Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
1382/2004-3
Relator: MARIA ISABEL DUARTE
Descritores: MEDIDA TUTELAR
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 03/31/2004
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: PROVIDO
Sumário: A escolha da medida tutelar educativa tem como critério o princípio da adequação e suficiência dando-se preferência àquela que melhor contribua para que o menor seja educado para o direito e se insira de forma digna e responsável na vida em sociedade.
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, na 3ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa:


I - Relatório

1.1 - O Ex.mo Magistrado do Ministério Público, interpôs recurso, do acórdão proferido no processo n.º..., proferido pelo Tribunal Colectivo misto do 3º juízo, 2ª secção do Tribunal de Família e de Menores de Lisboa, que deliberou aplicar ao menor (A), nascido a 08/02/89, filho de (J) e de (JS), natural da Reboleira - Amadora e residente, antes de internado, na ... Amadora, a medida tutelar de internamento em regime semiaberto, com a duração de um ano e seis meses;

1.1.1 - Nas suas alegações, apresentou as seguintes conclusões:
“1 - As medidas tutelares educativas «visam a educação do menor para o Direito e a sua inserção, de forma digna e responsável, na vida em comunidade (cfr. art.º 1, da respectiva lei).
2 - A própria lei estabelece critérios para a escolha das medidas tutelares, estando o julgador vinculado a tais critérios de escolha.
3 - Critérios que são os da adequação e suficiência, e de entre as medidas adequadas e suficientes, o tribunal está vinculado a escolher a medida que represente menor intervenção na autonomia de decisão e de condução de vida do menor e que seja susceptível de obter a sua maior adesão e adesão de seus pais, representante legal ou pessoa que tenha a sua guarda de facto (cfr. Art.º 6º, n.º 1).
4 - E quanto à duração da medida, a lei determina que a sua duração deve ser « proporcional à gravidade do facto e à necessidade de educação para o Direito manifestada na prática do facto e subsistente no momento da decisão» (art.º 7º n.º 1).
5 - E não sendo possível, como o não é no caso, o cumprimento simultâneo, há-de este ser sucessivo (Art.º 8º n.º 3).
6 - No caso, o menor cumpre uma medida tutelar de internamento por dois anos, e de seguida iria, ou irá cumprir mais 18 meses de internamento, ou seja, o menor ficará privado de liberdade por três anos e meio com a agravante de, para um jovem adolescente, a noção do tempo não ser a mesma que para um adulto: 3 anos e meio de privação de liberdade são uma «eternidade», um exagero.
7 - E devendo ser a escolha da medida tutelar orientada pelo interesse do menor ( art.º 6º, n.º 3 ), a sua desadequação gerará revolta, incompreensão, desânimo, isto é, será contraproducente e deseducativa, exactamente o oposto ao objectivo legal.
8 - Parece-nos, pois, que o tempo de duração da medida (18 meses) é altamente exagerado, desproporcionado à gravidade do facto (roubo simples), desproporcionado à necessidade de educação do menor para o direito subsistente no momento, e por isso, contraria os fins educativos que são o apanágio das medidas tutelares,
9 - E se em vez de um crime de roubo tivessem sido cometidos vários? Ou tivesse sido cometido, por exemplo, um crime de homicídio, tentado, ou consumado? Ou uma violação? Ou fogo posto?
Ao aplicar ao jovem (A) a medida tutelar de ano e meio de internamento em centro educativo, o tribunal violou os arts. 2º n.º 1, 6º n.º 1 e n.º 3, e 7º n.º 1, todos da Lei Tutelar Educativa.
Pelo que entendemos adequada, suficiente, pedagógica e conforme aos interesses do menor e aos objectivos da lei, a medida de internamento em centro educativo, por 6 meses, sob o regime semi fechado.
Vossas Ex.as decidirão, porém, como for de lei e justiça.”.

1.2 - Recebido o recurso foi dado cumprimento ao art. 411º n.º 5, do C.P.P., aplicável “ex vi”, do disposto no art. 128º, n.º 1, da Lei Tutelar Educativa Lei n.º 166/99, de 14/9, não tendo o arguido apresentado resposta.

1.3 - Neste Tribunal, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto não emitiu parecer.

1.4 - Foi cumprido o preceituado não art. 417º ns.º 1, 3 a 7, do C.P.P., aplicável nos termos constantes do ponto 1. 2.

1.5 - Foram colhidos os vistos legais.

1.6 - O processo foi sujeito à conferência, nos termos do art. 126º, da Lei Tutelar Educativa.

Cumpre apreciar e decidir:


II – Fundamentação
2.1 - Em sede de decisão recorrida considerou-se provada a seguinte factualidade:
“a) No dia 01/02/2003, pelas 23h30m, no interior de um comboio da linha de Sintra, na estação da Reboleira, o menor (A) em conjugação de esforços com o menor (N), com um forte puxão, retirou das mãos de (I), id. a fls. 3 v.º, um telemóvel marca Nokia, modelo 3410, no valor de 174 Euros, pondo-se de imediato em fuga.
b) Entretanto, no dia 03 de Fevereiro, pelas 12 horas, foi encontrado, juntamente com o (N), por elementos da PSP, atentar vender o referido telemóvel, que foi de imediato apreendido, vindo, posteriormente, a ser entregue à ofendida (conforme termo de entrega de fls. 8).
c) Apropriou-se do referido telemóvel, querendo e tendo conseguido integrá-lo na sua esfera patrimonial, bem sabendo que não lhe pertencia e que agia contra a vontade da ofendida.
d) Agiu voluntária livre e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.
Mais se provou:
O menor (A) nasceu em 08/02/1989.
Residia à data dos factos, alternadamente, com a mãe e com o pai que estão separados, tendo 3 irmãos a residir com a mãe e 9 com o pai (três do quais são apenas filhos da mãe do (A)).
O (A) ficava por sua responsabilidade durante o dia, chegando a casa da mãe por volta das 18 horas e a partir de certa altura passou a ter a chave da casa sendo habitual chegar a casa por volta das 22h30/23horas para jantar.
Viveu com um ama até aos 4 anos e concluiu o 1º ciclo sem dificuldades de aprendizagem e de comportamento.
No 5º ano começou a revelar-se pouco motivado e absentista, sendo que no ano lectivo 2002/2003, era quarta vez que se encontrava matriculado no 5º ano, ia à escola mas faltava às aulas.
Já em 2001 é referenciado como um aluno de risco, tendo o primeiro processo disciplinar em Abril de 2001, e em consequência suspenso;
Começa então a acompanhar-se com vários jovens de conduta duvidosa e a iniciar-se na prática de ilícitos.
A mãe não consegue exercer qualquer autoridade sobre o menor, o que favorece a sua busca e integração em grupos marginais, com condutas desviantes.
A sua auto estima é muito fraca.
Entra no Centro Educativo Padre António Vieira, em Caxias, a 06/02/2003, no âmbito do PTE 1112/02, em regime semi-aberto.
Inicialmente aceitou mal o internamento, mas actualmente tem um comportamento cordato com os pares e agentes educativos, sendo em geral cumpridor das regras internas e frequentando um curso de formação pré-profissional demonstrando interesse e empenho.
O menor encontra-se bem integrado na instituição Padre António Vieira, tem um bom relacionamento com os colegas, concluiu o 2º ciclo, frequenta o 3º ciclo por unidades capitalizáveis; desenvolve actividade extracurricular de cerâmica artística.
A mãe do menor tem ido visitar o seu filho todos os fins-de-semana e entende que a institucionalização tem sido boa para o filho.
O menor encontra-se em cumprimento de medida tutelar de internamento, em regime semiaberto, pelo período de dois anos, medida essa à qual foi descontado o tempo em que esteve em medida cautelar à ordem do processo 1112/02 do 1º juízo, 2ª secção, em virtude da prática de dois crimes de roubo e um outro crime de ofensas à integridade física ocorridos em 11 de Junho 15 de Outubro e 22 de Outubro, sempre de 2002.
Não há factos não provados.

III - MOTIVAÇÃO
Os factos dados como provados e relativos aos ilícitos criminais resultaram da confissão integral e sem reservas por parte do menor e os factos relativos à personalidade e condições sócios económicas do menor resultaram quer dos depoimentos das pessoas ouvidas em audiência quer do teor do relatório social com avaliação psicológica constante de fls. 165 a 172 elaborado nos termos do art.º 71º, n.º 5 da L.T.E.”

2.2 - O recurso restringe-se às questões de direito avançadas pelo recorrente e à apreciação de eventuais vícios do art. 410°, n.º 2 CPP, aplicável “ex vi”, do disposto no art. 128º, n.º 1, da lei tutelar educativa Lei n.º 166/99, de 14/9, ou, de nulidades que não devam considerar-se sanadas. E dentro destes limites, são as conclusões da motivação que delimitam o objecto do recurso (art. 412°, n.º 1 CPP), uma vez que as questões submetidas à apreciação da instância de recurso são as definidas pelo recorrente.
"Os recursos não podem ser utilizados com o único objectivo de uma "melhor justiça. O recorrente tem de indicar expressamente os vícios da decisão recorrida. A motivação do recurso consiste exactamente na indicação daqueles vícios."- Cunha Rodrigues, Jornadas de Direito Processual Penal, CEJ, p.387.
Trata-se de um verdadeiro ónus de alegação e motivação do recurso, devendo o recorrente" formular com rigor o que pede ao tribunal".
São as conclusões que irão habilitar o tribunal superior a conhecer dos motivos que levam o recorrente a discordar da decisão recorrida, quer no campo dos factos quer no plano do direito.
Ora, as conclusões destinam-se a resumir essas razões que servem de fundamento ao pedido, não podendo confundir-se com o próprio pedido pois destinam-se a permitir que o tribunal conhecer, de forma imediata e resumida, qual o âmbito do recurso e os seus fundamentos.
E, sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões do recurso (art. 412°, n.º 1 CPP), às quais o tribunal se deve restringir (AC. STJ de 9.12.98, BMJ 482°,68), não basta que na motivação se indique, de forma genérica, a pretensão do recorrente pois a lei impõe a indicação especificada de fundamentos do recurso, nas conclusões, para que o tribunal conheça, com precisão, as razões da discordância em relação à decisão recorrida.
Essa definição compete exclusivamente ao recorrente e tem a finalidade útil e garantística de permitir que não existam dúvidas de interpretação acerca dos motivos que levam o recorrente a impugnar a decisão, o que poderia acontecer perante a mera leitura das alegações, por natureza mais desenvolvidas, definindo-se claramente quais os fundamentos de facto e/ou de direito, já que é através das conclusões que se conhece o objecto do recurso.
Neste sentido se pronunciaram, entre outros, os Ac. STJ 21.4.93, 19.4.94, 9.11.94, C.J, do STJ, tomos 2°, 2° e 3° dos anos respectivos, p. 206, 189, 245.
Como se viu, a lei exige conclusões em que o recorrente sintetize os fundamentos e diga o que pretenda que o juiz decida, certamente porque são elas que delimitam o objecto do recurso.
Não pode o tribunal seleccionar as questões segundo o seu livre arbítrio nem procurar encontrar no meio das alegações, por vezes extensas e pouco inteligíveis, o que lhe pareça ser uma conclusão.
As conclusões nada têm de inútil ou de meramente formal.
Constituem, por natureza e definição, a forma de indicação explícita e clara da fundamentação das questões equacionadas pelo recorrente e destinam-se, à luz da cooperação devida pelas partes, a clarificar o debate quer para exercício do contraditório, quer para enquadramento da decisão

2.3 - Feita esta introdução de âmbito geral e analisadas as conclusões de recurso, facilmente se constatará que o recorrente não põe em causa a matéria de facto fixada, sendo o recurso restrito à matéria de direito, conforme já referido no ponto anterior.

2.4 - O objecto de um recurso penal é delimitado pelas conclusões da respectiva motivação - arts. 403, n.º 1, e 412°, n.º 1, do CPP., conforme retro mencionado, no caso dos autos a questão que se coloca é, apenas, a da duração da medida tutelar imposta.

2.5 - Da questão de direito.
2.5.1- Da medida tutelar aplicada
Ao Estado incumbe o dever de garantir o gozo e o exercício dos direitos fundamentais à liberdade e à autodeterminação (de que é titular o menor) e à educação e manutenção dos filhos (de que são detentores os progenitores); ao dever que ao Estado incumbe de proteger a infância e a juventude, nomeadamente, na formação da sua capacidade de autodeterminação (função-educação); ao dever que ao Estado incumbe de proteger a paz social e os bens jurídicos essenciais da comunidade (função segurança); ao dever que ao Estado incumbe, em homenagem a objectivos de prevenção geral e especial, de atacar precocemente o desenvolvimento de carreiras criminosas.
“(...) Educar é educar para viver em sociedade, e não está preparado para viver em sociedade quem não observa as condições mínimas de subsistência e funcionamento da sociedade.” (...) Educar para o direito não é, portanto, em primeira linha, defender a sociedade. É, sobretudo, ajudar alguém para que possa ser um cidadão adaptado, sem o que, como antes se viu, a felicidade só será acessível a outros.” - Souto Moura, “A Tutela Educativa: Factores de legitimação e objectivos”, in infância e Juventude n.º 4/00, pág. 37 e 38.
O primeiro dos pressupostos para a intervenção tutelar é, assim, a existência de uma ofensa a bens jurídicos fundamentais, traduzido na prática de facto considerado por lei como crime, nos termos do art. 1º, da Lei Tutelar Educativa, Lei N.º 166/99, de 14/9, de seguida, apenas designada de LTE.
No entanto, a prática de facto ilícito tipificado na lei penal não determina necessariamente a aplicação de medida tutelar educativa, porquanto o fim da intervenção tutelar é a educação do menor para o direito, não o seu sancionamento ou punição pela prática do facto ilícito penal.
Com efeito, as medidas tutelares educativas tem por finalidade a educação do menor para o direito e a sua inserção, de forma digna e responsável, na vida em comunidade - art. 2º n.º 1, da mencionada LTE.
É, ainda, necessário que a necessidade de correcção, subsista no momento da decisão, nos termos dos arts. 7º n.º 1, 78º n.º 1, 87º n.º 1 al. c), 93º n.º 1 al. b), 110º n.º 2 e 119º n.º 2, da citada LTE.
Portanto, da análise das disposições deste diploma conclui-se que só é legítima a aplicação de medida tutelar educativa desde que verificados, cumulativamente, os seguintes pressupostos: o menor cometa facto ilícito tipificado na lei penal como crime; necessidade de correcção da sua personalidade no plano do dever-ser jurídico manifestada na prática do facto; que essa necessidade subsista no momento da decisão da aplicação da medida.
No art. 4º, da LTE consagra-se o princípio da tipicidade ou taxatividade das medidas tutelares educativas passíveis de aplicação, enquanto corolário de legalidade.
Só podem ser aplicadas as medidas previstas neste preceito, não lhe podendo ser aplicáveis medidas, quer quanto à espécie, quer quanto à modalidade de execução, em contrário ao previsto no diploma.
No entanto, quanto, ao seu conteúdo e modalidade de execução existe alguma flexibilidade.
As medidas enumeradas neste preceito legal estão ordenadas pela respectiva ordem crescente de gravidade, considerando o grau de limitação e restrição de liberdade do menor no que se refere à sua autonomia de decisão e condução da sua vida e simbolizam o princípio de intervenção mínima que caracteriza todo o processo tutelar. O grau da gravidade das medidas mostra-se, também, referenciado no n.º 4, do art. 133º, da mencionada LTE.
O art.º 6º da mesma LTE enuncia os critérios a observar na escolha da medida tutelar educativa aplicável de entre as várias elencadas no art. 4º.
Assim, um dos critérios é integrado pelo princípio de adequação e suficiência da medida, dando-se preferência àquela que realize de forma adequada e suficiente a finalidade subjacente à sua aplicação, isto é, a socialização do menor, ou, como refere no seu art. 2º n.º 1, a sua educação para o direito e inserção de forma digna e responsável na vida em sociedade.
No art. 7º, da citada LTE, fixam-se os critérios a observar quanto à determinação da duração da medida escolhida. Portanto, em primeiro lugar, haverá que escolher a medida a aplicar de acordo com os critérios referidos no anterior normativo. Escolhida a medida, fixar-se-á a sua duração, tendo em conta os limites legais de duração (prazos mínimos e máximos) fixados para cada uma das medidas, de acordo com os critérios definidos neste critério.
Na determinação da duração concreta das medidas há que observar os critérios de proporcionalidade e necessidade de correcção da personalidade do menor manifestada na prática do facto e que subsista no momento da decisão, conforme já afirmado, nos termos expressos no n.º 1, deste preceito.
Na fixação da duração da medida concretamente aplicada, o tribunal deve ter em conta a gravidade do facto cometido, a necessidade de correcção da personalidade do menor manifestada na prática do facto e a actualidade dessa necessidade de correcção. Observados tais limites, mostra-se respeitada a proporcionalidade da duração da medida.
A gravidade do facto funciona aqui como um limite à duração da medida, assim como a medida da culpa funciona como limite à medida da pena criminal.
A medida de internamento destina-se a menores cuja necessidade educativa, evidenciada na prática do facto, deva ser satisfeita mediante um afastamento temporário do seu meio habitual com recurso a específicos programas e métodos pedagógicos.
O art. 13º, da LTE fixa o período mínimo e máximo para a duração das medidas de internamento, não podendo ser inferior a três meses e superior a dois anos, nos casos de internamento em regime aberto e semiaberto, conforme estabelece o seu n.º 1.
No caso “sub judice” o recorrente, apenas questiona, a duração da medida de internamento em regime semiaberto, imposta ao menor, pelo período de dezoito meses.
Efectivamente, o M.ºP.º recorre do acórdão proferido nos autos à margem identificados, na parte em que aplicou ao menor (A), a medida tutelar de internamento em Centro Educativo por ano e meio (18 meses), sob o regime semiaberto.
O recorrente entende, que as circunstâncias actuais do menor são diferentes das previamente existentes, devendo ser-lhe aplicada medida tutelar de internamento em Centro Educativo, pelo período de seis meses, sob regime semiaberto.
E vejamos quais essas circunstâncias actuais do menor !
O mesmo já se encontrar a cumprir de medida tutelar de internamento em Centro Educativo, por dois anos em regime semi aberto, à ordem do processo tutelar educativo n.º 1112/0, desde 6/2/03.
E, como refere na matéria apurada, o facto de apesar de inicialmente a sua adaptação ao Centro Educativo, à disciplina, à privação da liberdade, ter sido difícil, actualmente é muito boa.
O menor cumpre as regras do Centro, é cordato com educadores e com os seus pares, tem aproveitamento, e esforça-se, nas matérias de aprendizagem escolar, e frequenta, com entusiasmo, o curso de cerâmica.
Tem, algum, apoio familiar da mãe que o visita todos os fins de semana
Ora, atendendo às explanações jurídicas, retro apontadas, as medidas tutelares educativas «visam a educação do menor para o Direito e a sua inserção, de forma digna e responsável, na vida em comunidade», conforme preceitua o citado art.º 1º da respectiva lei.
O critério da medida escolhida é inquestionável, mostrando-se a escolha feita de acordo, com os princípios da adequação e suficiência expressos nos preceitos legais supra mencionados - arts. 1, 4º , 6º da LTE.
O ponto de discorda diz respeito à duração da medida, que deve ser «proporcional à gravidade do facto e à necessidade de educação para o direito manifestada na prática do facto e subsistente no momento da decisão», nos termos expressos no citado art.º 7º n.º 1, da LTE.
Efectivamente, o menor cumpre, já, uma medida tutelar de internamento, por dois anos, e, como refere o recorrente, “(...) de seguida iria, ou irá, cumprir mais 18 meses de internamento, ou seja, o menor ficará privado de liberdade por três anos e meio ( cfr. art.º 8º).
Não podemos deixar de ter em conta o tempo útil para um adolescente: três anos e meio de privação de liberdade é uma «eternidade», aos seus olhos configurará uma injustiça, um castigo exagerado face ao seu actual comportamento, empenho e esforço.
E como tal gerará revolta, incompreensão, desânimo, isto é, será contraproducente e deseducativo, exactamente o oposto ao objectivo legal.
Parece-nos, pois, que o tempo de duração da medida (18 meses) é altamente exagerado, desproporcionado à gravidade do facto ( roubo sem arma), desproporcionado à necessidade de educação do menor para o direito, subsistente no momento.
(...) Acresce, e isso não pode ser olvidado, que o jovem está em pleno cumprimento de medida tutelar de internamento, sendo o facto, obviamente anterior.
(...) Sendo certo que mais do que dois anos não o permite o regime aberto e o semi aberto (art.º 18º n.º 1) e o regime fechado só admite medida com duração de três anos, nas circunstâncias estabelecidas pela lei (art.º 18º, n.º 2).”
Ora, dado se estar perante a aplicação de medidas da mesma espécie em diferentes processos, cuja apensação deverá ocorrer, em momento oportuno, nos termos do art. 37º n.º 2, da LTE, é obvio que não é possível, o seu cumprimento simultâneo, devendo a sua execução ser sucessiva, conforme preceituam os arts. 8º ns.º 3 e 5 e 133º, da mencionada LTE. O citado n.º 5, do art. 8º, e porque se trata de cumprimento sucessivo de medidas tutelares, veio estabelecer um limite temporal máximo de duração de todas elas, segundo o qual o tempo total de duração de todas as medidas não pode ultrapassar o dobro do tempo da medida mais grave aplicada, cessando, em qualquer caso, obrigatoriamente, quando o destinatário atinja 21 anos de idade.
Portanto, em face de todo o circunstancialismo factico e de direiro, parece-nos, atendendo aos aludidos princípios de adequação da intervenção, de proporcionalidade à gravidade do facto e ao da necessidade de educação do menor, que é justo e adequado fixar a duração, da medida de internamento em centro educativo, em regime semiaberto, em dez meses.


III - Decisão
Em face do exposto, acordam em conceder provimento ao recurso, revogando o acórdão recorrido, na parte relativa à duração da medida de internamento em centro educativo, em regime semiaberto, fixada em dezoito meses, que se substituí por dez meses.

Sem custas.

(Processado por computador e integralmente revisto pela relatora que rubrica as restantes folhas).

Lisboa, 04/04/31

Maria Isabel Duarte

António Simões

Moraes da Rocha