Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
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| Relator: | EZAGÜY MARTINS | ||
| Descritores: | EXECUÇÃO REMIÇÃO DEPÓSITO DO PREÇO | ||
| Nº do Documento: | RL | ||
| Data do Acordão: | 02/08/2007 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Meio Processual: | AGRAVO | ||
| Decisão: | NÃO PROVIDO | ||
| Sumário: | I- O remidor que exerça o direito no acto de abertura e aceitação das propostas em carta fechada beneficia da possibilidade de não pagar imediatamente a totalidade do preço (o que no direito anterior lhe era exigido, por força do revogado art.º 912º, n.º 2). II- Se, ao invés, exercer o direito depois da abertura e aceitação das propostas, o remidor terá de depositar logo a totalidade do preço. III- A necessidade de depósito do preço, “no momento da remição”, é incompatível com quaisquer dilações, designadamente implicadas por necessidade de prévia notificação de despacho a admiti-la e a mandar efectuar aquele em prazo para tanto fixado. | ||
| Decisão Texto Parcial: | |||
| Decisão Texto Integral: | Acordam na 2ª Secção (cível) deste Tribunal da Relação I- Nos autos de execução para pagamento de quantia certa, com processo comum, sob a forma ordinária, que o Banco requereu, em 16-01-2003, contra J D F, penhorada uma fracção autónoma de prédio em regime de propriedade horizontal, veio a ser ordenada a venda daquela, através de propostas em carta fechada. Aceite que foi uma oferta, em 09-03-2006, veio a D C F P, em 21 de Março de 2006, antes de ser proferido despacho de adjudicação do bem, requerer “lhe seja concedido o direito de remissão…em virtude de ser filha da executada…”, conforme documentos de folhas 39 a 43. Sobre tal requerimento recaindo o despacho de 23-03-2006, reproduzido a folhas 23 a 25, do teor seguinte: «Dispõe o art. 912º do CPC que: “1. Ao cônjuge que não esteja separada judicialmente de pessoas e bens e aos descendentes ou ascendentes dos executados é reconhecido o direito de remir todos os bens adjudicados ou vendidos, ou parte deles, pelo preço por que tiver sido feita a adjudicação ou a venda. 2. O preço irá ser depositado no momento da remição.”. Ora, o requerente veio aos autos exercer o direito de remição, não tendo depositado o preço (conforme obriga o nº 2 do artº 912º do CPC). Na realidade, aos presentes autos aplica-se o CPC na versão anterior ao DL 38/2003, na medida em que era este que se encontrava em vigor aquando da instauração da presente execução. Assim sendo, não tendo sido cumprida uma formalidade inerente à remição, nem nada tendo sido requerido quanto ao mesmo, indefere-se o requerimento de fls.122. Notifique.». Inconformada, recorreu a Requerente da remição, formulando, nas suas alegações, as seguintes conclusões: 1- O douto Tribunal de 1ª instância, por decisão de fls. , indeferiu o requerimento de remição com o fundamento da falta de depósito do preço; II- A Agravante, na qualidade de filha do Executado, em 21 de Março de 2006, veio requerer que lhe fosse concedido o exercício do direito de remição relativamente à fracção autónoma identificada nos autos; III - Assim, o douto Tribunal a quo tinha, nos termos dos artigos 912 e 913 do Código de Processo Civil, de fixar um prazo à Agravante, para esta efectuar o depósito do preço, e, em seguida, adjudicar-lhe a fracção, em virtude desta ter requerido o direito de remição, dentro do período em que esse direito podia ser exercido; IV - O douto Tribunal de 1ª instância, com a decisão objecto do presente recurso, violou o disposto nos artigo(s) 912° e 913° do Código de Processo Civil; V - O douto Tribunal a quo só podia indeferir a pretensão da Agravante se esta não depositasse o preço no prazo que lhe tivesse sido fixado; VI — Por fim, dir-se-á, que a ora Agravante, não sendo parte nos presentes autos, não podia efectuar o depósito do preço sem ser notificada pelo douto Tribunal a quo a deferir a remição e a ordenar o pagamento imediato. VII - Sendo julgado procedente o presente recurso de agravo, desde já deve ser revogada a decisão ora Recorrida, e, em consequência, ordenar-se ao douto Tribunal recorrido que fixe um prazo à ora Agravante para depositar o preço devido, nos termos dos artigos 912° e 913º do Código de Processo Civil. Não houve contra-alegações. O Sr. juiz a quo manteve o seu despacho. II- II- Corridos os vistos legais, cumpre decidir. Face às conclusões de recurso, que como é sabido, e no seu reporte à fundamentação da decisão recorrida, definem o objecto daquele – vd. artºs 684º, n.º 3, 690º,n.º 3, 660º, n.º 2 e 713º, n.º 2, do Cód. Proc. Civil - é questão proposta à resolução deste Tribunal, a de saber se a requerente, quando se apresentou a exercer o arrogado direito de remição, estava obrigada a, na mesma ocasião, proceder ao depósito do preço por que foi feita a venda do bem, ou antes deveria ter sido notificada de despacho que, deferindo a sua pretensão, lhe assinasse prazo para o depósito. Com interesse, emerge da dinâmica processual o que se deixou referido supra, em sede de relatório. Vejamos. II-1- Cobra efectivamente aplicação, no caso em apreço, e atenta a data de entrada do requerimento executivo respectivo, o art.º 912º do Código de Processo Civil, na redacção anterior à introduzida pelo Dec.-Lei n.º 38/2003, de 08 de Março, ex vi do art.º 21º do mesmo Dec.-Lei. De acordo com tal normativo “1 – Ao cônjuge que não esteja separado judicialmente de pessoas e bens e aos descendentes ou ascendentes do executado é reconhecido o direito de remir todos os bens adjudicados ou vendidos, ou parte deles pelo preço por que tiver sido feita a adjudicação ou a venda. 2 – O preço há-de ser depositado no momento da remição.”. Sendo que nos termos do art.º 913º do mesmo Código, também na sua anterior redacção, “O direito de remição pode ser exercido: a) No caso de venda judicial, até ser proferido despacho de adjudicação dos bens ao proponente; b) Na venda extra-judicial, até ao momento da entrega dos bens ou da assinatura do título que a documenta”. No confronto do primeiro dos citados normativos, não tem sido uniforme a jurisprudência nacional. Assim, a Relação do Porto, no seu Acórdão de 23-11-2000,(1) decidiu que: “I - O depósito do preço da remição - artigo 912 n.º 2 do Código de Processo Civil - é precedido de despacho a admiti-la e a mandar efectuar aquele em prazo para tanto fixado.”. Nesse mesmo sentido se havendo pronunciado o Acórdão desta Relação, de 06-12-1990,(2) em cujo sumário ler-se pode: “Pedido o direito de remição, não há que proceder ao depósito do preço enquanto não for proferido o competente despacho de deferimento. ”. A mesma Relação do Porto, no seu Acórdão de 27-11-2000,(3) já considerou porém que: “ O titular do direito de remição de bens vendidos ou adjudicados em processo de execução que quiser exercer o seu direito tem de proceder ao imediato depósito do preço, solicitando as guias para o respectivo depósito, bem como para o das custas prováveis.”. E, no Acórdão daquela Relação, de 06-07-2001,(4) entendeu-se que “II - Ao exercer o direito de remição, deve o requerente demonstrar que depositou o preço correspondente à proposta aceite, acrescido do montante respeitante às obrigações fiscais inerentes à transmissão, ou solicitar a emissão de guias para depósito imediato desses valores.”. A propósito desta temática, referia Alberto dos Reis (5) que “Não goza o remidor do benefício concedido ao arrematante pelas alíneas 1ª e 2ª do art.º 904º; tem de depositar no acto todo o preço, e não unicamente a décima parte”. Sobre este ponto, escrevendo Eurico Lopes Cardoso: “Tanto no caso de venda judicial como no de adjudicação, com o pedido de remição se deve fazer o de guias para depósito do preço e das custas prováveis. Tal depósito deve fazer-se imediatamente, salvo apresentando-se a remir em separado mais de um ascendente ou mais de um descendente no mesmo grau, hipótese na qual…”.(6) Jorge Barata e M. Laranjo Pereira,(7) assinalam: “Quanto ao pagamento do preço pelo remidor, esclarece-nos o art.º 912/2 que terá de ser depositado integralmente no momento da remição”. A redacção introduzida no art.º 913º do Código de Processo Civil, pelo Dec.-Lei n.º 38/2003, de 8 de Março, distinguindo entre situações de remição exercida no acto de abertura e aceitação de propostas em carta fechada, e de remição exercida depois daquele, veio, pelo que respeita a esta última, acolher expressamente a solução que reputamos anteriormente consagrada, de forma global, para todos os casos de remição, no citado art.º 912º, n.º 2, do Código de Processo Civil. E isto, assim, ao estabelecer: “Aplica-se ao remidor, que exerça o seu direito no acto de abertura e aceitação das propostas em carta fechada, o disposto no art.º 897º, com as adaptações necessárias, bem como o disposto nos n.ºs 1 a 3 do art.º 898º, devendo o preço ser integralmente depositado quando o direito de remição seja exercido depois desse momento…”. Certo dispor o n.º 1 do art.º 897º do Código de Processo Civil, na sua actual redacção, que “Os proponentes devem juntar à sua proposta, como caução, um cheque visado, à ordem do solicitador de execução ou, na sua falta, da secretaria, no montante a 20% do valor base dos bens, ou garantia bancária no mesmo valor.”. Anotando, a propósito, José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes,(8) que “O remidor que exerça o direito no acto de abertura e aceitação das propostas em carta fechada (art.ºs 893 e 894) beneficia da possibilidade de não pagar imediatamente a totalidade do preço (o que no direito anterior lhe era exigido, por força do revogado art.º 912-2)...Se, ao invés, exercer o direito depois da abertura e aceitação das propostas, o remidor terá de depositar logo a totalidade do preço…”. De facto, entendemos ser a melhor interpretação do art.º 912º, n.º 2, do Código de Processo Civil, aquela que, não arrasando o elemento literal – que “não é só o ponto de partida, é também um elemento irremovível de toda a interpretação”(9) – considera a necessidade de depósito do preço, “no momento da remição”, como incompatível com quaisquer dilações, designadamente implicadas por necessidade de prévia notificação de despacho a admiti-la e a mandar efectuar aquele em prazo para tanto fixado. De resto, o que apenas marginalmente se assinala, nem requereu a Requerente, ao apresentar-se a exercer o direito de remição, a passagem de guias para depósito – que sempre teria que ser imediato – do preço, como de folhas 43 se alcança. Improcedem, em suma, as conclusões do agravo. III – Nestes termos, acordam em negar provimento ao recurso, confirmando o despacho recorrido. Custas pela Recorrente. Lisboa, 2007-02-08 _________________ (Ezagüy Martins) _________________ (Maria José Mouro) _________________ (Neto Neves) _______________________________________________________ 1 Proc. 0031496, in www.dgsi.pt/jtrp.nsf.. 2 Proc. 0041782, in www.dgsi.pt/jtrl.nsf. 3 Rec. 0051063, in B.M.J. 501º, 344. 4 Proc. 0131110, in www.dgsi.pt/jtrp.nsf. 5 In “Processo de execução”, Vol. 2º, pág. 485. 6 In “Manual da Acção Executiva”, 3ª Ed., Almedina, 1964, pág. 664. 7 In “Direito Processual Civil” II – Parte I, 1976/1977, Ed. da FDL, pág. 378. 8 In “Código de Processo Civil, Anotado”, Vol. 3º, Coimbra Editora, 2003, pág. 624. 9 Apud Oliveira Ascensão, in “Introdução ao Estudo do Direito - Noções Fundamentais”, Edição dos SSUL, Ano Lectivo de 1970/71, com revisão parcial em 1972/73 – 1º ano – 1ª turma. |