Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
819/13.2TBMTA.L1-8
Relator: OCTÁVIA VIEGAS
Descritores: FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉCTRICA
CONTRATO DE SEGURO
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 06/04/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Sumário: - Tendo a conduta de um terceiro provocado a quebra no fornecimento de energia, se os danos causados não resultarem da mesma, mas de anomalia ocorrida no fornecimento, na sequência desta, essa intervenção de terceiro não consubstancia a excepção prevista no artigo 509 do C.Civil.
- No âmbito do regime do contrato de seguro aprovado pelo DL 72/2008, de 16.04, no âmbito do contrato de seguro de responsabilidade civil voluntário, a seguradora só pode ser demandada directamente se tal estiver previsto no contrato ou o segurado tenha informado o lesado da existência do contrato de seguro e se tenham iniciado negociações.
- O desconforto causado pelo frio por falta e as preocupações resultantes de uma casa ficar desprotegida por avaria e um alarme instalado, são mais do que meras contrariedades do desenrolar da vida quotidiana, sendo relevantes para efeitos do disposto no art. 496 do C.Civil.
(Sumário elaborado pela Relatora)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:



RELATÓRIO:


A e B, intentaram a presente acção declarativa de condenação, com processo sumário (convertido em comum, após a entrada do Novo Código de Processo Civil), contra:
« C, S.A.», « D, S.A.», e « E, S.A.»,

Peticionando a condenação solidária das Rés no pagamento ao primeiro Autor da quantia de € 6.435 (seis mil quatrocentos e trinta e cinco euros) a título de danos patrimoniais e na quantia de € 5.000 (cinco mil euros) a título de danos não patrimoniais, e no pagamento ao segundo Autor da quantia de € 3.600 (três mil e seiscentos euros), a título de danos patrimoniais, e na quantia de € 5.000 (cinco mil euros), a título de danos não patrimoniais, quantias estas acrescidas de juros à taxa legal desde a propositura da presente acção ate integral pagamento.

Fundamentam a sua pretensão no fornecimento deficitário de energia eléctrica, o qual causou os danos acima peticionados.

A Rés contestaram, impugnando alguma da matéria factual vertida pela Autora e aceitando como verdadeira outra, concluindo pela improcedência do peticionado.

Em sede de audiência preliminar, frustrada a tentativa de conciliação, foi exarado despacho saneador, onde se fixou o valor da acção e o objecto do litígio e se consignaram os temas da prova assentes e
Foi proferida decisão que julgo a acção parcialmente procedente, porquanto provada apenas em parte e, em consequência, condenou a Ré « E, S.A.» no pagamento ao Autor A. da importância de € 3.285, acrescida dos juros de mora, contados à taxa de 4 % desde a citação até pagamento integral, a título de danos patrimoniais, e de € 1.000 a título de danos não patrimoniais, acrescida dos juros de mora, contados à taxa de 4 % desde a data de prolação da presente sentença até integral pagamento, e no pagamento ao Autor B da importância de € 2.840, acrescida dos juros de mora, contados à taxa de 4 % desde a citação até pagamento integral, a título de danos patrimoniais, e de € 1.000 a título de danos não patrimoniais, acrescida dos juros de mora, contados à taxa de 4 % desde a data de prolação da presente sentença até integral pagamento. No mais, absolveu as Rés do peticionado.

Inconformada, C, S.A., recorreu, apresentando as seguintes conclusões das alegações:

1. Vieram os Autores intentar Acção Declarativa com vista a condenação solidária das Rés  C S.A., ora Apelante, D, S.A. e E, S.A., na quantia global de 20.035,00 € a título de danos patrimoniais (10.035,00 €) e danos não patrimoniais (10.000,00 €), acrescidos dos respectivos juros de mora.
2. Como causa de pedir, invocaram que em cinco datas diferentes, ao longo dos anos de 2009 e 2011, ocorreram falhas de energia eléctrica nas respectivas instalações de consumo, provocando danos em equipamentos e privação de conforto – que justificaria os danos não patrimoniais.
3. As Rés contestaram, com fundamentos diferentes: a E, S.A. alegou ter regularizado todos os danos decorrentes do sinistro ocorrido em 1 de Fevereiro de 2009 e afirmou desconhecer os restantes factos por não terem sido participados pela sua seguradora – a C– com a qual tem uma apólice de franquia (em que a E regulariza os sinistros e recobra da C a totalidade dos valores pagos) com o montante máximo de 50.000,00 € e
4. A C, S.A. expôs que os danos reclamados quanto à data de 01 de Fevereiro de 2009, derivaram de uma efectiva avaria de uma linha da rede de distribuição de energia elétrica e que, foram ressarcidos, sendo que, quanto às demais datas, não há registos quanto a alterações/ incidentes na rede que abastece de energia os Autores, com excepção do dia 25 de Fevereiro de 2011, data em que uma entidade terceira – a empresa F, Lda,
- comprovadamente, na execução de obras próprias, embateu com uma grua numa linha de média tensão, gerando a interrupção de fornecimento de energia.
5. O Tribunal a quo proferiu Sentença condenando parcialmente a E, S.A., por existir responsabilidade objectiva e contratual da C – nos termos do 509º, 798º e 799º do Cód Civil, (contratualmente transferida para a E).
6. Com o devido respeito, que é muito, tal aresto não pode merecer a concordância da Ré ora Apelante, que recorre enquanto pessoa directa e efectivamente prejudicada pela decisão, nos termos do n.º 2 do artigo 631º do Cód.de Proc. Civil – dado que a E recobra, por via do contrato de seguro, da C os valores em que seja condenada.
7. Os factos provados conduzem indubitavelmente a uma das situações de excepção de aplicação do regime do artigo 509º C.C., não sendo também aplicáveis os art.798º e 799º, pelo não estamos perante qualquer responsabilidade objectiva ou contratual da Apelante - padecendo portanto a sentença de que se recorre de manifesto erro de julgamento.

Da Apreciação da Matéria de Facto:

8. De acordo com a Sentença resultou provado – alíneas EE), FF), GG), HH), II), JJ), KK), LL), MM), NN), OO), PP), QQ) e RR) da matéria de facto – que, alegadamente, um rol de equipamentos dos Autores foram danificados, bem como os seus respectivos valores.
9. No entanto os Autores não fizeram nenhuma prova (um único documento sequer ou testemunhal), conforme lhes competia, do número de equipamentos danificados, ou sequer dos respectivos valores…Nem o Tribunal a quo o fundamentou devidamente…
10. Em face da ausência de prova, não pode ser retirada, sem dúvidas, que os Autores tivessem conhecido uma única perda ou qual o valor concreto das mesmas…O que deve determinar a relegação para liquidação de sentença para apurar o quantum indemnizatório, sob pena de enriquecimento sem causa.

Da Subsunção Jurídica dos Factos Provados:
11. De acordo com a Sentença resultou provado – alíneas F), K), L), M), N) e O) da matéria de facto – que a C  transferiu os contractos de fornecimento de energia eléctrica para a D. Que no dia 25 de Fevereiro de 2011 ocorreu um incidente, devido ao embate de um camião de terceiro, na rede pública de distribuição de energia eléctrica, numa linha que alimentava de energia eléctrica os locais de consumo dos Autores, originando um corte no fornecimento. Os danos foram reconhecidos pelo terceiro - a « F, L.da» -. Logo após o incidente a equipa de piquete da primeira Ré deslocou-se ao local e tomou conta da ocorrência logrando repor o fornecimento de energia.
12. Provado ficou então que os danos ocorridos na rede, na zona da residência dos Autores, no dia 25 de Fevereiro de 2011, derivam da intervenção, comprovada, de um terceiro na rede e não devido a qualquer problema da rede eléctrica que se encontrava devidamente instalada, em funcionamento e em prefeito estado de conservação.
Da alegada responsabilidade objectiva - art. 509º do Cód. Civil
13. Andou bem a Sentença Recorrida na parte em que considerou que é aplicável à actividade da EDP Distribuição o artigo 509º do Código Civil – responsabilidade objectiva ou pelo risco dos danos resultantes da actividade de condução de energia eléctrica -. Aplicação, essa, que não merece qualquer reparo ou censura.
14.No entanto, o Tribunal a quo não interpretou convenientemente o normativo em apreço na parte em que estabelece os casos de excepção de aplicação do artigo 509º C.C. Nem tampouco quando decidiu apreciar a responsabilidade da C à luz dos artigos 798º e 799º do Código Civil.
15. É certo que a C responde, em função da actividade que exerce independentemente de culpa, mas com duas importantes excepções: i) quando a rede estiver de acordo com as regras técnicas em vigor e em perfeito estado de conservação, ii) Nem se os danos forem devidos a causa de força maior (toda a causa exterior independente do funcionamento e utilização da coisa).– nos termos no n.º 1 in fine e n.º 2 do artigo 509º do Cód. Civil,
16. Entendimento decorrente também do Regulamento das Relações Comerciais do Sector Elétrico – Regulamento n.º 468/2012 de 12 de Novembro de 2012, publicado no Diário da República, 2.ª série — N.º 218, os Decretos-Leis n.º 29/2006, de 15 de Fevereiro e n.º 172/2006, de 23 de agosto que estabelecem a legislação base do sector elétrico
17. Bem como do Regulamento de Qualidade de Serviço (Despacho n.º 5255/2006 DR II série de 8 de Março) - consideram-se casos fortuitos ou de força maior os que reúnem as condições de exterioridade, imprevisibilidade, irresistibilidade, nomeadamente os que resultem da ocorrência de greve geral, alteração da ordem pública, incêndio, terramoto, inundação, vento de intensidade excepcional, descarga atmosférica directa, sabotagem, malfeitoria e intervenção de terceiros devidamente comprovada.” (n.º 4 do artigo 2º) “ Intervenção de Terceiros – incidente causado,designadamente, por: - Embate de veículos sobre equipamentos das instalações da rede; - Trabalhos da responsabilidade de entidades não contratadas pelos operadores das redes de transporte e de distribuição que afectem acidentalmente as instalações da rede; …(ponto 4.4.6. Anexo I)
18. No mesmo sentido tem vindo a ser entendido pela jurisprudência dos tribunais, conforme decidido unanimemente pelo Douto Tribunal da Relação do Porto, em Acórdão proferido em 13-09-2012; bem como pelo Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11.12.2001, proc. 02B2482, e ainda do Tribunal da Relação do Porto de 13.09.2012, proc. 47/10.9TBSBR.P1, que parcialmente se transcreveram.
19. Pelo que, encontrando-se provada a excepção do n.º 2 do Art. 509º in fine do C.C., conforme supra exposto, não pode ser a Demandada responsabilizada por alterações que não se verificaram na rede.
Da alegada responsabilidade contratual - art. 789º e 799º do Cód. Civil.
20. O Tribunal a quo deu como provado – ponto F)- que a C transferiu para a D o contrato de fornecimento de energia eléctrica.
21. Transferência que foi estabelecida pelo enquadramento legislativo imposto para o sector de energia elétrica em 2006 e veio negar à C a celebração de contrato de fornecimento de energia como comercializador, à concessionária, em exclusivo, das redes de distribuição de energia elétrica que integram o Sistema Elétrico Nacional (SEN).
22. Ora, andou mal a sentença ao considerar que a C é responsável contratualmente perante os Autores nos termos dos artigos 798º e 799º do C.C., não apenas de acordo com o facto provado do ponto F) mas também por ter ocorrido, comprovadamente, uma intervenção de terceiro e portanto uma causa de força maior, que evidencia que o não cumprimento da prestação não derivou de culpa sua.
23. A Apelante - através da sua equipa de piquete, que deslocou-se ao local de imediato, tomou conta da ocorrência e repôs o fornecimento de energia – conforme provado - agiu de modo diligente, cauteloso e zeloso com a finalidade de realizar a prestação que lhe estava adstrita, de acordo com a conduta de um bonus pater famílias afastando a presunção de culpa se se considerasse aplicável o artigo 799º do CC.
24. Encontrando-se assim, mediante a probatio diabólica, ilididas as presunções legais invocadas na sentença por prova em contrário, nos termos do n.º 2 do art. 350º do C.C, implicando a absolvição das Rés de todo o pedido.

Dos Danos Não Patrimoniais:
25. O Tribunal de primeira instância veio por último a considerar que os Autores sofreram danos não patrimoniais - não puderam aquecer a casa, dispor dos bens e temeram pela sua segurança ao não disporem de um sistema de alarme – conforme os factos provados nos pontos TT), UU), VV) e XX).
26. Incómodos, estes que o Tribunal a quo considerou que corresponderiam a, € 1.000,00 de danos não patrimoniais.
27. Ora, a responsabilidade civil não tem, nem pode ter, uma função punitivo preventiva mas um escopo meramente reparador, daí que tenha que pressupor, necessariamente, a existência de um dano (artigo 562º do Código Civil) que afete profundamente os valores ou interesses da personalidade física ou moral, medindo-se a gravidade do dano por um padrão objectivo em função da tutela do direito de acordo com o art. 496 n.º 1 CC.
28. Não existe aqui qualquer dano estético, quantum doloris, ou prejuízo de afirmação pessoal que pela sua gravidade, medida por um padrão objectivo, mereça a tutela do direito, de acordo com os bons critérios para a correcta aplicação do instituto em causa - termos em que, salvo melhor opinião mas sem conceder, tal quantia não será devida, por, uma vez mais, manifesto erro de julgamento.

Termina dizendo que deverá ser concedido provimento ao Recurso, devendo a decisão proferida em 1ª Instância ser anulada pelo Tribunal ad quem, devendo ser proferida nova
Decisão, em substituição da Sentença Recorrida, que, contemplando o que nele se expôs,
- Dê como NÃO PROVADOS as actuais alíneas EE), FF), GG), HH), II), JJ), KK), LL), MM), NN), OO), PP), QQ) e RR) dos “factos provados” e
Absolva do pedido a Ré EDP Distribuição por não verificados os pressupostos de aplicação do instituto da Responsabilidade Civil, seja a nível de responsabilidade objectiva nos termos do artigo 509º C.C. ou contratual, dos art.798º e 799º C.C., bem como não se encontram verificados os danos peticionados.

Inconformada, E S. A., recorreu, apresentando as seguintes conclusões das alegações
1ª–Subscrevem-se e dão-se por reproduzidas as doutas conclusões de recurso oferecidas pela Ré C, S.A.
2ª–A douta decisão final mostra-se materialmente incorrecta, na medida em que condena apenas a Ré Seguradora, ora Apelante, sem que, antes, faça também incidir a condenação sobre a sua segurada.
3ª–A obrigação da Seguradora constitui-se por subsequência da obrigação da segurada.
Funda-se na obrigação contratual clausulada e dentro das forças do contrato de seguro;
4ª–Ademais, no caso concreto dos autos, a apólice fora contratada como “apólice de franquias”; o que significa que, nos limites do capital garantido, responde a própria entidade segurada.
5ª–Os Autores não produziram prova (testemunhal ou documental) sobre a quantidade,
qualidade e características dos bens sinistrados, nem sobre o quantitativo dos prejuízos que alegaram ter sofrido.
6ª–De modo que, não tendo existido prova produzida, e também porque não vem
justificado na douta sentença, a matéria de facto constante das als. EE) a RR), deve ser
considerada “não provada”.
7ª–Foi dado por provado que no referido dia 25/Fevereiro/2011, à hora em que se registaram os danos nos aparelhos eléctricos dos AA., ocorreu um acidente causado por um camião-grua, pertença de uma terceira entidade, que provocou o corte do fornecimento de energia (cfr. als. K a M da matéria de facto).
8ª– Este é o facto conhecido e apurado nos autos.
9ª–O tribunal “a quo” estabelece o nexo causal, por recurso a raciocínio baseado em
extrapolação e dedução de circunstâncias – que não são sustentadas pela matéria de facto apurada nos autos – para concluir que os danos advindos aos AA. foram causados por anomalia no Posto de Transformação da Ré.
10ª–Foi constatada e comprovada a existência de uma causa de força maior, exterior,
independente do funcionamento da rede de abastecimento e sem intervenção da Ré fornecedora de energia.
11ª–Esta causa faz excluir a responsabilidade e a obrigação de indemnizar por parte da Ré C e, subsequentemente, da ora Recorrente;
Pelo que, deve ser decretada a absolvição dos pedidos formulados pelos AA.
12ª–O tribunal “a quo” fez errada interpretação e aplicação do artº 509º /2 do Cód. Civil.
Sem prejuízo das anteriores conclusões,
13ª–Considerando como não provada a matéria de facto constante das als. EE) a RR),
deve ser relegado para liquidação posterior o montante indemnizatório correspondente ao valor de reparação ou substituição dos objectos tidos por danificados, e apenas estes.
14ª–Os factos apurados nas als. SS) a WW), objectivamente apreciados, não se revestem de gravidade tal que mereçam a tutela do direito para efeitos de aplicação do artº 496º / 3 do Cód. Civil, antes devendo ser qualificados como “incómodos, contrariedades, ou desconforto”, e enquadrados como situações correntes da vida do quotidiano.
15ª-Ainda que doutro modo possa admitir-se, a compensação arbitrada (1.000,00€ para
cada AA.), considera-se excessiva.
16ª–Mostram-se violadas por erro de interpretação e/ou de aplicação: as estipulações do contrato de seguro firmado entre as RR; e as regras constantes, entre outras, das disposições citadas nas anteriores conclusões.

Termina dizendo que deverá ser concedido provimento ao presente recurso e, em conformidade com as precedentes alegações, alterada a decisão proferida sobre a matéria de facto referida, revogada a sentença recorrida, e decretada a absolvição das recorrentes quanto aos pedidos formulados pelos Autores.

A e B , contra-alegaram, no recurso apresentado por E, S.A:

I)  Não merece qual quer reparo a douta sentença recorrida.
II) Cabia à Recorrente cumprir o preceituado no art" 640º n" 1 do CC .
III) Pelo que, a não observância do disposto no art" 640º nº 1, viola aquele preceito legal,
IV) Devendo, o recurso sobre a decisão da matéria de facto ser por via disso rejeitado.
V) A apelante considera ter existido um motivo de força maior que exclui a responsabilidade da R. C e logo a sua também,
VI) Não assiste razão, à R. ora apelante, uma vez que, e mesmo que tal se admitisse, o que não se concebe, que tal facto, se inclua na definição de força maior, vertida no artigo 509 n" 2 do Código Civil caberia à R. C alegar e provar o nexo de causalidade existente.
VII) Nem a ora apelante nem a R. C  fizeram prova do nexo de causalidade entre o sinistro e os danos causados pelo corte de fornecimento de energia elétrica.
VIII) Não ficando estabelecido e provado o nexo de causalidade se pode imputar a terceiros os danos causados aos AA.
IX) Ficando por via disso afastada a exclusão da responsabilidade da R. C e por via disso a da ora apelante.
X) Refere a apelante nas suas conclusões que a apólice fora contratada como apólice de franquias e que o Tribunal não poderia condenar a apelante sem condenar a sua segurada.
XI) Mais uma vez e salvo o devido respeito entendemos que andou bem o Tribunal a quo, e que não assiste razão à apelante uma vez que quem invoca um direito tem de o provar inequivocamente, e a apelante não o demonstrou nem provou.
XII) Mais uma vez o tribunal apreciou livremente e valorou livremente a prova, fixando a matéria de facto, em conformidade com a sua livre convicção sobre cada facto controvertido, e decidindo em conformidade.
XIII) Pelo que entendemos inexistir erro de interpretação ou aplicação do direito.

Termina dizendo que deve ser julgado improcedente o recurso e confirmada a decisão recorrida.

Em primeira instância foram considerados provados os seguintes factos:
A) O primeiro Autor, A, é dono da moradia sita na Rua -------------------------------
B) O segundo Autor, B, é dono da moradia sita em Rua -------------------------------
C) O primeiro Autor reside na morada elencada em A).
D) O segundo Autor reside na morada elencada em B).
E) A primeira Ré, «C, S.A.», é uma empresa que se dedica à distribuição e fornecimento de energia eléctrica.
F) No exercício da sua actividade comercial, a primeira Ré celebrou com os Autores um contrato de energia eléctrica, nos termos do qual se obrigava a fornecer aos Autores electricidade, tendo tais contratos sido transferidos para a segunda Ré, «D», a qual passou a assegurar a continuidade do fornecimento de energia eléctrica.
G) O primeiro Autor celebrou o contrato de fornecimento de energia eléctrica, em Baixa Tensão Normal (BTN), em 14 de Março de 2006, a que foi atribuído o n.º de cliente ------------------, para a instalação sita na Rua---------------------------------------------
H) O segundo Autor celebrou o contrato de fornecimento de energia eléctrica, em Baixa Tensão Normal (BTN), com o nº ------------------, com início em 23 de Novembro de 2005, para a instalação sita na Rua ---------------------------------------------------.
I) O fornecimento de energia eléctrica pela primeira Ré ao local de consumo correspondente à morada do primeiro e segundo Autores só foi efectuado após a empresa « G » ter verificado as instalações eléctricas, e emitido parecer de conformidade das instalações.
J) Os Autores são consumidores de energia eléctrica e sempre cumpriram pontualmente as suas obrigações de pagamento de energia eléctrica.
K) Pelas 8 horas e 15 minutos do dia 25 de Fevereiro de 2011 ocorreu um incidente na rede pública de distribuição de energia eléctrica, numa linha de média tensão (LI .........) que alimentava de energia eléctrica as instalações inerentes aos locais de consumo em causa, originando um corte no fornecimento de energia eléctrica na zona da residência dos Autores.
L) O incidente descrito em K) deveu-se ao embate de um camião grua, com a matrícula 4039VT, «propriedade da empresa F, Lda» e ao serviço desta, que executava obras na zona de ------------------, na LI ..........., o que provocou a queda de um condutor de energia e o disparo da linha em causa.
M) Os danos provocados pelo incidente elencado em K) foram reconhecidos pela «Transportes Central da Anunciada, L.da».
N) Logo após o incidente descrito em K), a equipa de piquete da primeira Ré deslocou-se ao local e tomou conta da ocorrência, logrando repor o fornecimento de energia.
O) Em virtude dessa falha e da reposição de energia, alguns dos ares condicionados do primeiro Autor começaram a deitar faíscas, tendo dois aparelhos deixado de funcionar.
P) Em 28 de Fevereiro de 2011, o primeiro Autor, A, fez uma participação por carta registada à primeira Ré, invocando danos causados na sua habitação, identificando os aparelhos em causa.
Q) Em 28 de Fevereiro de 2011, o segundo Autor, B, fez uma participação por carta registada à primeira Ré, invocando danos causados na sua habitação, identificando os aparelhos em causa.
R) Não tendo obtido qualquer resposta, os Autores voltaram a enviar nova carta registada datada de 31 de Março de 2011, com o mesmo teor das assinaladas em P) e Q).
S) A primeira Ré respondeu ao primeiro Autor assumindo que houve interrupção e reposição de energia na rede de média tensão da Moita, tendo declinado a responsabilidade pelo incidente.
T) Por carta datada de 5 de Abril de 2011, a primeira Ré respondeu ao segundo Autor que declinava a responsabilidade pelos danos, alegando que foi uma máquina dos «F, Lda» que embateu na linha da rede da baixa tensão da ....................................
U) (…) Sugerindo que o segundo Autor contactasse a referida empresa no sentido desta vir a  assumir os prejuízos reclamados.
V) O primeiro Autor fez, em 31 de Março de 2011, nova participação por carta registada enviada à primeira Ré, invocando incidente da mesma natureza, por danos causados neste dia.
W) O segundo Autor fez nova participação à primeira Ré, invocando incidente da mesma natureza, por danos causados no dia 31 de Março de 2011.
X) Em 23 de Abril de 2011, o primeiro Autor fez uma participação, por carta registada, interpelando a primeira Ré para que procedesse à reparação e reclamando o pagamento dos danos causados nos equipamentos, por evento ocorrido nesse dia.
Y) Em 23 de Abril de 2011, o segundo Autor fez uma participação interpelando a primeira Ré para que procedesse à reparação e reclamando o pagamento dos danos causados nos equipamentos, por evento ocorrido nesse dia.
Z) Em dia não concretamente apurado, dentro do ano de 2011 e após o dia 25 de Fevereiro de 2011, o primeiro Autor, em virtude do corte de fornecimento de energia eléctrica, solicitou a deslocação à sua residência de um piquete da «C».
AA) Em carta datada de 20 de Junho de 2011, a Ré «C» responde ao abaixo assinado datado de 30 de Maio de 2011, reconhecendo a existência de alguns incidentes de interrupção do fornecimento de energia eléctrica naquela zona, qualificando-os como inerentes à normal exploração de uma rede eléctrica, devendo os equipamentos eléctricos ser concebidos para funcionar nestas circunstâncias.
BB) No dia 25 de Fevereiro de 2011, o tempo estava bom e seco, não tendo ocorrido qualquer anormalidade climatérica.
CC) Na sequência das reclamações apresentadas pelos moradores daquele bairro e da intervenção da Câmara Municipal da Moita, a segunda Ré procedeu à reparação no posto de transformação em dia não concretamente apurado mas posteriormente ao dia 25 de Fevereiro de 2011.
DD)Desde a intervenção enunciada em CC), pese embora se verifiquem esporadicamente cortes breves no fornecimento de energia eléctrica, os mesmos não danificam os aparelhos eléctricos.
EE)Por causa do fornecimento defeituoso de energia ocorrido em 25 de Fevereiro de 2011, estragaram-se dois aparelhos de ar condicionado da marca «--------», no valor unitário de € 500, pertença do Autor A.
FF) (…) Um computador portátil marca «----», no valor de € 1.000.
GG) (…) Uma máquina de lavar roupa da marca «.....», no valor de € 500.
HH) (…) Um alarme «----------», no valor de € 500.
II) (…) O motor portão de correr de garagem queimou, no valor de € 300.
JJ) (…) Uma aparelhagem de som, no valor de € 300.
KK) (…) Uma máquina de café marca «---------», no valor de € 150.
LL) (…) Uma lâmpada de candeeiro exterior, no valor de € 35.
MM) Por causa do fornecimento defeituoso de energia ocorrido em 25 de Fevereiro de 2011, estragaram-se dois aparelhos de ar condicionado, no valor de € 1.000, pertença do Autor B.
NN)(…) Um portão da garagem, no montante de € 300.
OO) (…) Um computador portátil, no valor de € 1.000.
PP) (…) Um alarme, no montante de € 500.
QQ) (…) Uma lâmpada de candeeiro exterior, na cifra de € 40.
RR) Os aparelhos elencados de EE) a QQ) encontravam-se a funcionar regularmente, em bom estado de conservação.
SS) O local onde os Autores habitam é uma zona muito fria e húmida no Inverno.
TT) Os Autores e os seus filhos passaram frio durante o Inverno, não podendo ligar os aparelhos de ar condicionado.
UU) O Autor A viu-se impedido de usar os bens descritos de EE) a LL).
VV) O Autor B viu-se impedido de usar os bens descritos de MM) a QQ).
WW) Os Autores habitam em moradias de piso térreo e vivem com receio dos assaltos, razão pelas quais instalaram os alarmes acima elencados, aumentando o seu receio quando estes deixaram de funcionar.
XX) A primeira Ré, ao celebrar um seguro de responsabilidade civil, transferiu a responsabilidade civil por danos causados a terceiros para a Ré «E.», através do contrato de seguro cuja apólice tem o n.º ----------------------------------------------------------.
Factos não provados:
Não se demonstrou que:
I) Em 25 de Fevereiro de 2011, estragaram-se mais do que dois aparelhos de ar condicionado da marca «------------», pertença do Autor A.
II) (…) O motor portão de correr de garagem queimou por mais que uma vez.
III) Em 25 de Fevereiro de 2011 estragou-se uma máquina de café «-------», na importância de € 150, pertença do Autor B.
IV) (…) Uma aparelhagem de alta fidelidade, no valor de € 600.
V)No dia 31 de Março de 2011 verificou-se um outro corte abrupto no fornecimento de energia eléctrica na zona da residência dos Autores.
VI) Em virtude, dessa falha de energia viram os Autores mais uma vez os seus aparelhos eléctricos danificados.
VII) Em 23 de Abril de 2011, o fornecimento de energia eléctrica foi de novo cortado na residência dos Autores.
VIII) O corte do fornecimento de energia ocorrido em 23 de Abril de 2011 danificou aparelhos eléctricos dos Autores, causando lhes danos e transtornos.
IX) Os técnicos da segunda Ré que se deslocaram à residência dos ora Autores admitiram a hipótese destas contínuas e sucessivas falhas de energia eléctrica terem origem no transformador do Posto de Transformação.
X) No dia 19 de Julho de 2011, foi executada pela primeira Ré uma acção de manutenção preventiva e periódica, feita ao abrigo de um plano programado que incluía a manutenção preventiva de todos os Postos de Transformação da área operacional de Setúbal.
XI)Pese embora o Autor A ter procedido a suas expensas às reparações de alguns aparelhos estes voltaram de novo a ser danificados por novos cortes de fornecimento de energia eléctrica.

Cumpre decidir:

Nas conclusões das alegações de recurso, C, SA e de E, SA, requereram que a matéria que consta das alíneas EE, FF, GG, HH, II, JJ, KK, LL, MM, NN, OO, PP, QQ e RR dos factos provados seja considerada não provada.

O Tribunal da Relação pode alterar a decisão da 1ª instância sobre a matéria de facto se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto ou se tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada a decisão proferida com base nos depoimentos (art. 662 do CPC).

Atento o disposto no art. 607, nº5, do CPC o juiz aprecia livremente as provas e decide segundo a sua prudente convicção. A liberdade de julgamento está vinculada a uma análise crítica das provas e à especificação dos fundamentos  que foram decisivos para a formação da sua convicção ( art. 607, nº4, do CPC)

A garantia de duplo grau de jurisdição não põe em causa o princípio da liberdade de julgamento que  resulta da norma referida, permitindo, no entanto, sindicar, a correcção da análise das provas , segundo as regras da ciência, da lógica e da experiência, prevenindo o erro do julgador e corrigindo-o se for caso disso.

Ouvidos os depoimentos das testemunhas I, J e K, conjugados com os documentos de fls. 38/39, carta que o A. A enviou em 28.02.2011 para a C dando conta dos danos sofridos com alterações na corrente no dia 25.02.2011, consideramos que foi feita prova de que os equipamentos referidos nas alíneas EE a LL ficaram danificados após o corte e reposição do fornecimento de energia elétrica ocorrido em 25.02.2011, não tendo ficado apurado o valor dos prejuízos daí decorrentes, nem o valor que tinham os equipamentos. Quanto às alíneas MM a QQ, após serem ouvidas as testemunhas L, M, N e confrontados com os documentos de fls.40/41,carta que o A. B enviou em 28.02.2011 para a C dando conta dos danos sofridos com alterações na corrente no dia 25.02.2011 consideramos que ficou apurado que em virtude do corte e reposição do fornecimento de energia no dia 25 de Fevereiro de 2011 se estragaram os equipamentos do Autor referidos nas alíneas MM a QQ, não tendo ficado apurado o valor dos prejuízos daí decorrentes, nem o valor que tinham os equipamentos.

Assim os pontos EE a QQ da mat´ria de facto assente são alterados, passando a ter a seguinte redação:EE)Por causa do fornecimento defeituoso de energia ocorrido em 25 de Fevereiro de 2011, estragaram-se dois aparelhos de ar condicionado da marca «----------», pertença do Autor A.
FF) (…) Um computador portátil marca «----».
GG) (…) Uma máquina de lavar roupa da marca «-----».
HH) (…) Um alarme «----------».
II) (…) O motor portão de correr de garagem queimou.
JJ) (…) Uma aparelhagem de som.
KK) (…) Uma máquina de café marca «---------».
LL) (…) Uma lâmpada de candeeiro exterior.
MM) Por causa do fornecimento defeituoso de energia ocorrido em 25 de Fevereiro de 2011, estragaram-se dois aparelhos de ar condicionado, pertença do Autor B.
NN)(…) Um portão da garagem,.
OO) (…) Um computador portátil.
PP) (…) Um alarme.
QQ) (…) Uma lâmpada de candeeiro exterior.

Do depoimento das testemunhas referidas resulta que os equipamentos funcionavam normalmente até essa data, nada se apurando quanto ao estado de conservação.

Assim a alínea RR da matéria passa a ter a seguinte redacção: Os aparelhos elencados de EE) a QQ) encontravam-se a funcionar regularmente.

Quanto às restantes conclusões do recurso de  C, SA.

Verificação de factos que conduzem à excepção do art. 509 do C.Civil.

Nos  termos do art. 509, nº1, do C.Civil, aquele que tiver a direcção efectiva de instalação destinada à condução ou entrega de energia eléctrica ou do gás, e utilizar essa instalação no seu interesse, responde tanto pelo prejuízo que derive da condução ou entrega da electricidade ou do gás, como pelos danos resultantes da própria instalação, excepto se ao tempo do acidente esta estiver de acordo com as regras técnicas em vigor e em perfeito estado de conservação. Nos termos do nº2, do mesmo artigo, não obrigam a reparação os danos devidos a causa de força maior; considera-se de força maior toda a causa exterior independente do funcionamento e utilização da coisa.

Ficou provado nos autos que pelas 8 horas e 15 minutos do dia 25 de Fevereiro de 2011 ocorreu um incidente na rede pública de distribuição de energia eléctrica, numa linha de média tensão (LI ----------) que alimentava de energia eléctrica as instalações inerentes aos locais de consumo em causa, originando um corte no fornecimento de energia eléctrica na zona da residência dos Autores. O incidente referido deveu-se ao embate de um camião grua, com a matrícula 4039VT, «propriedade da empresa F, L.da» e ao serviço desta, que executava obras na zona de -------------, na LI ------------, o que provocou a queda de um condutor de energia e o disparo da linha em causa. Logo após o incidente a equipa de piquete da primeira Ré deslocou-se ao local e tomou conta da ocorrência, logrando repor o fornecimento de energia.. Resultou ainda provado, que em virtude dessa falha e da reposição de energia, alguns dos ares condicionados do primeiro Autor começaram a deitar faíscas, tendo dois aparelhos deixado de funcionar, tendo-se estragado outros aparelhos eléctricos dos autores nesse dia quando ocorreram as alterações no fornecimento de energia.

A intervenção do terceiro que provocou o acidente não se enquadra na excepção referida no nº2, uma vez que os danos foram provocados no âmbito fornecimento da energia, resultando do modo como a distribuição e entrega da mesma foi efectuada que estragou os aparelhos. O interveniente no acidente provocou a interrupção da energia e os danos não foram produzidos pela falha de energia, mas sim no âmbito do fornecimento. Assim, consideramos que não se verifica a excepção prevista no art. 509, nº2, do C.Civil, pelo que improcedem nesta parte as alegações da Recorrente.

A Recorrente entende que não se provaram danos não patrimoniais que revistam a gravidade que a lei exige para darem lugar a reparação.

O art. 562 do C.Civil diz que quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação. Por sua vez, o art. 496 do C.Civil diz que na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.

Conforme resulta dos autos, ficou provado que  o local onde os Autores habitam é uma zona muito fria e húmida no Inverno; Os Autores e os seus filhos passaram frio durante o Inverno, não podendo ligar os aparelhos de ar condicionado; O Autor A viu-se impedido de usar os bens descritos de EE) a LL); O Autor B viu-se impedido de usar os bens descritos de MM) a QQ); Os Autores habitam em moradias de piso térreo e vivem com receio dos assaltos, razão pelas quais instalaram os alarmes acima elencados, aumentando o seu receio quando estes deixaram de funcionar. Estes incómodos e contratempos que os Autores sofreram, não se podem considerar contratempos normais que surgem no desenrolar da vida quotidiana, são alterações ao padrão de conforto e bem estar dos Autores, que sofreram frio e preocupações, que se tinham esforçado por não sofrer ao adquirir e utilizar os equipamentos que se estragaram, no âmbito da anomalia do fornecimento de energia. Consideramos assim que tais danos revestem suficiente gravidade, merecendo reparação.

Nos termos do art. 496, nº4, do C.Civil o montante da indemnização é fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção em qualquer caso as circunstâncias referidas no art. 494 do C.Civil. Considerando que é obrigação da fornecedora de energia, fazê-lo em condições de segurança para pessoas e bens, dada a importância quer económica quer social do serviço, a dependência dos consumidores da fonte de energia, muitas vezes sem outra alternativa para assegurarem o conforto e a segurança de que ficaram privados, o que lhes causou desconforto e preocupações que não é exígivel que suportem, consideramos adequada a indemnização de 1.000,00 a título de danos patrimoniais, atribuída a cada um dos autores.

Improcedem assim nesta parte as conclusões da Recorrente.

Quanto às restantes conclusões do recurso de E, SA,

A Recorrente entende que não pode ser condenada a indemnizar a indemnizar os danos sem a sua segurada ser condenada no ressarcimento dos mesmos.

Os factos referidos nos autos, que desencadearam o pedido formulado, ocorreram em 25.02.2011, pelo que se lhes aplica o regime do contrato de seguro aprovado pelo DL 72/2008, de 16.04.

Nos termos do novo regime o art. 140 , nº2, diz que o contrato de seguro pode prever o direito de o lesado demandar directamente o segurador, isoladamente  ou em conjunto com o segurado. O nº3 diz que o direito de o lesado demandar directamente o segurador verifica-se ainda quando o segurado o tenha informado da existência de um contrato de seguro com o consequente início de negociações directas entre o lesado e o segurador.

No caso dos autos porque não se trata de contrato de seguro obrigatório e não resulta que exista no contrato previsão que permita ao lesado demandar directamente a seguradora, a acção directa contra a seguradora só pode ocorrer quando o segurado tenha informado o lesado da existência de um contrato de seguro e a seguradora tenha iniciado negociações directas, o que também não resulta dos autos.
A C, SA, transferiu a responsabilidade civil por danos causados no exercicio da sua actividade para a Recorrente. Ambas foram demandadas nos presentes autos.

A sentença recorrida ( a fls 256 dos autos) atribui à C, SA  a obrigação de indemnizar os danos decorrentes dos factos ocorridos em 25.02.2011, mas considerando que esta transferiu a responsabilidade civil por danos causados a terceiros no âmbito da sua actividade  para E, SA, através de contrato de seguro, condena esta no pagamento dos danos apurados, mostra-se assim respeitado o  regime do contrato de seguro aprovado pelo DL 72/2008, de 16.04.

Quanto à ocorrência de caso de força maior e danos sofridos pelos Recorridos, dá-se por reproduzido o acima referido, na apreciação do recurso de C, SA.

Improcedem assim, nesta parte, as alegações da Recorrente.

Uma vez que não foi apurado o valor dos danos patrimoniais sofridos, o seu apuramento será feito e liquidação (art. 609 do CPC)

Conclusões:
- Tendo a conduta de um terceiro provocado a quebra no fornecimento de energia, se os danos causados não resultarem da mesma, mas de anomalia ocorrida no fornecimento, na sequência desta, essa intervenção de terceiro não consubstancia a excepção prevista no artigo 509 do C.Civil.
- No âmbito do regime do contrato de seguro aprovado pelo DL 72/2008, de 16.04, no âmbito do contrato de seguro de responsabilidade civil voluntário, a segurador só pode ser demanda directamente se tal estiver previsto no contrato ou o segurado tenha informado o lesado da existência do contrato de seguro e se tenham iniciado negociações.
- O desconforto causado pelo frio por falta e as preocupações resultantes de uma casa ficar desprotegida por avaria e um alarme instalado, são mais do que meras contrariedades do desenrolar da vida quotidiana, sendo relevantes para efeitos do disposto no art. 496 do C.Civil

Face ao exposto, revoga-se a sentença na parte em que condenou E, SA, a pagar ao Autor A as quantias de  € 3.285, acrescida dos juros de mora, contados à taxa de 4 % desde a citação até pagamento integral, a título de danos patrimoniais, crescida dos juros de mora, contados à taxa de 4 % desde a data de prolação da presente sentença até integral pagamento, e no pagamento ao Autor B da importância de € 2.840, acrescida dos juros de mora, contados à taxa de 4 % desde a citação até pagamento integral, a título de danos patrimoniais, acrescida dos juros de mora, contados à taxa de 4 % desde a data de prolação da presente sentença até integral pagamento, devendo o apuramento do valor dos danos ser apurado e liquidação de sentença, mantendo no mais a sentença recorrida.

Custas por Autores e Rés, na proporção de ¼ e ¾, respectivamente


Lisboa,  04/06/2015

Octávia Viegas
Rui da Ponte Gomes
Luís Correia de Mendonça