Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
7643/14.3YYLSB-A.L1-2
Relator: ONDINA CARMO ALVES
Descritores: OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO
LIVRANÇA
AVALISTA
PLANO DE REVITALIZAÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 06/07/2018
Votação: UNANIMIDADE COM * DEC VOT
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: 1. O avalista não se obriga ao cumprimento da obrigação constituída pelo avalizado (obrigação subjacente), mas tão-somente ao pagamento da quantia titulada no título de crédito (obrigação cartular), constituindo esta uma obrigação autónoma e independente daquela.
2. Em resultado dessa autonomia, a aprovação de um plano de recuperação de que beneficia a sociedade subscritora de uma livrança vencida e não paga, não aproveita aos respectivos avalistas, não podendo estes invocar tal circunstância na oposição à execução instaurada pelo portador da livrança.
3. O processo de revitalização e o plano de recuperação nele homologado visam apenas a revitalização do concreto devedor a que se reporta e não a revitalização de qualquer outro devedor que responda solidariamente pela mesma obrigação, não podendo este opor ao credor um meio de defesa que é pessoal do seu condevedor, como é o caso da modificação do crédito decorrente do plano de recuperação aprovado e homologado em processo de revitalização a este respeitante.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA

I. RELATÓRIO

 MANUEL e MARIA, residentes na Rua ….. vieram deduzir, em 13.07.2015, contra BANCO B., , com sede na …., nos termos do artigo 728.º do Código de Processo Civil, OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO POR EMBARGOS, por apenso ao processo executivo para pagamento de quantia certa, que esta deduziu contra aqueles, tendente a obter a respectiva extinção do pedido executivo.
Fundamentaram os embargantes a sua pretensão da forma seguinte:
1. No entender dos aqui embargantes o requerimento executivo é inepto porquanto o exequente não articulou no requerimento executivo os factos integrantes da relação jurídica fundamental que esteve na origem da emissão das livranças dadas à execução.
2. A título de causa de pedir e da sua demonstração, a exequente expressou no requerimento executivo, sob a epígrafe Factos: “Livranças no montante de €91.097,66, €11.546,74 e €96.911,22 vencidas e não pagas, acrescidas de juros vencidos e vincendos até efectivo e integral pagamento e honorários de Agente de execução”.
3. Assim, constata-se do requerimento executivo que a exequente não expôs os factos referentes à causa de pedir e aos fundamentos jurídicos referente ao título dado à execução, nomeadamente não alegou a relação fundamental referente aos mencionados títulos.
4. É certo que a acção executiva não visa a definição do direito violado, porque se destina a providenciar quanto à sua reparação efectiva, surgindo o título executivo como sua condição suficiente (artigo 10º, nº4 do Código de Processo Civil).
5. O artigo 724º do CPC, prescreve no número 1º os requisitos a que deve obedecer o requerimento executivo, destacando na sua al. e) que o exequente expõe sucintamente os factos que fundamentam o pedido quando não constem do título.
6. Deste preceito legal decorre, para além do mais, que o exequente deverá indicar a causa de pedir que fundamenta o seu pedido.
7. Consabidamente, a causa de pedir é o facto constitutivo da situação jurídica material que se quer fazer valer, é, pois, a relação fundamental.
8. A causa de pedir é constituída pelos factos essenciais de que nasce o direito invocado, é um elemento imprescindível da identificação da pretensão processual.
9. O título executivo não se confunde com a causa de pedir, pois o título executivo é apenas o documento donde consta a obrigação, um instrumento probatório da obrigação exequenda, mas não donde ela nasce.
10. In casu, a causa de pedir não consta nem do requerimento executivo  nem do título executivo.
11. Do título executivo não constam todos os factos necessários para que do mesmo se retire a causa de pedir.
12. Pelo que deveria o exequente no requerimento executivo alegar os factos constitutivos da relação subjacente.
13. Sem a alegação da causa de pedir, os embargantes estão impedidos de alegar na presente oposição à execução factos referentes à relação material controvertida subjacente, factos que pudessem ser alegados como defesa no processo de declaração (artigo 713° do C.P.C.).
14. A vaga e genérica remissão para as livranças dadas à execução, sem indicar o respectivo número, nem data de vencimento, não supre a falta de alegação da causa de pedir, porque os documentos servem para demonstrar os factos e não para suprir as insuficiências de alegação.
15. Um título executivo relativo a uma obrigação exige a indicação do respectivo facto constitutivo, porque sem ele a obrigação não fica individualizada, sendo o requerimento executivo inepto se não a indicar.
16. Deve ser indeferido liminarmente o requerimento executivo fundado em título negocial quando seja manifesto, face aos elementos constantes dos autos, a inexistência de factos constitutivos da obrigação exequenda de que lhe seja lícito conhecer.
17. Até porque, o fundamento substantivo da acção executiva é a própria obrigação exequenda e não o próprio título executivo, uma vez que este é o instrumento documental legal dessa obrigação.
18. A lei expressa ser nula o processo quando for inepta a petição inicial, em razão de falta de causa de pedir (artigos 186º, n.ºs 1 e 2, alínea a), do Código de Processo Civil).
19. Nulidade que aqui expressamente se invoca e peticiona, devendo assim ser julgada procedente a presente oposição à execução e em consequência deverá declarar-se a nulidade do processo por ineptidão do requerimento executivo.
Sem prescindir e por mera cautela de patrocínio, sempre se dirá que:
20. Os presentes autos de execução foram instaurados contra os aqui embargantes pelo facto destes se terem constituído avalistas nas livranças dadas à execução subscritas a favor da Sociedade Indústria de Matérias Primas, Lda.
21. Sucede que, por se encontrar em dificuldades de natureza económicofinanceira impeditivas de cumprir pontualmente com as suas obrigações, a Sociedade Indústria de Matérias Primas, Lda., deu entrada de Processo especial de Revitalização, em 30 de Junho de 2014.
22. O processo especial de revitalização correu seus termos sob o nº 949/14.3TYLSB, na 1ª Secção de Comércio, J5 da Comarca de Lisboa.
23. Todavia, pese embora as dificuldades financeiras, o certo é que a Sociedade subscritora das livranças dadas à execução reúne as condições necessárias para a sua recuperação.
24. O exequente, aqui embargado, reclamou o seu crédito, no montante de €202.603,96, o qual foi reconhecido pelo Administrador de Insolvência como garantido.
25. A aludida sociedade  encontra-se a laborar normalmente e ficou demonstrado nos autos de Recuperação e Revitalização que a mesma pode pagar a dívida para com o aqui embargado.
26. A sociedade em questão e os principais credores viabilizaram um plano especial de revitalização.
27. O financiamento concedido pelo aqui exequente/embargado para além das livranças com aval, objecto dos presentes autos, é também garantido por uma hipoteca sobre um imóvel sito na Quinta da Mata verde, …, cujo valor patrimonial é de 446.135,38€ e cuja propriedade é pertença da referida Sociedade, conforme documento que junta sob o nº1.
28. No âmbito do PER, foi aprovado, com voto contra do aqui embargado, um Plano de recuperação, que para além do mais e no que toca ao crédito da exequente respeita, contempla que o crédito reconhecido no valor de €203.252,86 será pago por inteiro e de uma só vez, sendo afecto ao seu reembolso os recursos a libertar pela alienação do imóvel industrial sito na Quinta da Mata Verde.
29. Ficou convencionado nos termos do Plano de recuperação que o prazo de venda do referido imóvel é fixado em 12 meses a contar da data do transito em julgado da sentença homologatória do plano de recuperação e caso a venda não ocorresse-se nesse prazo, o crédito do BPI seria integralmente pago em dinheiro nos 90 dias seguintes; E caso não fosse possível seria o referido imóvel objecto de uma dação em cumprimento a favor do credor BPI, conforme copia que aqui se junta.
30. O referido Plano de recuperação aprovado pela maioria dos credores aguarda prolação de sentença homologatória do mesmo.
31. O Embargado somente poderá receber da subscritora das livranças o pagamento do seu crédito de acordo com o Plano de Recuperação aprovado, pelo que a obrigação exequenda ainda não lhe é exigível.
32. E uma vez que a obrigação é inexigível perante a devedora principal, os aqui opoentes, avalistas das livranças, que permanecem no domínio das relações imediatas, podem opor perante o exequente a excepção da inexigibilidade que a Sociedade lhe poderia opor.
33. E isto porque a medida da responsabilidade do avalista mede-se pela do avalizado e tudo o que favoreça ou desfavoreça o avalizado estende-se ao avalista.
34. Nos termos do disposto no art. 32º da LULL, os avalistas ocupam posição igual àquela por quem deram o aval.
35. Dispõe o art. 22º da LULL que o avalista é responsável nos mesmos termos que a pessoa afiançada.
36. O aval assume um carácter acessório e a responsabilidade do avalista é consentânea com a responsabilidade do avalizado.
37. A extensão e o conteúdo da obrigação do avalista afere-se pela do avalizado.
38. Ora, sendo o aval o acto pelo qual um terceiro garante o pagamento de uma letra por parte dos seus subscritores, estipulando-se que o dador do aval é responsável da mesma maneira que a pessoa por si avalizada, os opoentes tornaram-se pessoalmente responsáveis pela dívida por si garantida.
39. E a ser assim, tal como nos parece ser, a inexigibilidade da dívida perante a Pogalis aproveita aos aqui opoentes.
40. Conforme já referido supra, a subscritora das livranças foi alvo de um Processo Especial de Revitalização, no âmbito do qual foi aprovado um Plano de Revitalização que aguarda homologação judicial.
41. O Plano de Revitalização contempla um plano de pagamento da dívida ao aqui embargado, como credor garantido e o seu pagamento integral no prazo de doze meses após a homologação do plano com a venda do imóvel que serve de garantia ao crédito.
42. Nos termos dos pactos de preenchimento de livranças em caução, objecto dos presentes autos, os aqui opoentes conferiram ao banco os poderes bastantes para o se preenchimento logo que deixe de ser cumprida a obrigação caucionada.
43. Ora, a obrigação caucionada não deixou de ser cumprida por parte da sociedade, mas tão só o seu vencimento foi deferido, nos termos do Plano de revitalização aprovado, o que acarretou uma modificação da obrigação.
44. O embargado, com vista a accionar os avalistas, não interpelou os aqui opoentes do incumprimento por parte da devedora principal.
45. Acresce que, o credor que exigir judicialmente a prestação apenas a um dos devedores fica inibido de proceder judicialmente contra os demais.
46. O exequente poderia ter optado por não reclamar o crédito no processo especial de revitalização e promover uma execução contra os ora embargantes.
47. Porém, optou por reclamar o seu crédito no processo especial de revitalização no qual o título que serve de base à execução se transmudou, passando a existir um novo título - o plano especial de revitalização homologado por sentença.
48. E, concomitantemente, usou o título primitivo para demandar os avalistas e, assim, está a obter o ressarcimento do seu crédito por dois lados, o que não é aceitável e legítimo.
49. Assim, com a aprovação do plano especial de revitalização deixou de se verificar o pressuposto dificuldade de obtenção da prestação, como a "insolvência" ou "risco de insolvência", do artigo 519º do CC;
50. Ora nos termos do disposto no art. 519º do CC, se o credor exigir de um dos devedores a totalidade da prestação, fica inibido de proceder contra os demais devedores, excepto em caso de insolvência ou risco de insolvência.
51. Pelo que em face da aprovação do plano de recuperação, foi afastado o risco de insolvência, uma vez que conforme decorre do aludido plano a empresa é economicamente recuperável e o património pertença da mesma, garante do crédito do embargado, é suficiente para cumprir com a obrigação.
52. Além do mais, se a empresa afiançada beneficia da suspensão das acções em curso durante todo o tempo em que perdurarem as negociações, nos termos do art. 17º-E, n.º 1, do CIRE, até que haja sido aprovado e homologado o plano de recuperação, as livranças dadas à execução são, face ao disposto naquele normativo, actualmente inexigíveis, por ser inexigível à sociedade, principal pagadora, o pagamento daquelas importâncias.
53. Deve, assim, execução ser suspensa até que resulte provado que aquela sociedade não tem meios para solver a dívida, o que é permitido pelo disposto no artº 729°, alínea g), 1ª parte do Código de Processo Civil.
Terminam, requerendo que os embargos de executado sejam julgados procedente por provados e, em consequência:
a) Ser declarado nulo o processo em face da ineptidão do requerimento executivo;
b) Sem prescindir e por mera cautela e dever de patrocínio, devem os presentes embargos ser julgados procedentes por provados e execução ser julgada extinta com base no disposto na al. g), 1ª parte do art. 729º do CPC
Por despacho de 10.05.2016, os embargos foram recebidos e a exequente notificada para contestar, nos termos dos n.º 2 e 3 do artigo 732.º do CPC.
Em 06.06.2016, a exequente apresentou contestação, na qual invocou:
1. Os embargantes, enquanto avalistas, são responsáveis pelo pagamento das livranças dadas à execução, as quais têm a data de 09.06.2014, que é anterior à data em que foi proferido o despacho de nomeação de administrador judicial provisório no invocado processo especial de revitalização.
2. Ainda que o exequente ficasse inibido de accionar a sociedade subscritora, o PER não obsta à execução contra os fiadores ou avalistas das obrigações da sociedade recuperada, como pretendem os embargantes.
3. Nada impede a execução contra os avalistas, nem que se aplique o preceituado no artigo 217º, nº 4 do CIRE, onde se determina que a existência de um plano não afecta os créditos dos credores da insolvência sobre co-devedores ou terceiros.
4. O PER nos termos em que foi homologado, não se aplica ao exequente na parte em que prevê a dação em cumprimento do imóvel sobre o exequente que detém hipoteca genérica, como resulta do próprio despacho de homologação proferido em 22.07.2015.
5. Ao contrário do alegado pelos embargantes a dívida é exigível, as livranças foram entregues em branco acompanhadas do necessário pacto de preenchimento.
6. Para reforço destas garantias, em 29.12.2009, a mutuária sociedade constituiu uma hipoteca genérica, até ao montante máximo assegurado de € 379.176,00 sobre o imóvel identificado pelos embargantes.
7. As livranças apenas seriam preenchidas em caso de incumprimento dos contratos, o que veio a acontecer.
8. Face ao incumprimento por parte da mutuária, o exequente, interpelou-a por cartas registadas com aviso de recepção, datadas de 19.02.2014 e 21.03.2014, para proceder ao pagamento dos valores vencidos, advertindo-a que, caso não procedesse ao pagamento dos montantes em dívida no prazo fixado, considerar-se-iam resolvidos os contratos, dando, nessa data, conhecimento aos embargantes avalistas.
9. Face ao não pagamento de qualquer valor por parte da mutuária, o exequente procedeu ao preenchimento das livranças, dando conhecimento aos embargantes.
10. O exequente interpelou os embargantes, na qualidade de avalistas, quer do incumprimento por parte da mutuária, quer do preenchimento das livranças.
11. Existiu efectivo incumprimento da mutuária em data muito anterior ao da sua admissão ao PER, pelo as obrigações caucionadas pelas livranças dadas à execução são efectivamente exigíveis desde 09.06.2014.
12. O exequente tem o direito de exigir simultaneamente de qualquer um dos devedores o pagamento da prestação, nos termos do artigo 519º, nº 1 do CC.
13. O exequente não estava por qualquer forma inibido de proceder judicialmente contra os avalistas, apesar de ter reclamado o seu crédito no PER da subscritora.
14. Apenas existe a obrigação do exequente de comunicar aos autos de execução os montantes eventualmente pagos a título do plano aprovado no âmbito do PER.
15. O PER está encerrado desde 11.05.2015, data em que transitou em julgado a sentença que homologou o plano de recuperação.
16. Não se encontram preenchidas as condições legais indispensáveis para a suspensão da execução sem a prestação da decida caução, devendo ser indeferida esta pretensão.
17. Os embargantes, na ânsia de se furtarem às responsabilidades assumidas, não hesitaram em litigar contra lei expressa, deduzindo embargos cuja total falta de fundamento bem conhecem, faltando à verdade e omitindo factos com o único propósito de delongar o decurso da acção executiva.   
Terminou a exequente/embargada a sua contestação, requerendo sejam julgados improcedentes os embargos e condenados os embargantes como litigantes de má fé, em multa e indemnização à embargada não inferior a € 5.000,00.
Em 24.06.2016, os embargantes vieram, ao abrigo do princípio do contraditório, responder ao pedido de condenação de litigância de má fé, invocando:
1. A conduta dos embargantes ao deduzir oposição não é passível de ser enquadrada no instituto da litigância de má fé.
2. O comportamento dos embargantes, como parte no processo, pelas razões escritas na oposição não preenche a estatuição prevista para o instituto da litigância de má fé.
3. No entender dos embargantes, o requerimento executivo é inepto porquanto no requerimento executivo não são articulados factos integrantes da relação jurídica fundamental que esteve na origem da emissão das livranças dadas à execução no entender dos embargantes, em face da homologação do PER da devedora principal e bem assim em face da viabilidade económica da mesma, deverão os autos de execução serem jugados extintos.
4. Uma vez que, a obrigação caucionada não deixou de ser cumprida pela devedora principal, mas tão só o seu vencimento foi deferido, nos termos do Plano de revitalização aprovado, o que acarreta uma modificação da obrigação.
5. Os embargantes não atuaram abusivamente.
6. Os embargantes deduziram os presentes embargos convictos da justeza da sua pretensão que consideram legitima.
7. Os embargantes não litigaram conscientemente, com dolo ou negligência grave, de forma manifestamente reprovável com vista a impedir ou a entorpecer a acão da justiça, ou a deduzir pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não deviam ignorar.
8. Destarte e em face do ante exposto deverá improceder o pedido de condenação como litigante de má fé.
Em 10.02.2017, foi proferido o seguinte Despacho:
Em face do tempo já decorrido desde a apresentação dos articulados e resultando da sentença proferida em 22.07.2015, no Proc. n.º 949/14.3TYLSB, que homologou o plano de recuperação da Indústria de Matérias Primas, Lda. que o crédito do aqui exequente seria pago, de uma só vez, no prazo de 12 meses a contar do trânsito em julgado dessa sentença, através da venda do imóvel hipotecado a seu favor ou,  nos 90 dias seguintes, em dinheiro, notifique o exequente para, em 10 dias, informar se a quantia que reclamava na execução já lhe foi paga ou, na negativa, por que razão ainda não o foi.
Em 02.03.2017, a exequente, BANCO P. respondeu, informando que a quantia reclamada na execução ainda não foi paga. Mais invocou que, não obstante o plano de recuperação ter sido aprovado e homologado, em 22.07.2015, e da decisão ter resultado que o crédito do Exequente seria pago de uma só vez, no prazo de 12 meses a contar do trânsito em julgado da sentença homologatória do plano, através da venda do imóvel, ou nos 90 dias seguintes, em dinheiro, o acordado no plano foi totalmente incumprido não tendo sido paga qualquer quantia, não obstante as interpelações efectuadas para o efeito.
Em 25.10.2017 o Tribunal  a quo proferiu despacho saneador e, por entender que o estado do processo permitia, sem necessidade de mais provas, o conhecimento do mérito, nos termos do disposto no art. 595.º, n.º 1, al. b), do Código de Processo Civil, dispensou a realização de audiência prévia, por manifestamente inútil, ao abrigo dos artigos 6.º e 130.º do CPC e conheceu, de imediato, do fundo da causa, entendendo não se mostrar necessário elencar quaisquer factos, dado que as questões levantadas são meramente jurídicas e, pela sua natureza, não carecem de qualquer elenco de factos.
Consta, assim, do Dispositivo da sentença, o seguinte:
Em face do exposto, julgo improcedentes os presentes embargos de executado e, consequentemente, a execução que constitui os autos principais seguirá os seus ulteriores termos.
Custas pelo embargante, nos termos do art. 527.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil.
Registe e notifique.
Inconformados com o assim decidido, os embargantes interpuseram, em 29.11.2017, recurso de apelação, relativamente à sentença prolatada.
São as seguintes as CONCLUSÕES dos recorrentes:
i. Os autos de execução foram instaurados contra os recorrentes, porque estes se constituíram avalista na livrança subscrita a favor da Sociedade Indústria de Matérias Primas, Lda.
ii. A empresa entrou em PER processo que correu seus termos sob o nº949/14.3TYLSB, na 1ª secção de Comércio, J5, do Tribunal judicial da Comarca de Lisboa.
iii. Apelado reclamou o seu crédito, no montante de €202.603,96, o qual foi devidamente reconhecido pelo Administrador Judicial como credito garantido.
iv. O apelado apenas poderá ver ressarcido o seu crédito em conformidade com o Plano aprovado no PER, pelo que a obrigação exequenda, à data da propositura da execução, ainda não era exigível.
v. A aprovação do plano da insolvência, o qual aprovou o crédito, alterou o prazo do cumprimento da obrigação, o que beneficia o avalista, torna inexigível a obrigação exequenda, por causa superveniente.
vi. Com a aprovação do PER e sua homologação por sentença, foi alterado o prazo de cumprimento da obrigação e deixou de se verificar os pressupostos que decorrem do art.519º do CC.
vii. Como foi alterado o prazo de cumprimento da obrigação, a qual, não sendo  imediatamente  exigível,  se  repercute  necessariamente  na relação processual estabelecida entre o exequente e os avalistas, no processo executivo contra estes instaurado.
viii. E como a dívida avalizada só é exigível quando estiver vencida, não poderia o Apelado lançar mão da execução contra os ora Apelantes.
ix. Pelo que, ao decidir como decidiu, fez o Tribunal "a quo" errada interpretação e aplicação do disposto nos arts. 30º, 31 º, 32º e 77º da LULL, 512º, nº1, 519º do CC
A recorrida apresentou contra-alegações, defendendo a manutenção do decidido e formulou as seguintes CONCLUSÕES:
i. O recurso foi interposto do despacho saneador-sentença proferido em 25.10.2017 que julgou improcedentes os embargos de executado.
ii. Os Recorrentes alegam a violação dos artigos 30°, 31°, 32° e 77° da LULL e art. 512° e 519 do CPC.
iii. Os Recorrentes voltam a invocar o mesmo fundamento: a inexigibilidade do crédito exequendo por força da homologação do PER.
iv. Repisando os mesmos argumentos que mereceram o devido julgamento por parte do tribunal recorrido, relativamente ao qual nada há a apontar, é manifesto que não assiste razão aos Recorrentes.
v. Os autos de execução foram instaurados contra os Recorrentes na qualidade de avalistas.
vi. Porém, ao contrário do que pretendem os Recorrentes, o PER da subscritora não obsta à execução contra os avalistas das obrigações da sociedade recuperada.
vii. Pois, as livranças já se encontravam preenchidas à data do despacho de nomeação de administrador judicial provisório da subscritora, pelo que a homologação do PER não beneficia os avalistas, nem torna inexigível a obrigação exequenda.
viii. O art. 217.°, n.° 4 do CIRE determina que a existência de um plano não afeta os créditos dos credores da insolvência sobre codevedores ou terceiros.
ix. A decisão do tribunal está em perfeita consonância com o entendimento unânime da doutrina e da jurisprudência dos nossos tribunais.
x. São inúmeros os arestos dos tribunais superiores que preconizam a posição assumida pelo tribunal recorrido, de que o PER vale apenas entre as partes envolvidas (o devedor e os respetivos credores), não tendo aplicação a outros codevedores
xi. Designadamente, assim o entendeu o Supremo Tribunal de Justiça em 26.02.2013, É, pois, de concluir que a aprovação do plano de insolvência da sociedade subscritora da livrança, "GG, S.A. ", onde passou a existir uma moratória para o cumprimento das suas obrigações, quanto ao pagamento dos seus débitos, não é invocável pelos respectivos avalistas, ora recorrentes, contra quem o Banco portador da mesma livrança instaurou a presente execução para obter o seu pagamento.
xii. A sentença recorrida não enferma de erro de interpretação, não violou as normas jurídicas invocadas, nem qualquer outra norma jurídica, pelo que deverá manter-se integralmente.
Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

II. ÂMBITO DO RECURSO DE APELAÇÃO

Importa ter em consideração que, de acordo com o disposto no artigo 635º, nº 4 do CPC, é pelas conclusões da alegação dos recorrentes que se define o objecto e se delimita o âmbito do recurso, sem prejuízo das questões de que o tribunal
ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.

Assim, e face ao teor das conclusões formuladas a solução a alcançar pressupõe a análise das seguintes questões:
i. DAS CARACTERÍSTICAS DOS TÍTULOS DADOS À EXECUÇÃO;
ii. DAS REPERCUSSÕES DA APROVAÇÃO DE UM PLANO DE REVITALIZAÇÃO APRESENTADO NO ÂMBITO DO PER, REQUERIDO PELA SUBSCRITORA DAS LIVRANÇAS DADAS À EXECUÇÃO, COM RELAÇÃO AOS AVALISTAS
Ø Por forma a apurar se tal Plano de Revitalização aproveita aos avalistas da avalizada acarretando a inexigibilidade da obrigação daqueles.

III . FUNDAMENTAÇÃO
A – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Com relevância para a decisão a proferir, importa ter em consideração a alegação factual referida no relatório deste acórdão, cujo teor aqui se dá por reproduzido.


B - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

No caso vertente estamos perante três livranças que foram dadas à execução como título executivo.

A livrança é um título de crédito à ordem cujo conteúdo envolve, além do mais, a promessa pura e simples por uma pessoa de pagar a outra determinada quantia (artigo 75º da Lei Uniforme sobre Letras e Livranças - LULL).
Pela aposição da assinatura na livrança, o emitente desta obriga-se a pagá-la na data do vencimento.  E, segundo o artigo 78º da L.U.L.L., o subscritor de uma livrança é responsável da mesma forma que o aceitante de uma letra.
Há, porém, uma diferença fundamental neste aspecto entre a letra e a livrança. Enquanto naquela, o emitente (sacador) se obriga a fazer pagar, porque delega o pagamento no sacado e, só se responsabiliza como obrigado suplente, i.e., como obrigado em via de regresso se, o sacado, a não pagar; nesta, é o próprio emitente que se obriga a pagar na época do vencimento.
Na livrança o emitente é, pois, o obrigado principal. Daí a equiparação expressa, no artigo 78º do LULL, ao aceitante de uma letra. 
O negócio subjacente da emissão da livrança é simplesmente a soma de dinheiro que o emitente reconhece ter recebido do tomador.
No caso das livranças que servem de títulos executivos, a sociedade Indústria de Matérias Primas, Lda. foi subscritora das mesmas, e os executados/embargantes nelas apuseram a respectiva assinatura, na qualidade de avalistas, sendo a exequente a portadora das ditas livranças.
Dúvidas não há que os embargantes são obrigados cambiários. Estes, apuseram as respectivas assinaturas no verso das livranças dadas à execução, o que significa que se obrigaram ao pagamento das mesmas, de harmonia com o disposto no artigo 31º, aplicável ex vi dos artigos 78º e 77º, ambos da LULL.
O regime jurídico do aval encontra-se estabelecido nos artigos 30.º a 32.º da Lei Uniforme de Letras e Livranças.
O aval, nos termos do artigo 30º da LULL, é o acto pelo qual um terceiro ou um signatário da letra ou de uma livrança garante o pagamento desse título, por parte de um dos respectivos subscritores - v. F. CORREIA, Letra de Câmbio, 198. 
A função do aval é uma função de garantia, inserida ao lado da obrigação de um certo subscritor cambiário, a cobri-la ou caucioná-la, sendo o dador de aval, nos termos do artigo 32º, nº 1, da LULL, responsável da mesma maneira que a pessoa por ele afiançada, o que significa que a medida da responsabilidade do avalista é a do avalizado.
Com efeito, a obrigação do avalista subsiste independentemente da obrigação do avalizado, como resulta do artigo 32º da LULL, ao estatuir que: O dador de aval é responsável da mesma maneira que a pessoa por ele afiançada. A sua obrigação mantém-se, mesmo no caso de a obrigação que ele garantiu ser nula por qualquer razão que não seja um vício de forma.
Por força do disposto nos artigos 43º a 48º da LULL., aplicável ex vi do artigo 77º do mesmo diploma, o portador pode exercer o seu direito de acção contra qualquer obrigado cambiário, reclamando o pagamento da livrança não paga e juros, despesas de protesto, avisos dados e outras despesas. 
Diz-se no artigo 47º do mesmo diploma que Os sacadores, aceitantes, endossantes ou avalistas de uma letra são todos solidariamente responsáveis para com o portador.
Esta solidariedade é uma solidariedade imprópria posto que aqueles não se encontram vinculados nos termos em que o estão os devedores na solidariedade passiva (artigo 512º e segts do C.C .).
A solidariedade dos obrigados cambiários significa apenas que o portador do título pode exigir de qualquer dos responsáveis, individual ou colectivamente, a totalidade da letra ou de livrança, sendo o aceitante ou o subscritor o único obrigado directo, o devedor principal da prestação cambiária e, o sacador, endossante e respectivos avalistas são os obrigados indirectos. 
É verdade que o avalista do subscritor da livrança responde perante o portador do título nos termos em que este responde, podendo ser accionado pelo portador, individualmente ou juntamente com os demais subscritores. Mas, o avalista não é responsável ou não se obriga ao cumprimento da obrigação constituída pelo avalizado (obrigação subjacente), mas ao pagamento da quantia titulada no título de crédito (obrigação cartular), constituindo esta uma obrigação autónoma e independente daquela.
No caso em apreço, as livranças dadas à execução, foram entregues à exequente, em branco, com as assinaturas quer da subscritora, quer dos executados/avalistas e a exequente completou o seu preenchimento.
Admite a lei, no artigo 10º da LULL., aplicável à livrança ex vi do artigo 77º da LULL, a emissão de livranças incompletas, devendo o seu preenchimento ser efectuado nos limites e termos ajustados, mediante o que se designa por contrato ou pacto de preenchimento.
O pacto de preenchimento é o acto pelo qual as partes ajustam os termos em que deverá definir-se a obrigação cambiária, tais como a fixação do seu montante, as condições relativas ao seu conteúdo, o tempo do vencimento, a sede do pagamento. 
E, aquele que emite uma livrança em branco atribui a quem a entrega, o direito de a completar, em determinados termos, pelo que o preenchimento da mesma só é abusivo se for efectuado com desrespeito pelo contrato de preenchimento.
A livrança subscrita em branco, uma vez preenchida, constitui título executivo, que importa a constituição de uma obrigação pecuniária, dotada de força executiva, valendo por si, atendendo às características da incorporação da obrigação no título, da literalidade, em que o título se define pelos exactos termos que dele constem, da autonomia do direito do portador legítimo do título e da abstracção, em que a existência e validade da obrigação prescinde da causa que lhe deu origem.
No caso em análise, não foi colocado em causa que a exequente não estivesse autorizada a preencher as livranças entregues em branco, com as assinaturas da subscritora e dos avalistas, o que estes invocam é a circunstância da subscritora das livranças ter requerido um processo especial de revitalização que, embora posterior ao vencimento das livranças, será inexigível aos executados/embargantes o pagamento das aludidas livranças, questão que se analisará subsequentemente.

ii. DAS REPERCUSSÕES DA APROVAÇÃO DE UM PLANO DE REVITALIZAÇÃO APRESENTADO NO ÂMBITO DO PER, REQUERIDO PELA SUBSCRITORA DAS LIVRANÇAS DADAS À EXECUÇÃO, COM RELAÇÃO AOS AVALISTAS
Como acima ficou dito, o avalista não se obriga ao cumprimento da obrigação constituída pelo avalizado, mas tão somente ao pagamento da quantia titulada no título de crédito.
Por virtude da autonomia da obrigação cartular face à obrigação subjacente, aquela permanecerá, independentemente das vicissitudes e alterações da obrigação causal.
É, por isso, entendimento uniforme na doutrina e na jurisprudência que o avalista não pode defender-se com as excepções que o seu avalizado pode opor ao portador do título, salvo o do pagamento – v. neste sentido VAZ SERRA, R.L.J. 113, 186, nota 2 e, a título meramente exemplificativo, Ac. STJ de 19.06.2006, CJ/STJ, 2º, 118.
E, é precisamente em resultado desta autonomia da obrigação do avalista que melhor se compreende o que decorre do nº 4 do artigo 217º do CIRE que expressamente estabelece: “As providências previstas no plano de insolvência com incidência no passivo do devedor não afectam a existência nem o montante dos direitos dos credores da insolvência contra os condevedores ou os terceiros garantes da obrigação, mas estes sujeitos apenas poderão agir contra o devedor em via de regresso nos termos em que o credor da insolvência pudesse exercer contra ele os seus direitos”.
Consagrou o legislador, no citado preceito, o entendimento de que o credor mantém incólumes os direitos de que dispunha contra condevedores e terceiros garantes, podendo exigir deles tudo aquilo por que respondem e no regime de responsabilidade originário, sem prejuízo, evidentemente, do regime geral das relações entre os co-obrigados e garantes e estes com o devedor – v. a este propósito LUÍS A. CARVALHO FERNANDES E JOÃO LABAREDA, CIRE ANOT., II vol., 130-131.
É certo que, formalmente, o plano de insolvência e o plano de recuperação, aprovado no âmbito de um processo especial de revitalização, são realidades jurídicas distintas.
Mas, como se referiu no Ac. TRC de 27.06.2017 (Pº 780/14.6TBVIS-A.C1), acessível em www.dsgi.pt., na prática, a diferenciação entre essas duas realidades decorre apenas da circunstância de se inserirem em processos distintos (processo de insolvência ou processo de revitalização), sendo que, no primeiro caso, o plano incide sobre um devedor já declarado insolvente, incidindo, no segundo caso, sobre um devedor que está em situação de insolvência meramente iminente.
No que concerne ao conteúdo e objectivos, tais processos são semelhantes, visando essencialmente a adopção de um conjunto de providências que se destinam a satisfazer os direitos dos credores pela forma que se entenda necessária para permitir a efectiva recuperação e viabilidade económica do devedor.
Determina, aliás, o próprio artigo 17º-F, nº 5, do CIRE, que o juiz, na decisão a proferir sobre a homologação ou não do plano de recuperação, deve aplicar, com as necessárias adaptações, as regras vigentes em matéria de aprovação e homologação do plano de insolvência previstas no título IX, sendo que, nesse título IX, estão incluídas as normas referentes ao conteúdo do plano, bem como o supra referido artigo 217º do CIRE.
O plano de recuperação ou o plano de insolvência é, por conseguinte, constituído por um conjunto de medidas que só se aplicam à sociedade em recuperação ou insolvente, não sendo razoável que o credor ficasse inibido de accionar os respectivos avalistas, que não são alvo do processo de recuperação ou de insolvência, não se encontrando, assim, impossibilitados de cumprir as obrigações cartulares livremente assumidas e que se mostram vencidas em datas anteriores aos aludidos planos, precisamente face à autonomia da obrigação do aval que prestaram.
É, portanto, e como acima ficou dito, a autonomia do aval relativamente à relação subjacente, que justifica que o aval não seja afectado pelas vicissitudes da relação subjacente, mais concretamente pela nova conformação do crédito decorrente da aprovação e homologação do plano de recuperação ou de insolvência.
A autonomia da obrigação cartular impede que os acordos homologados em planos de insolvência ou em processos de revitalização impliquem a consequente alteração daquela obrigação cartular anteriormente constituída e incumprida. A aprovação e homologação do plano de recuperação da sociedade subscritora das livranças dadas à execução não é invocável pelos respectivos avalistas contra quem o Banco, portador de livranças vencidas e não pagas em data anterior à instauração do processo especial de revitalização.
A doutrina da autonomia da obrigação do avalista está conforme e harmoniza-se perfeitamente com o preceituado no artigo 217º, n.º 4, do CIRE, sendo que a aprovação e homologação de plano de recuperação ou de plano de insolvência da sociedade subscritora das livranças, e o que aí se faça constar quanto ao cumprimento das suas obrigações/débitos, não é invocável pelos respectivos avalistas/recorrentes, contra quem o Banco portador das livranças instaurou acção executiva.
Ademais, perante o estatuído no artigo 17º-E, n.º 1, no confronto com a previsão do artigo 88º, n.º 1 do CIRE, segundo o qual “A declaração de insolvência determina a suspensão de quaisquer diligências executivas ou providências requeridas pelos credores da insolvência que atinjam os bens integrantes da massa insolvente e obsta à instauração ou ao prosseguimento de qualquer acção executiva intentada pelos credores da insolvência; porém, se houver outros executados, a execução prossegue contra estes”, expressamente salvaguarda a continuidade da acção contra os demais executados, sendo que a posição dos credores passa pela continuidade ou prosseguimento das acções ou providências de natureza executiva, até porque a paragem do processo quanto a todos os requeridos/executados pode prejudicar os interesses dos credores sem trazer nenhum ganho em troca – cfr. neste sentido, CARVALHO FERNANDES E JOÃO LABAREDA, ob. cit., 165.
Assim, o plano de recuperação aprovado e homologado no processo de revitalização só diz respeito e só vincula os credores e o devedor que se apresentou à revitalização e o que aí foi acordado, quer quanto à dívida deste, quer quanto à eventual prorrogação do prazo de pagamento, perdão parcial ou períodos de carência, não é extensível às obrigações dos condevedores nem dos garantes, nem por estes invocável, permanecendo inalteradas as respectivas obrigações.
Há, pois, que concluir que a aprovação/homologação do plano de recuperação da  sociedade subscritora das livranças dadas à execução, vencidas e não pagas em datas anteriores ao PER,  não aproveita aos avalistas, não sendo, portanto, susceptível de ser invocado pelos executados/apelantes, uma vez que o credor/exequente, portador das livranças, não está inibido de accionar os avalistas - como fez - face à autonomia da obrigação do aval que estes prestaram, entendimento que, de resto, tem sido unânime, desde há muito, na jurisprudência – v. neste sentido, entre muitos e a título meramente exemplificativo, Acs. STJ de 26.02.2013 (Pº 597/11.0TBSSB-A.L1.S1) e de 28.04.2016 (Pº 1106/12.9YYPRT-B.P1.S1); Acs. R. L. de 26.06.2012 (Pº 597/11.0TBSSB-A.L1), de 21.11.2013 (Pº 16/13.7TBSCF-A.L1 relatado pelo ora relatora), de 04.05.2015 (Pº 125/13.2TCFUN-A.L1-6) e de 17.05.2016 (Pº 20931/12.7TYLSB-A.L1); Acs. TRP de 09.07.2014 (Pº 1213/12.8TBVFR-B.P1), de 16.09.2014 (Pº 1527/13.0TBVNG-A.P1), de 07.10.2014 (Pº 3803/13.2TBGDM-A.P1) e de 18.04.2017 (Pº 10562/16.5T8PRT-A.P1); Acs. TRC de 23.05.2017 (Pº 789/15.2T8PBL-B.C1) e de 27.06.2017 (Pº 780/14.6TBVIS-A.C1); TRG de 04.12.2008 (Pº 2523/08-1) e de 11.09.2012 (Pº 1642/10.1TBGMR-B.G1); Acs. TRE de 08.02.2018 (Pº 709/14.1TBOLH-C.E1) e de 22.02.2018 (Pº 2484/13.8TBABF-A.E1), acessíveis em www.dgsi.pt.
Soçobra, por conseguinte, a apelação, confirmando-se a decisão recorrida.
Vencidos, são os recorrentes responsáveis pelas custas respectivas - artigo 527º, nºs 1 e 2 do CPC.

IV. DECISÃO

Pelo exposto, acordam os Juízes desta 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar improcedente o recurso, confirmando-se a decisão recorrida e em condenar os recorrentes no pagamento das custas respectivas.

Lisboa, 7 de Junho de 2018

Ondina Carmo Alves - Relatora
 
Pedro Martins

Arlindo Crua 

Declaração de Voto
Concordo com a decisão final, mas não com a fundamentação, pelo que se segue:
Não se pode dizer, sem mais, que “a aprovação de um plano de revitalização em benefício da sociedade subscritora de uma livrança, com a modificação do crédito, não aproveita aos respectivos avalistas, não podendo estes invocar tal circunstância na oposição à execução instaurada pelo portador da livrança.”
Pois que se até lá não tiver havido incumprimento da obrigação subjacente (o que é possível acontecer perante um PER – antes da insolvência - e já não perante um PR – depois da insolvência), a modificação dela no PER vai necessariamente reflectir-se na obrigação do pré-avalista. É que o preenchimento da livrança ocorrerá então depois da modificação da obrigação e por isso a livrança só poderá ser preenchida tendo em conta essa modificação.
E sendo assim, também não se pode dizer que um PR (depois da insolvência) e um PER são, para o que interessa, semelhantes e que o art. 217/4 do CIRE seja aplicável à questão.
No caso, concordo com a solução final, porque o incumprimento da obrigação – segundo decorre dos factos que é possível retirar do relatório do acórdão –, tal como o preenchimento das livranças, ocorreu antes da homologação do plano, ou melhor, terá ocorrido até antes do requerimento do PER.
Para o que antecede, tive em consideração a anotação de Carolina Cunha ao ac. do STJ de 04/05/2017, RLJ 147/4007, Nov/Dez 2017, págs. 119 e segs, e especialmente págs 134 a 138 (o que também imporia algumas correcções nalgumas passagens secundárias do ac. do TRL de 16/03/2017, proc. 794/15.9T8FNC-B-2, de que fui relator).
Pedro Martins