Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
5324/14.7YYLSB-A.L1-6
Relator: GABRIELA DE FÁTIMA MARQUES
Descritores: EMBARGOS DE EXECUTADO
INUTILIDADE SUPERVENIENTE DA LIDE
OBRIGAÇÃO ILÍQUIDA
LIQUIDAÇÃO DA OBRIGAÇÃO
CÁLCULO ARITMÉTICO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 03/14/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I. Face a uma decisão do Tribunal Superior que entendeu que a liquidação da dívida exequenda dependia de simples cálculo aritmético, existe neste caso a inutilidade superveniente dos embargos de executado com o fundamento na incerteza, inexigibilidade e iliquidez da obrigação.
II. A discussão que o executado poderá efetuar em sede de embargos apenas pode visar os elementos controvertidos que presidiram ao simples cálculo da obrigação, mas não aqueles que já se encontram abrangidos pela segurança do título executivo que constitui a sentença condenatória.
III. Não constando dos embargos a impugnação dos factos que determinaram a liquidação da obrigação nos termos enunciados pela exequente, a obrigação consolidou-se pela decisão que determinou que podia ser liquidada por simples cálculo aritmético.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes na 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa:

I. Relatório:
CA… intentou ação executiva para pagamento de quantia certa contra C…, apresentando como título executivo a sentença proferida na 10ª Vara Cível de Lisboa, 3ª secção no processo n° 5361/06.5TVLSB, transitada em julgado, procedendo à liquidação no requerimento executivo da seguinte forma: «Os factos constam exclusivamente do título executivo. Acontece que o título executivo não liquida a dívida e como tal cumpre fazê-lo nesta fase. Decidiu-se na sentença: - condenar o R. a pagar ao A. o montante correspondente à diferença entre a quantia de €. 26.569,41 já paga pelo R. e o valor dos trabalhos realizados pelo A., este a apurar em incidente de liquidação, caso o valor que venha a ser apurado seja superior ao montante pago pelo R., acrescido de juros de mora, desde a data de decisão de liquidação até integral pagamento. Ora, o valor total orçamentado e adjudicado para a realização dos trabalhos foi de €. 48.662,72. Ficou provado que o A. realizou todos os trabalhos acordados à excepção dos seguintes:
-   remoção do entulho para ao vazadouro municipal;
-   colocação de pedras moleanas no átrio do prédio;
- reconstituição do espaço onde montou o estaleiro, na fracção correspondente ao 9º A;
-  pintura de parte da empena lateral;
-  limpeza e pintura das grades dos estendais;
-  isolamento do pavimento ao pé das grades do terraço;
-  reparação de caleiras do telhado;
-  montagem e pintura de tubo de saída de águas do telhado;
- pintura dos pilares da entrada;
- limpeza e pintura da pala da entrada;
- montagem da totalidade dos blocos de vidro da entrada;
- pintura de cor verde garrafa na porta principal, caixas de correio, portão do terraço, portas dos elevadores, janela lateral e portão da garagem;
-  montagem de diversos cabos estendais;
-  afinação de diversas roldanas, coladas de tinta;
- desentupimento dos esgotos do terraço a alta pressão, onde se encontravam areias.
Com a realização destes trabalhos, à excepção da colocação das pedras moleanas no átrio do prédio, o R. teve que pagar a terceiros a quantia de €. 4.618,87.
A colocação das pedras moleanas importa na quantia de €. 1.197,11, conforme orçamento que se junta.
A remoção do entulho importa em €. 94.77, conforme orçamento que se junta.
Assim, face ao exposto e atenta a decisão proferida à que subtrair ao valor total da obras, o valor que o R. pagou e como tal há um saldo a favor do A. no valor de €. 22.093,31 há que subtrair o montante de € 4.618,87, bem como o montante de € 1.197,11 e o montante de € 94,77.
- Pelo que resulta um saldo credor a favor do autor no montante de € 16.182,56, valor este líquido e em dívida e que se reclama o seu pagamento por meio desta acção executiva.
- A este valor acrescem os respectivos juros desde a data da liquidação até efectivo e integral pagamento».
Após a citação do executado nos termos dos artºs 716º nº 3 e 4 e 728º do CPC, e tendo o executado embargado, ao abrigo do artº 734º do CPC, foi rejeitada oficiosamente a execução e declarada a mesma extinta.
Inconformado recorreu a exequente, pedindo a revogação da decisão, tendo sido proferido Acórdão, datado de 28/06/2017, que ordenou o prosseguimento da execução, concluindo que face à sentença condenatória e o requerimento executivo não estaríamos perante uma obrigação genérica cuja liquidação dependa do mecanismo legal previsto nos artº 358º e ss. do CPC.
Considerando o Acórdão proferido, foi pelo juiz a quo nestes embargos de executado proferido o seguinte despacho:« Atendendo ao teor da decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Lisboa, junto aos autos de execução a fls. 120 e seguintes, o prosseguimento dos presentes embargos, por extinção do respectivo objecto, perdeu a razão de ser, estando manifestamente prejudicada a apreciação da invocada excepção de inexistência de título executivo, único fundamento relevante, aliás, no âmbito dos embargos.
Assim sendo, e sem necessidade de maiores considerações, julgo extintos os presentes embargos de executado, por inutilidade superveniente da lide – art. 277.º, alínea e) do Código de Processo Civil.
Custas pelo embargante.
Registe e notifique.
Comunique ao Sr. Agente de Execução.
Lisboa, d.s.»
A executada recorreu deste despacho, pedindo a revogação da decisão substituindo-a por outra que ordene a primeira instância a julgar os embargos de executado, na parte que falta apreciar, isto é, o estatuído na alínea e) do artigo 729.º do CPC ou no limite, ordene o tribunal a quo a proferir sentença que aprecie e valide os valores indicados pelo exequente no seu requerimento executivo, em face do assacado pela executada nos artigos 16.º a 20.º dos embargos. Para tanto, formulou as seguintes conclusões:
«1. A sentença recorrida ao declarar a extinção dos autos de embargos de executado, por inutilidade superveniente da lide, violou a alínea e) do artigo 277.º do CPC.
2. Com efeito, compulsada essa sentença vislumbra-se, para respaldar a inutilidade superveniente dos embargos, que “atendendo ao teor da decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Lisboa, junto aos autos de execução a fls. 120 e seguintes, o prosseguimento dos presentes embargos, por extinção do respectivo objecto, perdeu a razão de ser, estando manifestamente prejudicada a apreciação da invocada excepção de inexistência de título executivo, único fundamento relevante, aliás, no âmbito dos embargos”. (sublinhado nosso)
3. Sucede que, tal impossibilidade apenas existirá quando, por facto ocorrido na pendência da instância, a pretensão do autor não se poder manter, em virtude do desaparecimento dos sujeitos ou do objecto do processo, ou se encontra satisfação fora do esquema da providência pretendida.
4. Todavia, nos presentes autos, nem o exequente nem a executada foram extintos, nem os fundamentos de oposição á execução poderiam ser alegados em outra sede processual que não nos embargos de executado, e muitos menos que o objecto destes últimos tenha sido extinto.
5. Por tal motivo, e ao contrário do que a decisão recorrida pretende fazer crer, a inexistência de título executivo não foi o único fundamento de oposição à execução alegado pela executada. (sublinhado nosso)
6. Na verdade, e feita uma leitura atenta da integralidade dos embargos deduzidos, nomeadamente dos seus artigos 16.º a 20.º, aí se alcança que a executada também alegou que o valor apurado pelo exequente não tem suporte factual, (sublinhado nosso)
7. Porquanto, entre outros reparos, como deixou a executada dito no artigo 19.º dos seus embargos, relativamente aos trabalhos efectivamente prestados, o exequente não alegou, nem provou, “qual o valor que despendeu em mão-de-obra e materiais na concretização dos mesmos”.
8. isto é, que a obrigação exequenda liquidada pelo exequente é incerta, ilíquida e inexigível, tal como afirmou em jeito de conclusão, naquele artigo 20.º. (sublinhado nosso)
9. Dito ainda de outro modo, a executada na sua oposição à execução invocou não só o fundamento estatuído na alínea a) do artigo 729.º do CPC, mas também o disposto na alínea e) do mesmo preceito legal.
10. Aliás, para tanto, bastará ver que nos embargos, após a executada ter até ao seu artigo 15.º alegado factos tendentes à demonstração da inexistência do título executivo, no final daquele mesmo artigo, mencionou que “caso assim se não entenda, o que por hipótese meramente académica se concebe, sempre se dirá que”, (sublinhado nosso)
11. o que pressupõe no mínimo dois fundamentos.
12. Por tal motivo, o objecto dos embargos não foi extinto, ao invés, ele subsiste na obrigação de o tribunal a quo se pronunciar sobre a falta dos requisitos de exequibilidade da obrigação exequenda, tal como a executada assacou nos seus embargos à liquidação da obrigação exequenda indicada pelo exequente. (sublinhado nosso)
13. Acresce que, ao ter a instância recorrida, no seguimento da decisão singular da Relação de Lisboa de 28/06/2017, julgado extintos os autos de embargos por inutilidade, não admitindo a oposição apresentada, inevitavelmente sonegou à executada a possibilidade de exercer o seu direito de defesa, tendo-lhe sido em consequência negado o acesso ao tribunal.
14. Partindo do pressuposto que a obrigação genérica poderia ser liquidada no requerimento executivo, como decidiu a Relação de Lisboa, note-se que nos artigos 16.º a 20.º dos embargos de executado, já não está em causa a inexistência de título, mas sim a liquidação entretanto indicada pelo exequente no seu requerimento executivo.
15. Dito de outro modo, uma coisa é a decisão singular da Relação de Lisboa ter considerado que a liquidação de condenação genérica, nos presentes autos, não necessitava de se efectuar mediante o recurso a um incidente de liquidação, podendo ser realizada no próprio requerimento executivo,
16. outra, completamente distinta, é a executada ter refutado a liquidação feita pelo exequente naquele requerimento, e ver-se agora confrontada perante a decisão do tribunal a quo de, sobre os valores indicados e pela Apelante refutados, não ter pronunciado uma única palavra,
17. isto é, não ter julgado, ou no limite, sentenciado a factualidade arrolada pela executada no sentido de indagar dos requisitos de exequibilidade da obrigação exequenda.
18. Aliás, e no sentido de ser dado cumprimento a esse propósito, acautelando o direito de defesa da executada relativamente ao valor liquidado pelo exequente, a decisão singular da Relação de Lisboa de 28/06/2017, na sua pág. 7 (fls. 120 e ss. dos autos de execução), apontou que “cabendo ao executado, discordando da liquidação feita pelo exequente, opor-se à execução com fundamento no art. 729.º...alíena e) – incerteza, inexigibilidade ou iliquidez da obrigação exequenda, tal como ela é definida pelo exequente no requerimento executivo”. (sublinhado nosso)
19. Na verdade, tendo sido permitido liquidar a obrigação exequenda no próprio requerimento executivo, nada obriga, como não poderia deixar de ser, a executada a aceitar irremediavelmente o ali indicado. Daí que, este fundamento para oposição, ao contrário do que parece resultar da sentença recorrida, não possa ser interpretado como sendo irrelevante, senão vejamos.
20. Na pág. 10 da sentença dada à execução é dito que o exequente “realizou no prédio os trabalhos acordados, à excepção dos referidos na resposta ao artº 12º; desconhecendo-se, porém, o valor desses trabalhos”. (sublinhado nosso)
21. Mais à frente, na pág. 11 daquela sentença foi decidido “condenar o R. a pagar a A. o montante corresponde à diferença entre a quantia de €26.569,41 já paga pelo R. e o valor dos trabalhos realizados pelo A., este a apurar em incidente de liquidação, caso o valor que venha a ser apurado seja superior ao montante pago pelo R…”. (sublinhado nosso)
22. Sucede que, compulsado o requerimento executivo, e no seguimento do dito no título dado à execução, aí se alcança que o exequente não indica qual o valor dos trabalhos realizados.
23. Daí que a executada tenha alegado nos seus embargos que a obrigação exequenda era incerta e ilíquida, sem suporte factual, porquanto não poderá a operação aritmética feita pelo exequente se traduzir na subtração do valor pago pela executada, à quantia total da obra adjudicada, quando, ao invés, aquela subtração deveria ter sido feita entre o valor de 26.569,41€ e o valor dos trabalhos realizados.
24. E para provar que tal subtração não respeito os limites do título, bastará ler o início do último paragrafo do requerimento executivo, no qual o exequente alegou que, “face ao exposto…à que subtrair ao valor total da obra, o valor que o R. pagou…”. (sublinhado nosso)
25. Aliás, salvo o devido respeito, só se pode concluir que o exequente confundiu a expressão “valor dos trabalhos realizados”, com a expressão “valor total da obra”
26. E por o título executivo ser claro na operação aritmética a realizar, por idêntico raciocínio, também não poderia o exequente abater o valor das pedras moleanas, da remoção do entulho, bem como o valor despendido com terceiros para a conclusão da obra.
27. Não obstante, e sem conceder, a ser tal possível, note-se que os valores de 1.197,11€ e de 94,77€, referentes à colocação das pedras moleanas e à remoção do entulho, são verbas tão só respaldas em orçamentos apresentados pelo exequente, fabulando o exequente, não provando sequer se esses valores foram os pagos pela executada para realização destes dois serviços.
28. E muito menos, o exequente indicou e provou, o valor correspondente aos demais serviços que não logrou concluir, e tal não é de menor importância na medida em que o valor desses serviços poderia ser superior ao pago pela executada a terceiros, para conclusão dessas obras, estando a Apelante em consequência compelida a pagar uma verba superior à que hipoteticamente seria devido, o que se traduziria numa situação de enriquecimento sem justa causa.
29. Porém, e não menos importante, diz o título dado à execução que a executada apenas seria obrigada a pagar certo valor caso o valor apurado na dita operação de subtração, que nas contas do exequente é de 16.182,56€, fosse superior aos 26.569,41€ já pagos pela executada. O que não se verificou, e daí a executada ter dito nos seus embargos que a obrigação exequenda era inexigível. (sublinhado nosso)
30. Isto é, em suma, e conforme alegou a executada no artigo 16.º dos seus embargos, “o valor exigido pelo exequente não tem suporte factual”.
31. E diga-se que tal nada tem que ver com a inexistência de um título executivo, nem com qualquer discussão relacionada com este fundamento, mas tão só, com o facto de a executada refutar o valor liquidado e indicado pelo exequente.
32. Note-se que, os reparos invocados pela executada, tal como constam dos embargos, podem levar à extinção ou modificação da obrigação exequenda,
33. sendo que, uma coisa é o titulo executivo em si mesmo, outra, e completamente distinta, é a obrigação nele incorporada não deter os requisitos legais necessários.
34. Por tal motivo, não tendo a decisão recorrida procedido à apreciação da verificação dos requisitos de que depende a exequibilidade da obrigação exequenda, tal como havia alegado a executada nos seus embargos, e tal não é um fundamento irrelevante como se viu,
35. não se debruçando sequer a instância recorrida sobre a validade dos valores indicados pelo exequente, preteriu o direito de defesa da Apelante, violando os artigos 728.º do CPC e 20.º da CRP.
36. A tudo acresce que, a sentença recorrida é nula por não se ter pronunciado “sobre questões que devesse apreciar”.
37. Com efeito, ao ter a decisão singular da Relação de Lisboa de 28/06/2017 apenas incidido sobre os autos principais de execução, e não sobre os autos de embargos,
38. não obstante a revogação da sentença de 15/12/2016, aquela decisão singular ter claramente acautelado o direito de defesa da executada nos embargos deduzidos, sempre que não viesse a concordar com a liquidação indicada pelo exequente no requerimento executivo,
39. e tendo a instância recorrida julgado esses embargos extintos por inutilidade superveniente da lide, sem se ter sequer debruçado sobre o fundamento de oposição estatuído na alínea e) do artigo 729.º do CPC, tal como havia alegado a executada,
40. inevitavelmente tal feriu a sentença recorrida de nulidade, por o tribunal a quo não se ter pronunciado sobre uma questão a ele levado, de harmonia com o estatuído na alínea d) do artigo 615.º do CPC.
41. Nulidade que se verifica igualmente, em consequência de o exequente descontar o valor de 26.569,41€ ao valor total da obra adjudicada, quando deveria ter feito a diferença entre aquele valor e a quantia apurada a título de trabalhos realizados,
42. porquanto, ao não ter respeitado a operação aritmética constante do título executivo, excedeu os limites daí constantes, originando uma quantia exequenda superior,
43. motivo pelo qual, recaindo sobre a instância recorrida a obrigação de oficiosamente reconhecer esse excesso, tal como lhe impõe o n.º 3 do artigo 726.º e artigo 734.º, ambos do CPC, e não tendo essa instância dado cumprimento ao dever que sobre si recaia, irremediavelmente tal também acarretou a nulidade da sentença recorrida, como estatui a alínea d) do artigo 615.º do CPC.».
Não foram apresentadas contra-alegações.
O recurso foi admitido e colhidos os vistos cumpre decidir.
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Questão a decidir:
O objecto do recurso é definido pelas conclusões do recorrente (art.ºs 5.º, 635.º n.º3 e 639.º n.ºs 1 e 3, do CPC), para além do que é de conhecimento oficioso, e porque os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, ele é delimitado pelo conteúdo da decisão recorrida.
Importa assim, saber:
- Se face ao Acórdão da Relação de Lisboa proferido na execução, que entendeu que a liquidação da dívida exequenda dependia de simples cálculo aritmético, existe a inutilidade dos embargos de executado com o fundamento de incerteza, inexigibilidade e iliquidez da obrigação.
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II. Fundamentação:
Os elementos fácticos relevantes para a decisão são os constantes do relatório que antecede que se dão por reproduzidos, bem como os seguintes:
1) O título executivo apresentado é a sentença condenatória proferida no proc. nº 5361/06.5TVLSB, que correu termos na 10ª Vara Cível de Lisboa 3ª secção que, na parte ora relevante, dispõe o seguinte: «Da audiência de discussão e julgamento, resultaram provados os seguintes factos:
1- O A., usando o logótipo de S&S, foi contactado pelo R. para realização de trabalhos no prédio da Rua do Patrocínio, nº 00. – al. A) dos factos assentes
2- O A., para realização desta obra, deslocou-se ao local e, posteriormente, elaborou e enviou ao R. um orçamento, que o R. recebeu, tendo adjudicado a obra ao A.. – al. B) dos factos assentes
3- Ficou acordado entre o A. e o R. que o pagamento do preço dos trabalhos, no montante global de Esc. 9.756.000$00 (nove milhões setecentos e cinquenta e seis mil escudos)/€ 48.662,72, seria efectuado da seguinte forma: a) 10% com a adjudicação; b) 40% no início da obra; c) 25% no meio e d) 25% no fim. – al. C) dos factos assentes;
4- O R. efectuou o pagamento de Esc. 4.878.000$00 (€ 24.331,36) do valor da obra. – al. D) dos factos assentes
5- O R. remeteu ao A. a carta datada de 14.12.2000, que se mostra junta a fls. 48, com o seguinte teor: “Admirado com a vossa ausência nestes quinze dias e não encontrando motivo para esta paragem das obras, agradeço que nos informem o que se passa.”. – al. E) dos factos assentes
 6- O R. remeteu ao A. a carta registada datada de 15.01.2001, que foi devolvida com a indicação “Não reclamado”, e que se mostra junta a fls. 49, com o seguinte teor: “Ref.: Obras adjudicadas no prédio da Rua do Patrocínio, nº 65, em Lisboa. (…)  Serve a presente para mais uma vez pedir a V. Exªs para nos informarem o que se passa, pois abandonaram a obra em epígrafe e nada comunicaram a esta Administração. Assim agradeço que na volta do correio ou no prazo máximo de oito dias, nos informe o que se passa.”. – al. F) dos factos assentes
 7- O R. remeteu ao A. a carta registada com aviso de recepção, datada de 29.01.2001, que foi recebida, e que se mostra junta a fls. 52, com o seguinte teor: “Ref.: Obras adjudicadas no prédio da Rua do Patrocínio, nº 65, em Lisboa. (…)  Esta Administração está bastante admirada com o comportamento da v/ forma, pois abandonaram a obra em epígrafe e há cerca de dois meses não aparecem nem respondem às cartas desta administração, apesar da última (15 de Janeiro de 2001) ter sido registada. Dado o v/ estranho comportamento, teremos de tomar medidas drásticas para se acabarem as obras no imóvel. Esperando que tomem uma posição neste assunto, agradeço que entrem em contacto com esta Administração na pessoa de qualquer dos seus Administradores (V… Tel…. telemóvel … ou C… C … ou …). – al. F) dos factos assentes
 8- O R. remeteu ao A. a carta registada, datada de 29.03.2001, que se mostra junta a fls. 55, com o seguinte teor:  “Apesar de se terem comprometido a acabar as obras em epígrafe, depois da nossa última carta de 29/01/2001, o certo é que não apareceram para findar as obras. Assim, esta Administração rescinde o contrato com V. Exªs, pois está à espera desde Novembro de 2000 para se dar por findo o vosso trabalho.”. – al. H) dos factos assentes
9- O A. realizou no prédio os trabalhos acordados, à excepção dos referidos na resposta ao artº 12º. – resposta ao artº 1º da base instrutória
10- Posteriormente ao acordado em C), A. e R. acordaram que o pagamento dos restantes 50% do valor da obra seriam pagos em duas prestações, em Novembro de 2001 e em Novembro de 2002. – resposta ao artº 2º da base instrutória
11- Foi igualmente acordado entre A. e R. que, em resultado da alteração do prazo de pagamento dos restantes 50%, o R. pagaria, em Março de 2001, a quantia de Esc. 975.600$00 (€ 4.866,27), a título de juros. – resposta ao artº 3º da base instrutória
12- O A., a solicitação do R., para que fosse possível transferir dinheiro da conta poupança condomínio para a conta à ordem, emitiu uma factura no valor de Esc. 2.470.572$00/€ 12.323,16, com IVA incluído. – resposta ao artº 7º da base instrutória
13- O A. deixou de comparecer na obra em Novembro de 2000. – resposta ao artº 9º da base instrutória;
14- Após receber a carta datada de 29.01.2001, aludida em G), o A. referiu pretender terminar a obra. – resposta ao artº 10º da base instrutória
15- O R. pagou ao A. as seguintes quantias, que se integram no montante referido em D): a) Esc. 2.471.009$00 (€ 12.325,34), em 12 de Junho de 2000; b) Esc. 1.000.000$00 (€ 4.987,97), em 27 de Junho de 2000; c) Esc. 800.000$00 (€ 3.990,38), em 6 de Julho de 2000; d) Esc. 144.400$00 (€ 720,26), em 1 de Agosto de 2000; e) Esc. 100.000$00 (€ 498,79), em 16 de Outubro de 2000; f) Esc. 111.280$00 (€ 555,06), em 16 de Outubro de 2000; e g) Esc. 700.000$00 (€ 3.491,58), em 20 de Novembro de 2000. – resposta ao artº 11º da base instrutória;
16- O A. não realizou as seguintes obras: a) remoção do entulho para o vazadouro municipal; b) colocação de pedras moleanas no átrio do prédio; c) reconstituição do espaço onde montou o estaleiro, na fracção correspondente ao 9º A; d) pintura de parte da empena lateral; e) limpeza e pintura das grades dos estendais; f) isolamento do pavimento ao pé das grades do terraço; g) reparação de caleiras do telhado; h) montagem e pintura de tubo de saída de águas do telhado; i) pintura dos pilares da entrada; j) limpeza e pintura da pala da entrada; l) montagem da totalidade dos blocos de vidro da entrada; m) pintura de cor verde garrafa na porta principal, caixas de correio, portão do terraço, portas dos elevadores, janela lateral e portão da garagem; n) montagem de diversos cabos estendais; o) afinação de diversas roldanas, coladas da tinta; p) desentupimento dos esgotos do terraço a alta pressão, onde se encontravam areias. – resposta ao artº 12º da base instrutória;
17- O R. contratou pessoal para realizar os trabalhos referidos na resposta ao artº 12º, à excepção da colocação de pedras moleanas no átrio do prédio, tendo pago o montante de € 4.618,87. – resposta ao artº 13º da base instrutória»;
2) No âmbito do dispositivo da sentença concluiu-se: «(…) Pelo exposto, nos presentes autos de acção declarativa de condenação, com processo comum na forma ordinária, intentada por CA… contra C…, Lisboa, decide-se: - condenar o R. a pagar ao A. o montante correspondente à diferença entre a quantia de € 26.569,41 já paga pelo R. e o valor dos trabalhos realizados pelo A., este a apurar em incidente de liquidação, caso o valor que venha a ser apurado seja superior ao montante pago pelo R.»;
3) Na fundamentação do Acórdão proferido nos autos de execução de que estes embargos correm por apenso e constituem oposição à mesma, na fundamentação da procedência do recurso consta, além do mais, o seguinte: «Ter-se-á de concluir, ao invés do afirmado pelo executado/apelado, que quer o valor pela qual a obra foi adjudicada, quer os trabalhos executados e não executados e respectivos valores constam do título executivo (sentença condenatória e liquidação inserta no requerimento executivo em relação à colocação das pedras e remoção do entulho) c como salientou o apelante "... relativamente aos dois elementos em falta (valor da colocação das pedras moleanas e remoção do entulho) foi feita prova documental — a chamada prova complementar do título — como a própria lei permite, nos termos do art. 715.° n.° 1, segundo o qual quando a obrigação esteja dependente de urna prestação por parte do credor, incumbe a este alegar e provar documentalmente, no próprio requerimento executivo, que se efectuou ou ofereceu a prestação...". Acresce que estamos diante uma execução para pagamento de quantia certa e não para prestação de facto e mais ainda que o direito de defesa do executado estará sempre assegurado pelo recurso à oposição à execução, aliás, para tanto, inicialmente, o executado até foi notificado, na sequência do despacho do Mm.° Juiz a quo de 28.05.2014 (transcrito a fls.1 deste trabalho). Em suma, como refere o apelante "... O valor total orçamentado e adjudicado para a realização da obra foi de C 48.662,72, e a este valor teria que ser deduzido o valor já pago pelo executado/recorrido, bem como o valor pago por este a terceiros para completar o trabalho que não foi feito pelo exequente/recorrente e ainda o valor referente á colocação das pedras moleanas e à retirada do entulho que não foi efectuado, ..., ora, resulta desta simples subtracção que existe um crédito a favor do autor/exequente no montante de € 16.182,56, valor este liquido e calculado de forma simples resultante dos documentos e prova existente quer do processo declarativo quer do presente processo executivo, os orçamentos, os quais juntou corno mera prova complementar...". Aqui chegados, tendo o exequente apurado/determinado a obrigação exequenda em € 16.182,56, montante correspondente à diferença entre a soma das quantias pagas pelo réu/ora executado, num total de e 32.480,16 (€ 26.569,41 + € 4.618,87 + € 1.197,11 + e 94,77) e o preço global da empreitada fixado em € 48.662,72, conclui-se estar o exequente munido de título executivo bastante para accionar o executado, sabendo-se que o título executivo é, pois, a base ou o alicerce da própria acção executiva - art. 10.° n.°s 5 e 6 — sendo dele, por consequência, que resulta a exequibilidade da pretensão exequenda, uma vez que nele se incorpora o direito do credor a executar o património do devedor com vista à obtenção da real satisfação do seu direito, ou, dito de outro modo, o próprio direito de execução.»;
3) Na petição de embargos alega o embargante nos artºs 16º a 20º o seguinte: «16º O valor exigido pelo Exequente não tem suporte factual. Porquanto,17º O executado entregou ao Exequente a quantia de €26.569,41 – sendo que a última prestação paga foi cerca de 10 dias antes de o Exequente abandonar a obra – mais de metade do valor orçamentado pela totalidade das obras. 18º O Exequente abandonou a obra em Novembro de 2000, sem a ter concluído e sem dar qualquer justificação, pretendendo, agora, cobrar valores de trabalhos que sabe que não realizou – uma vez que o Executado teve de contactar uma outra empresa para concluir os trabalhos iniciados pelo Exequente. 19º Não alegando, nem provando quais foram os trabalhos realizados – desde o início da obra até ao abandono – e qual o valor que despendeu em mão de obra e materiais na concretização dos mesmos. 20º Só, assim, pode a obrigação tornar-se líquida, certa e exigível».  
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III. O Direito:
A questão que importa decidir é saber se perante um Acórdão da Relação de Lisboa que revogou a decisão de indeferimento e declaração de extinção da execução, por se ter considerado que a quantia exequenda não se podia tornar liquida por mero cálculo aritmético, concluindo este tribunal o contrário, devem ou não subsistir os embargos com o fundamento na inexigibilidade, incerteza e iliquidez da sentença apresentada como título executivo.
Como preconiza o n.º 6 do artigo 704.º do Código de Processo Civil que tendo havido condenação genérica, nos termos do n.º 2 do artigo 609.º, e não dependendo a condenação de simples cálculo aritmético, a sentença só constitui título executivo após a liquidação no processo declarativo, sem prejuízo da imediata exequibilidade da parte que seja líquida e do disposto no n.º 7 do artigo 716.º.
Nos termos prescritos no n.º 2 do artigo 358.º, o incidente de liquidação pode ser deduzido depois de proferida sentença de condenação genérica, nos termos do n.º 2 do artigo 609.º, e, caso seja admitido, a instância extinta considera-se renovada. Além disso, de acordo com o disposto no artigo 556.º, n.º 2 do CPC é permitido formular pedidos genéricos quando o objecto mediato da acção seja uma universalidade, de facto ou de direito, ou ainda quando não seja possível determinar de modo definitivo as consequências do facto ilícito, ou o lesado pretenda usar da faculdade que lhe confere o artigo 569.º do Código Civil.
Como se escreve no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 20.10.2014 (João Nunes), acessível em www.dgsi.pt, “A liquidação de condenação genérica depende de simples cálculo aritmético se assenta em factos que ou estão abrangidos pela segurança do título executivo ou são factos que podem ser oficiosamente conhecidos pelo tribunal e agente de execução; Diversamente, não depende de simples cálculo aritmético (embora implique, também, por definição, um cálculo aritmético) se assenta em factos controvertidos, que não estão abrangidos pela segurança do título e que não são notórios nem de conhecimento oficioso.”.
Rui Pinto (in “Manual da Execução e Despejo”, pág. 237 e ss) escreve que «o acertamento da obrigação cujo objecto não esteja quantificado em face do título é um dos pressupostos da execução, já que ele irá dar a medida do ataque ao património do executado – cfr. O princípio da proporcionalidade estabelecido no nº 3 do artº 735º do CPC. Como tal, deve ter lugar preliminarmente à execução propriamente dita, uma operação de quantificação da obrigação – a liquidação – feita, por força do artº 10º do CPC, dentro dos limites que lhe são fixados pelo título executivo não podendo constituir um modo de extensão do seu âmbito».
Donde, a execução assentará numa obrigação, e estando em causa uma execução para pagamento de quantia certa a regra é que o valor deva ser indicado e liquidado pela exequente. Ora, mesmo numa sentença condenatória cujo dispositivo determina que o valor da condenação será a liquidar, tal não afasta logo a possibilidade da liquidação poder ser feita por simples cálculo aritmético nos termos do artº 716º e artº 704º à contrario, ambos do CPC.
Rui Pinto Duarte (Notas ao Código de Processo Civil, Coimbra Editora, pág. 483) escreve que «[a] liquidação dependente de simples cálculo aritmético assenta em factos que ou estão abrangidos pela segurança do título executivo ou são factos que podem ser oficiosamente conhecidos pelo tribunal e agente de execução. Estes são, nos termos gerais, os factos notórios, de conhecimento resultante do exercício das suas funções ou cujo próprio regime permite esse conhecimento (…). A liquidação não dependente de simples cálculo aritmético, embora implique também, por definição, uma cálculo aritmético, assenta em factos (i.é., em matéria de facto) que, por não estarem abrangidos pela segurança do título executivo, não serem notórios ou não serem de conhecimento oficioso, são passíveis de controversão».
A liquidação pressupõe sempre um cálculo aritmético, mas este constitui um acto juridicamente relevante, tanto nos factos em que assenta, como nos efeitos que do mesmo decorre, porém  todos os títulos executivos podem estar sujeitos ou a um simples cálculo aritmético ou a uma liquidação prévia, incluindo as sentenças condenatórias, competindo ao exequente efetuar tal liquidação no requerimento executivo – cf. artº 724º nº 1 alínea h) do CPC.
Deste modo, sempre que o título executivo é uma sentença e o quantum da obrigação exequenda está dependente de alegação e ulterior prova dos factos que fundamentam o pedido, deve a liquidação ser realizada na própria acção declarativa através do incidente de liquidação: nestes casos só perante a indicação pelo Autor de todos os elementos necessários para o apuramento da liquidação a efectuar, bem como a apresentação das respectivas provas, elementos esses que serão objecto de contraditório a ser exercido pela outra parte, é possível fixar o montante da obrigação.
Ao contrário, a liquidação depende de simples cálculo aritmético, processando-se na própria execução, se, embora ilíquida, assenta em factos não controvertidos, que se encontram abrangidos pela segurança do título executivo, e o exequente especifica os valores que considera compreendidos na prestação devida e conclui o requerimento executivo com um pedido líquido (cfr. artigo 716.º, n.º 1, do Código de Processo Civil); esta situação poderá verificar-se ainda que a obrigação esteja dependente de condição suspensiva ou de uma prestação por parte do credor ou de terceiro, uma vez que também aqui estão em causa factos não controvertidos – pois encontram-se abrangidos pelo título executivo –, e do que se trata é tão só de apurar da verificação da condição suspensiva ou do cumprimento da prestação por parte do credor ou de terceiro, fixados na obrigação a cumprir (cfr. n.º 1 do artigo 715.º).
Como refere Rui Pinto ( in ob. Cit. Pág. 243) «a liquidação que não depende de simples cálculo aritmético, embora implique também, por definição, um cálculo aritmético, assenta em factos ( i.e., em matéria de facto) que, por não estarem abrangidos pela segurança do título, não serem notórios ou não serem de conhecimento oficioso, são passíveis de controversão.»
Decidiu-se no Ac da RL de 10/04/2018 ( in www.dgsi.pt/jtrl): «A liquidação não depende de simples cálculo aritmético se os pressupostos do cálculo da obrigação pecuniária a que se reporta a condenação genérica assentarem em factos novos, suscetíveis de prova, que não estão abrangidos pela segurança do título executivo e não sejam notórios, nem de conhecimento oficioso».
No caso dos autos e na esteira do supra referido foi no âmbito da execução de que estes embargos correm por apenso e constituem oposição, decidido por este Tribunal de recurso e na fundamentação da procedência, além do mais, o seguinte: «Ter-se-á de concluir, ao invés do afirmado pelo executado/apelado, que quer o valor pela qual a obra foi adjudicada, quer os trabalhos executados e não executados e respectivos valores constam do título executivo (sentença condenatória e liquidação inserta no requerimento executivo em relação à colocação das pedras e remoção do entulho) c como salientou o apelante "... relativamente aos dois elementos em falta (valor da colocação das pedras moleanas e remoção do entulho) foi feita prova documental — a chamada prova complementar do título — como a própria lei permite, nos termos do art. 715.° n.° 1, segundo o qual quando a obrigação esteja dependente de urna prestação por parte do credor, incumbe a este alegar e provar documentalmente, no próprio requerimento executivo, que se efectuou ou ofereceu a prestação...". Acresce que estamos diante uma execução para pagamento de quantia certa e não para prestação de facto e mais ainda que o direito de defesa do executado estará sempre assegurado pelo recurso à oposição à execução, aliás, para tanto, inicialmente, o executado até foi notificado, na sequência do despacho do Mm.° Juiz a quo de 28.05.2014 (transcrito a fls.1 deste trabalho). Em suma, como refere o apelante "... O valor total orçamentado e adjudicado para a realização da obra foi de C 48.662,72, e a este valor teria que ser deduzido o valor já pago pelo executado/recorrido, bem como o valor pago por este a terceiros para completar o trabalho que não foi feito pelo exequente/recorrente e ainda o valor referente á colocação das pedras moleanas e à retirada do entulho que não foi efectuado, ..., ora, resulta desta simples subtracção que existe um crédito a favor do autor/exequente no montante de € 16.182,56, valor este liquido e calculado de forma simples resultante dos documentos e prova existente quer do processo declarativo quer do presente processo executivo, os orçamentos, os quais juntou corno mera prova complementar...". Aqui chegados, tendo o exequente apurado/determinado a obrigação exequenda em € 16.182,56, montante correspondente à diferença entre a soma das quantias pagas pelo réu/ora executado, num total de e 32.480,16 (€ 26.569,41 + € 4.618,87 + € 1.197,11 + e 94,77) e o preço global da empreitada fixado em € 48.662,72, conclui-se estar o exequente munido de título executivo bastante para accionar o executado, sabendo-se que o título executivo é, pois, a base ou o alicerce da própria acção executiva - art. 10.° n.°s 5 e 6 — sendo dele, por consequência, que resulta a exequibilidade da pretensão exequenda, uma vez que nele se incorpora o direito do credor a executar o património do devedor com vista à obtenção da real satisfação do seu direito, ou, dito de outro modo, o próprio direito de execução.».
Com efeito, manifestamente o exequente liquidou a quantia exequenda tendo por base a decisão proferida e assente nos factos na mesma considerados, pois, ao contrário do pretendido em termos recursórios os factos provados em sede de sentença concluíam, por um lado, que a exequente realizou todos os trabalhos contratados, com exeção dos elencados no ponto 12. dos factos provados. Logo, considerando que os trabalhos contratados tinham o seu suporte no contrato, a prova de que realizou todos os que não se encontram excluídos no ponto 12., só pode significar que o valor será o considerado no contrato, excluindo o valor dos não realizados. Na verdade, na sentença que serve de título à execução provou-se que o A., usando o logótipo de S&S, foi contactado pelo R. para realização de trabalhos no prédio da Rua do Patrocínio, nº 65. E o A., para realização desta obra, deslocou-se ao local e, posteriormente, elaborou e enviou ao R. um orçamento, que o R. recebeu, tendo adjudicado a obra ao A. Provou-se ainda que ficou acordado entre o A. e o R. que o pagamento do preço dos trabalhos, no montante global de Esc. 9.756.000$00 (nove milhões setecentos e cinquenta e seis mil escudos)/€ 48.662,72, seria feito de forma faseada.
Destes factos resulta quer o valor total da obra contratada, quer ainda o tipo de trabalhos que corresponderia a tal obra, mas ao contrário do afirmado em sede de recurso o pagamento faseado do valor da obra não tem correlação com os trabalhos que teriam sido feitos em cada momento, ou seja, em nada releva considerar que a circunstância de a empreiteira ter abandonado a obra significa que tenha de se fazer prova dos trabalhos efectuados até essa data. Na verdade, concluir como pretende a apelante significaria fazer tábua rasa da prova dos factos contidos na sentença e nesta, manifestamente, se conclui que os trabalhos contratados, frise-se, cujo valor estava previamente fixado entre as partes no contrato, foram realizados com exeção dos referidos na sentença e cujo rol consta do ponto 12. dos factos provados.
Assim, a quantia liquidada pela exequente tem correspondência com os factos tal como foram considerados na sentença cuja execução se pretende, pois na sentença ficou consignado que trabalhos, dos contratados, foram realizados, pelo que haveria apenas que aferir do valor dos trabalhos não realizados pela exequente e deduzir tal valor ao valor total da obra, tal como foi feito pela exequente em sede de requerimento executivo.
Defende ainda a apelante que o Tribunal a quo não se pronunciou sobre o fundamento da oposição à execução estatuído na alínea e) do artigo 729.º do CPC, e tal determina a nulidade da decisão nos termos da alínea d) do artigo 615.º do CPC.
Assenta ainda as suas conclusões no fundamento que a embargante nos artigos 16º e ss. dos seus embargos alega factos que nos permitem concluir que  “o valor exigido pelo exequente não tem suporte factual”.
O conteúdo dos artºs 16º a 20º da petição de embargos é o seguinte: «16º O valor exigido pelo Exequente não tem suporte factual. Porquanto,17º O executado entregou ao Exequente a quantia de €26.569,41 – sendo que a última prestação paga foi cerca de 10 dias antes de o Exequente abandonar a obra – mais de metade do valor orçamentado pela totalidade das obras. 18º O Exequente abandonou a obra em Novembro de 2000, sem a ter concluído e sem dar qualquer justificação, pretendendo, agora, cobrar valores de trabalhos que sabe que não realizou – uma vez que o Executado teve de contactar uma outra empresa para concluir os trabalhos iniciados pelo Exequente. 19º Não alegando, nem provando quais foram os trabalhos realizados – desde o início da obra até ao abandono – e qual o valor que despendeu em mão de obra e materiais na concretização dos mesmos. 20º Só, assim, pode a obrigação tornar-se líquida, certa e exigível».
Ora, manifestamente não assiste razão à apelante, pois a obrigação foi liquidada tendo por base os factos contidos na sentença, e os únicos factos que não estavam contidos na mesma e seriam passíveis de oposição em sede de embargos, citada que foi a executada da liquidação e da possibildiade de deduzir oposição, como ocorreu nos autos, seriam os factos que se reportam ao valor das obras não efectuadas e para cuja prova a exequente juntou documentos. É certo que o valor dessas obras em concreto teriam influência no valor da quantia exequenda, pois sempre tal valor seria deduzido ao valor total da obra, porém, nos artºs 16º a 20º dos embargos, em momento algum a embargante põe em causa tais valores, pretendendo sim discutir a obra já realizada, quando esta, em concreto, ficou consolidada na matéria de facto contida na sentença que constitui o título executivo. Aliás, como se decidiu no Acórdão proferido neste Tribunal relativamente aos dois elementos em falta (valor da colocação das pedras moleanas e remoção do entulho) foi feita prova documental — a chamada prova complementar do título — como a própria lei permite, nos termos do art. 715.° n.° 1, segundo o qual quando a obrigação esteja dependente de uma prestação por parte do credor, incumbe a este alegar e provar documentalmente, no próprio requerimento executivo, que se efectuou ou ofereceu a prestação...". Acresce que estamos diante uma execução para pagamento de quantia certa e não para prestação de facto, pelo que o direito de defesa do executado estará é certo assegurado pelo recurso à oposição à execução, mas esta oposição tem de ter na sua base os factos controvertidos e reportados ao valor das obras não realizadas e não, como parece pretender a apelante, as obras feitas e seu valor. Na verdade, as obras realizadas resultam provadas, e apenas o seu valor será obtido através da subtracção do valor das obras não realizadas, pelo que considerando que se conhece o valor total da obra, apenas restará aferir do valor das obras não realizadas. É essa liquidação que é feita pelo exequente no título executivo, e é a esta liquidação que o executado poderá deduzir embargos, sob pena de a obrigação se considerar fixada nos termos do requerimento executivo – cf. artº 716º nº 4 do CPC.
Vigora, assim, o ónus de impugnação quanto aos factos que constituem ou fundamentam a liquidação. Na verdade, a executada nada refere quanto aos factos, ou sequer quanto aos documentos, que a exequente junta para suporte do valor indicado relativamente às obras não realizadas, pois apenas esse valor era passível de discussão em sede de embargos, todos os demais factos beneficiam da certeza contida na sentença apresentada como título executivo. Logo, bastaria à executada, ao abrigo do ónus de impugnação que lhe assistia quanto aos valores que não tinham suporte na sentença, impugnar os mesmos, bastando a sua negação.
Na verdade, não consta dos artºs 16º a 20º da petição de embargos qualquer oposição aos factos que presidem à liquidação e ainda controvertidos – o valor das obras não realizadas.
Com efeito, nada no âmbito dos embargos, nomeadamente nos artºs 16º a 20º do articulado de oposição, determina  a impugnação dos factos da liquidação passíveis de impugnação, sendo que o demais alegado resulta provado no âmbito da sentença.
Por tudo o exposto, não se verifica  a nulidade da decisão sendo o recurso improcedente, mantendo-se a decisão recorrida. Pois, não constando dos embargos a impugnação dos factos que determinaram a liquidação da obrigação nos termos enunciados pela exequente, a obrigação consolidou-se pela decisão que determinou que podia ser liquidada por simples cálculo aritmético. Tal cálculo poderia ser objecto de impugnação quanto à sua premissa ainda controvertida – o valor das obras não realizadas – mas, não tendo a embargante impugnado tais valores, verifica-se a extinção dos embargos, tal como decidiu o tribunal a quo.
                                   *
 IV. Decisão:
Por todo o exposto, acorda-se em julgar improcedente o recurso de apelação interposto pela executada/embargante, mantendo-se a decisão recorrida.
Custas pela apelante.
Registe e notifique.

Lisboa, 14 de Março de 2019

Gabriela de Fátima Marques
Adeodato Brotas
Gilberto Jorge