Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
5715/2007-4
Relator: FERREIRA MARQUES
Descritores: CONTRA-ORDENAÇÃO
NULIDADE
COMPETÊNCIA
CONCURSO REAL DE INFRACÇÕES
CÚMULO JURÍDICO DE PENAS
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 10/17/2007
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: CONFIRMADA
Sumário:
1. Tem competência para aplicação das coimas correspondentes às contra-ordenações laborais o Inspector-Geral do Trabalho, o qual pode delegá-la nos Delegados e Subdelegados da Inspecção do Trabalho espalhados pelo país.
2. A decisão administrativa que expressamente remete e reproduz a proposta de decisão do instrutor da qual constam todos os requisitos do n.º 1 do art. 58º do RGCO não ofende o direito de defesa do arguido, sendo um procedimento perfeitamente válido.
3. Quem praticar várias contra-ordenações é punido, em cúmulo jurídico, com uma única coima.
4. O limite máximo da moldura legal dessa coima única é formado pela soma das coimas concretamente aplicadas a cada uma das infracções que integram o concurso, não podendo, contudo, exceder o dobro do limite máximo da contra-ordenação a que corresponder coima com um limite mais elevado. E o limite mínimo da coima única é constituído pela coima concreta mais elevada.
(sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa:

I. RELATÓRIO

(A), Gestão de Bares, Lda, com sede na Rua..., no Montijo, impugnou judicialmente a decisão da Inspecção Geral do Trabalho, de 20 de Junho de 2006, que lhe aplicou a coima única de € 15.000,00, sendo € 600,00, por violação do disposto na al. j) do art. 120º do Código do Trabalho; € 600,00, por violação do disposto no n.º 1 do art. 179º do Código do Trabalho; € 600,00, por violação do n.º 1 do art. 25º do DL 102/2000, de 2/6; € 1.400,00, por violação da alínea a), do n.º 2 do art. 245º da Lei 35/2004, de 29/7; € 1.400,00, por violação do disposto do art. 162º do Código do Trabalho; € 5.000,00, por violação do disposto do art. 37º, n.º 1 da Lei 100/97, de 13/9; € 700,00, por violação da cláusula 76ª do CCT celebrado entre a ARESP e a FESAHT, publicado no BTE n.º 23/2001, com PE, publicada no BTE n.º 11/2002, e alteração no BTE n.º 28/2004, conjugado com o n.º 5 do art. 267º do Código do Trabalho; € 5.000,00, por violação do art. 89º da Lei 99/2003, de 27/8, em conjugação com o art. 159º, n.ºs 1 e 2 da Lei 35/2004, de 29/7.

O Tribunal do Trabalho do Barreiro negou provimento ao recurso e confirmou a decisão da IGT.

Inconformada, a arguida interpôs recurso da sentença do TTB para esta Relação, no qual formulou as seguintes conclusões:
(…)
Terminou pedindo o provimento do recurso, a revogação da sentença recorrida e a absolvição da coima que lhe foi aplicada.

O MºPº, na sua sua contra-alegação, pugna pela confirmação da sentença recorrida e pelo não provimento do recurso.

Admitido o recurso na forma, com o efeito e no regime de subida devidos, subiram os autos a esta Relação onde, depois de colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

II. QUESTÕES A APRECIAR

As questões que se suscitam neste recurso são as seguintes:
1. Saber se a decisão da IGT enferma das nulidades que a recorrente lhe imputa;

2. Saber se a sentença recorrida ao aplicar à recorrente a coima única de € 15.000,00, violou o disposto no art. 19º do DL 433/82, de 27/10, na redacção que lhe foi dada pelo DL 244/95, de 14/09.

III. FUNDAMENTOS DE FACTO

A 1ª instância considerou provada a seguinte matéria de facto:
1. No dia 4 de Novembro de 2005, pelas 00 horas e 30 minutos, foi efectuada pelo Sr. Inspector autuante uma visita inspectiva no local de trabalho Discoteca X, sito na Rua ..., Antigo Cais do Montijo, explorado pela empresa arguida;
2. A actividade económica da ora arguida naquele local consiste em explorar um estabelecimento de diversão nocturna, bar com discoteca aos fins de semana, com música ao vivo;
3. À data da inspecção e no local de trabalho, a arguida mantinha ao seu serviço, sob as suas ordens, direcção e fiscalização, mediante retribuição, os trabalhadores (R), admitido em Setembro de 2005; (M), admitida em Maio de 2005 e (L), admitido pelo menos, desde Maio de 2005, todos com a categoria de Empregado de Balcão;
4. O horário de trabalho definido pela entidade empregadora é das 22 horas às 6 horas ao Domingo e das 22 horas às 7 horas ou 8 horas, às Sextas e Sábados e vésperas de feriados;
5. Estes trabalhadores exercem as suas funções em três balcões do Bar, dois situados no interior do estabelecimento e outro no exterior, no espaço contíguo ao rio;
6. Sendo os equipamentos de trabalho fornecidos pela arguida;
7. No momento da visita inspectiva, em 4/11/2005, foi entregue pelo Inspector autuante ao sócio gerente (AR), uma notificação para apresentar no dia 15/11/2005, nos serviços do Barreiro da IGT, determinada documentação laboral, como seja, o mapa de horário de trabalho; mapa de quadro de pessoal de 2004; folhas de remuneração da Segurança Social de Janeiro a Setembro de 2005; recibos de retribuição dos trabalhadores de Janeiro a Setembro de 2005; registo de pessoal, apólice de seguros de acidentes de trabalho e último recibo pago; comunicação obrigatória de início de actividade à IGT; fichas de aptidão dos exames de saúde dos trabalhadores; registo de controlo de entradas no estabelecimento; contratos de trabalho celebrados com trabalhadores estrangeiros;
8. Na data designada para o efeito a arguida não compareceu nem se fez representar nem apresentou qualquer justificação para a falta;
9. A arguida não mantém permanentemente actualizado no estabelecimento o registo de pessoal, com indicação dos nomes, datas de nascimento e admissão, modalidades de contratos, categorias, promoções, retribuições, datas de início e termo de férias e faltas que impliquem a perda de retribuição ou diminuição dos dias de férias;
10. A arguida não elaborou nem afixou em local visível no estabelecimento comercial o mapa de horário de trabalho;
11. Tendo a arguida aberto ao público o estabelecimento comercial de que é proprietária, pelo menos, em Maio de 2005, não comunicou aos serviços da Inspecção Geral do Trabalho, o início da laboração ou abertura do estabelecimento e sendo notificada para o fazer, nada fez;
12. À data da visita inspectiva, a arguida não havia submetido, antes da admissão ou nos 15 dias subsequentes, a exames de saúde de aptidão ou a exames periódicos os seus trabalhadores e, notificada para exibir as fichas, nada cumpriu;
13. A arguida não mantém o registo que permita apurar o número de horas prestadas pelos seus trabalhadores, por dia e por semana, com indicação das horas de início e do termo de trabalho;
14. À data da visita inspectiva, o pessoal ao serviço da empresa arguida não se encontrava seguro por qualquer seguro de acidentes de trabalho;
15. No acto de pagamento da retribuição, a arguida não entregava a cada trabalhador documento de onde conste, entre outros elementos, a identificação das partes, o período a que corresponde a retribuição, os descontos e valor líquido a receber;
16. A arguida foi notificada para exibir nos serviços da IGT, no Barreiro, em 15/11/2005, os recibos de retribuição de todo o pessoal ao seu serviço, respeitantes ao período de Janeiro a Setembro de 2005 e nada exibiu;
17. Aos trabalhadores ao serviço da arguida não era entregue qualquer recibo de retribuição, nem os mesmos foram incluídos na folha de remunerações mensais da Segurança Social;
18. Na data da visita inspectiva, a arguida mantinha ao seu serviço o trabalhador (L), no desempenho das suas funções de Empregado de Balcão, admitido pelo menos desde Maio de 2005, sem que tivesse sido comunicado no acto de admissão ou até ao levantamento do auto de notícia, aos serviços do IGT, a celebração do seu contrato de trabalho;
19. Sendo a arguida notificada para exibir, em 15/11/2005, nos serviços da IGT do Barreiro, o contrato de trabalho celebrado com o trabalhador estrangeiro, não o fez;
20. Em 5 de Janeiro de 2006, a arguida foi notificada através do ofício n.° 24 do Auto de Advertência n°3/2006, onde lhe era concedido o prazo de 10 dias para regularizar a situação dos trabalhadores;
21. A arguida apesar de devidamente notificada do Auto de Advertência n° 3/2006 e das consequências do incumprimento, nada fez;
22. A arguida sabia que, com a sua atitude prejudicaria os trabalhadores na sua antiguidade e direitos sociais, como o gozo de férias ou o recebimento do subsídio de Natal e o benefício de se inscreverem na Segurança Social e dela usufruir os seus direitos;
23. A arguida agiu voluntária e deliberadamente, pois até à data do levantamento do auto de notícia não regularizou as medidas que eram determinadas pelo Auto de Advertência;
24. A arguida iniciou a sua actividade em 15/12/2004, tendo como sócios (JM), (AR) e (RC).

IV. FUNDAMENTOS DE DIREITO

1. Nulidades que a recorrente a imputa à decisão da IGT
a) A recorrente alega que a decisão da autoridade administrativa é nula, uma vez que a mesma foi proferida ao abrigo de uma delegação de competências do Sr. Inspector-Geral do Trabalho que se reporta ao Delegado da Inspecção do Trabalho de Setúbal e não ao Subdelegado do Barreiro.
Sustenta, por isso, que a referida decisão é nula, uma vez que a pessoa que a proferiu não tinha competência para tal.
Mas não lhe assiste qualquer razão à recorrente.
O procedimento das contra-ordenações laborais compete à Inspecção-Geral do Trabalho (art. 630º, n.º 1 do CT).
São territorialmente competentes para o procedimento das contra-ordenações laborais as delegações ou subdelegações dos serviços indicados no artigo anterior em cuja área se haja verificado a infracção (art. 631º do CT).
Tem competência para aplicação das coimas correspondentes às contra-ordenações laborais o Inspector-Geral do Trabalho (art. 630º, n.º 2 do Código do Trabalho). Esta competência pode, todavia, ser delegada pelo Inspector-Geral do Trabalho a cada um dos Delegados ou Subdelegados da Inspecção do Trabalho espalhados pelo país.
Estes, por sua vez, ao proferirem a decisão final nos processos de contra-ordenação, devem indicar que o fazem no âmbito de uma competência delegada e identificar essa delegação, sob pena de anulabilidade da decisão (arts. 38º, 123º, n.º 1, al. b) e 135º do CPA).
No caso em apreço, a decisão administrativa foi proferida pela Subdelegada do Barreiro, no uso da competência que em si foi delegada pelo Inspector-Geral do Trabalho, conforme despacho n.º 19.984/2004, de 24/9, com efeitos retroactivos, desde 17/8/2004.
É certo que, por lapso, foi mencionado na referida decisão o despacho n.º 11.212/2005 (2ª Série), publicado no DR II Série, de 18/5/2005, que subdelegava no Delegado de Setúbal a competência para aplicação das coimas, enquanto durasse o impedimento da Subdelegada do Barreiro. Mas o lapso cometido na indicação do n.º do despacho não afecta a referida decisão, uma vez que, findo aquele impedimento, a delegação de poderes regressou à Sudelegada do Barreiro, cuja competência para proferir tal decisão está justificada pelo aludido despacho n.º 19.984/2004, de 24/9.
Não se verifica, assim, a alegada falta de competência da Subdelegada do Barreiro, mas sim um mero lapso material na indicação do n.º do despacho da delegação de competências, lapso esse que não afecta a validade da decisão, uma vez que quem a proferiu tinha poderes para o efeito, conferidos pelo Inspector Geral do Trabalho.

b) A recorrente sustenta ainda que a decisão administrativa é nula, por violação do disposto nos arts. 374º, n.º 2 e 279º, n.º 1, al. a) do CPP aplicáveis “ex vi” art. 41º do DL 433/82, de 27/2, porquanto está deficientemente fundamentada, designadamente, no que se refere à omissão da matéria de facto dada como provada e ao elemento subjectivo, pelo que a sentença recorrida ao considerar que tal decisão se mostra fundamentada, nomeadamente quanto ao elemento subjectivo e que, nesta matéria, não há lugar à aplicação do CPP, interpretou e aplicou mal as disposições legais acima mencionadas.
Também em relação a esta questão não assiste qualquer razão à recorrente.
Efectivamente o art. 41º, n.º 1 do DL 433/82, de 27/10 [RGCO], consagra como direito subsidiário o Código do Processo Penal, mas este só será aplicável no processo contra-ordenacional, quando não existirem normas específicas que disciplinem o acto ou situação, no mencionado RGCO.
Ora, em relação à decisão condenatória proferida no processo contra-ordenacional, existe uma norma específica – o art. 58º do RGCO – que disciplina o seu conteúdo.
Dispõe este artigo no seu n.º 1 que a decisão que aplica a coima (...) deve conter: a) a identificação dos arguidos; b) a descrição dos factos imputados, com indicação das provas obtidas; c) a indicação das normas segundo as quais se pune e a fundamentação da decisão; d) a coima e as sanções acessórias.
Terá a decisão da IGT que condenou à arguida na coima única de € 15.000,00 cumprido as exigências impostas neste preceito?
Pensamos que sim.
Com efeito, a decisão proferida pela Sudelegada da IT do Barreiro ao referir, na sua parte final “concordo com a proposta acima referida, a fls. 70 a 89 dos autos, que aqui dou como inteiramente reproduzida, passando a mesma a fazer parte integrante da presente decisão” remeteu, de forma expressa e inequívoca, para a proposta da instrutora do processo e, ao consignar que a mesma passava a fazer parte integrante da decisão, assumiu, como seu, o conteúdo da mesma proposta. Por isso, não pode deixar de se reconhecer que a decisão final da autoridade administrativa integra em si, também, o conteúdo da proposta do instrutor do processo, de onde constam todos os elementos referidos n.º 1 do art. 58º do RGCO, nomeadamente, os factos imputados à arguida e a indicação das provas, as normas jurídicas violadas e as que os punem como contra-ordenação, bem como a fundamentação da decisão.
E note-se que juntamente com a decisão foi a arguida notificada também do teor da respectiva proposta, de forma que esta ficou a saber, com exactidão, quais os factos que lhe eram imputados e respectivas provas, bem como as normas jurídicas que os punem e, ainda, as razões da aplicação da coima em concreto.
Como escrevem Manuel Simas Santos e Jorge Lopes de Sousa (Contra-Ordenações – Anotações ao Regime Geral, Visilis Editores, 2001, pág. 322), “os requisitos previstos no art. 58º para a decisão condenatória do processo contra-ordenacional visam assegurar ao arguido a possibilidade do exercício efectivo dos seus direitos de defesa, que só poderá existir com conhecimento perfeito dos factos que lhe são imputados, das normas legais em que se enquadram e condições em que pode impugnar judicialmente aquela decisão. Por isso as exigências aqui feitas deverão considerar-se satisfeitas quando as indicações contidas na decisão sejam suficientes para permitir ao arguido o exercício desses direitos.”
Ora, o facto de a decisão da Subdelegada da IT do Barreiro ter em parte remetido para a proposta da instrutora do processo não retirou, no presente caso, clareza à decisão, nem deturpou ou truncou o seu conteúdo. E o direito de defesa da arguida não ficou minimamente afectado pelo facto de a autoridade administrativa ter decidido desta forma, como se verifica pelas alegações do recurso que interpôs da decisão da Inspecção do Trabalho, nas quais revela de forma clara, que compreendeu integralmente todos os factos que lhe foram imputados, a fundamentação da decisão, as normas violadas e as que punem a infracção cometida, bem como a medida da coima que lhe foi aplicada.
Na verdade, a proposta da instrutora do processo está muito bem estruturada e fundamentada em termos de facto e em termos de direito, é muito clara e acessível mesmo na parte que respeita ao elemento subjectivo, razão pela qual se compreende, perfeitamente, que a Sra. Subdelegada a tenha dado como reproduzida, assumindo-a como sua, o que equivale à sua transcrição integral, tal como lhe permite o art. 639º, n.º 5 do CT.
O Tribunal Constitucional no seu acórdão de 4/2/2003 – Proc. n.º 351/02, publicado no DR II Série, de 23/5/03, pág. 7.870, concluiu também que “a exigência constitucional de fundamentação expressa dos actos administrativos se não deixa de cumprir com a remissão para peça de processo (v.g. parecer ou proposta) que contenha tal fundamentação, também se obedecerá ao disposto no art. 58º do DL 433/82 se a decisão condenatória remeter para a proposta que contenha os requisitos ali previstos.”

Naturalmente que a Sra Subdelegada podia transcrever a proposta na íntegra, mas essa exigência parece-nos ser desnecessária e demasiado burocrática, com prejuízo para a celeridade processual e sem qualquer vantagem adicional para a clareza da mesma e para a defesa da arguida.
Deve, assim, concluir-se que a decisão administrativa que expressamente remete e reproduz a proposta de decisão do instrutor da qual constam todos os requisitos do n.º 1 do art. 58º do RGCO não ofende o direito de defesa do arguido, sendo um procedimento perfeitamente válido.

Improcedem, assim, as nulidades que a recorrente imputa à decisão da Inspecção do Trabalho.

2. Da alegada violação do art. 19º do DL 433/82, de 27/10. Concurso de contra-ordenações. Cúmulo jurídico das coimas.
Vejamos, agora, se juíza recorrida ao aplicar à recorrente a coima única de € 15.000,00, violou o disposto no art. 19º do DL 433/82, de 27/10, na redacção que lhe foi dada pelo DL 244/95, de 14/09.
Alega a recorrente que, nos termos do referido preceito, a prática de várias contra-ordenações dá lugar à punição com uma única coima que não pode exceder o dobro do limite máximo mais elevado da coima que lhe foi aplicada. Sendo, assim, a coima única, em caso algum, poderia exceder os € 10.000,00, ou seja, o dobro da coima fixada na alínea F) ou na alínea H) da parte III da proposta de decisão administrativa.
Conclui, por isso, a arguida que a sentença recorrida, ao considerar adequado o valor da coima aplicada pela IGT, condenando-a na coima única de € 15.000,00, violou o sobredito art. 19º, uma vez que, segundo esta norma, o valor máximo da coima a aplicar era € 10.000,00.
Também, neste ponto, como veremos de seguida, não assiste qualquer razão à recorrente.
Ao apreciar esta questão, convém ter presente que a recorrente não invocou a violação do art. 18º, mas tão somente a violação do art. 19º do DL 433/82, de 27/10, na redacção que lhe foi dada pelo DL 244/95, de 14/09, alegando que, nos termos desta norma, o valor máximo da coima a aplicar era € 10.000,00.
O art. 19º do DL 433/82, de 27/10, na redacção que lhe foi dada pelo DL 244/95, de 14/09, estabelece o seguinte:
1. Quem tiver praticado várias contra-ordenações é punido com uma coima cujo limite máximo resulta da soma das coimas concretamente aplicadas às infracções em concurso.
2. A coima aplicável não pode exceder o dobro do limite máximo mais elevado das contra-ordenações em concurso.
3. A coima a aplicar não pode ser inferior à mais elevada das coimas concretamente aplicadas às várias contra-ordenações.
Este artigo estabelece o regime da punição do concurso de contra-ordenações, que se concretiza na aplicação de uma única coima.
O limite máximo da moldura legal desta coima única é formado pela soma das coimas concretamente aplicadas a cada uma das infracções que integram o concurso, mas sem exceder o dobro do limite máximo da contra-ordenação a que corresponder coima com um limite mais elevado. E o limite mínimo da coima única é constituído pela coima concreta mais elevada.
Assim, para determinar os limites máximo e mínimo da coima única aplicável, é necessário realizar as seguintes operações e verificações:
a) Fixam-se, em primeiro lugar, as coimas concretas que seriam de aplicar a cada uma das infracções em concurso;
b) Calcula-se a soma dessas coimas concretas, cujo resultado constituirá, em princípio, o limite máximo da coima única abstractamente aplicável ao concurso de infracções;
c) Verifica-se qual das contra-ordenações que integram o concurso é abstractamente punível com coima com limite máximo mais elevado (ao contrário do que sustenta a recorrente não é ao dobro do limite máximo mais elevado da coima concreta que lhe foi aplicada que se deve atender, mas sim ao dobro do limite máximo mais elevado da coima abstractamente aplicável à contra-ordenação punível com coima com limite mais elevado).
d) Calcula-se o dobro deste limite máximo mais elevado;
e) Compara-se a soma das coimas concretas referidas em b) com o dobro do limite máximo referido em d);
f) O limite máximo da coima única abstractamente aplicável ao concurso de infracções é o menor destes dois valores referidos em e);
g) Verifica-se qual das coimas concretas, referidas em a) é mais elevada e será esse o limite mínimo da coima única abstractamente aplicável.
É dentro destes limites máximo e mínimo que o tribunal tem de se movimentar para determinar o montante da coima única a aplicar pelo concurso de infracções.
À recorrente foram aplicadas as seguintes coimas: € 600,00, por violação do n.º 1 do art. 25º do DL 102/2000, de 2/6; € 1.400,00, por violação da alínea a), do n.º 2 do art. 245º da Lei 35/2004, de 29/7; € 1.400,00, por violação do disposto do art. 162º do Código do Trabalho; € 5.000,00, por violação do disposto do art. 37º, n.º 1 da Lei 100/97, de 13/9; € 700,00, por violação da cláusula 76ª do CCT celebrado entre a ARESP e a FESAHT, publicado no BTE n.º 23/2001, com PE, publicada no BTE n.º 11/2002, e alteração no BTE n.º 28/2004, conjugado com o n.º 5 do art. 267º do Código do Trabalho; € 5.000,00, por violação do art. 89º da Lei 99/2003, de 27/8, em conjugação com o art. 159º, n.ºs 1 e 2 da Lei 35/2004, de 29/7.
Como a soma das coimas concretamente aplicadas a cada uma das referidas contra-ordenações totaliza o montante de € 15.300,00 e como o dobro do limite máximo mais elevado da coima aplicável à contra-ordenação abstractamente punível com coima com limite máximo mais elevado é € 16.910,00 (2 x 8.455,00), o limite máximo da coima única abstractamente aplicável ao referido concurso de infracções é o menor destes dois valores, ou seja, € 15.300,00. E como a coima concreta mais elevada aplicada no referido concurso à arguida foi de € 5.000,00, será este o limite mínimo da coima única abstractamente aplicável.
A moldura da coima abstractamente aplicável ao referido concurso de infracções tem, assim, como limite mínimo € 5.000,00 e como limite máximo € 15.300,00.
Era dentro desta moldura [5.000,00 - 15.300,00 euros] que o tribunal a quo tinha de se movimentar para determinar o montante da coima única a aplicar pelo concurso de infracções, de harmonia com os critérios definidos no art. 18º do RGCO.
A Mma juíza a quo, ao aplicar à recorrente a coima única de € 15.000,00, não violou, portanto, o disposto no art. 19º do DL 433/82, de 27/10, na redacção que lhe foi dada pelo DL 244/95, de 14/09.

Improcedem, assim, todas as conclusões do recurso interposto pela recorrente.

V. DECISÃO

Em conformidade com os fundamentos expostos, nega-se provimento ao recurso e confirma-se a sentença recorrida.
Custas pela recorrente.

Lisboa, 17 de Outubro de 2007

Ferreira Marques
Maria João Romba
José Feteira