Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
1436/17.3TXLSB-A.L1-5
Relator: AGOSTINHO TORRES
Descritores: PRISÃO POR DIAS LIVRES
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 05/28/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NÃO PROVIDO
Sumário: Não tendo o arguido requerido audiência para aplicação da norma transitória do artº 12º da Lei n.º 94/2017, de 23 de Agosto, deve aplicar-se, face à revogação do artº 45º do CP, o regime que seria aplicável em caso de incumprimento das apresentações em períodos (dias) livres, passando a sê-lo em contínuo, nos termos do que estava disposto no entretanto revogado artº 125, nº4 do CEPMPL, aprovado pela Lei 115/2009.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: ACORDAM EM CONFERÊNCIA OS JUÍZES NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA – 5ª SECÇÃO (PENAL)

I-RELATÓRIO
1.1- A 29 de Janeiro de 2018  pelo Tribunal de Execução das Penas de Lisboa Juiz 5 , no âmbito do Proc. n° 1436/17.3TXLSB-A,  foi decidido:   
““I. RELATÓRIO
M. foi, por sentença proferida no processo n.° 39/16.4S9LSB do juiz 1 do juízo local de pequena criminalidade de Lisboa, condenado na pena de 6 (seis) meses de prisão, pela prática de um crime de condução sem habilitação legal.
Mais foi decidido na referida sentença que a pena seria a cumprir em dias livres.
Foi comunicado a este tribunal que o condenado iniciou o cumprimento da pena em 05/08/2017, o que originou o presente processo supletivo, cuja tramitação segue, com as necessárias adaptações, os termos do processo de concessão de liberdade condicional (art. 234.° do código da execução das penas e medidas privativas da liberdade).
O condenado encontra-se representado por defensora. Foi ouvido presencialmente (cfr. fls. 178 e s.).

O Ministério Público emitiu parecer no sentido de o arguido cumprir a pena remanescente em regime contínuo.
II. FUNDAMENTAÇÃO
A) De facto
1. Factos provados
a) Por sentença transitada em julgado, proferida no processo n.° 39/16.4S9LSB do juiz 1 do juízo local de pequena criminalidade de Lisboa, M. foi condenado na pena de 6 (seis) meses de prisão.
b) Mais foi decidido na referida sentença que a pena seria a cumprir em dias livres, mais concretamente em 36 (trinta e seis) períodos sucessivos, correspondentes a fins-de-semana, entre as 09horas de sábado e as 21 horas de domingo.
c) O condenado foi notificado da guia de apresentação, para que iniciasse o cumprimento da pena em 05/08/2017.
d) O condenado apresentou-se em 05/08/2017 a fim de iniciar o cumprimento da pena.
e) E apresentou-se, ainda, em 26/08/2017, 02/09/2017, 09/09/2017, 16/09/2017 e 04/11/2017.
f) Tendo cumprido os períodos iniciados nas datas referidas em c) e d), num total de seis.
g) O condenado não compareceu no estabelecimento prisional para cumprimento de qualquer outro período.
h) O arguido explorava um estabelecimento comercial de cafetaria e afins.
2. Factos não provados
Não está demonstrado que o arguido deixou de comparecer no estabelecimento prisional porquanto o "senhor que trabalhava" no estabelecimento comercial referido em h) adoeceu e o arguido teve de substituí-lo.
3. Motivação da matéria de facto
Os factos sobremencionados resultam da certidão da sentença condenatória, junta a fls. 7 e ss., da guia de apresentação e notificação juntas a fls. 63 e 64, da informação do estabelecimento prisional, junta a fls. 157, retificada a fls. 159, do mapa de apresentações do condenado, junto a fls. 159 verso, da declaração de IRS e do contrato de arrendamento comercial, juntos, respetivamente, a fls. 163 e ss. e 172 e ss..
O arguido não apresentou qualquer prova passível de demonstrar que deixou de comparecer no estabelecimento prisional porquanto o "senhor que trabalhava" no estabelecimento comercial referido em h) adoeceu e o arguido teve de substituí-lo.

B) De direito
Do manancial fáctico provado resulta que M. foi condenado na pena de 6 (seis) meses de prisão e que, tendo-lhe sido concedida a possibilidade -corolário dos princípios de intervenção mínima do direito penal e da proporcionalidade das penas - de cumprir tal pena por dias livres, apenas cumpriu 6 períodos de um total de 36.
Chamado a pronunciar-se sobre a sua omissão, o condenado invocou, em suma, a ausência de um trabalhador seu por doença e a consequente necessidade de o substituir ao fim de semana no estabelecimento comercial por si explorado.
A apreciação da justificação das faltas remete-nos para a noção de justo impedimento enquanto ocorrência de um evento não imputável à parte e que obsta à prática do ato. Como tem sublinhado alguma jurisprudência, as circunstâncias justificativas da falta de comparência devem ser supervenientes e revelar-se totalmente incompatíveis com a execução da pena imposta (cfr., entre outros, o acórdão da relação do Porto, de 16/01/2013, in CJ, T.I. pág. 252).
Ora, este não é, de todo, o caso. Em primeiro lugar, porque dos factos invocados o condenado apenas demonstrou que explorava um estabelecimento comercial. Em segundo lugar, porque, ainda que a referida ausência estivesse comprovada, a mesma não justificaria a conduta do condenado, pois o que se lhe imporia, então, seria substituir o trabalhador em falta por outro. Não colhe o argumento de que "tinha as contas do café e da casa para pagar", pois o montante que deixava de despender com o trabalhador ausente (cujo vencimento em caso de falta por doença não tinha legalmente de suportar), serviria para que contratasse um substituto. Ademais, a ter, de facto, uma justificação plausível para as suas ausências no estabelecimento prisional, não deixaria o condenado de comunicá-la, o que não fez, procurando, apenas agora, que se encontra novamente sob a égide da justiça penal, argumentar em seu prol.
Em síntese, a justificação aventada pelo condenado não está demonstrada, nem consubstancia uma justificação atendível para o incumprimento culposo do condenado.
O condenado não só não demonstrou qualquer justificação atendível para a falta de comparência no estabelecimento prisional, como verdadeiramente revelou indiferença e pouca motivação para aproveitar um regime de cumprimento da pena que melhor promoveria a reinserção social.
Importa, como tal, converter a prisão aplicada, com o desconto que se impuser, em regime contínuo. Efetivamente, como vem sendo entendido pelos tribunais superiores (cfr., ente outros, os acórdãos do tribunal da relação de Lisboa, proferidos nos processos n.° 3130/10.7TXLSB-D.L1 e n.° 596/15.2TXLSB-B.L1) e acompanhamos, tendo o arguido sido condenado numa pena de prisão que culposamente apenas cumpriu em parte e não tendo oportunamente lançado mão da reabertura da audiência prevista no art. 12.° n.° 1 da lei n.° 94/2017, de 24 de agosto, impõe-se proceder à conversão em regime contínuo, seja por força do disposto nos n.°s 2 e 3 do mesmo preceito, seja por a lei revogatória do regime penal não impossibilitar a continuação da sua aplicação a casos pretéritos. Efetivamente, a congruência sistemática impõe que uma sentença transitada em julgado seja passível de execução, pois que a conduta criminal do condenado não foi amnistiada ou descriminalizada e a prisão por dias livres constitui uma pena substitutiva da prisão efetiva, subsistindo sempre esta (ainda que não aquela).
Uma vez que o condenado cumpriu seis períodos, cada um equivalente a cinco dias - 12.° n.° 3 da lei 94/2017, de 24 de agosto -, restam-lhe cumprir 150 dias (30 x 5) dos iniciais 180 dias (36 x 5).

III. DECISÃO
Em face de todo o exposto, julgo injustificadas as faltas de apresentação de M. no estabelecimento prisional e determino que a pena de prisão em que foi condenado no processo n.° 39/16.4S9LSB do juiz 1 do juízo local de pequena criminalidade de Lisboa passe a ser cumprida em regime contínuo, pelo tempo que faltar, sendo, em concreto, 150 (cento e cinquenta) dias de prisão.
Custas a suportar pelo condenado, fixando-se a taxa de justiça em 2 (duas) UC. Notifique e comunique ao estabelecimento prisional de Monsanto e ao tribunal da condenação.”

1.2 – Desta decisão  recorreu o arguido, dizendo em conclusões da motivação apresentada:
1. Vem M. , condenado na pena de 6 (seis) meses de prisão, por sentença transitada em julgado, proferida no processo n°.39/16.4S9LSB, do juiz 1, do juízo local de pequena criminalidade de Lisboa, mas foi decidido na referida sentença que a pena seria a cumprir em dias livres, mais concretamente em 36 (trinta e seis) períodos sucessivos, correspondentes a fins-de-semana, entre as 9 horas de Sábado e as 21 horas de Domingo.
2. É fundamento do presente recurso:
- contesta o arguido ora recorrente vir condenado em pena de prisão efectiva, quando já não existe penas por dias livres.
-a lei de prisão por dias livres foi revogada, estando os tribunais a quo, a converterem em penas suspensas.
-a condenação em pena excessiva, uma vez que não foram ponderados todos os elementos que depõem a favor do agente e o facto do próprio relatório social afirmar que este mostrou-se apreensivo e colaborante; e
- a não suspensão da pena de prisão aplicada.
3. Considera-se excessiva a pena na qual foi o arguido condenado. Mas ainda que assim não se entenda. O que por mera cautela de patrocínio se concede, a verdade é que os factos trazidos aos autos e também factos que foram considerados como provados nos autos seriam suficientes para a determinação de uma pena de prisão suspensa na sua execução, conforme a actual jurisprudência relativamente à revogação do artigo do Código Penal da prisão por dias livres.
4. Resulta do relatório social que o condenado está bem inserido na sociedade. Goza de grande estima por parte dos seus familiares e amigos, que nunca o abandonaram. Vive num ambiente familiar saudável.
5. O condenado está em prisão preventiva, sendo um preso exemplar devido ao seu bom comportamento. Mas mais importante ainda, o condenado mostra-se apreensivo face à sua situação judicial e encontra-se com uma postura colaborante.
6. Tais factos por si impunham a determinação de uma medida de pena inferior. O seu dolo, apesar de directo, não representa uma intensidade elevada.
7. O condenado admitiu que praticou os factos;
8. O condenado mostrou-se apreensivo face à sua situação judicial e às suas eventuais implicações, adoptando uma postura colaborante e atenta;
9. O condenado é considerado um recluso exemplar, está inserido num ambiente social e familiar estável e tem perspectivas de se estabilizar profissionalmente, factores que indicam claramente que da atenuação adviesse vantagens para a sua reinserção social.
10. A experiência da prisão preventiva actualmente vivida abalou física e psicologicamente o condenado, o qual sempre demonstrou, um propósito firme de evitar novos comportamentos desviantes, chegando a procurar ajuda médica.
11. Não se compreende, sendo mesmo inaceitável que o condenado, venha a cumprir uma pena desajustada e desproporcional.
12. A pena não pode ultrapassar a medida da culpabilidade, mas logicamente poderá não alcançá-la sempre que isso seja permitido pelo fim preventivo.
13. E na verdade o que acontece, é que o douto Tribunal a quo não fez, com o devido respeito, um juízo correcto da medida da culpa do condenado.
14. Sendo certo que, em sede de exigências de prevenção especial de socialização, o Tribunal a quo não considerou, salvo o devido respeito, todos os elementos trazidos aos autos e a prova aí realizada.
15. A pena na qual foi o arguido condenado é essencialmente e objectivamente injusta em função da culpa do agente e restantes circunstâncias - cfr. Artigos 40.o, 50.o, 710, 72.o e 73.o do Código Penal.
16. E a rever-se a pena aplicada ao condenado deve também ser ponderada a eventual suspensão da pena, uma vez que a suspensão da execução da pena constitui uma faculdade vinculada, desde que verificados os seus pressupostos - forma! e material - exigidos no artigo 50.° do CP.
17. Não só porque o seu limite em nosso entender seria sempre suspensa na sua execução, mas também porque ela se revela adequada e suficiente à realização das finalidades da punição, pelo já supra exposto.
18. Tendo em consideração todos os factos que depõem a favor do agente deve ser revista a sua pena.
 (…)”
1.3- Em resposta disse o MºPº, em síntese:
1. “Por sentença transitada em julgado, proferida no processo n.° 39/16.4S9LSB, que correu termos no Juízo Local de Pequena Criminalidade de Lisboa - Juiz 1, foi o recorrente condenado na pena de 6 meses de prisão, pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artigo 3.°, n.os 1 e 2, do Decreto- Lei n.° 2/98, de 3 de Janeiro e determinou-se o seu cumprimento em regime de dias livres, concretamente em 36 períodos sucessivos.
2. Desses períodos de prisão o ora recorrente apenas cumpriu 6, remanescendo 30 períodos por cumprir.
3. Por decisão de 29 de Janeiro de 2018, o tribunal de execução das penas julgou injustificadas as faltas de apresentação do recorrente e determinou o cumprimento em regime contínuo da pena restante, concretamente 150 dias.
4. O recorrente, não contestando o incumprimento do regime de prisão por dias livres derivado das faltas injustificadas por si dadas, considera ser excessivo o número de dias resultantes da conversão, reivindica a aplicação do Regime Penal Aplicável a Jovens Delinquentes (Decreto-Lei n.° 401/82, de 23 de Setembro), assim como a suspensão da execução da prisão contínua.
5. A conversão efetuada obedeceu à previsão legal contida no artigo 45.° n° 3 do Código Penal, na redação anterior à alteração introduzida pela Lei n° 94/2017, de 23 de agosto, cuja aplicação se mantém para as condenações ainda em vigor porque as penas não se mostram extintas, segundo a qual cada período corresponde a cinco dias de prisão continua.
6. Assim, porque o recorrente apenas cumpriu 6 dos 36 períodos impostos na decisão condenatória, restam 30 períodos, equivalentes a 150 dias (5 dias x 30 períodos).
7. O Regime Penal Aplicável a Jovens Delinquentes (Decreto-Lei n.° 401/82, de 23 de Setembro) não é aplicável no caso em apreço, por falta de base legal e, ainda que assim não fosse, pelo facto de o recorrente ter 24 anos de idade à data da prática dos factos, tratando-se de regime que apenas abrange jovens com idade compreendida entre os 16 e os 21 anos de idade.
8. Também por inexistência de base legal, ao tribunal de execução das penas não era exigível que ponderasse uma eventual suspensão da execução da prisão contínua decorrente da conversão.
9. Tal ponderação foi realizada em sede própria, nomeadamente na sentença e acórdão proferidos pelo Tribunal de Pequena Instância Criminal de Lisboa e pelo Tribunal da Relação de Lisboa, que decidiram pela não verificação dos pressupostos para a sua aplicação.
10.A decisão ora recorrida configura a única solução juridicamente válida e adequada ao caso sub Júdice,

Nestes termos, e nos demais de direito, não deverá o recurso interposto merecer provimento, confirmando-se a douta decisão recorrida.”

1.4 - Admitido o recurso e remetido a esta Relação, o MºPº emitiu parecer no sentido de ser negado provimento, remetendo-se para as razões aludidas na resposta do seu par em 1ª instância.

1.5- Após exame preliminar e vistos legais foram remetidos os autos à Conferência, cumprindo agora decidir.

II- CONHECENDO

2.1-O âmbito dos recursos encontra-se delimitado em função das questões sumariadas pelo recorrente nas conclusões extraídas da respectiva motivação, [1]. e visam permitir ou habilitar o tribunal ad quem a conhecer as razões de discordância do recorrente em relação à decisão recorrida [2].

2.2-Está em  discussão para apreciação e em síntese:

- Excessividade da pena, revisão e  suspensão da  execução.

2. 3 -  A POSIÇÃO DESTE TRIBUNAL  ad quem.

2.3.1- Alega o recluso ter havido - excessividade da pena, pedindo a sua revisão com suspensão da execução.
O recluso, por estar actualmente em prisão preventiva desde 26.3.2018 por crime de homicídio qualificado na forma tentada e  ofensa à integridade física qualificada, foi ouvido nos presentes autos acerca da sua situação de incumprimento desde 4.11.2017, já depois da entrada em vigor da Lei n.º 94/2017, de 23 de Agosto, cuja norma transitória ( artº 12º, dispôs assim:

Artigo 12.º
Disposição transitória
1 - O condenado em prisão por dias livres ou em regime de semidetenção, por sentença transitada em julgado, pode requerer ao tribunal a reabertura da audiência para que:
a) A prisão pelo tempo que faltar seja substituída por pena não privativa da liberdade, sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição; ou
b) A prisão passe a ser cumprida, pelo tempo que faltar, no regime de permanência na habitação introduzido pela presente lei.
2 - À prisão em regime contínuo que resulte do incumprimento das obrigações de apresentação decorrentes da prisão por dias livres ou em regime de semidetenção pode aplicar-se o regime de permanência na habitação introduzido pela presente lei.
3 - Para efeito do disposto nos números anteriores, cada período correspondente a um fim de semana equivale a cinco dias de prisão contínua.

O arguido nunca requereu aquela abertura de audiência mencionada no artº 12º nº1 citado.
Como muito bem o salientou o MPº,  quer  regime penal para jovens que a alteração do regime de detenção para suspensão executiva se mostram inaplicáveis por inexistência de previsão legal (o arguido à data dos factos já tinha mais de 21 anos pois nasceu a 10 de Agosto de 1991 e os factos ocorreram a 6 de Fevereiro de 2016) e, quanto à suspensão da execução da pena ela no processo de condenação tinha sido desde logo afastada por não garantir suficientemente as expectativas de modificação do comportamento anómico do arguido.
Foi referido na decisão condenatória, além do mais, que:
“ (…) O arguido conta com 24 anos de idade e regista sete condenações pela prática de crimes. Com efeito, o arguido conta com três condenações anteriores pela prática de crimes de tráfico de estupefacientes, nas quais lhe foram aplicadas penas de prisão que se mostram neste momento suspensas na sua execução. Para além do mais, regista três condenações pela prática de crimes de condução de veículo sem habilitação legal, sendo certo que, in casu cometeu novo crime no decurso da suspensão da execução de uma pena de prisão de 9 meses, e tem ainda pendente uma pena de 4 anos de prisão suspensa na sua execução por igual período no processo n.° 11/10.8SLLSB, da extinta 2.a Vara Criminal de Lisboa, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes agravado.
Ora, o tipo penal sob apreciação admite em alternativa a aplicação de uma pena de prisão ou uma pena de multa.
Dispõe o art.º 70.º, do Código Penal que: «Se ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade, o tribunal dá preferência à segunda sempre que esta realizar deforma adequada e suficiente as finalidades da punição.»
Atendendo ao disposto no art. 70.° do Código Penal, entende o Tribunal que a aplicação de uma pena de multa já não realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição optando-se, por isso, pela aplicação de uma pena privativa da liberdade.
Deste modo, entende o Tribunal que só a pena de prisão se afigura a adequada a satisfazer a finalidade de intimidação de futuros comportamentos similares ao tomado pelo arguido, isto é, dá resposta às finalidades da prevenção geral negativa, pesando o facto de o arguido não ser primário, sendo que as condenações anteriores, contribui para reforçar o juízo de censurabilidade, da ilicitude e prevenção geral e especial, de tal modo, que ao arguido tem de ser cominada uma pena suficientemente dissuasora de futuros comportamentos delituosos, e que lhe imprima na consciência do mesmo a censurabilidade da sua conduta.
O arguido tem condenações recentes pela prática de crimes idênticos ao dos presentes autos. Assim:
a) por sentença proferida em 14.7.2015, transitada em julgado em 30.9.2015, no Processo n.° 197/15.5S9LSB, deste Tribunal (Juiz 3), pela prática em 19.6.2015, de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, previsto e punido pelo art. 3.B, n.B 2, do D.L. n.° 2/98, de 03 de Janeiro, na pena de 10 meses de prisão substituída por 250 dias de multa à taxa diária de € 6,00;
b) por sentença proferida em 3.11.2014, transitada em julgado em 16.12.2014, no Processo n.° 1225/14.7SILSB, deste Tribunal (Juiz 3), pela prática em 19.10.2014, de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, previsto e punido pelo art. 3.Q, n.° 2, do D.L. n.° 2/98, de 03 de Janeiro e um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelo art. 292.°, n.e 1, do Código Penal, na pena única de 100 dias de multa, à taxa diária de € 5,00 e na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 3 meses;
c) por sentença proferida em 29.12.2014, transitada em julgado em 19.2.2015, no Processo n.B 1965/14.0PKLSB, deste Tribunal (Juiz 1), pela prática em 28.12.2014, de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, previsto e punido pelo art. 3.2, n.° 2, do D.L. n.B 2/98, de 03 de Janeiro, na pena de 9 meses de prisão suspensa na sua execução por 1 ano.
Sopesando todas as circunstâncias, julga-se adequado condenar o arguido na pena de 6 (oito) meses de prisão pela prática de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, previsto e punido pelo art. 3.a, n.B 2, do D.L. n.B 2/98, de 03 de Janeiro, pena essa que se fixa tendo em conta a forma de cumprimento que infra se determinará.
Não obstante a pena ser inferior a um ano de prisão, não é adequado a sua substituição por pena de multa, ao abrigo do disposto no art. 43.a, n.Q 1, do Código Penal, uma vez que, como ficou patente tal pena pecuniária não se afigura suficiente para assegurar o não cometimento de futuros crimes por parte do arguido.
(…) Pelos mesmos motivos também não se substituirá a pena de prisão por prestação de trabalho a favor da comunidade, por força do disposto no art. 58.º, nº 1 do Código Penal, pois entendemos que a pena de prisão é exigida pela necessidade de prevenir o cometimento de futuros crimes e só ela permite alcançar adequada e suficientemente os fins das penas. Tanto mais que, basta dizer que está demonstrado que as medidas não detentivas não têm qualquer efeito dissuasor no arguido, pelo que, falece a possibilidade de lhe substituir a pena de prisão pela de trabalho a favor da comunidade, e não pode nem deve ser olvidado que a execução da pena de prisão serve para defender a sociedade e prevenir a prática de crimes, conforme art. 42.B do Código Penal.
Ponderar-se-á então a possibilidade de suspender a execução da pena de prisão, atendendo a que a pena aplicada não é superior a 5 anos.
(…)
Ora, no caso concreto, não se mostra viável fazer esse prognóstico favorável.
Com efeito, a simples ameaça da prisão não foi suficiente para o arguido pautar a sua conduta em conformidade com o direito, pois, o arguido conta com várias condenações, três delas recentes e pela prática do mesmo tipo de ilícito em questão nos autos (sentenças transitadas em julgado em 30.9.2015, 16.12.2014 e 19.2.2015 em que foi condenado numa pena de prisão suspensa na sua execução e outra em pena de prisão substituída por pena de multa), assumindo assim, uma conduta recalcitrante de quem demonstra desrespeito pela lei e pelas condenações anteriores.
Nesta medida, a privação da liberdade do arguido afigura-se como necessária a afastá-lo, no futuro, da prática de tais crimes, sendo a única que lhe permitirá interiorizar os valores jurídicos e sociais vigentes e determinar-se segundo a ordem normativa estabelecida, maxime, no domínio da condução rodoviária.
Porém, tendo em conta que o arguido ainda não teve contacto com o sistema prisional (como resulta do seu certificado de registo criminal), aparenta estar integrado familiar e profissionalmente, julgamos adequado e suficiente às finalidades da punição a aplicação no caso sub Júdice, o cumprimento, em dias livres da pena de prisão, nos termos e para os efeitos do art. 45.E do Código Penal.(…)”
*
Ora, também os motivos apresentados pelo arguido para não se ter apresentado afiguram-se insuficientes e intempestivos. Faltou sucessivamente às apresentações e nem sequer se dignou informar o processo ou o EP acerca do que se passaria, revelando uma ligeireza e indiferença evidentes.
Não tendo requerido audiência para aplicação da norma transitória do artº 12º aludido, deve aplicar-se, face à revogação do artº 45º do CP, o regime que seria aplicável em caso de incumprimento das apresentações em períodos (dias) livres, passando a sê-lo em contínuo nos termos do que estava disposto no entretanto revogado artº 125, nº4 do CEPMPL- Lei 115/2009:
“1 - A execução da prisão por dias livres e da prisão em regime de semidetenção obedece ao disposto no presente Código e no Regulamento Geral, com as especificações fixadas neste capítulo.
2 – (…)
3 – (…)
4 - As faltas de entrada no estabelecimento prisional de harmonia com a sentença são imediatamente comunicadas ao tribunal de execução das penas. Se este tribunal, depois de ouvir o condenado e de proceder às diligências necessárias, não considerar a falta justificada, passa a prisão a ser cumprida em regime contínuo pelo tempo que faltar, passando-se, para o efeito, mandados de captura.
5(…)
( Redacção dada pelo seguinte diploma: Lei n.º 115/2009, de 12 de Outubro)

Contudo, nos termos do nº2 do artº 12º da  norma transitória da Lei 94/2017:
“(…) 2 - À prisão em regime contínuo que resulte do incumprimento das obrigações de apresentação decorrentes da prisão por dias livres ou em regime de semidetenção pode aplicar-se o regime de permanência na habitação introduzido pela presente lei.(….)”,
Parece poder este RPH aplicar-se no TEP independentemente do nº1 ou de ser o arguido a requerê-lo, caso seja verificado que o recluso pode cumprir o remanescente da pena em regime de habitação, após homologação judicial o que deve ser avaliado oportunamente mas, de momento, ultrapassa tal hipótese o objecto do presente recurso ficando à consideração da 1ª instância (TEP) essa avaliação e oportunidade.
Nestes termos, não obstante, improcede o recurso.

III- DECISÃO

3.1 - Pelo exposto, julga-se o recurso improcedente
3.2 - Taxa de justiça em 3 Uc a cargo do recorrente

Lisboa, 28  de Maio  de  2019

Os Juízes Desembargadores
(texto elaborado em  suporte informático , revisto e rubricado pelo relator – (artº 94º do CPP)
                                                          
Agostinho Torres
João Carrola

[1] vide Ac. STJ para fixação de jurisprudência 19.10.1995 publicado no DR, I-A Série de 28.12.95
[2]  vide ,entre outros, o Ac STJ de 19.06.96, BMJ 458, págª 98 e  o Ac STJ de 13.03.91, procº 416794, 3ª sec., tb citº em anot. ao artº 412º do CPP de  Maia Gonçalves 12ª ed; e Germano Marques da Silva, Curso Procº Penal ,III, 2ª ed., págª 335; e ainda  jurisprudência uniforme do STJ (cfr. Acs. do STJ de 16-11-95, in BMJ 451/279 e de 31-01-96, in BMJ 453/338) e Ac. STJ de 28.04.99, CJ/STJ, ano de 1999, p. 196 e jurisprudência ali citada), bem como Simas Santos / Leal Henriques, Recursos em Processo Penal, 5ª ed., p. 74 e decisões ali referenciadas.