Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
863/12.7TVLSB-A.L1-2
Relator: EZAGÜY MARTINS
Descritores: GARANTIA AUTÓNOMA
CLÁUSULA ON FIRST DEMAND
PROVIDÊNCIA CAUTELAR COMUM
IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 02/21/2013
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I – Não obstante a automaticidade da garantia autónoma, à primeira solicitação, isentando-se o beneficiário da prova do pressuposto do seu direito, e subtraindo-o ao confronto com a alegação de excepções derivadas da relação principal, não fica vedada ao garante a possibilidade de recusar a soma objecto da garantia em caso de “fraude” ou de “abuso de direito” do beneficiário.
II – existindo fraude, abuso ou má-fé do beneficiário quando a sua interpelação for contrária ao equilíbrio da relação jurídica principal que a obrigação do garante visa garantir.
III – A fraude ou o abuso deverão ser manifestos, inequívocos.
IV – A prova dessa fraude ou abuso, será líquida ou inequívoca quando permite a percepção imediata e segura daqueles, quando os torna óbvios.
V – E pronta ou preexistente quando não se mostra necessário requerer a produção de provas suplementares, proceder a medidas de instrução, ou ouvir terceiros para estabelecer a fraude ou o abuso do beneficiário.
VI – Corresponde a tais características a prova documental, de “segura e imediata interpretação”.
VII – Estando em causa uma garantia autónoma e à primeira solicitação, não é de aceitar, em sede de procedimento cautelar, e designadamente requerido pelo devedor, um simples fumus bónus júris, uma vez que tal autonomia se não coaduna com o deferimento de providências senão em situações excepcionais e seria excessivamente relativizada, caso nos bastássemos com uma prova meramente sumária ou indiciatória, com base na qual o juiz pudesse fazer um simples juízo de probabilidade.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na 2ª Secção (cível) deste Tribunal da Relação

I – “A” - Serviços Comerciais Para Transportes S. A., requereu procedimento cautelar comum contra “B” Card S.A., e Banco “C”, S. A., Sociedade Aberta, requerendo que seja ordenado “ao Banco “C” S.A. que se abstenha de liquidar à “B” Card as garantias bancárias identificadas no presente requerimento de providência cautelar, bem como à “B” Card que se abstenha de as tentar cobrar e receber, com todas as consequências legais.”.

Alegando, para tanto e em suma, que tendo prestado tais garantias à primeira Requerida, no âmbito de contrato de agência com ela celebrado, aquela accionou “a garantia bancária”, “em abuso manifesto de direito (…) dada a existência de créditos e contracréditos recíprocos, bem como a novação da dívida” (garantida), nos termos de que dá conta.
Sendo superior o crédito da Requerente sobre a Requerida – relativo a comissões e juros pelo atraso no seu pagamento – do que o crédito desta última sobre aquela – resultante de valores de fornecimentos de combustível aos clientes angariados pela Requerente, a entregar à Requerida.
Pretendendo a requerente compensar o crédito da Requerida com o seu superior contracrédito, e até à concorrência de ambos.
A não se entender assim, não teria ainda a “B” Card o direito a exigir agora o pagamento das quantias de que entende ser credora, uma vez que aceitou alterar o prazo e a forma de pagamento das mesmas.
Ora, caso o segundo Requerido honre o seu compromisso, e exija, de imediato, o provisionamento da conta bancária por parte da “A”, para fazer face aos montantes pagos, esta entrará em incumprimento com o setor bancário nacional, agravando problemas na gestão da sua tesouraria, e dificilmente conseguirá ver ressarcido o seu crédito sobre a “B” Card em tempo útil.

Citadas as Requeridas, deduziu oposição a “B” Card, S.A., dizendo – em alegações extensas ad nauseam – da inexistência de abuso de direito que, comprovado, legitimasse o “C” a deixar de honrar a garantia prestada, que é autónoma, a primeira solicitação.
E, bem assim, estarem pagas as comissões a que a Requerente tinha direito, bem como prescrita “a larguíssima maioria dos juros reclamados”.
Deduzindo, no mais, impugnação, e desde logo no tocante ao crédito arrogado pela Requerente e à invocada novação objetiva.
Rejeitando, em qualquer caso, a verificação dos requisitos de decretamento da providência.

Remata com o imediato julgamento da improcedência da providência, “por ser já manifesto que não se encontram preenchidos os requisitos legais de que depende o (seu) decretamento (…) absolvendo-se, consequente e imediatamente a Requerida do pedido, sem necessidade de produção de qualquer outra prova adicional”, ou “Caso ainda assim não se entenda; (…) Deve, a presente providência ser julgada totalmente improcedente, por não provada, absolvendo-se a Requerida do pedido e, condenando-se, em qualquer caso, a Requerente como litigante de má-fé em multa e indemnização condigna”.

Por despacho de folhas 240, foi a Requerente convidada a “suprir as insuficiências na concretização da matéria de facto alegada no art.º 43° do requerimento inicial, esclarecendo o critério utilizado que serviu de base à obtenção dos valores aí constantes.", e ordenada a notificação da mesma “para, querendo, responder às excepções deduzidas pela requerida, bem como ao pedido por esta formulado da sua condenação como litigante de má fé”.

Ao que correspondeu aquela, pugnando pela improcedência da considerada matéria de exceção, que reconduz às alegadas “Falta de preenchimento dos requisitos necessários ao decretamento da providência cautelar respeitante a garantia bancária autónoma e (…) Falta de preenchimento dos requisitos necessários ao decretamento da providência cautelar inominada.”.

Em requerimento de folhas 257-260, sustentou a 1ª Requerida não ter a Requerente correspondido de forma efetiva ao convite relativo à concretização de matéria de facto, e não constituírem as questões que foram objeto da resposta daquela, verdadeira matéria de exceção.
Requerendo seja “desconsiderado e dado por não escrito o arrazoado nos artigos 6º a 44º do requerimento, por legalmente inadmissível”.

Vindo o assim requerido a ser indeferido por despacho de folhas 326, trecho II.

 Inquiridas as arroladas testemunhas, foi proferida decisão que – considerando não se ter apurado “nenhuma circunstância que permita concluir no sentido de dever ser determinada ao garante, legitimamente, a recusa do pagamento solicitada na presente providência e, igualmente (…) nenhum motivo que justifique a determinação da 1.ª requerida a abster-se de (re)accionar tal garantia” – indeferiu a providência cautelar requerida.

Inconformada, recorreu a Requerente, formulando, nas suas alegações, as seguintes conclusões:
“(I) A sentença do tribunal a quo considerou como provada, e muito bem, parte significativa dos factos alegados pela “A”,
(II) Não obstante, e mal, alguns dos factos alegados pela “A” não foram considerados provados pelo juiz a quo,
(III) Assim, entende a “A” que os factos que seguidamente se indicam deviam ter sido considerados provados em face da documentação junta e dos testemunhos prestados em sede de inquirição.
(IV) Por isso a “A” entende que se impõe a sua reapreciação à luz de tudo quanto ficou exposto.
(V) A “A” entende que se encontra provado o alegado no artigo 41.º do requerimento de providência cautelar.
(VI) Tal prova decorre do testemunho da Dra. “D”, devidamente identificado e transcrito no ponto 2.
(VII) Deverá, pois, em conformidade, ser considerado como provado o alegado no artigo 41.º do requerimento de providência cautelar.
(VIII) A “A” entende que se encontra provado o alegado no artigo 43.º do requerimento de providência cautelar.
(IX) Tal prova decorre do documento n.º 4 junto aos autos com o requerimento de providência cautelar bem como dos testemunhos prestados pela Dra. “D” e Dr. “E”, devidamente identificados e transcritos no ponto 2.
(X) Deverá, pois, em conformidade, ser considerado como provado o alegado no artigo 43.º do requerimento de providência cautelar.
(XI) A “A” entende que se encontra provado o alegado no artigo 58.º do requerimento de providência cautelar.
(XII) Tal prova decorre do documento n.º 6 junto aos autos com o requerimento de providência cautelar bem como dos testemunhos prestados pela Dra. “D”, Dr. “E”, Dr. “F” e Dr. “G”, devidamente identificados e parcialmente transcritos no ponto 2.
(XIII) Deverá, pois, em conformidade, ser considerado como provado o alegado no artigo 58.º do requerimento de providência cautelar
(XIV) A “A” entende que se encontra provado o alegado no artigo 59.º do requerimento de providência cautelar.
(XV) Tal prova decorre do documento n.º 6 junto aos autos com o requerimento de providência cautelar bem como dos testemunhos prestados pela Dra. “D”, Dr. “E” e Dr. “F”, devidamente identificados e parcialmente transcritos no ponto 2.
(XVI) Deverá, pois, em conformidade, ser considerado como provado o alegado no artigo 59.º do requerimento de providência cautelar.
(XVII) A “A” entende que se encontra provado o alegado no artigo 64.º do requerimento de providência cautelar.
(XVIII) Tal prova decorre do testemunho prestado pelo Dr. “G”, devidamente identificado e transcrito no ponto 2.
(XIX) Deverá, pois, em conformidade, ser considerado como provado o alegado no artigo 64.º do requerimento de providência cautelar.
(XX) A “A” entende que se encontra provado o alegado no artigo 67.º do requerimento de providência cautelar.
(XXI) Tal prova decorre dos documentos n.º 7 e n.º 9 junto aos autos com o requerimento de providência cautelar bem como do testemunho prestado pelo Dr. “E”, devidamente identificado e transcrito no ponto 2.
(XXII) Deverá, pois, em conformidade, ser considerado como provado o alegado no artigo 67.º do requerimento de providência cautelar.
(XXIII) A “A” entende que se encontra provado o alegado no artigo 69.º do requerimento de providência cautelar.
(XXIV) Tal prova decorre do documento n.º 9 junto aos autos com o requerimento de providência cautelar bem como do testemunho prestado pelo Dr. “E” devidamente identificado e transcrito no ponto 2.
(XXV) Deverá, pois, em conformidade, ser considerado como provado o alegado no artigo 69.º do requerimento de providência cautelar.
(XXVI) A “A” entende que se encontra provado o alegado no artigo 71.º do requerimento de providência cautelar.
(XXVII) Tal prova decorre do documento n.º 12 junto aos autos com o requerimento de providência cautelar.
(XXVIII) Deverá, pois, em conformidade, ser considerado como provado o alegado no artigo 71.º do requerimento de providência cautelar
(XXIX) A “A” entende que se encontra provado o alegado no artigo 75.º do requerimento de providência cautelar.
(XXX) Tal prova decorre do documento n.º 9 junto aos autos com o requerimento de providência cautelar bem como dos testemunhos prestados pela Dra. “D”, Dr. “E”, devidamente identificados e parcialmente transcritos no ponto 2.
(XXXI) Deverá, pois, em conformidade, ser considerado como provado o alegado no artigo 75.º do requerimento de providência cautelar.
(XXXII) A “A” entende que se encontra provado o alegado no artigo 76.º do requerimento de providência cautelar.
 (XXXIII) Tal prova decorre do documento n.º 10 e seguintes juntos pela “B” CARD na sua oposição.
(XXXIV) Deverá, pois, em conformidade, ser considerado como provado o alegado no artigo 76.º do requerimento de providência cautelar
(XXXV) A “A” entende que se encontra provado o alegado no artigo 89.º do requerimento de providência cautelar.
(XXXVI) Tal prova decorre do documento n.º 6 junto aos autos com o requerimento de providência cautelar, do documento n.º 4 junto com a oposição bem como dos testemunhos prestados pela Dra. “D”, Dr. “E”, Dr. “F” e Dr. “G”, devidamente identificados e parcialmente transcritos no ponto 2.
(XXXVII) Deverá, pois, em conformidade, ser considerado como provado o alegado no artigo 89.º do requerimento de providência cautelar
(XXXVIII) O contrato de colaboração celebrado entre a “A” E A “B” CARD em 01 de Junho de 1994 é, inegavelmente, um contrato de agência.
(XXXIX) No âmbito desse contrato a “A”, para além da angariação de clientela, assumiu a obrigação de liquidar as dívidas dos clientes angariados,
(XL) Assumindo igualmente a obrigação de cobrar junto dos clientes em nome e por conta da “B” CARD.
(XLI) A assunção de tais obrigações, porque estranhas ao núcleo essencial do contrato de agência, dá lugar ao pagamento de comissões especiais, conforme consta da lei reguladora do contrato de agência.
(XLII) O valor devido pela assunção de tais obrigações foi devidamente comunicado à “B” CARD por carta datada de 19 de Janeiro de 2012 (Doc. 4 junto com o requerimento de providência cautelar).
(XLIII) A “B” CARD não pagou tal montante,
(XLIV) Sendo que tal montante não se encontrava reflectido na comissão paga pela “B” CARD.
(XLV) Não só porque existiam clientes relativamente aos quais a “A” não assumiu os encargos de cobrança nem a assunção do vínculo del credere sendo a comissão devida pela “B” CARD igual,
(XLVI) Mas também porque existem clientes entretanto transferidos para a órbita directa da “B” CARD, relativamente aos quais esta assumiu o risco de cobrança, mas não obstante continuou a pagar a mesma comissão à “A”.
(XLVII) Assim, a “A” é credora da “B” CARD pelos montantes indicados na carta enviada a 19 de Janeiro de 2012 relativos ao valor das comissões em dívida e respectivos juros no total aproximado de € 5.722.761,62
(XLVIII) Não tendo tais montantes sido pagos.
(XLIX) Assim, na já aludida missiva de 19 de Janeiro de 2012 a “A” declarou a sua intenção de proceder a uma compensação parcial de créditos.
(L) Tal compensação é possível por cumprir todos os requisitos legais,
(LI) A exigência por parte da “A” dos montantes em causa a título de comissões não consubstancia qualquer abuso de direito
(LII) Nem consubstancia qualquer situação de venire contra factum proprium,
(LIII) Não só porque o Juiz a quo não faz qualquer análise ao equilíbrio contratual subjacente,
(LIV) Como também não fundamenta a sua posição, nomeadamente, fazendo a análise dos pressupostos do abuso de direito ou do venire contra factum proprium.
(LV) Acresce que a “A” entende que ocorreu novação da dívida, isto porque,
(LVI) As partes acordaram numa alteração do montante da dívida, fixando-a em € 2.000.000,00,
(LVII) As partes acordaram igualmente na fixação de um prazo de cinco anos para proceder ao respectivo pagamento,
(LVIII) Tendo a “A” consentido na manutenção em vigor das garantias bancárias existentes.
(LIX) As partes acordaram igualmente em novas condições comerciais,
(LX) Nomeadamente, no valor da nova comissão que se cifraria no pagamento de € 0,12 por litro,
(LXI) E na transferência dos clientes directamente para a órbita da “B” CARD,
(LXII) Não colhem pois os argumentos esgrimidos pelo Juiz a quo para sustentar e inexistência de novação da dívida,
(LXIII) Em face de tudo isto existem motivos ponderosos para decretar a inibição do BANCO “C” de pagar a garantia bancária,
(LXIV) Sendo esta a única forma que a “A” tem para fazer valer os seus direitos,
(LXV) Sendo, igualmente, através do decretamento da providência cautelar requerida a única forma que a “A” tem de evitar um prejuízo irreparável que, no limite, põe em causa a própria sobrevivência da empresa.”.

Requer a revogação da decisão recorrida, e sua substituição por outra em que se decrete a providência cautelar requerida.


II - Corridos os determinados vistos, cumpre decidir.
Face às conclusões de recurso, que como é sabido, e no seu reporte à fundamentação da decisão recorrida, definem o objecto daquele – vd. art.ºs 684º, n.º 3, 660º, n.º 2 e 713º, n.º 2, do Código de Processo Civil – são questões propostas à resolução deste Tribunal:
- se é de alterar a decisão da 1ª instância quanto à matéria de facto, nos termos propugnados pela Requerente;
- na positiva, se deverá ser deferida a requerida providência cautelar.
*
Considerou-se indiciariamente assente, na 1ª instância, a matéria de facto seguinte:
“1) A “A” - Serviços Comerciais para Transportes, S.A. é uma sociedade anónima que tem como objecto social o comércio de bens e a prestação de serviços de apoio ao sector dos transportes, prestando serviços aos associados da “H” - ..., conforme certidão permanente disponível para consulta em www.....pt mediante os códigos de acesso ... e ...;
2) A “H” é sócia da “A”, conforme certidão permanente disponível para consulta em www.....pt mediante os códigos de acesso referidos em 1);---
3) A “B” Card, S.A. é a sociedade emissora e gestora do cartão de crédito "“B” Star" destinado ao pagamento do consumo de carburantes e outros serviços na rede de estações de serviço "“B”";---
4) Em 01/06/1994, a “A” e a “B” Card celebraram um contrato denominado "Contrato de Colaboração", cuja cópia consta junta como documento n.º 1 com o requerimento inicial e cujo teor se dá desde já como reproduzido para todos os efeitos;---
5) Ao abrigo do mencionado contrato, a “B” Card autorizava a “A”  a proporcionar aos seus clientes (empresas de transporte rodoviário de mercadorias sócias da “H”) o mencionado cartão de crédito “B” Star;---
6) A “B” Card concedia aos clientes da “A” desconto no abastecimento de combustível efectuado nos postos de abastecimentos explorados pela “B” ... S.A., em Espanha, o que pediu à “A” para divulgar aos seus clientes. Porque pretendia – como transmitiu à “A” - que o maior número possível de clientes da “A” aderisse ao cartão “B” Star, porque queria vender a maior quantidade possível de combustíveis nas suas estações de serviço;---
7) Uma vez angariados os clientes, teriam de ser observados os formalismos constantes da cláusula 2.ª do mencionado Contrato de Colaboração, competindo à “A” "entregar a “B” Card os pedidos (impresso “B”) de cartões “B” Star preenchidos e assinados por cada um dos clientes angariados", o que a “A” sempre fez;---
8) Uma vez iniciados os fornecimentos de combustível aos clientes, a “B” Card passaria a enviar à “A” as facturas dos mesmos, bem como um extracto em papel de todas as operações por cada cliente angariado, competindo depois à “A” reenviar tais elementos aos clientes angariados (cf. cláusula 3ª, n.ºs. 2 e 4, do mesmo acordo);---
9) Efectuados os fornecimentos de combustíveis e enviadas as respectivas facturas, colocava-se a questão do pagamento, constando da cláusula 4.ª n.º 1 do referido acordo que, "a “A” compromete-se a pagar em pesetas o valor das facturas dos clientes angariados [...] no trigésimo dia da data de emissão da factura, através de débito em conta bancária" e do n.º 2 da mesma cláusula que: "A “B” Card autoriza a “A” a cobrar em seu nome e por sua conta as facturas derivadas da utilização do cartão “B” Star pelos clientes angariados", o que a requerente fez;--
10) Nos termos do denominado “Contrato de Colaboração”, junto aos autos sob Doc. 1 do requerimento Inicial, consta da cláusula 5.ª do mesmo que:---
«1. A “A”, para garantia de pagamento das facturas emitidas em nome dos clientes angariados, entregará à “B” Card, uma garantia bancária, segundo modelo que constituiu o anexo II a este contrato, de 500.000 pesetas por cartão distribuído.---
2. No caso de a “A” ampliar o número de clientes angariados e, ou, de cartões distribuídos, a “A” deverá enviar juntamente com os pedidos de cartões (impresso “B”) preenchidos e assinados pelos clientes, uma lista com os seus nomes e n.º de contribuinte, bem como uma garantia bancária complementar (…).---
6. “B” Card poderá proceder à execução da garantia bancária quando o considere oportuno, caso não consiga recuperar os valores pendentes de cobrança»;---
11) A requerente entregou à requerida garantias bancárias para cumprimento da obrigação por si assumida, tendo, designadamente, o Banco “I” (actualmente Banco “C” SA.) emitido - datada de 12 de Junho de 1995 e alvo de aditamento em 11 de Janeiro de 2001 - a garantia bancária n.º ... LC cuja cópia consta junta como documento n.º 2 com o requerimento inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, dele constando escrito, nomeadamente, o seguinte:---
«O BANCO “I”, S.A. COM SEDE EM LISBOA, NA RUA ..., ..., …VEM, A PEDIDO DE “A” – SERVIÇOS COMERCIAIS PARA TRANSPORTES, S.A., …CONSTITUIR-SE GARANTE SOLIDÁRIO, COM EXPRESSA RENÚNCIA AO BENEFÍCIO DE PRÉVIA EXCUSSÃO, PERANTE “B” CARD, S.A.,…ATÉ À IMPORTÂNCIA MÁXIMA DE PESETAS 150,000,000.00 (CENT E CINQUENTA MILHÕES DE PESETAS) DO CUMPRIMENTO DAS OBRIGAÇÕES DA “A”–SERVIÇOS COMERCIAIS PARA TRANSPORTES, S.A. PARA COM A “B” CARD, S.A. DERIVADAS DA UTILIZAÇÃO DOS CARTÕES “B” CARD, NOS TERMOS DO CONTRATO CELEBRADO EM 1 DE JUNHO DE 1994 ENTRE A “A”, A “B” CARD E A “B” EESS (…).---
NESTES TERMOS, O BANCO “I” COMPROMETE-SE A PAGAR A “B” CARD, S.A., IMEDIATAMENTE E PERANTE A APRESENTAÇÃO DE SIMPLES INTERPELAÇÃO ESCRITA EM QUE SE ESPECIFIQUEM AS OBRIGAÇÕES INCUMPRIDAS PELA “A”, QUAISQUER QUANTIAS DEVIDAS E CAUCIONADAS PELA PRESENTE GARANTIA (…)»;---
12) Na carta de 12 de Junho de 1995, com a qual era remetida à requerente a garantia bancária, o Banco “I” referia, nomeadamente, que: «(…) DE ACORDO COM AS VOSSAS INSTRUÇÕES, EMITIMOS A GARANTIA, NOSSO NÚMERO EM EPÍGRAFE. ANEXAMOS CÓPIA DA MESMA PARA VOSSOS ARQUIVOS. (…) FICA ASSENTE QUE ESTE BANCO, NO CASO DE VIR A SER CHAMADO A EFECTUAR QUALQUER PAGAMENTO POR FORÇA DA MENCIONADA GARANTIA, NÃO TERÁ DE APRECIAR A JUSTIÇA OU DIREITO DE RECLAMAÇÃO DO BENEFICIÁRIO, LIMITANDO-SE A EFECTUAR TAL PAGAMENTO POR SUA/VOSSA INTEIRA E EXCLUSIVA RESPONSABILIDADE. ASSIM, CONSIDERAMO-NOS DESDE JÁ AUTORIZADOS A DEBITAR QUALQUER CONTA DE QUE V. EXAS(S) SEJA(M) TITRULAR(ES) NESTE BANCO OU A RECLAMAR DE V. EXA(S) A IMEDIATA LIQUIDAÇÃO DA IMPORTÂNCIA PAGA POR NÓS AO BENEFICIÁRIO, SEM QUE, POR QUALQUER FORMA OU FUNDAMNETO, POSSA(M) V. EXA.(S) DEDUZIR OPOSIÇÃO AO REFERIDO PAGAMENTO (…)»;---
13) O valor da referida garantia bancária seria ampliado até ao montante máximo de 300.000.000,00 de pesetas (no contravalor de € 1.803.036,31) conforme Doc. n.º 3 junto com o requerimento inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;-
14) No âmbito do aludido contrato consta da cláusula 8.ª do mesmo que:---
«2. “B” EESS pagará à “A” uma comissão de zero vírgula cinco cinco (0,55) pesetas por cada litro fornecido aos clientes angariados, através do cartão “B” Star, durante os anos de 1994 e 1995.---
2. “B” EESS pagará à “A” uma comissão de mil (1000) pesetas por cada cartão solicitado durante os anos de 1994 e 1995, como prémio de angariação de clientes.---
3. “A” emitirá mensalmente uma factura de comissões, que será paga por “B” EESS, mediante transferência bancária para a conta bancária indicada na cláusula 5.ª, número 3»;---
15) Nos termos do referido acordo, a “B” ... S.A. assumiu a responsabilidade pelo pagamento das referidas comissões e a “A” a obrigação de promover a celebração de contratos mediante a sua actividade de angariação de clientes entre os associados da “H”;---
16) A actividade prosseguida pela “A” implicava a total da autonomia da mesma em relação, quer à “B” Card, quer a “B” ..., S.A., sendo que, esta relação se manteve, pelo menos, entre 1994 e 2011;---
17) Ao longo de 2011 foram mantidas reuniões entre representantes da requerente e da 1.ª requerida, visando, por um lado, a actualização das condições comerciais entre as partes e, por outro, a regularização da dívida que a “A” tinha para com a “B”Card;---
18) A “B” Card remeteu à requerente, datada de 30/05/2011, a carta cuja cópia consta de fls. 53 dos autos (documento n.º 6 junto com o requerimento inicial), cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, de onde consta escrito, nomeadamente, que: “En lo relaccionado com aspectos comerciales, somos conscientes de la necessidad urgente de actualizar las condiciones comerciales existentes y adecuarlas a la situácion actual del mercado";---
19) Em Setembro de 2011, as partes já tinham iniciado negociações para a renegociação do acordo;---
20) Em 27/10/2011 a 1ª requerida remeteu à requerente o email cuja cópia consta de fls. 54 (doc. 7 junto com o requerimento inicial, que aqui se dá por integralmente reproduzido) dele constando, nomeadamente, escrito que: “(…) Como continuacián a la conversácion mantenida ayer se ha llegado ai acuerdo de aceptar a la financiación de la deuda en los términos que a continuacián te detallo.---
- “A” está obligada presentar nuevos avales bancarios que garanticen la totalidad de la deuda aplazada; 2.000.000€. Se trata de que la deuda aplazada esté garantizada, y hay dos opciones o que se entreguen garantías nuevas o las que tenéis actualmente se renegocien garantigando el aplazamiento de pago.
- “A” se tiene que comprometer al traspaso de su fondo de comercio, con el fin de poder hacer frente a los pagos del aplazamiento de la deuda.---
- Los clientes que actualmente tiene avalados “A” de “B” Card, se tendrían que traspasar antes del día 15 de Noviembre, fecha límite en la que se trendrá que dejar firmado el Aplazamiento de Pago y el nuevo Contrato de Agencia. Las Tarjetas de estos contratos serán bloqueadas en esta fecha.---
- A la fecha de la firma tendrá que hacer efectivo el importe resultante de la deuda total menos la deuda aplazada (...)”;---
21) A requerente respondeu à 1.ª requerida, por email de 31/10/2011, cuja cópia consta de fls. 54 dos autos (documento n.º 7 junto com o requerimento inicial), cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, de onde consta escrito, nomeadamente, que: “(…) para podermos dar seguimento aos vossos pedidos expressos na mensagem enviada no final da passada quinta feira, é urgente que nos enviem a minuta do contrato que vai regular as relações entre as nossas empresas, no futuro, a fim de podermos negociar com os nossos bancos a questão das garantias bancárias. Podemos informar que temos já aprazadas reuniões com esses bancos para a semana 45, pelo que insistimos no envio urgente da minuta do contrato.---
Por outro lado sem termos o contrato assinado parece-nos descabido fixar a data de 15 de Novembro como data limite para a transferência da carteira que é actualmente da responsabilidade da “A”.---
Nesta conformidade, e mantendo a nossa intenção de rapidamente resolver esta questão ficamos na expectativa do envio urgente da minuta do contrato para nossa análise (…)”;---
22) A “B” Card remeteu ao Banco “C”, S.A., com data de 7/11/2011, a telecópia cuja cópia consta de fls. 56 dos autos (doc. n.º 8, junto com o requerimento inicial) de onde consta escrito, nomeadamente, o seguinte:---
«(…) Em referência à garantia bancária (...) informamos-lhes que “A” manifestou-nos problemas pontuais de tesouraria e realizou-nos uma proposta de renegociação de dívida em pagamentos y prazos periódicos com uma duração de 5 anos.---
Solicitamos que nos confirmem se aceitam que a dívida consequente da renegociação do prazo de pagamento encontra-se coberta pela garantia em referencia nas mesmas condições e garantias que a dívida original.---
Agrademos que nos respondam com a maior brevidade possível, dando a vossa conformidade.---
No caso de não recebermos resposta num prazo de 10 dias, procederemos à execução da referida garantia bancária (...)»;---
23) A requerente remeteu à 1ª requerida, a carta datada de 09/11/2011, cuja cópia consta de fls. 57-58 dos autos (documento n.º 9 junto com o requerimento inicial), cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, de onde consta escrito, nomeadamente, que: “(…) Foi com estranheza, surpresa e completa estupefacção que hoje fomos surpreendidos com uma informação do Banco “C” dando conta da recepção e teor de uma comunicação por telefax, datada de 07 de Novembro passado, que lhes foi dirigida por V. Exas., em que, para além de revelarem a negociação em curso, dão conta da existência de dívidas e de problemas de tesouraria na n/empresa e exigem a alteração e/ou emissão de uma nova garantia bancária para garantia do acordo, ameaçando por fim a execução da garantia bancária existente no montante de € 1.803.036,31, na falta de uma resposta por parte daquele Banco em 10 dias.---
Importa aqui relembrar que mantemos com V.... um relacionamento comercial de quase duas décadas, ao longo do qual vimos promovendo e comercializando os v/produtos e serviços, em especial, os v/cartões para aquisição de gasóleo e outros serviços, angariando directa ou indirectamente, centenas de clientes para tais produtos, envolvendo um volume de negócio de centenas de milhões de Euros.---
A par de um baixo e desfasado comissionamento, a grave crise económico-financeira nacional e internacional sem precedentes (...) afectou sobremaneira a empresa e o já debilitado sector dos transportes, ao qual se dirigem especialmente os serviços comercializados/prestados.---
Não obstante o exposto e tais anormais circunstâncias, externas à empresa e imprevisíveis, sempre esta, através da sua administração, manifestou a firme intenção de, como sempre fez, cumprir com as suas responsabilidades.---
No decorrer do presente ano encetámos negociações e realizámos diversas reuniões visando a concretização de um acordo para apuramento e pagamento das responsabilidades à vossa empresa e, bem assim, para regulamentação das n/relações comerciais futuras, o que neste último caso, envolve, designadamente, a revisão/celebração de novo contrato de agência, com o aumento significativo de comissões e transferência de clientes para V....---
Com o propósito de concretizar tal acordo, deslocámo-nos aos vossos escritórios em Madrid no passado dia 20 de Setembro de 2011 e apresentámos uma proposta final que mereceu a concordância de V....---
Ficámos a aguardar pelo envio da minuta de tal contrato ou contratos que V... ficaram de elaborar, tendo em vista a sua formalização.---
Após várias insistências nossas durante o passado mês de Outubro, recebemos no dia 27 desse mês, uma v/comunicação por email, contendo novas e diferentes exigências, nunca antes colocadas ou faladas entre as partes.---
Dando conta disso, mas no sentido de dar resposta a tais novas exigências, respondemos a 31 de Outubro (igualmente por email), insistindo na necessidade de envio da minuta do contrato a fim de que pudéssemos realizar as necessárias reuniões com as instituições bancárias com que trabalhamos.---
Ora, a v/ atitude supra referida, face a todo o exposto, consubstancia manifesta má-fé negocial por parte de V...., sendo geradora de prejuízos de diversa ordem para a Empresa, na medida em que existem diversas operações bancárias em curso, prejuízo que, na sua maioria, ainda serão oportunamente apurados e que imputamos a V...., para além de colocarem em causa a manutenção das negociações em curso e o relacionamento comercial com V...., o qual, como sabem, envolve, além do mais, terceiros.---
Sem prejuízo do que antecede e antes do mais, aguardaremos que V.exas, se assim entenderem, se dignem, o mais breve possível, dar-nos a explicação que entenderem por conveniente relativamente a este assunto (…)»;---
24) A 1.ª requerida remeteu à requerente, a carta datada de 14/11/2011, cuja cópia consta de fls. 61-62 dos autos (documento n.º 11 junto com o requerimento inicial), cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, de onde consta escrito, nomeadamente, que: “(…) Acusamos a recepção da V/carta de 09-11-2011 (…).---
Mediante nosso correio electrónico de 27-10-2011, referido na V/ carta ora sob resposta, o nosso colaborador “G” comunicou a V. Exas., as condições essenciais para que a “B” CARD aceite o pagamento em prestações do montante total que têm em dívida para com esta Companhia.---
Uma dessas condições, identificada no n/ e-mail de 27-10-2011, é precisamente a “obrigação de a “A” apresentar novas garantias bancárias, tendo por objecto a totalidade do valor em dívida objecto de pagamento em prestações, ou seja, de € 2.000.000,00”. Mais tivemos o cuidado de explicar que, “tendo em conta o facto de a dívida, objecto de pagamento em prestações, estar neste momento garantida, existem duas opções: a entrega de novas garantias bancárias ou a renegociação das garantias actuais por forma a que garantam na íntegra a totalidade das prestações de pagamento e a consequente dilação”.---
Este nosso comunicado teve por base as sucessivas reuniões, contactos e comunicados anteriores que sempre mantivemos com V. Exas., pelo que muito estranhamos a V/ carta em epígrafe.---
Aliás, tendo em conta essas mesmas negociações e a plataforma de entendimento a que ambas as Partes haviam chegado, e com o único motivo de agilizar o processo, dado que o tempo decorria sem a “B” CARD obter qualquer conforto sobre a validade das garantias actuais para o pagamento prestacional ou dilatado da dívida, que tomamos a iniciativa de adaptar a garantia actual a essa situação, solicitando a confirmação do banco garante.---
Como bem sabem, a “B” CARD é a beneficiária dessa garantia, o que lhe confere o direito de se manter informada sobre a cobertura e extensão da mesma, bem como de se salvaguardar acerca da viabilidade da mesma.
Nunca se pretendeu executar garantias bancárias, sem dar a opção a V. Exas. de entregar outras garantias ou comprovativos da extensão das actuais garantias ao pagamento prestacional ou dilatado do montante total da dívida que têm para com a “B” CARD.---
Muito menos duvidamos da V/ firme intenção em cumprir com as V/ obrigações (…)»;-
25) A “B” Card solicitou, com data de 19 de Dezembro de 2011, à “A” o pagamento do valor de € 2.866.659,86 (sendo € 2.581.800,82 relativamente a valor considerado vencido e € 284.859,04 relativamente a valor considerado por vencer), nos termos da carta cuja cópia foi junta como documento n.º 5 com o requerimento inicial e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;---
26) A “A” solicitou à “B” Card o pagamento do montante de € 5.722.761,62, por carta enviada no dia 19 de Janeiro de 2012, cuja cópia consta como documento n.º 4 junto com o requerimento inicial e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, não tendo tal quantia sido paga pela “B” Card;---
27) A “B” Card remeteu, em resposta à carta de 19 de Janeiro de 2012, à requerente, a carta cuja cópia consta de fls. 228 dos autos (documento n.º 9 junto com a oposição), datada de 10 de Fevereiro de 2012, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, de onde consta escrito, nomeadamente, que:---
«(…) Conhecemos a realidade contratual e comercial da relação existente com a “A” e na mesma não encontramos qualquer fundamento para os pedidos que formulam e afirmações que produzem.---
A certeza que temos é que ao longo dos últimos anos foi manifesta a reiterada situação de incumprimento contratual por parte da “A”, que muito tem prejudicado a “B” CARD, S.A. (…) consideramos os pedidos resultantes da Vossa carta abusivos e contrários a uma actuação de boa fé.---
Face ao exposto, resta comunicar que a “B” CARD, S.A. não aceita qualquer dos pedidos feitos por V. Exas., nem qualquer tipo de compensação de créditos ou o exercício de direitos de retenção a que, abusivamente, se arrogam (…)»;---
28) A “B” Card remeteu ao Banco “C”, S.A., com data de 31/01/2012, a carta cuja cópia consta de fls. 63 dos autos (doc. n.º 12, junto com o requerimento inicial) de onde consta escrito, nomeadamente, o seguinte:---
«(…) Nos termos e para os efeitos previstos na garantia prestada pelo Vosso banco a favor da “B” CARD, S.A., no valor total de € 1.803.036,31 (correspondente a trezentos milhões de Pesetas), acima referenciada, temos a informar V. Exas. que a sociedade “A” é nesta data devedora para com a “B” CARD, S.A., da referida quantia.---
Pelo exposto, solicitamos pela presente que procedam imediatamente e em prazo não superior a 5 (cinco) dias, ao pagamento, à “B” CARD, S.A., do valor em dívida acima referido, através de transferência para a nossa conta bancária com IBAN…»;---
29) A requerente sempre aceitou os valores de comissões que lhe foram sendo regularizados, os quais descontava nos valores que facturava à 1.ª requerida, sendo que, só solicitou a esta o pagamento do valor mencionado em 26), na data constante do documento aí também referido.---
***
E não provada:
“A demais matéria alegada no requerimento inicial, na oposição e no requerimento de resposta e não considerada nos pontos A) supra e C) infra.---
C) – Matéria não considerada na selecção factual:---
O alegado nos artigos 16º, 19º, 20º, 21º, 31º, 32º, 35º, 39º, 40º, 42º, 44º, 49º, 50º, 51º, 52º, 53º, 54º, 65º, 66º, 77º, 79º, 80º, 81º, 82º, 83º, 84º, 85º, 86º, 87º, 88º, 90º, 91º, 92º, 93º, 94º, 95º, 96º, 97º do requerimento inicial e nos artigos 1º, 2º, 3º, 4º, 5º, 6º, 7º, 8º, 12º, 13º, 14º, 15º, 16º, 17º, 19º, 21º, 22º, 23º, 24º, 25º, 26º, 27º, 28º, 32º, 33º, 34º, 35º, 36º, 37º, 38º, 39º, 40º, 41º, 42º, 43º, 44º, 45º, 46º, 47º, 48º, 49º, 50º, 51º, 52º, 53º, 54º, 55º, 56º, 57º, 58º, 59º, 60º, 61º, 62º, 63º, 64º, 67º, 69º, 70º, 72º, 73º, 74º, 75º, 76º, 77º, 78º, 79º, 80º, 81º, 82º, 83º, 84º, 86º, 87º, 88º, 89º, 90º, 91º, 92º, 93º, 94º, 95º, 96º, 97º, 98º, 99º, 100º, 101º, 102º, 103º, 104º, 105º, 106º, 107º, 108º, 109º, 110º, 111º, 112º, 113º, 114º, 115º, 116º, 117º, 118º, 119º, 120º, 121º, 122º, 123º, 124º, 125º, 126º, 127º, 129º, 130º, 131º, 132º, 133º, 134º, 135º, 136º, 137º, 138º, 139º, 140º, 141º, 143º, 144º, 145º, 146º, 147º, 148º, 149º, 150º, 151º, 152º, 153º, 154º, 155º, 156º, 157º, 158º, 159º, 160º, 161º, 163º, 164º, 165º, 166º, 167º, 168º, 169º, 170º, 171º, 172º, 173º, 174º, 175º, 176º, 177º, 178º, 179º, 180º, 181º, 182º da oposição e nos artigos 1º, 4º, 5º, 6º, 7º, 8º, 9º, 10º, 11º, 12º, 13º, 14º, 15º, 16º, 17º, 18º, 19º, 20º, 21º, 22º, 23º, 24º, 25º, 26º, 26º, 27º, 28º, 29º, 30º, 31º, 32º, 33º, 34º, 35º, 36º, 37º, 38º, 39º, 40º, 41º, 42º, 43º, 44º, 45º, 46º, 47º, 48º e 49º do articulado de resposta subsequentemente apresentado pela requerente, contém matéria conclusiva, repetida ou de Direito, pelo que, não foi considerada na selecção factual supra efectuada.”.
*
Vejamos.
1. Não questiona a Recorrente a qualificação jurídica da garantia prestada, assim em causa, operada na sentença recorrida, como “garantia bancária autónoma”.
Aceitando-se a bondade daquela, e para lá se fazer referência, no Anexo II do “contrato de colaboração” em causa, à constituição do Banco garante “em garante solidário, com expressa renúncia ao beneficiário de excussão, divisão e ordem”.
Pois que se trata aí de assumida “Garantia Bancária”, pela qual “o Banco compromete-se a pagar a “B” CARD, S.A., imediatamente e perante a apresentação de um simples ofício por escrito, que não é necessário que se faça por via notarial, qualquer quantidade solicitada até à importância total da presente garantia, sem restrições de nenhum tipo”.
Distinguindo a doutrina a fiança automática “à primeira solicitação” da garantia autónoma “à primeira solicitação”.
E sendo pedra de toque, nessa distinção, a inclusão, na segunda, de cláusulas que “de forma clara, exprimam a autonomia da garantia, face à obrigação derivada da relação subjacente.”.
Como será o caso de uma cláusula “…por meio da qual o garante “renuncie” totalmente e de forma expressa, à possibilidade de invocar excepções decorrentes do contrato base, quer no momento em que lhe é solicitado o pagamento, quer em momento posterior. Pois (…) uma das mais notórias expressões da acessoriedade da fiança traduz-se no direito do fiador opor ao credor todas as excepções que podem ser opostas ao devedor principal. Direito esse que existe na fiança «à primeira solicitação», embora só possa ser exercido no âmbito de uma acção de repetição do indevido.”.[1]
Ora, e precisamente, decorre do texto respetivo que a garantia em causa envolve uma obrigação directa e independente do Banco para com o Beneficiário/”B” Card, S.A., não podendo aquele opor a esta quaisquer meios de defesa de que, eventualmente o ordenador se possa prevalecer, ou, sequer, recusar o pagamento das obrigações e/ou responsabilidade ora garantidas, sob a alegação de que não está demonstrada a mora, falta de cumprimento, o cumprimento defeituoso ou outra causa, por parte do ordenador.

2. Não obstante a automaticidade da garantia, isentando-se o beneficiário da prova do pressuposto do seu direito, e subtraindo-o ao confronto com a alegação de excepções derivadas da relação principal,[2]  não fica vedada ao garante, segundo a doutrina e jurisprudência prevalentes, a possibilidade de recusar a soma objecto da garantia em caso de “fraude” ou de “abuso de direito” do beneficiário,[3] para além da hipótese de extinção da garantia por cumprimento, resolução ou caducidade.[4]
Como em geral resulta dos artigos 762º e 334º do Código Civil, também aqui a actuação das partes se deve pautar pelas regras da boa fé, sendo ilegítimo exercer um direito em manifesto desrespeito pelos “limites impostos pela boa fé, bons costumes ou pelo fim social ou económico do direito” (artigo 334º).
Sem que aquela possibilidade de recusa, porém, seja reconhecida em termos absolutos.
Exigindo-se “que a fraude ou o abuso sejam manifestos, inequívocos, que firam os olhos, e faz-se depender, por isso, a possibilidade de recusa do garante do facto de este ter em seu poder prova pronta e líquida da fraude ou do abuso do beneficiário.”.
Sendo a prova líquida ou inequívoca “quando permite a percepção imediata e segura da fraude ou do abuso, quando os torna óbvios”.
E pronta ou preexistente “quando não se mostra necessário requerer a produção de provas suplementares, proceder a medidas de instrução, ou ouvir terceiros para estabelecer a fraude ou o abuso do beneficiário.”.[5]
Indo a doutrina maioritária no sentido da exigibilidade da prova documental, de segura e imediata interpretação.
Assim Mónica Jardim,[6] refere a “prova documental de segura e imediata interpretação, pois esta prova satisfaz plenamente a exigência de prova pronta (preconstituída) e líquida (inequívoca)”…”A não ser que o abuso decorra de factos de tal forma complexos, que não possam ser confirmados com um simples documento. Nesse caso será de exigir laudo arbitral ou sentença judicial transitada em julgado.”.
Sustentando Galvão Telles a necessidade de a “má fé” ser “patente, não oferecendo a menor dúvida, por decorrer com absoluta segurança de prova documental (…)”.[7]
E observando Calvão da Silva,[8] que “todas as cautelas são poucas, e por isso se exige ao dador da ordem uma prova líquida, uma prova qualificada, segura e inequívoca da conduta fraudulenta ou abusiva do credor, que a doutrina maioritária requer documental”.
Fátima Gomes[9] assinala ser tal “prova líquida (…) sobretudo, associada à prova documental”, admitindo-se ainda “a invocabilidade de prova resultante de uma decisão judicial transitada em julgado ou de uma decisão arbitral”.

3. Reconhecendo a doutrina, tal como a jurisprudência, que a autonomia da garantia bancária permite no entanto igualmente ao devedor mandante obstar ao pagamento imediato, nesses mesmos casos de existência de tal prova inequívoca e notória de fraude manifesta ou de abuso evidente por parte do beneficiário.[10]
E, assim, conforme também decidido no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14-10-2004,[11] intentando, “em sede judicial, providências cautelares, ou mesmo acções, destinadas a impedir o garante de entregar a quantia pecuniária ao beneficiário ou este de a receber, desde que o mandante apresente prova líquida e inequívoca de fraude manifesta ou de abuso evidente do beneficiário.”.

Como se ponderou no já citado Acórdão daquele Tribunal de 21-04-2010, “Entende-se que, estando em causa uma garantia autónoma e à primeira solicitação, é no âmbito do processo cautelar que há-de ser devidamente considerada a sua autonomia relativamente ao contrato subjacente, de forma a evitar que, através de uma decisão baseada em prova de primeira aparência e respeitante a esse contrato, se altere a natureza da garantia prestada.
Não sendo pois de aceitar, nessa sede cautelar, um simples fumus bónus júris, “uma vez que está em causa o cumprimento de um contrato de garantia cuja característica dominante é a autonomia. Autonomia essa que se não coaduna com o deferimento de providências senão em situações excepcionais e que, seria excessivamente relativizada, caso nos bastássemos com uma prova meramente sumária ou indiciatória, com base na qual o juiz pudesse fazer um simples juízo de probabilidade.”.[12]

4. Francisco Cortez, referindo-se à evolução da jurisprudência europeia a propósito, dá conta da adopção de uma «concepção extensiva de fraude manifesta», que existirá “quando o recurso à garantia viola de forma evidente o equilíbrio de interesses efectivado pela operação comercial entre o mandante e o beneficiário.”.
Parecendo “pois certa a conclusão de que existirá fraude, abuso ou má-fé do beneficiário quando a sua interpelação for contrária ao equilíbrio da relação jurídica principal que a obrigação do garante visa garantir.”. [13]
Assimilando Mónica Jardim a existência de fraude à “ausência de direito do beneficiário tendo em conta o contrato base”[14] seja, por exemplo, porque este foi declarado inválido por sentença com trânsito em julgado, seja porque o garante, ou o devedor/garantido dispõe de prova líquida de que o incumprimento alegado não se verificou.

5. Ora pretende a Recorrente dever considerar-se provada a matéria dos art.ºs 41.º, 43.º, 58.º, 59.º, 64.º, 67.º, 69.º, 71.º, 75.º, 76.º 89.º do Requerimento inicial.
Ou seja, que:
41º - “Todavia, a “A” nunca recebeu tais montantes”;
43º - “O montante de tais comissões e dos juros pelo atraso no seu pagamento é o seguinte:  
Ano                 Comissões           Juros                           Total
1995                € 81.990,99    € 153.679,76   € 235.870,77
1996                € 150.525,75  € 265.425,05   € 415.960,79
1997                € 79,055,75    € 129.270,80   € 206.326,00
1998                € 140.645,50  € 203.971,16   € 344.616,66
1999                € 236.630,43  € 313.341,19   € 552.371,62
2000                € 242167,09   € 269.153,57   € 531.340,66
2001                € 249347,42   € 267.677,66   € 517.425,27
2002                € 336.723,10  € 323,560,59   € 662.238,69
2003                € 260.347,32  € 234.423,01   € 514.660,33
2004                € 251.969,16  € 180.423,52   € 432,412,68
2005                € 206.745,39  € 127.268,01   € 334.013,39
2006                € 208.959,36  € 108.876,63   € 317.835,98
2007                € 193.666,92  € 81.455,61     € 275.122,52
2008                € 124.967,34 € 39.148,52            € 164.115,85
2009                 € 83.154,51    € 17.441,29         € 100.595,80
2010                € 70.923,28    € 8.772,30                € 79.695,58
2011                  € 34.307,45   € 1.606,57                € 35.914,02
Total       € 2.976,656,19         € 2.746.105,43           € 5.722.761,62”.
58º - “Tendo as partes acordado que a comissão devida seria de € 0,12 por cada litro abastecimento na rede de estabelecimentos, por um prazo de cinco anos.”.
59º - “Foi também acordado um novo prazo de pagamento da dívida da “A” à “B” Card e que esta seria paga através de descontos a efectuar na nova comissão acordada.”
64º - “Ora, sendo assim, é forçoso concluir que as partes alteraram os prazos e consequentemente a exigibilidade da dívida da “A” à “B” card.”.
67º - “Tendo havido tal acordo de novação, a “A” ficou a aguardar a sua formalização”.
69º - “Mas, quando nada o fazia prever, a “B” Card, S.A., em absoluta contradição com tudo o que já estava acordado, voltou atrás.”.
71º - “Como resulta do seu teor, “C” é intimado a responder ao fax, sem ter ainda conhecimento das negociações porque, recorde-se, a “A” aguardava o envio "da minuta do contrato para formalização do acordado, sob pena da ameaça da “B” Card S.A. executar a garantia bancária.”.
75º - “Depois, a “B” Card alterou as condições acordadas com a “A”, passando a exigir juros de mora e a realização de um pagamento fixo mensal.”.
76º - “Sucederam-se diversas comunicações entre as partes, realizaram-se diversas reuniões…mas a “A” nunca conseguiu que a “B” Card formalizasse o acordo a que as partes haviam efetivamente chegado.”.
89º - “Na realidade, as negociações entre a “A” e a “B” Card, entre outros objetivos já mencionados, procuravam a reestruturação da dívida, fixada em € 2.000.000,00, mediante o estabelecimento de um plano de pagamentos.”. 

Tendo a 1ª instância julgado não provada a matéria de tais art.ºs.

2. Desde logo, no tocante à matéria do art.º 41º, temos que tais “montantes”, alegadamente não recebidos, reportam às “comissões especiais” que, por via da estipulação de convenção del credere, a Requerente sustenta que teria direito a receber, em cumulação, relativas ao encargo da cobrança de créditos da 1ª Requerida e à convenção del credere.
Sendo assim manifesto que, de acordo com as regras do ónus da prova, apenas à primeira Requerente poderia importar o eventual provado de ter pago tais comissões especiais à Requerente.
Mas, para além disso, ponto é que esse alegado não pagamento, não se reporta a montante cujo apuro seja sindicável em função de elementos de cálculo alegados pela Requerente, ou estabelecidos na lei.
Retenha-se que no art.º 43º do requerimento inicial, a Requerente indica montantes de comissões, por anos, globalizando os valores relativos à comissão por convenção “del credere” e à comissão pela cobrança de créditos.
E isto, assim, mesmo depois de convidada a concretizar o alegado nesse art.º.
Pois que, como do seu requerimento de folhas 245 a 252, se alcança, limitou-se aquela, nos art.ºs 2º a 4º do mesmo, a referir ter sido o valor das “comissões identificadas (…) encontrado pela aplicação do seguinte critério: Aplicação do valor da comissão paga à “A” pela “B” card, sobre o volume total de litros vendidos em cada ano, desde o início da relação comercial, em 1995 até ao final de 2011.”
Mais indicando “os seguintes valores de referência da comissão paga pela “B” Card”, durante o ano de 2011 pelo Cartão “B” Espanha - € 0,006010120/Lt – e pelo Cartão “B” Portugal - € 0,007481968/Lt.
E alegando que “para cada ano indicado (1995 a 2011) foi aplicado o valor de referência da comissão indicada supra no ponto 3º para a totalidade do combustível fornecido em cada ano.”.

Tendo-se assim que não é por qualquer forma indicado o volume de litros considerado (?) pela requerente em cada ano do período em causa.
Para além de se não discriminarem assim os volumes parcelares de litros a que foram aplicadas as comissões alegadamente previstas para cada um dos referenciados cartões, ““B” Espanha” e “B” Portugal”, respetivamente.
Como também não se esclareceram quais os valores de referência da comissão, aplicáveis ao longo dos anos, que foram considerados no cálculo dos alegados valores de comissão devidos, concedendo-se não ter a Requerente pretendido aplicar o alegado valor de referência do ano de 2011 aos anos de 1995-2010…

Em suma, redunda o “apuro” do art.º 43º do requerimento inicial em mero conclusivo.
E, logo também por isso, quando o nele alegado – como no antecedente art.º 41º - não tivesse sido considerado não provado, melhor deveria não se ter a 1ª instância sequer pronunciado sobre a matéria de tais art.ºs – cfr. art.º art.ºs 646º, n.º 4 do Código de Processo Civil – como de resto fez em relação a outros.

O mesmo cabendo observar no que respeita à matéria dos art.ºs 64º – “Ora, sendo assim, é forçoso concluir…” – e 69º – “quando nada o fazia prever, a “B” Card S.A., em absoluta contradição com tudo o que já estava acordado, voltou atrás” – do Requerimento Inicial.

E, outrossim, quanto à matéria do art.º 71º.
Certo aqui que o teor porventura relevante do documento em causa – do qual a Requerente conclui “resultar” que o “C” é intimado a responder ao fax, sem ter ainda conhecimento das negociações” – se mostra transcrito no n.º 22 da matéria de facto assente, tratando-se, aliás no art.º em referência, de meras considerações sobre o antecedentemente alegado pela mesma Requerente: “porque, recorde-se, a “A” aguardava o envio da minuta (…) sob pena da ameaça  da “B” Card S.A. (…)”.

Sendo, no relativo à matéria do art.º 67º, que a mesma apenas é considerável expurgada do juízo de direito, relativo à qualificação do (novo) acordo supostamente celebrado, como “de novação”.

Ora, e assim cingindo-nos à matéria dos art.ºs 58º. 59º, 67º - este conformado nos termos antecedentemente referidos – 75º, 76º e 89º, apela a Recorrente:
- Quanto à matéria dos art.ºs 58º, aos depoimentos das testemunhas “E”, “D”, “F” e “G”, e ao documento n.º 6, junto com o requerimento inicial do procedimento cautelar. 
- No tocante à matéria do art.º 59º, aos depoimentos das testemunhas “E”, “D”, “F” e ao mesmo documento n.º 6.
- No tocante à matéria do 67º, ao depoimento da testemunha “E” e aos documentos n.ºs 7 e 9, juntos com o requerimento inicial do procedimento cautelar.
- No tocante à matéria do art.º 75º, aos depoimentos das testemunhas “E” e “D”, e ao sobredito documento n.º 9, bem como ao documento n.º 11 junto com a oposição.
- Quanto à matéria do art.º 76º, aos “documentos n.ºs 10 e seguintes da Oposição.
- Quanto à matéria do art.º 89º, aos depoimentos das testemunhas “E”, “D”, “F” e “G”, e aos documentos n.º 6, junto com o requerimento inicial e n.º 4, junto com a oposição.

Estando pois o recurso – e desde logo na vertente impugnatória da matéria de facto – condenado à improcedência.

Com efeito, afastada a produção de prova testemunhal em quanto pudesse interessar à má-fé ou abuso de direito por parte da beneficiária “B” Card, S.A., temos que também os documentos invocados não fazem prova “de segura e imediata interpretação”…no sentido pretendido pela recorrente nas suas elaboradas alegações.

3.1.Assim, o documento n.º 6, junto com o requerimento inicial, dá conta, sem margem para dúvidas, e do ponto de vista da 1ª Requerida, de se não haver ultimado qualquer “novo acordo comercial”.
Sem prejuízo da anuência manifestada por aquela empresa quanto a pontos desse futuro “novo acordo comercial”, a firmar.
Assim, aparentemente, no tocante à consciência “da necessidade urgente de atualizar as condições comerciais existentes (…) neste sentido a oferta realizada, a comissão por litro, tanto parta ofertas com desconto sobre PVP e Tarifa PRN seria de 1,2 cents/LT. O acordo seria firmado por 5 anos.”
E à inclusão da dívida da “A” “no acordo a firmar com um plano de pagamentos e um plano de migração de contratos apresentados pela “A” a CPP”.
Sendo, retenha-se, que “O plano de pagamentos terá de ser elaborado de tal forma que a “B” Card o aceite (…) Neste sentido e dentro do plano de amortização da dívida, a “B” CARD aceitaria como parte do pagamento da dívida, descontar a totalidade das comissões a receber pela “A”.”
E “Rogamos-te nos envies os dois planos com o fim de os analisar e incluir no acordo para, se estiver tudo correto, ser assinado com a maior brevidade.”.

Deste modo não resultando do documento em análise um qualquer acordo de alteração do contrato vigente, seja no tocante à comissão devida e prazo de validade da mesma, seja no que concerne a um novo prazo e modo de pagamento da dívida, tratando-se apenas da convergência quanto a pontos a incluir num novo contrato, se e quando o mesmo viesse a ser celebrado.

Não nos confrontando pois, relativamente ao mesmo documento, e por reporte à matéria dos art.ºs 58º e 59º, com a tal prova segura e de imediata interpretação.

Nem sendo assim legítimo concluir, como se fez no art.º 64º do requerimento inicial, “que as partes alteraram os prazos e consequentemente a exigibilidade da dívida da “A” à “B” Card”.

3.2. Diga-se, por outro lado, que também os documento n.ºs 7 e 9, juntos com o requerimento inicial, e 11, junto com a oposição, não constituem, quanto à matéria dos art.ºs 67º e 75º, aquela exigível prova, estando mesmo longe disso.
O documento n.º 7 reproduz um mail da Requerente dirigido à 1ª Requerida, e a resposta desta.
E o que dele resulta é a continuação das negociações, fazendo a 1ª Requerida depender o acordo final da prestação de novas garantias bancárias da “totalidade da dívida prorrogada” “garantindo a prorrogação do (prazo de) pagamento.”.
Mais referindo como data limite para a ultimação do novo acordo, o dia 15 de Novembro, no qual “terá que ficar firmada a prorrogação do prazo de pagamento e o novo contrato de agência”, sendo ainda que com a assinatura do acordo terá que ser entregue o montante resultante da dívida total menos a dívida prorrogada”.
Tudo rejeitando a tese do simples aguardar, por parte da Requerente, da “formalização” de um acordo negocial já alcançado.

O documento n.º 9 é reprodução de uma carta enviada pela…Requerente à 1ª Requerida.
Como tal sujeita à livre apreciação do julgador, cfr. art.ºs 366º do Código Civil.
E na qual, de resto – para além da referência a não concretizadas novas exigências da 1ª Requerida, e à alegada falta de envio de minuta(s) de contrato(s), nem se lobriga qualquer referência a exigência de juros ou pagamento fixo mensal, de banda daquela.
Não sendo assim recondutível à tal prova segura de imediata interpretação.

O documento n.º 11 junto com a oposição – reprodução de mail enviado pela 1ª requerida à Requerente – nada refere quanto pagamentos fixos mensais – sendo, no tocante a juros, que se não vê como, relativamente a pagamentos em atraso, o seu, ali não formulado, pedido de pagamento, poderia configurar uma “nova” exigência.

3.3. Quanto aos “documentos n.ºs 10 e seguintes da Oposição”, assim, presuntivamente os n.ºs 10 a 12, trata-se – conforme já antecedentemente referido quanto ao n.º 11 – da reprodução de mails trocados entre a Requerente e a 1ª Requerida, sendo sistematicamente por esta mencionada a necessidade de serem observadas determinadas condições, consideradas em falta, para a celebração do novo acordo.
Deles não resultando a realização de quaisquer “reuniões”, mas apenas, e por parte da 1ª Requerida, o condicionamento da suspensão do prazo de 15 dias concedido na carta da “B” de 19-12-2011, “aos acordos que sejam alcançados como resultado da reunião a ter lugar o mais tardar até ao próximo dia 11.”.

Sendo, de qualquer modo, que concedida a ocorrência de diversas comunicações entre as partes e a realização de diversas reuniões, o que relevaria, desse art.º 76º, seria o facto de tendo as partes chegado a acordo final, e apesar dessas comunicações e reuniões, nunca ter a Requerente conseguido que a “B” Card formalizasse tal acordo.

Ora, como visto, não só não está feita prova segura e líquida da conclusão de tal acordo, como os verificados documentos apontam para não se ter alcançado o dito acordo.

Anotando-se que, como é sabido, “O contrato  não fica concluído enquanto as partes não houverem acordado em todas as cláusulas sobre as quais qualquer delas tenha julgado necessário o acordo.”, cfr. art.º 232º, do Código Civil.

3.4. Finalmente, e quanto à matéria do art.º 89º, ponto é que a dívida da Requerente é referida no documento n.º 4 junto com a oposição, como sendo de € 4. 487.701,95, estando vencida relativamente ao montante de € 2.623.711,30.
Resultando da demais documentação referenciada pela própria Requerente, e analisada supra, que o montante de € 2.000.000,00 seria o da “dívida prorrogada”, ou seja, da parte da dívida vencida que, no âmbito do acordo a firmar – desde que observadas e preenchidas várias condições – veria o seu pagamento diferido ao longo de novo prazo a conceder para o efeito.
Sendo o remanescente, de acordo com a 1ª Requerida, a liquidar até à data limite para a celebração desse novo contrato.

Nada de diferente aportando o já analisado documento n.º 6, junto com o requerimento inicial, onde, como visto, apenas se refere – e neste particular – a aceitação por parte da “B” da inclusão da dívida da “A” no acordo a firmar com um plano de pagamentos e um plano de migração de contratos apresentados pela “A” a CPP.

Ou seja, nenhuma prova “de segura e imediata interpretação” resulta de tais documentos no sentido de as aludidas negociações procurarem, para além do mais, a reestruturação da dívida “fixada em € 2.000.000,00, mediante um plano de pagamentos”.

Posto o que, e não sendo assim também seguro que as negociações entre a “A” e a “B” card, entre outros aspetos, contemplavam a reestruturação parcial da dívida da 1ª para com a 2ª, mediante o estabelecimento de um plano de pagamentos, sempre a matéria do art.º 89º teria de ser dada por não provada.

4. Assinale-se ainda, conquanto assim apenas marginalmente, ter-se consignado, na motivação da decisão da 1ª instância quanto à matéria de facto, que:
“b) Relativamente à prova testemunhal:---
(…)
Concretizando, relativamente a “E”, o mesmo mereceu credibilidade, pelo detalhe e espontaneidade com que depôs relativamente aos termos e momento em que se iniciaram as relações comerciais entre as partes e ao concreto papel que a requerente tinha em tais relações. Referiu, por exemplo, pertencer-lhe a primeira assinatura que consta por baixo da palavra «“A”» no documento de fls. 36, elemento demonstrativo do seu conhecimento sobre o teor do contrato firmado entre a requerente e a 1ª requerida. Explicitou, com relativo pormenor, a «mecânica» de execução do contrato de fls. 32 e ss. dos autos, bem como, a intervenção que a requerente tinha na entrega dos cartões, nas suas substituições, na gestão de reclamações a eles referentes. No que concerne às negociações mantidas entre a requerente e a 1ª requerida nos últimos anos, o depoente mencionou que em 2010 a «requerente começou a perceber haver todo o risco do negócio para o nosso lado» e, que, nessa medida, tiveram lugar entre as partes reuniões destinadas a «melhorar as condições para os clientes finais e a nossa comissão e estabelecer a forma de regularizar a dívida que havia» (da requerente à 1.ª requerida). O depoente foi concludente e honesto em afirmar que, contudo, das reuniões havidas, resultou uma mera «proposta», destinada a «melhoria das condições para os clientes finais e a nossa comissão dobrou (de 6 cêntimos, por litro, passou para 12 cêntimos)». Contudo, não confirmou que relativamente a este valor tivesse sido fixado prazo de duração. Mencionou que a requerente pretendia pagar a dívida existente para com a 1.ª requerida, mas segundo a disponibilidade de prazo que entendesse, tendo procurado, junto da 1.ª requerida, dilatar o prazo.
(…)
Por sua vez, “D” – que afirmou que nas funções que desempenha se insere a responsabilidade pelas cobranças, tesouraria e pessoal da requerente – referiu que teve conhecimento da renegociação do contrato entre a requerente e a 1.ª requerida, à qual se procedeu tendo em vista os pontos que mencionou carecerem de alteração. Referiu, contudo, não ter estado presente nas negociações em questão.
(…)
 Contudo, concluiu a referida “D” que «não se chegou a bom porto, porque na altura final o que a “B” queria era que o pagamento da dívida fosse a 3 anos». Neste ponto, a documentação junta aos autos e os demais depoimentos prestados não corroboram uma tal versão, sendo que, por exemplo, nos documentos de fls. 53, 56, 62-63 se alude a um prazo de «acordo» projectado de 5 anos. Referiu também a aludida depoente, de forma incoerente e injustificada, que as partes chegaram a acordo, mas depois, posteriormente, afirmou que não foi possível o acordo.
De igual modo, o aludido depoimento nada permitiu concluir sobre a veracidade do que foi alegado nos artigos 55º, 58º, 64º e 67º (por reportar tais alusões a negociações inacabadas), 41º, 43º, 69º, 70º, 71º, 75º e 76º do requerimento inicial.---
Quanto a “F”, esta testemunha explicitou, de forma clara, segura e detalhada, qual a intervenção tida na relação que nos anos de 2010 e 2011 foi estabelecida entre a requerente e a 1.ª requerida, tendo relatado a sua participação pessoal em duas reuniões (uma em Portugal, nas instalações da requerente e outra em Madrid, nas instalações da 1.ª requerida), explicando o seu conhecimento da existência de tais reuniões e das propostas relativas à renegociação das relações existentes entre as partes. Explicitou o «modelo» acordado para os prazos de pagamento nos termos do contrato de fls. 32 e ss. e, bem assim, as comissões nele estabelecidas, clarificando que as comissões que eram devidas pela actuação da requerente esta as considerava (descontava) nos pagamentos que a requerente devesse efectuar à 1.ª requerida. Referiu que do seu conhecimento a requerente não solicitou à 1.ª requerida o pagamento de quaisquer outras comissões e que os valores referentes às comissões se encontram pagos, desta forma, pela 1.ª requerida à requerente. Aludiu, de forma objectiva, ao valor a que corresponderá a dívida da requerente para com a 1.ª requerida. Com segurança e clareza referiu que não foi concluído algum acordo para renegociação do contrato existente, porque a requerente não satisfazia, desde logo, o que denominou de «1ª condição»: A existência de garantias bancárias válidas para garantir o pagamento da dívida da requerente. Salientou que as demais condições em questão eram o montante a pagar e o prazo e que, também quanto a elas, houve negociações, mas não se chegou a acordo.
(…)
Por fim, “G”, depondo sobre a matéria dos artigos 54º a 66º do requerimento inicial confirmou, no essencial a realização de reuniões e de contactos por escrito entre a requerente e a 1ª requerida, para pagamento da dívida da requerente à 1.ª requerida e também para renegociação das condições comerciais vigentes. Explicitou qual o ponto até ao qual as negociações chegaram, referindo, contudo, que a requerente nunca se disponibilizou a formalizar o reconhecimento da dívida.
(…)”.

Ora, tendo-se procedido à reprodução do registo áudio dos depoimentos das testemunhas, apenas se pode confirmar a justeza do assim consignado em sede de motivação.
*
É pois de manter a decisão da 1ª instância quanto à matéria de facto.

Com improcedência das conclusões da Requerente, nesta parte

II – 2 – Da verificação dos requisitos para o deferimento do decretamento da requerida providência.
Da factualidade assim subsistentemente apurada, não resulta a ausência do direito da “B” Card, objeto da garantia prestada, e tendo em conta o contrato base.
Nem que tal direito seja integralmente compensável com um indiscutível contracrédito da Requerente.
Não sendo assim também de concluir ser a interpelação da “B” Card ao Banco garante contrária ao equilíbrio da relação jurídica principal visada pela obrigação do garante.
E estando igualmente prejudicado o equacionar do prejuízo grave e de difícil reparação, da Requerente.

Posto o que sempre estariam em falta requisitos do decretamento da requerida providência, cfr. tb. o art.º 381º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil.

           
 III – Nestes termos, acordam em julgar a apelação improcedente, confirmando a decisão recorrida.
***
Custas pela Recorrente, que decaiu totalmente.
Aplicando-se a secção B da tabela I anexa ao Regulamento das Custas Processuais.

Em observância do disposto no n.º 7 do art.º 713º, do Código de Processo Civil, passa a elaborar-se sumário, da responsabilidade do relator, como segue:
(…)
***

Lisboa, 2013-02-21 

Ezagüy Martins
Maria José Mouro
Maria Teresa Albuquerque
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[1] Mónica Jardim, in “Garantia Autónoma”, Almedina, Julho 2002, págs. 198, 199.
[2] Cfr. Menezes Cordeiro, in “Manual de Direito Bancário”, 2ª Ed., 2001, Almedina, pág. 657, e Francisco Cortez, in “Garantia Bancária Autónoma”, ROA, II, Julho/92 -52º- pág. 513.
[3] Vd. Mónica Jardim, in op. cit., pág. 288, e o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 21-04-2010, proc. 458/09.2YFLSB, Realtor Maria dos Parsers Pizarro Belize, in www.dgsi.pt/jstj.nsf.
[4]Vd. para além dos autores antecedentemente citados, Luís Manuel Telles de Menezes Leitão, in “Garantias das Obrigações”, Almedina, Fevereiro de 2006, págs. 156-157.
5 Mónica Jardim, in op. cit., pág. 292. Vd. tb. Ferrer Correia, in “Notas para o estudo do contrato de garantia bancária”, separata da revista de Direito e Economia, Coimbra, 1982, pág. 257.
6 In op. cit. pág. 293.
7IA “Garantia bancária autónoma”, in “O Direito”, ano 129, 1988, págs. 289-290.
8 In “Estudos de Direito Comercial (Pareceres), 1996, Almedina, págs. 342-343.
9 In “Garantia Bancária Autónoma à Primeira Solicitação”, Direito e Justiça, Vol. VIII, tomo 2, 1994, pág. 119 e seguintes, págs. 180-181.
[10] Vd. Mónica Jardim, in op. cit., pág. 327 e seguintes; e o Acórdão da Relação do Porto, de 02-10-2008, proc. 0835046, Relatora Deolinda Varão, in www.dgsi.pt/jtrp.nsf.
11 Proc. 04B2883, Relator Araújo Barros, in www.dgsi.pt(jstj.nsf.; Também assim o Acórdão desta Relação de 23-02-2010, proc. 5714/09.7TVLSB.L1-7, Relator Abrantes Geraldes, in www.dgsi.pt/jtrl.nsf.           
12 Proc. 458/09.2YFLSB, Relatora Maria dos Prazeres Pizarro Beleza, no mesmo sítio da Internet.
13 Mónica Jardim, in op. cit., pág. 337.       
[13] In ROA ano 52°, II, Julho, 1992, pág. 599.
[14] In op. cit., pág. 301.