Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
4660/2007-6
Relator: GRANJA DA FONSECA
Descritores: TRIBUNAL COMPETENTE
INJUNÇÃO
OPOSIÇÃO
ACÇÃO DECLARATIVA
ALÇADA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 05/31/2007
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: CONFLITO DE COMPETÊNCIA
Decisão: DECLARAÇÃO DE COMPETÊNCIA
Sumário: 1 – Se a providência da injunção não alcança a sua finalidade com a aposição da fórmula executória, por força da oposição deduzida, os autos passam a tramitar-se, após a distribuição, com as alterações que o procedimento pré – judicial da injunção determinou, de tal sorte que, para valores superiores à alçada do Tribunal da Relação, os autos são remetidos para o tribunal competente, aplicando-se a forma de processo comum.
2 – Uma coisa é a lei prever a possibilidade da intervenção do tribunal colectivo, outra será a intervenção em concreto desse tribunal.
3 – Porque estamos perante uma acção cível de valor superior à alçada do Tribunal da Relação, não estando excluída a intervenção do tribunal colectivo, na medida em que houve contestação, nem nada impedindo que qualquer das partes possa requerer essa intervenção, encontram-se preenchidos os requisitos legais que conferem às varas cíveis a competência para conhecerem e julgarem esta acção declarativa cível.
(G.F.)
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:
1.
[I. B.] intentou procedimento de injunção contra [C. B.], solicitando o pagamento da quantia de € 49.649,53.

Tendo a requerida deduzido oposição, os autos foram remetidos às Varas Cíveis de Lisboa, para distribuição.

Considerando que o “procedimento de injunção só deve ser remetido às varas cíveis, quando, havendo oposição, ambas as partes requeiram a intervenção do tribunal colectivo (o que não ocorreu no caso dos autos) e não se verificando nenhuma das excepções previstas no n.º 2 do artigo 646º do CPC”, a Exc. ma Juiz da 7ª Vara Cível declarou esta vara incompetente, em razão da forma do processo, determinando a sua remessa, após trânsito em julgado do despacho, aos Juízos Cíveis de Lisboa.
Redistribuídos os autos, a Exc. ma Juiz do 6º Juízo Cível, declarou este juízo incompetente para tramitar a presente acção, ordenando que se rectificasse a distribuição e fossem os autos remetidos à 7ª Vara.

Estamos, assim, perante um conflito de competência entre a 7ª Vara Cível e o 6º Juízo Cível ambos de Lisboa, em que os Magistrados Judiciais afectos aos referidos tribunais se atribuem mutuamente competência, negando a própria, para conhecimento da “Acção de Processo Ordinário, com o n.º 2350/06, 3TVLSB”, tendo ambas as decisões conflituantes transitado em julgado, conflito esse cuja resolução importa decidir.

Diz o artigo 461º, sob a epígrafe “formas do processo comum” que “o processo comum é ordinário, sumário e sumaríssimo”.

O critério para distinguir os campos de aplicação das três formas de processo comum de declaração consta do artigo 462º, n.º 1.

O entendimento desta disposição depende de duas noções prévias: a de valor da causa e a de alçada do tribunal.

Cabendo ao caso processo declarativo, fixa-se primeiro, em face dos artigos 305º e seguintes , o valor da causa.

Se o valor da causa exceder a alçada da Relação, usar-se-á o processo ordinário.

Se o valor da causa for igual ou inferior à alçada da Relação e não couber processo sumaríssimo, usar-se-á processo sumário.

O processo sumaríssimo usar-se-á quando o valor da causa for igual ou inferior ao valor da alçada do tribunal de comarca e a acção se destinar a um destes três fins:
a) – Cumprimento de obrigações pecuniárias;
b) – Indemnização por dano computado em quantia certa;
c) – Entrega de coisa móvel.

Porém, para obter o pagamento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos, o DL n.º 269/98, de 1/09, com as alterações introduzidas pelo DL n.º 383/99, de 23/09, e pelo DL n.º 183/2000, de 10/08, pelo DL 323/2001, de 17/12, pelo DL n.º 32/2003, de 8/03 pelo DL n.º 38/2003, de 8/03 e pelo DL n.º 107/2005, de 1/07, criou um procedimento especial que encerra uma acção declarativa seguida de injunção, procedimento esse que substitui, no respectivo âmbito de aplicação, o processo comum sumaríssimo.

Isto é, a providência da injunção, ou alcança a sua finalidade com a aposição da fórmula executória ou então fica inalcançada essa finalidade, por força da oposição deduzida ou da frustração da notificação do requerido ou ainda no caso de se suscitar questão sujeita a decisão judicial.

Não alcançando a providência o seu termo normal, os autos passam a tramitar-se, após distribuição, como acção declarativa especial com as adaptações que o procedimento pré - judicial da injunção determinou.

Assim dispõe o artigo 7º, n.º 2, do DL n.º 32/2003, de 17/2, na redacção dada pelo DL n.º 107/2005, de 1/07, o seguinte:
“Para valores superiores à alçada do Tribunal da Relação, a dedução da oposição e a frustração da notificação no procedimento de injunção determinam a remessa dos autos para o tribunal competente, aplicando-se a forma de processo comum”.

Analisando este preceito, importa referir que o n.º 1 do artigo 24º da Lei n.º 3/99, de 13/01, fixou a alçada, em matéria cível, dos tribunais da Relação em € 14.963,94 e a dos tribunais de 1ª instância em € 3.740,98.

Por sua vez, depois de se ter procedido, entre os tribunais da 1ª instância, à distinção de tribunais de competência específica e de competência especializada (art. 64º), a LOFTJ (Lei 3/99) veio definir a competência específica das varas cíveis (art. 97º), dos juízos cíveis (art. 99º) e dos juízos de pequena instância cível (art. 101º).

Às varas cíveis compete, além do mais, a preparação e julgamento das acções declarativas cíveis de valor superior à alçada do tribunal da Relação em que a lei preveja a intervenção do tribunal colectivo [art. 97º, n.º 1, al. a) da LOFTJ].

“Compete aos juízos cíveis preparar e julgar os processos de natureza cível que não sejam da competência das varas cíveis e dos juízos de pequena instância cível (artigo 99º da LOFTJ).

Esta norma estabelece uma competência residual dos juízos cíveis, isto é, tudo o que não seja da competência dos demais tribunais de competência específica cível, é da competência dos juízos cíveis.

Por fim, o artigo 646º CPC, referente ao processo comum ordinário, prevê a intervenção e competência do tribunal colectivo, enunciando os requisitos de que depende a sua intervenção, referindo o n.º 2 desse preceito os casos em que não é admissível a intervenção do colectivo.

Reportando-nos ao caso dos autos, verifica-se que o valor da causa é de € 49.649,53., ou seja, valor superior à alçada da Relação.

Entretanto, por ter sido deduzida oposição e porque o valor da causa é superior ao valor da alçada do tribunal da Relação, há que convolar o procedimento injuntivo em processo comum ordinário.

Ora, porque os presentes autos seguem a forma de processo comum ordinário e porque se não verifica nenhuma das excepções previstas no n.º 2 do artigo 646º, poderia, dentro da previsão legal, ter sido solicitada a intervenção do tribunal colectivo.

Por outras palavras: uma coisa é a lei prever a possibilidade de intervenção do tribunal colectivo, (daí a forma verbal utilizada tenha sido o presente do conjuntivo – preveja) outra será a intervenção em concreto do tribunal colectivo, tendo em conta o disposto no n.º 1 do artigo 646º CPC.

Donde, porque estamos perante uma acção cível de valor superior à alçada do Tribunal da Relação, não estando excluída a intervenção do tribunal colectivo, na medida em que houve contestação, bastando que qualquer das partes requeira essa intervenção (artigo 646º, n.º 1), encontram-se preenchidos os requisitos legais que conferem a competência às varas para julgarem, bem como para conhecerem desta acção declarativa cível.

Em consequência, o conflito delineado pelas decisões conflituantes em apreço não pode deixar de ser resolvido no sentido de que é a 7ª Vara Cível do Tribunal da Comarca de Lisboa o tribunal competente para conhecer da presente acção.

Como o autor intentou a acção no tribunal competente, é absolutamente alheio ao conflito. Por sua vez, porque dele ninguém pode extrair qualquer proveito, não é da responsabilidade de qualquer das partes o pagamento das custas respectivas (artigo 446º, n. os 1 e 2 do CPC).
5.
Pelo exposto, declara-se que é a 7ª Vara Cível (1ª Secção) do Tribunal da Comarca de Lisboa a competente para conhecer da supra referida acção, determinando-se processo lhe seja remetido para o efeito.
Sem custas.
Dê conhecimento à Exc. ma Juiz do 6º Juízo Cível.
Notifique.
Lisboa, 31 de Maio de 2007
Manuel F. Granja da Fonseca
Fernando Pereira Rodrigues
Fernanda Isabel Pereira