsto e punido pelo artigo 210º do Código Penal e roubo qualificado, face à enorme expressão e gravidade deste tipo de crimes, consabidamente causadores de grande alarme social” (3.5.3.1.), ficando deste modo bem evidenciado que a questão foi colocada e discutida, tendo sido ultrapassada com a prevalência da proposta do grupo parlamentar do PS, vazada em lei.
Já a remissão para o conceito de vítima especialmente vulnerável consagrado no art.º 67º-A do Código de Processo Penal, que decorrerá do contributo do Conselho Superior do Ministério Público (cfr. https://app.parlamento.pt/webutils/docs), não constava do projeto de lei que continha o seguinte nessa alínea: “Os condenados por crimes praticados contra vítimas especialmente vulneráveis, incluindo as crianças e os jovens, as mulheres grávidas e as pessoas idosas, doentes, pessoas com deficiência e imigrantes”; tudo indica, pois, que, ao introduzir tal alteração na formulação final da alínea g), do nº 1 do art.º 7º, não contou o legislador com a possibilidade interpretativa que agora se adota no acórdão de, através de um jogo de remissões, anular a indicação expressa do nº 2 do art.º 210º feita na prévia alínea b), i), do mesmo nº1 do art.º 7º.
Em suma: resulta clarividente do texto da lei e do pensamento do legislador reconstituído através da análise do processo legislativo que, como se escreve no acórdão, o legislador quis deliberadamente aplicar a Lei do Perdão e Amnistia aos condenados por crimes de roubo na previsão do nº1 do art.º 210º do Código Penal; simplesmente não atentou que, ao introduzir na alínea g), do nº1 do art.º 7º  a remissão para o disposto no art.º 67º-A, desta norma haveria nova remissão para o disposto no art.º 1º/j) e l), ambos do Código de Processo Penal, e desse modo, estava a abrir a porta a interpretações como aquela que o acórdão sufraga e que, na prática, representam uma derrogação da norma contida na própria norma traduzida na expressão popular de “fazer entrar pela janela o que não se quis deixar entrar pela porta”.
Assim, muito embora admita alguma equivocidade do texto legal, entendo que nem a letra nem o espírito da lei consentem a interpretação sufragada no acórdão, sendo a interpretação que preconizamos, além do mais, aquela que observa a presunção legal de que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados – art.º 9º/3 do Código Civil.
Julgaria, assim, improcedente o recurso, mantendo a decisão recorrida.
Ana Cláudia Nogueira
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[1] Cfr. no mesmo sentido, as seguintes decisões mencionadas por Pedro Brito no referido estudo, em nota de rodapé n.º 48 (págs. 31 e 32): “acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 28-02-2023, processo n.º 637/2020, relator Artur Vargues, in www.datajuris.pt; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 09-06-2022,  processo n.º 41/2021, relator Orlando Gonçalves, in www.datajuris.pt; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 04-11-2021, processo n.º 77/2021, relator Helena Moniz, in www.datajuris.pt; acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 15-09-2021, processo n.º 444/2020, relator Maria Elisa Matos Silva, in www.datajuris.pt; acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 21-06-2021, processo n.º 2381/2020, relator Maria de Fátima Bernardes, in www.datajuris.pt; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 14-01-2021, processo n.º 515/2017, relator Clemente Lima, in www.datajuris.pt; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 14-05-2020, processo n.º 796/2018, relator Helena Moniz, in www.datajuris.pt; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 05-03-2020, processo n.º 34/2018, relator Nuno Gomes da Silva, in www.datajuris.pt; acórdão do Supremo tribunal de Justiça, de 28-03-2018, processo n.º 622/17.0SYLSB-A, relator Lopes da Mota, in www.dgsi.pt; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 20-03-2014, processo n.º 21/12.0PGPDL.L1.S1, relator Armindo Monteiro, in www.dgsi.pt; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 13-03-2008, processo n.º 08P924, relator Rodrigues da Costa, in www.dgsi.pt; Dias, Maria do Carmo Silva, in Comentário Judiciário do Código de Processo Penal, Tomo I, Livraria Almedina, 2019, pág. 77)”