Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
4355/13.9TBALM.L2-2
Relator: ANTÓNIO MOREIRA
Descritores: EXPROPRIAÇÃO
INDEMNIZAÇÃO
SOLO APTO PARA CONSTRUÇÃO
POTENCIALIDADE
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 09/14/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: RECURSO PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário: 1- A determinação do valor da parcela expropriada que está integrada numa operação de loteamento, para a qual foram deliberados camarariamente índices de construção máxima por cada um dos lotes a constituir, deve observar os critérios dos nº 4 e seguintes do art.º 26º do Código das Expropriações, face à sua natureza densificadora ou concretizadora do princípio geral da consideração da aptidão construtiva da parcela expropriada segundo uma utilização económica normal, emergente dos art.º 23º, nº 1 e 5, e 26º, nº 1, ambos do Código das Expropriações.
2- Só perante a constatação de um desvio evidente ao valor real e corrente da parcela expropriada, apurado de acordo com o seu destino efectivo ou possível, numa utilização económica normal, é que devem ser utilizados outros critérios, assim respeitando tal princípio e alcançando, por esta forma, a justa indemnização.
(Sumário elaborado ao abrigo do disposto no art.º 663º, nº 7, do Código de Processo Civil)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo assinados:

AEBT – Auto-Estradas do Baixo Tejo, S.A. iniciou e fez seguir processo de expropriação relativo à parcela de terreno designada pelo nº 18, necessária à construção do lanço do IC32 – Casas Velhas‑Palhais – Trecho 2 – Lazarim/Palhais, a destacar do prédio rústico sito no Lugar de Casal de Santo António, descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial de Almada sob o nº ____ e inscrito na matriz cadastral rústica sob o artigo __ da secção T, da freguesia de Caparica, pertencente a JF. e cônjuge, MF., e a AC. e cônjuge, MC.
Houve lugar à vistoria ad perpetuam rei memoriam.
A expropriante tomou posse administrativa da parcela expropriada.
Houve lugar à arbitragem, na qual foi atribuído, como valor de indemnização, por unanimidade, o montante de € 240.583,00.
Por despacho de 22/7/2013 foi adjudicada a propriedade da parcela expropriada à expropriante.
Os expropriados interpuseram recurso da decisão arbitral alegando para tanto e em síntese que:
- Os critérios aplicados pelos árbitros não reflectem o valor real das parcelas;
- A média aritmética entre vários critérios referenciais não constitui um critério legal de determinação do valor da indemnização;
- Os árbitros não atenderam à existência de um processo de loteamento que abrangia a parcela expropriada e autorizava a constituição de 35 lotes habitacionais, nem atenderam ao facto de terem sido construídas todas as infra‑estruturas do loteamento, provisoriamente recepcionadas pelo Município, nem atenderam ao facto de, devido à expropriação, ser impossível a constituição de 4 lotes para habitação plurifamiliar e de 4 lotes para habitação unifamiliar, com a área total de 3.292 m2;
- Não foi tido em conta o índice de construção do loteamento aprovado, de 100% em 4 lotes e de 54% nos restantes;
- Não foi tido em conta que a parcela é servida por passeios em toda a extensão do arruamento e por redes de drenagem de águas pluviais;
- Para poderem pagar a comparticipação que lhes cabia nas obras de infra‑estruturas de loteamento, os expropriados prometeram vender os seus lotes, por determinados valores melhor discriminados nos autos, tendo recebido € 453.906,08 de sinal, valor que utilizaram para o pagamento da referida comparticipação;
- Não podem ser ignorados os reais valores venais dos lotes sacrificados, nem as legítimas expectativas de aprovação de um loteamento há mais de duas décadas;
- Não pode ser utilizado o critério do art.º 26º do Código das Expropriações, nem qualquer outro desse artigo, mas outrossim o de um valor corrente de mercado, ao abrigo do disposto nos art.º 23º, nº 1 e 5 e 27º, nº 3 do Código das Expropriações;
- Esse valor corresponderá ao dos preços de mercado dos lotes situados nas imediações, totalizando o valor dos lotes perdidos.
Concluíram pela fixação da indemnização no valor de € 1.323.600,00.
Admitido o recurso, a expropriante apresentou resposta, aí pugnando pela improcedência do recurso e alegando que:
- No processo de loteamento aprovado refere-se que as obras de infra-estruturas não se encontram concluídas;
Jamais chegou a ser emitido alvará;
- Os expropriados só requereram a prorrogação de prazo até ao ano 2000;
- É estranho que o Município não tenha declarado a caducidade da licença de loteamento;
- Jamais existiram lotes, pelo que os expropriados celebraram contratos-promessa de compra e venda de algo inexistente;
- Os expropriados não referem quais os motivos pelos quais o alvará de loteamento não chegou a ser emitido, apenas dizendo que lhes são alheios;
- As obras de infra-estruturas – incompletas – já tinham 17 anos aquando da DUP, pelo que estariam em estado de abandono e obsolescência, revestindo um valor meramente residual.
Conclui pela manutenção do valor da indemnização constante do acórdão arbitral.
Foi ordenada e realizada avaliação, tendo sido apresentado o relatório pericial, no qual os peritos indicados pelo Tribunal e pela expropriante defenderam a fixação da indemnização no valor de € 245.889,00, enquanto o perito indicado pelos expropriados defendeu a sua fixação em € 1.323.600,00.
Foram prestados os esclarecimentos solicitados aos peritos.
Foi realizada audiência final, após o que foi proferida sentença, em 7/9/2016, aí sendo fixado o montante da indemnização devida aos expropriados em € 245.889,00.
Dessa sentença foi interposto recurso pelos expropriados.
Em 12/4/2018 foi proferido acórdão por este Tribunal da Relação de Lisboa, com o seguinte dispositivo:
Em face do exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar procedente a apelação e, em consequência, anula-se a decisão recorrida que deverá ser substituída por despacho determinando a realização de nova perícia tendo em conta os pressupostos acima definidos, mais concretamente computando o cálculo da justa indemnização considerando os índices previstos na Deliberação da Câmara Municipal de Almada de 15.03.1995 que aponta para índices de construção “3” para os lotes previstos para habitação plurifamiliar e o índice “0,544” para os lotes previstos para habitação unifamiliar.
Custas a cargo da parte vencida a final”.
Na instância recorrida foi determinada a realização de nova perícia, tendo por objecto “(…) o cálculo da justa indemnização considerando os índices previstos na deliberação da Câmara Municipal de Almada de 15.03.1995 (que aponta para índices de construção “3” para os lotes previstos para habitação plurifamiliar e o índice “0,544” para os lotes previstos para habitação unifamiliar), nos termos cabalmente identificados no acórdão da Relação de Lisboa de 12 de Abril de 2018 (…)”.
Foi realizada a perícia determinada, tendo sido apresentado o relatório pericial (em 7/12/2018), no qual os peritos indicados pelo Tribunal e pela expropriante calcularam o valor da indemnização em € 561.336,79, com referência aos índices indicados, tendo o perito indicado pelos expropriados mantido que a indemnização devia ser fixada no valor de € 1.323.600,00.
Em 1/7/2019 os peritos responderam à reclamação e pedidos de esclarecimento da expropriante e dos expropriados.
Em 23/3/2020, na sequência de nova reclamação e pedidos de esclarecimentos, os peritos apresentaram relatório complementar. Nesse relatório os peritos indicados pelo Tribunal apresentaram várias abordagens avaliativas e no âmbito das quais, além do mais, reduziram o valor indemnizatório antes apresentado e concluíram pela fixação da justa indemnização no valor de € 266.487,23 ou no valor de € 298.175,00. O perito indicado pela expropriante declarou aderir às sete primeiras abordagens apresentadas pelo peritos indicados pelo Tribunal. O perito indicado pelos expropriados manteve a posição assumida anteriormente.
Após realização da audiência final a expropriante e os expropriados apresentaram as respectivas alegações.
Seguidamente foi proferida sentença, datada de 25/9/2022, com o seguinte dispositivo:
Em face do expendido, decide-se julgar parcialmente procedente o recurso dos expropriados e, em consequência, fixar em € 298.175,00 (duzentos e noventa e oito mil, cento e setenta e cinco euros) o montante da indemnização devida aos mesmos, a qual será actualizada de acordo com os índices de preços no consumidor (excluindo habitação) publicados no I.N.E., desde a data da publicação da Declaração de Utilidade Pública até à data do trânsito em julgado da presente decisão.
Custas por expropriante e expropriados, na proporção do respectivo decaimento, nos termos do artigo 527.º do Código de Processo Civil”.
Os expropriados recorrem desta sentença, terminando a sua alegação com as seguintes conclusões, que aqui se reproduzem integralmente:
1.A não emissão do Alvará tem por causa a ablação da propriedade dos Expropriados decorrente do acto expropriativo dos autos, pelo que a não emissão do Alvará de loteamento não se deve a qualquer acto ou omissão dos Apelantes;
2.Ou seja, após a Câmara Municipal de Almada considerar que o loteamento é viável, não atribuindo a não emissão do respectivo alvará a qualquer acto ou omissão dos Apelantes, sobreveio o acto expropriativo, sendo certo que, quer o município quer os proprietários, alertaram a concessionária para a implicação que a via tal como se encontrava projectada iria ter no loteamento, tal como se infere das comunicações de fls. 1633 a 1636, tendo o município de Almada (Cfr. fls. 1634) salientado expressamente que “a proposta para a implantação do Ramo C+D inviabiliza a construção prevista em grande parte dos lotes integrados na operação de loteamento n.º ___/85, aprovada e com as obras de urbanização executadas sugere-se que seja revista a localização desta ligação, de forma a salvaguardar os lotes incluídos nesta operação de loteamento”;
3.Assim, não poderia, pois, o Tribunal a quo inferir, com o fez na Sentença em questão, que a não emissão do Alvará de Loteamento se deveu a qualquer comportamento ou omissão dos Apelantes, enquanto interessados na emissão do referido Alvará;
4.Ora, ainda que não se encontre emitido o respectivo alvará de loteamento, os lotes identificados na planta síntese do loteamento (doc. 2 junto ao Recurso da Decisão Arbitral) têm um valor de mercado perfeitamente quantificável tendo por base a constituição futura dos referidos lotes para construção, enquanto prédios urbanos, para mais quando já se mostra autorizada a constituição do loteamento e quando os serviços camarários reiteram a validade de tal deliberação;
5.E assim é na medida em que “no mercado, o valor de um terreno para construção não depende apenas das suas características intrínsecas, como sejam a sua área e a sua localização ou a sua orografia. Mais importante que isso é um factor que lhe é extrínseco e que depende dos poderes públicos, que é o seu potencial de construção, nomeadamente a volumetria autorizada e as características de uma realidade que ainda não existem, que é o prédio urbano que nele se vai poder construir. (…) O valor de um terreno para construção corresponde, fundamentalmente, a uma expectativa jurídica, consubstanciada num direito de nele se vir a construir um prédio com determinadas características e com determinado valor. É essa expectativa de uma riqueza materializada num imóvel a construir que faz aumentar o valor do património e a riqueza do proprietário do terreno para construção, logo que o terreno passa a ser considerado como sendo para construção. Por essa razão, quanto maior for o valor dos prédios a construir, maior é o valor dos terrenos para construção” (sublinhado e negrito nossos) (Cfr. José Maria Pires, Lições de Impostos sobre o Património e do Selo, Almedina, pág. 100);
6.Importa rememorar que, através da Deliberação Camarária de 15 de Março de 1995 de fls. 1617, foi aprovada por unanimidade a constituição de 35 lotes habitacionais com as características constantes da Planta Geral de Loteamento;
7.Os Apelantes, como contrapartida pela aprovação do loteamento, cederam ao Município de Almada 4.925 m2 de terreno para a construção do IC32, à data denominado CRIPS ou L3;
8.Igualmente, como contrapartida pela aprovação do loteamento, foram construídas as respectivas infraestruturas, as quais foram provisoriamente recepcionadas pela Câmara Municipal de Almada em 24 de Julho de 1992;
9.Os Apelantes requereram a emissão do respectivo Alvará de Loteamento, o qual foi aprovado pela Câmara Municipal de Almada nos termos constantes do despacho de 23 de Março de 1995;
10.A Comissão de Comproprietários dos prédios inseridos no processo de licenciamento referido, por comunicação escrita datada de 25 de Novembro de 2009, alertou a entidade Expropriante para o facto de a implantação do Ramo C+D do Nó do Botequim inviabilizar a construção prevista em grande parte dos lotes integrados na operação de loteamento já aprovada e com obras executadas;
11.Igualmente a Câmara Municipal de Almada, tempestivamente, informou a entidade expropriante que o novo trajecto do IC32, no “Nó do Botequim, a proposta para a implantação do Ramo C + D inviabiliza a construção prevista em grande parte dos lotes integrados na operação de loteamento nº ___/85, já aprovada e com as obras de urbanização executadas – sugere-se que seja revista a localização desta ligação de forma a salvaguardar os lotes incluídos na operação de loteamento;
12.Por isso, o valor indemnizatório determinado pelo Tribunal a quo não corresponde ao valor real e corrente das parcelas expropriadas nos presentes autos numa situação normal de mercado, não podendo ser descuidado o historial do processo de loteamento n.º ___/85 da Câmara Municipal de Almada que incidia sobre a parcela dos autos nos termos expressos na douta sentença;
13.Mais, a douta decisão impugnada desconsidera totalmente o sacrifício imposto aos Apelantes resultante da cedência ao Município de Almada de 4.925 m2 da área do seu prédio, como contrapartida pela aprovação do loteamento;
14.Assim, a expropriação dos autos, associada ao cálculo da justa indemnização apenas por aplicação dos critérios referenciais previstos nos n.os 4 a 7 do artigo 26.º do CE, traduzir-se-á numa imposição de um sacrifício especial e anormal aos Apelantes titulares de uma expectativa legítima de construção no prédio dos autos, que é sustentada pela deliberação camarária de 15 de Março de 1995, pelo despacho camarário de 23 de Março de 1995 e pelo parecer jurídico de 21 de Setembro de 2007;
15.Por isso, se impunha, atento o disposto no artigo 23.º, n.º 5 do CE, que o Tribunal a quo atendesse ao valor de mercado dos Lotes em questão nos presentes autos e não ao valor calculado de acordo com os critérios referenciais previstos no laudo pericial maioritário, de modo a se apurar a justa indemnização;
16.Sendo que, tendo em conta o processo de Loteamento n.º ___/85, não se poderá considerar indiferente o sacrifício imposto aos Apelantes que têm expectativas legítimas de aprovação de um loteamento há mais de duas décadas e que o Município de Almada aos dias de hoje continua a considerar que deverá ser considerado como válido;
17.Não podendo, assim, tão-só se considerar o valor do solo expropriado por apelo aos critérios do artigo 26.º do CE, sob pena de violação do n.º 5 do artigo 23.º do CE e do disposto no artigo 62.º, n.º 2 da CRP;
18.Na realidade, o valor que resulta da douta sentença impugnada, desconsiderando, em larga medida, o processo de loteamento n.º ___/85, aplicando os critérios referenciais do artigo 26.º, n.os 4 a 7, do CE, é desproporcionalmente inferior ao sacrifício imposto pela expropriação;
19.Acresce que se impunha a aplicação do preceituado nos n.os 1 e 5 do artigo 23.º do CE, que remetem para o critério do valor venal do bem expropriado;
20.Verificando-se assim uma divergência gritante entre os valores indemnizatórios fixados pelos peritos nomeados pelo Tribunal e pela entidade expropriante e pelo perito nomeado pelos Expropriados, o que se deveu à aplicação, pelos primeiros, dos parâmetros urbanísticos constantes do PDM de Almada, e, pelo segundo, do valor de mercado dos lotes expropriados à data da DUP;
21.Ora, em virtude da diferença de critérios adoptados pelos peritos, existem duas avaliações diferentes, sendo que o montante indemnizatório fixado, a título de justa indemnização, difere entre ambos os relatórios em € 575.187,50!
22.Na decisão final da 1.ª Instância, o Tribunal a quo acabou por sufragar o entendimento do laudo maioritário, desconsiderando totalmente, para efeitos de fixação da indemnização, a existência de um processo de loteamento e, bem assim, a aprovação da emissão do Alvará de Loteamento, criando uma divergência gritante que resulta da total dissemelhança do critério aplicado pelos peritos.
23.Tal decisão foi, porém, anulada, por douto Acórdão da 6.ª Secção desse Venerando Tribunal ad quem, proferido em 12 de Abril de 2018, já transitado em julgado, que concluiu pela necessidade de realização de nova perícia, que tivesse em conta, não os parâmetros urbanísticos previstos no PDM de Almada, mas sim os índices de construção previstos na Deliberação da Câmara Municipal de Almada de 15 de Março de 1995 que aprovou o projecto de loteamento para o prédio onde se situa a parcela a expropriar
24.A entidade expropriante não interpôs recurso de Revista do douto Acórdão de 12 de Abril de 2018 – admissível nos termos do artigo 66.º, n.º 5, CE a contrario –, aceitando, assim, o entendimento defendido pela Veneranda Relação de Lisboa, donde resulta que a própria entidade expropriante considera que o valor de mercado é o critério que deve ser atendido na fixação da indemnização devida pela expropriação;
25.Na esteira do citado Acórdão, sendo as parcelas em questão aptas para a construção, dever-se-á atender, na fixação da justa indemnização, aos índices de construção previstos no processo de loteamento que estava em curso na Câmara Municipal de Almada, e que estava aprovado por deliberação camarária anterior à vigência do PDM, não podendo ser aplicados os índices previstos no PDM Almada, por o mesmo não ser aplicável às parcelas expropriadas atento o princípio do tempus regit actum;
26.Assim, e sendo certo que o CE estabelece um elenco de critérios referenciais, tendentes ao apuramento do valor dos bens expropriados, contidos no artigo 26.º do CE, n.os 4 a 7, mas sujeitos ainda a um juízo correctivo na medida do que se mostre necessário para que possa ser concretizado aquele superior objectivo (artigo 23.º, n.º 5, do CE), a justa indemnização pela expropriação, atendendo-se à norma prevista no preceito em causa, deverá fixar-se no montante total 1.323.600 (um milhão, trezentos e vinte e três mil e seiscentos euros), afastando‑se, por isso, a aplicação dos critérios referenciais do artigo 26.º, n.os 4 a 7, do CE aplicados no Acórdão Arbitral confirmado pela douta decisão sob censura, em violação da norma do artigo 23.º, n.º 5, parte final, do CE.
27.Sendo relevante, para os presentes efeitos, o entendido e decidido pelo Tribunal ad quem, em 19 de Novembro de 2020, no âmbito do processo que correu termos sob o n.º 6871/12.0TBALM do qual cumpre destacar duas ideias essenciais: por um lado que os índices de construção constantes do processo de loteamento mantêm-se em vigor e por outro lado que o valor de mercado dos concretos lotes encontra-se perfeitamente quantificável;
28.Termos em que, sempre deverá revogar-se a douta sentença do Tribunal a quo, substituindo-se a mesma por douto Acórdão que fixe o valor da justa indemnização pela expropriação em € 1.323.600, de acordo com o disposto no artigo 23.º, n.º 5, parte final, do CE.
SEM PRESCINDIR
29.Ainda que improceda tudo o acima exposto, i.e, que não se atenda ao valor de mercado enquanto valor venal/valor comum ou valor de compra e venda, por aplicação do disposto no artigo 23.º, n.º 1 e 5, do CE, o que se admite por mera hipótese académica, sempre se dirá, ainda assim, que o cálculo expresso no Acórdão Arbitral, adoptado na íntegra na douta sentença sob recurso, viola o princípio tempus regit actum previsto no artigo 67.º do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação (RJUE), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro;
30.O índice de construção aplicado pelo Tribunal a quo para apurar o valor da justa indemnização é o índice bruto máximo de 0,35, previsto no artigo 91.º, n.º 1, do PDM do município de Almada
31.Entendendo o Tribunal a quo que, «Quanto ao aspecto da aplicabilidade dos referidos índices “3” e “0,544”, importa ainda referir que, no entendimento deste tribunal, da decisão do Tribunal da Relação de Lisboa não resulta a determinação de que o cálculo da indemnização deverá ser efectuado de acordo com os referidos índices, o que no essencial corresponderia, aliás, à realização de mera operação aritmética, mas sim a determinação de que no cálculo da justa indemnização deve ser ponderada a aplicação dos referidos índices, bem assim como de outros elementos preponderantes que não tenham sido considerados.»:
32.Todavia, salvo melhor entendimento, não assiste qualquer razão ao Tribunal a quo na interpretação realizada ao Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, porquanto resulta claro, do sobredito Acórdão, que a perícia deveria ser novamente realizada «(…) tendo em conta os pressupostos acima definidos, mais concretamente computando o cálculo da justa indemnização considerando os índices previstos na Deliberação da Câmara Municipal de Almada de 15.03.1995 que aposta para índices de construção “3” para os lotes previstos para habitação plurifamiliar e o índice “0,544” para os lotes previstos para habitação unifamiliar.».
33.Pelo que, não se concebe de que forma o Tribunal a quo, ao abrigo de tal decisão judicial devidamente transitada em julgado, considera legitimada a sua “opção” de aplicar apenas o potencial edificativo permitido pelo PDM de 0,35. Entendimento que, salvo melhor e douto entendimento, é manifestamente atentatório da referida decisão judicial devidamente consolidada na ordem jurídica.
34.O que salvo melhor e douto entendimento, consubstancia uma violação do caso julgado.
35.Por outro lado, vigora no nosso ordenamento jurídico o princípio tempus regit actum, que se encontra consagrado no artigo 67.º do RJUE, onde se dispõe que a validade das licenças ou autorizações depende da sua conformidade com as normas legais e regulamentares aplicáveis em vigor à data da sua prática!
36.Pelo que, seriam sempre aplicáveis os índices previstos na Deliberação da Câmara Municipal de Almada de 15 de Março de 1995, i.e, o índice de construção 3 para os lotes previstos de habitação plurifamiliar e o índice 0,544 nos lotes previstos para habitação unifamiliar, desconsiderando-se, pois, o índice que veio a resultar do PDMA e aplicado, em erro, pelos Srs. peritos no laudo pericial maioritário acolhido pela douta sentença do Tribunal a quo
37.Sendo amplamente aceite o entendimento segundo o qual, o PDM não pode pôr em causa os direitos e interesses legalmente constituídos dos particulares, não sendo aplicáveis a esta operação normas regulamentares posteriores.
38.Deste modo, consideram os Apelantes que, ainda que se entendam aplicáveis, para o cômputo do valor da justa indemnização, os critérios referenciais estabelecidos no artigo 26.º, n.os 4 a 7, do CE, certo é que o cálculo está inquinado com um dado de parcela errado, i. é, o índice bruto máximo aplicável não é de 0,35 (resultante do PDM).
39.Na realidade, os índices são 3 para os lotes previstos de habitação plurifamiliar e o índice 0,544 nos lotes previstos para habitação unifamiliar,
40.Nestes termos, improcedendo o acima exposto, i. é, considerando esse Venerando Tribunal ad quem que inaplicável o valor de enquanto valor venal/valor comum ou valor de compra e venda, por aplicação do disposto no artigo 23.º, n.º 1 e 5 do CE, sempre deverá, nos termos do disposto no artigo 662.º, n.º 2, alínea c), e n.º 3, alínea a), do CPC, revogar-se a douta sentença e ordenar-se a notificação dos Srs. peritos para computarem o cálculo da justa indemnização considerando os índices previstos na Deliberação da Câmara Municipal de Almada de 15 de Março de 1995, i. é, os índices são 3 para os lotes previstos de habitação plurifamiliar e o índice 0,544 nos lotes previstos para habitação unifamiliar.
A expropriante apresentou alegação de resposta, formulando as seguintes conclusões:
A.Os Expropriados afirmam divergir da metodologia de cálculo da indemnização adoptada pela primeira instância, por sustentada no entendimento de que a existência de lotes de terreno na propriedade não pressupõe um “potencial edificativo devidamente consolidado”.
B.A sentença recorrida deu como provada a existência de um processo de loteamento validamente aprovado, mas ineficaz, por falta de emissão do respectivo alvará.
C.Assim, esteve bem o Tribunal a quo, porquanto não pode valorizar-se de modo equivalente um lote sem alvará de um lote com alvará.
D.No entanto, nas alegações reafirmam os Expropriados que a divergência entre os valores indemnizatórios fixados se deve à aplicação, no relatório maioritário, dos parâmetros urbanísticos constantes do PDM de Almada, e no relatório minoritário do valor de mercado.
E.Na verdade, o perito que subscreve o relatório minoritário reconhece expressamente que utiliza um dos métodos consagrados no regulamento da CMVM n.º 97/11 e nem indica se os seus cálculos são efectuados com referência à data da declaração de utilidade pública.
F.Daí que o cálculo defendido pelos Expropriados se baseie numa mera estimativa do valor de mercado dos futuros lotes, ainda por cima ilíquido, por não ter em conta os investimentos adicionais de obras de urbanização e outros custos inerentes à constituição dos lotes.
G.Pelo contrário, o relatório complementar de esclarecimentos subscrito pelos peritos maioritários obedeceu ao CE, em especial no disposto no seu artigo 26.º, pois, conforme determinado pelo acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, os respectivos cálculos tiveram como referência os índices da Câmara Municipal de Almada de 1995.
H.Deste modo, a sentença recorrida fixou a indemnização de modo justo e correcto, por ter ponderado devidamente a circunstância de, à data da declaração de utilidade pública, existir um processo de loteamento aprovado, mas ineficaz, por falta de emissão do respectivo alvará.
I.As alegações dos Expropriados são reveladoras de que reclamam uma indemnização cujos cálculos ignoram a indicação do acórdão, mas para pôr em causa a sentença recorrida, que até cumpre o determinado no acórdão, reivindicam uma leitura literal desta mesma decisão.
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Sendo o objecto do recurso balizado pelas conclusões do apelante, nos termos preceituados pelos art.º 635º, nº 4, e 639º, nº 1, ambos do Código de Processo Civil, as questões submetidas a recurso, delimitadas pelas aludidas conclusões, prendem‑se com a determinação do valor da indemnização devida aos expropriados, tendo em atenção o já decidido no acórdão de 12/4/2018.
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É a seguinte a fundamentação de facto constante da sentença recorrida:
(Matéria de facto provada que consta da sentença de 7/9/2016 e que não foi objecto de alteração pelo acórdão de 12/4/2018)
A)Por despacho do Secretário de Estado Adjunto das Obras Publicas e das Comunicações nº 26735/2009 de 3 de Novembro de 2009, publicado no Diário da República nº 239, 2ª série de 11 de Dezembro de 2009, foi declarada a utilidade pública da expropriação das parcelas necessárias à construção do lanço do IC32 – Casas Velhas – Palhais – trecho 2 – Lazarim/Palhais (documento de fls. 9 a 11).
B)De entre essas parcelas inclui-se a parcela 18, a destacar de um prédio rústico, com área de 12.120 m2.
C)Por despacho do Secretário de Estado Adjunto das Obras Publicas e das Comunicações nº 16506/2010 de 22 de Outubro de 2010, publicado no Diário da República nº 211, 2ª série de 29 de Outubro de 2010, e rectificado pela Declaração de Rectificação nº 2421/2010 de 17 de Novembro de 2010, publicada no Diário da República nº 230, 2ª série de 26 de Novembro de 2010, foi expropriada do mesmo prédio mais uma subparcela de terreno, designada por subparcela 18.1, com a área de 2.572 m2 (documentos de fls. 12 a 15).
D)Para efectivação dos trabalhos de construção no Lanço IC32 – Casas Velhas – Palhais – trecho 2 – Lazarim/Palhais foi efectuada a expropriação da parcela a seguir indicada, a destacar do prédio rústico, sito no lugar de Casal de Santo António – Estrada Vale Fetal nº 20, freguesia da Charneca da Caparica, concelho de Almada, descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial de Almada sob o número ____ e inscrito na matriz cadastral rústica sob o artigo __ da secção T da freguesia de Caparica, composta pelas seguintes subparcelas:
- Subparcela nº 18 com a área de 238 m2, a confrontar de Norte com Domínio Público, de Sul e Nascente com o restante prédio e de Poente com ___ e outro;
- Subparcela nº 18.a) com a área de 36m2, a confrontar de Norte e Nascente com o restante prédio, de Sul com Estrada da Bela Vista e de Poente com ___ e outro;
- Subparcela nº 18.1 com a área de 2.572 m2, a confrontar de Norte e Nascente com o restante prédio, de Sul com Estrada da Bela Vista e de Poente com ___ e outro.
E)O prédio rústico descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial de Almada sob o número ____/19891215 da freguesia da Charneca da Caparica encontrava-se registado a favor dos aqui expropriados, por herança, pela apresentação nº 33 de 15/12/1989 (fls. 16 e 18).
F)O processo camarário de loteamento nº ___/1985, que corre termos na Câmara Municipal de Almada, teve início com um requerimento datado de 30 de Outubro de 1985, onde se manifestou a pretensão de “proceder ao loteamento das parcelas sitas em Vale Fetal, inscritas na matriz predial rústica sob os artigos __ da secção T, e parte do artigo __ da secção T, da freguesia de Caparica, e, descritos na Conservatória do Registo Predial de Almada, respectivamente sob os números ____, a fls. 94 do Livro B-4 e ____, a fls. 103 vº do Livro B-31 (…)”. – fls. 5 e 6 da certidão apensa.
G)Do processo de loteamento acima referido consta um auto de recepção provisória de 17 de Junho de 1992 onde se consignou que “verificaram os mesmos senhores que as obras de infra-estruturas, rede de águas e de esgotos e arruamentos já se encontram executados de molde a poderem ser recebidas provisoriamente pela Câmara Municipal de Almada.” – fls. 216 da certidão apensa.
H)Do processo de loteamento acima referido consta que na reunião da Câmara Municipal de Almada de 15 de Março de 1995 foi deliberado aprovar por unanimidade o seguinte: “(…) aprovar o presente pedido de licenciamento, sob as seguintes condições:
1 – É autorizado a constituição de 35 lotes habitacionais (…)
2 – Cedências
2.1. – Domínio Público
Os requerentes cedem gratuitamente por abate realizado na ocasião do registo do presente alvará de loteamento, ao Município de Almada, as áreas indicadas na planta de trabalho (…)
2.2. – Domínio Privado
Os requerentes cedem gratuitamente, em simultâneo com a emissão do alvará ao Município de Almada, a parcela de terreno (…)
5 – Os proprietários obrigam-se a proceder à anexação dos prédios objecto do presente loteamento, na Conservatória do Registo Predial, antes de procederem ao registo da respectiva autorização de loteamento. (…)
9 – As obras de infra-estruturas internas que foram objecto de recepção provisória não se encontram totalmente concluídas pelo que ficam sujeitas a eventuais condicionamentos que venham a ser impostos pelos SMAS, EDP e serviços de fiscalização (…).
11 – Será devida a mais-valia prevista nos termos do Dec.Lei 46 950 de 9/4/66.” – fls. 248 a 252 da certidão apensa.
I)Por despacho da Vereadora da CMA de 23/3/1995, foi aprovado o pedido de emissão de alvará de loteamento “nas condições expressas nas deliberações/despachos anteriormente referidos, salientando-se que os condicionamentos que antecedem a emissão do alvará de loteamento devem encontrar-se satisfeitos em data que permita a emissão do alvará antes de 31/3/95” – fls. 409 e 410 da certidão apensa.
J)Por ofício datado de 20/7/1995, foram os requerentes do processo de loteamento notificados nos seguintes termos: “Relativamente ao pedido de emissão de alvará de loteamento acima mencionado, informo de que deverá dar cumprimento ao seguinte:
1 – Permuta de 1.190m2 para domínio público (destaque de 910m2).
2 – Ceder 24 m2 à PT para domínio privado, em simultâneo à emissão de alvará.
3 – Apresentar garantia bancária para caucionar as infra-estruturas eléctricas no valor de 4.438.000$00. (…)” – fls. 348 da certidão apensa.
K)Por despachos de 22/11/1995, 3/7/1996, 3/1/1997, 27/6/1997, 2/12/1997, 17/2/1998, 21/5/1998, 1/3/1999, 14/9/1999 do/a Vereador/a da CMA, foram aprovados pedidos de prorrogação do prazo para satisfação dos condicionamentos que antecedem a emissão do alvará de loteamento. – fls. 416, 420, 424, 429, 433, 436, 440, 454, 459, da certidão apensa.
L)Por requerimento datado de 10/3/2000 foi requerida nova prorrogação do prazo por 180 dias para satisfação dos condicionamentos que antecedem a emissão do alvará de loteamento, que não foi objecto de deferimento nem indeferimento, tendo sido convocada a comissão de proprietários para prestar esclarecimentos. – fls. 461 e 462 da certidão apensa.
M)Por requerimento de 14/4/2011, foi apresentada “proposta de alteração ao loteamento (…)” – fls. 466 e 467 da certidão apensa.
N)No processo camarário de loteamento nº ___/1985 jamais foi emitido o alvará do loteamento.
***
1)Resulta do auto de vistoria ad perpetuam rei memoriam de 28 de Janeiro de 2010 (cujo auto consta de fls. 61/62) que: “(…) É constituída por um terreno com a área total de 274 m2, que se compõe de duas subparcelas:
SUBPARCELA 18 – terreno com a área de 238 m2, confrontando do Norte com Domínio Público, do Sul e Nascente com restante prédio e do Poente com ___ e outro. É constituída por um terreno com a pendente moderada com configuração trapezoidal servindo de área de apoio a actividade exercida na parte restante do prédio.
SUBPARCELA 18.a) consiste no logradouro com 36 m2 de um prédio urbano antigo de um piso, marginando a Estrada da Bela Vista, o qual não é objecto da presente expropriação.
3.2. IDENTIFICAÇÃO DO PRÉDIO
Ambas as subparcelas são destacadas do prédio rústico com a área de 12.120 m2, sito no lugar do Casal (…) A expropriação cria uma área sobrante de 1.143 m2.
4 – CLASSIFICAÇÃO NO ÂMBITO DO PDM
De acordo com a planta de Ordenamento e Condicionantes do PDM de Almada (…) a parcela está inserida na UNOP 10 em Espaço Urbanizável Habitacional de baixa densidade encontrando-se ainda de acordo com a carta de Outras Condicionantes abrangida por Espaços de Protecção de Infra-estruturas viárias, ou seja, localizada em “Espaço Canal”.
5 – INFRAESTRUTURAS URBANÍSTICAS
Dispõe das infra-estruturas localizadas na Estrada da Bela Vista com a qual confina, isto é: acesso rodoviário pavimentado, rede de abastecimento de água, rede de distribuição de energia eléctrica em baixa tensão, rede de esgotos e rede telefónica.
6 – BENFEITORIAS
Não existem na parcela quaisquer benfeitorias.”.
2)Resulta do auto de vistoria ad perpetuam rei memoriam, da parcela 18.1, de 5 de Janeiro de 2011 (cujo auto consta de fls. 65-69) que: “(…) É parte da propriedade antes identificada com as seguintes áreas e confrontações:
Terreno com a área de 2572 m2, e que confronta do Norte e nascente com restante prédio, do Sul com Estrada da Bela Vista, e do Poente com ___ e Outro.
6. Área total da parcela: 2.572 m2
7. Tipos de Solos, “capacidade de uso”, e formas de aproveitamento:
De acordo com a planta de Ordenamento e Condicionantes do PDM de Almada (…) a parcela está inserida na UNOP 10 em Espaço Urbanizável Habitacional de baixa Densidade encontrando-se ainda, de acordo com a carta de outras condicionantes, abrangida por Espaço de Protecção de Infra-estruturas Viárias, ou seja, localizada em “Espaço Canal”.
8. Descrição Pormenorizada da Parcela: Trata-se de parcela de forma irregular – ver Planta – dispersa em terreno em parte revolvido possivelmente resultante das obras do IC32, mas que aparenta ter estado a ser objecto de um processo de legalização urbanística.
Na envolvente próxima há construções antigas de rés-do-chão dispostas de maneira mais ou menos anárquica, enquanto na mais distante se verifica mais regulação na disposição da construção com moradias de rés-do-chão e 1º andar e edifícios de rés-do-chão e 3 andares.
9. Construções e outras benfeitorias: Não existem na parcela quaisquer benfeitorias com interesse económico.
10. Infra-estruturas urbanísticas: A Estrada da Bela Vista confinante com a parcela dispõe de infra-estruturas: pavimento rodoviário asfaltado, rede de abastecimento de água, rede de distribuição de energia eléctrica em baixa tensão, rede de esgotos e rede telefónica.
11. Aglomerado urbano em que se integra: No aglomerado de Casal de Santo António. (…)”.
3)A parcela expropriada é servida por um passeio em calçada de pedra delimitada por lancil apenas no arruamento sem nome (provado apenas do art.º 45º das alegações de recurso).
4)Os expropriados, por contrato promessa outorgado em 17 de Abril de 2001, prometeram vender à Sociedade de Construções Alvarlar, Lda. “os lotes identificados sob os nºs 1 e 2”, respectivamente, pelos preços de 40.000.000$00 (quarenta milhões de euros), ou € 199.519,15 – a que acrescia um apartamento de 3 assoalhadas no primeiro piso do edifício a construir nesse lote – e de 60.000.000$00 (sessenta milhões de euros), ou € 299.278,73. (artigo 49º das alegações de recurso).
5)E por contratos promessa outorgados em 19 de Dezembro de 2000 e 10 de Novembro de 1999, os expropriados prometeram vender a ___o lote identificado com o nº 3 na planta síntese de loteamento junta como doc. 2 pelo preço de 40.000.000$00 ou € 199.519,15 e a Correa & Santos, Lda. o lote identificado com o nº 4, pelo preço de 55.000.000$00, ou € 274.338,84. (art.º 50º das alegações de recurso).
***
(Factos provados na sequência da perícia ordenada em 27/9/2018)
6)No processo de loteamento nº ___/1985, a que se referem as alíneas F) a N) dos factos assentes, prevê-se, para cada um dos lotes 1, 2, 3 e 4 (habitação plurifamiliar) a área de terreno de 221 m2 e a área de construção de 663 m2 e para cada um dos lotes 5, 6, 7 e 8 (habitação unifamiliar) a área de terreno de 294 m2 e a área de construção de 160 m2, a que correspondem respectivamente os índices de construção “3” e “0,544”, calculados unicamente com base na dimensão de cada lote (fls. 2 e 3 do relatório de peritagem junto em 07.12.2018).
7)Os lotes 2 a 8 do processo de loteamento nº ___/1985 são directamente afectados pela expropriação, uma vez que os limites da área expropriada atravessam os polígonos de implantação dos edifícios que nesses lotes seria possível construir, inviabilizando a construção projectada (fls. 3 do relatório de peritagem junto em 07/12/2018).
8)O processo de loteamento nº ___/1985 diz respeito a três prédios de proprietários distintos, com a área total de 22.139 m2, dos quais 12.036 m2 correspondem ao prédio dos aqui expropriados, a que respeita a parcela 18 expropriada (fls. 5 do relatório inicial de peritagem, apresentado em 12/05/2014).
9)No referido processo de loteamento foram desenhados 35 lotes, aos quais foi afectada a área de 9.497,50 m2, com a área bruta de construção de 7.265 m2 (fls. 4 a 7 do esclarecimento apresentado em 01.07.2019 e 12 e 13 do relatório complementar apresentado em 23.03.2020).
10)A deliberação de aprovação do processo de loteamento prevê cedências de terrenos que totalizam 12.735,50 m2, dos quais 4.925 m2 destinados à construção do nó viário de acesso à Via L-3, construído no prédio contíguo ao prédio dos expropriados, correspondente à parcela 17 da DUP (ponto 10 da resposta aos quesitos dos expropriados, anexa ao relatório pericial inicial, junto em 12/05/2014 e fls. 31 do relatório complementar apresentado em 23/03/2020).
11)Nos relatórios de peritagem apresentados os peritos indicados pelo tribunal e pela expropriante calcularam o custo de construção em € 980,00/m2 de área bruta de construção, com base no valor de € 741,48 previsto na Portaria nº 1240/2008 de 31.10 para vigorar em 2009 para o preço por metro quadrado de construção para habitação, Zona I, a relação área útil vs área bruta de 85% por se tratar maioritariamente de construção de habitação tipo moradias, e a majoração de 55% em função da localização, por referência ao coeficiente de localização previsto no art.º 42º do CIMI (fls. 12 e 13 do relatório pericial apresentado em 12/05/2014, fls. 4 do relatório apresentado em 07/12/2018 e fls. 10 e seguintes do relatório complementar apresentado em 23/03/2020).
12)Nos referidos relatórios os mesmos peritos calcularam o índice fundiário de 20,75%, sendo 12% atinentes aos factores qualitativos “privilegiada localização junto a um nó de acesso à via L3 (actual IC32), relativamente próximo de Almada, Lisboa e Setúbal, do nó da A2 (em Almada) e da estação de comboios suburbanos da área metropolitana de Lisboa (Pragal); à qualidade ambiental, próximo da Paisagem Protegida da Arriba Fóssil da Costa da Caparica e linha de praias da Costa da Caparica, e ainda aos equipamentos existentes na zona (equipamentos escolares, desportivos, de saúde, transportes públicos, superfícies comerciais, etc.)” (fls. 14 e 15 do relatório pericial apresentado em 12/05/2014, fls. 4 do relatório apresentado em 07/12/2018 e fls. 10 e seguintes do relatório complementar apresentado em 23/03/2020).
13)E 8,75% à infra-estruturação do terreno, nos seguintes termos:
Acesso rodoviário, com pavimentação em betuminoso junto da parcela - 1,5%; Passeios em toda a extensão do arruamento do lado da parcela - 0;
Rede de abastecimento domiciliário de água, com serviço junto da parcela - 1%;
Rede de saneamento, com colector em serviço junto da parcela - 1,5%;
Rede de distribuição de energia eléctrica em baixa tensão com serviço junto da parcela - 1%;
Rede de drenagem de águas pluviais com colector em serviço junto da parcela -0,25%;
Estação depuradora, em ligação com a rede de colectores de saneamento - 2%;
Rede distribuidora de gás junto da parcela – 0,5%; Rede telefónica junto da parcela - 1%.
(fls. 14 e 15 do relatório pericial apresentado em 12/05/2014, fls. 4 do relatório apresentado em 07/12/2018 e fls. 10 e seguintes do relatório complementar apresentado em 23/03/2020).
14)Com referência à conjuntura económica recessiva atravessada pelo sector imobiliário, os peritos indicados pelo Tribunal e pela expropriante, com referência ao art.º 26º, nº 10 do CE, fixaram o factor correctivo de 5% (fls. 14 e 15 do relatório pericial apresentado em 12/05/2014, fls. 4 do relatório apresentado em 07/12/2018 e fls. 10 e seguintes do relatório complementar apresentado em 23/03/2020).
15)Em consequência da expropriação, será necessária a contratação de equipa técnica que proceda à reformulação do projecto de loteamento, nomeadamente quanto à distribuição e desenho dos lotes e sua adequação ao PDM, o que pode importar o custo estimado de € 25.000,00 (cfr. fls. 18 do relatório pericial apresentado em 12/05/2014, fls. 5 do relatório apresentado em 07/12/2018 e fls. 10 e seguintes do relatório complementar apresentado em 23/03/2020).
16)Em consequência da expropriação, haverá que proceder à destruição, na parcela do terreno dos expropriados não afectada pela expropriação, de algumas infra‑estruturas implantadas no terreno, nomeadamente rede viária interna que, atendendo à idade e estado de execução conservação, os peritos indicados pelo tribunal e pela expropriante avaliam em € 28.460,00, à razão de €10/m2x2846 m2 (cfr. fls. 18 do relatório pericial apresentado em 12/05/2014, fls. 5 do relatório apresentado em 07/12/2018 e fls. 10 e seguintes do relatório complementar apresentado em 23/03/2020).
***
Para melhor compreender o alcance da fundamentação constante da sentença recorrida e a discordância manifestada quanto à mesma pelos expropriados, importa recuperar o teor do acórdão proferido em 12/4/2018 por este Tribunal da Relação de Lisboa, tendo presente a divergência que os expropriados e a expropriante vêm mantendo, quanto aos critérios que devem prevalecer para o cálculo da indemnização devida por esta àqueles, em consequência da expropriação efectuada.
Assim, ficou afirmado nesse acórdão que:
Regressando à sentença recorrida, nela escreveu-se o seguinte passo com o qual também se concorda:
“(…)
No caso dos autos, dos factos assentes resulta que correu termos o identificado processo de loteamento, o qual obteve aprovação camarária sujeita a diversas condições, a satisfazer pelos requerentes, mas que jamais chegou a ser emitido o respectivo alvará, não constando do processo de loteamento em causa a prova de que os requerentes tenham cumprido as condições a que estava sujeita a emissão daquele.
O alvará é o título comprovativo do licenciamento de uma operação urbanística e é, por lei (artigo 74.º n.º 1 do DL n.º 555/99 de 16 de Dezembro), condição de eficácia da licença obtida com a deliberação final de deferimento pela Câmara Municipal (cfr. os artigos 4.º n.º 2 alínea a), 5.º n.º 1 e 26.º do DL n.º 555/99 de 16 de Dezembro).
(…)
Por isso e voltando ao caso concreto, não compete a este Tribunal sindicar da validade da aprovação do licenciamento do loteamento em questão pela CMA — sindicância que não é objecto deste processo nem é da jurisdição dos Tribunais comuns — nem compete a este Tribunal, nesta decisão sindicar da vigência ou caducidade desse licenciamento (as questões, no fundo, conexa com o disposto nos artigos 71.º e 76.º do RJUE).
A este Tribunal compete apenas constatar que, inexistindo o alvará de loteamento (previsto no artigo 74.° do RJUE), a licença de loteamento é ineficaz: não produz efeitos jurídicos.
(…)”
Porém, já não podemos acompanhar a sentença sob censura quando refere:
“(…)
No caso dos autos, acresce a circunstância de o perito minoritário (cujo “relatório” consta a fls. 419‑444) ter baseado o seu cálculo no potencial edificativo dos lotes que jamais chegaram a ser constituídos, inexistentes juridicamente e não geradores de quaisquer direitos, designadamente de aptidão construtiva. Não podemos, pelas razões de direito já acima explanadas, concordar com um raciocínio que parte de uma premissa errada de um direito que não existe.
(…)”
Vejamos
Todos os peritos convergem quanto à qualificação do “solo apto para construção” da parcela expropriada.
Divergindo, no entanto, quanto aos critérios para apuramento do seu valor que se reflecte nas díspares propostas de indemnização apresentadas.
Atento o quadro factual provado, estamos perante parcela de terreno apto para a construção, cujo montante de indemnização calcula-se com referência à data de declaração de utilidade pública, sendo actualizado à data da decisão final do processo de acordo com a evolução do índice de preços no consumidor, com exclusão da habitação - art. 24.º do CE.
Mais, o cálculo do valor do solo apto para construção deve ter em atenção projectos de construção ou, como dizem os apelantes, o seu potencial edificativo, ou como respondeu o perito dos expropriados “... reitera-se a existência de legítimas expectativas quanto à constituição dos lotes ...”, seguindo o previsto nos arts. 23.º e 26.º do CE — segundo o qual o valor do solo apto para a construção calcula-se por referência à construção que nele seria possível efectuar se não tivesse sido sujeito a expropriação, num aproveitamento económico normal, de acordo com as leis e os regulamentos em vigor, nos termos dos números seguintes e sem prejuízo do disposto no n.º 5 do artigo 23 - e não apenas a área expropriada, correspondendo tal indemnização ao valor do mercado das parcelas expropriadas, sendo esta a justa indemnização.
Sendo pois os critérios de avaliação do solo apto para construção, previstos no citado art. 26.º, meramente referenciais, densificadores ou concretizadores do critério geral previsto no art. 23.º do CE, não podendo obstar a que a indemnização a conceder se paute pelo valor real e corrente do bem de acordo com o seu destino efectivo ou possível, numa utilização económica normal.
Justa indemnização que — de harmonia com o disposto no art. 23.º n.º 1 do citado diploma legal — não visa compensar o benefício alcançado pela entidade expropriante, mas ressarcir o prejuízo que para o expropriado advém da expropriação, correspondente ao valor real e corrente do bem de acordo com o seu destino efectivo ou possível numa utilização económica normal, à data da publicação da declaração de utilidade pública, tendo em consideração as circunstâncias e condições de facto existentes naquela data.
A este propósito, J. A. Santos em anotação ao art. 1.º do Código das Expropriações desenvolve estes princípios atribuindo indemnização total ou integral ao garantir ao expropriado uma compensação plena de perda patrimonial, que lhe foi imposta e por si sofrida, a ser equitativamente repartida entre os cidadãos, compensação que se traduz em colocar o expropriado na posição de adquirir outro bem de igual natureza e valor. Só assim o expropriado, que começou por ser colocado numa posição de desigualdade perante os restantes cidadãos, consegue obter a justa compensação pelo especial sacrifício que lhe foi imposto.
Regressando aos autos, salientaram os expropriados que os árbitros não atenderam à existência de um processo de loteamento que abrangia a parcela expropriada e autorizava a constituição de vários lotes habitacionais, nem atenderam ao facto de terem sido construídas todas as infraestruturas do loteamento, provisoriamente recepcionadas pelo Município, matéria aliás considerada provada, cfr. se alcança das alíneas F, G, H e I.
Pelo que, salvo melhor entendimento, afigura-se-nos assistir razão aos apelantes quando referem que “… seriam de aplicar os índices previstos na Deliberação da Câmara Municipal de Almada de 15 de Março de 1995, constante de fls. 248 a 252 da certidão apensa, i. é, o índice de construção 3 para os lotes previstos de habitação plurifamiliar e o índice 0,544 nos lotes previstos para habitação unifamiliar, desconsiderando-se, pois, o índice bruto máximo de 0,35 por ser inaplicável, in casu, já que é fundado no PDM de Almada (aprovado em 1997) em violação do princípio tempus regit actum, que se encontra consagrado no artigo 62.º do Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro, onde se dispõe que a validade das licenças ou autorizações depende da sua conformidade com as normas legais e regulamentares aplicáveis em vigor à data da sua prática...”.
Ora, não tendo sido considerado tais índices (preterindo os referidos índices de construção 3 e 0,544), estribando-se a sentença recorrida no relatório pericial ainda que maioritário sem nada acrescentar ou suprir - apesar de outros elementos preponderantes que não foram tidos em conta no apuramento do valor do bem expropriado - deverá a mesma ser anulada, determinando-se a efectivação de nova avaliação tendo em vista suprir a referida omissão, pois só assim se poderá alcançar uma justa indemnização que, no entender de Fernando Alves Correia, in Plano Urbanístico e o Princípio da Legalidade, Coimbra, 1989, págs. 540 e segs. «... A indemnização tem de traduzir uma compensação integral do dano suportado pelo particular, acrescentando que a indemnização por expropriação deve garantir àquele uma compensação plena da perda patrimonial suportada, em termos de o colocar na posição de adquirir outro bem de igual natureza e valor (...), é seguro que a possibilidade de o expropriado adquirir, se esse for o seu desejo, uma coisa com características semelhantes às daquela que lhe foi retirada há-de constituir um fim da indemnização, o que indica que esta se traduza na colocação imediata à disposição do expropriado de uma soma correspondente à totalidade do quantitativo indemnizatório ...».
Termos em que procedendo como procedem, no essencial, as conclusões recursivas, a sentença sob censura não poderá subsistir”.
Ou seja, quando no acórdão de 12/4/2018 se decidiu pela anulação da sentença proferida em 7/9/2016, para que fosse realizada “nova perícia tendo em conta os pressupostos acima definidos, mais concretamente computando o cálculo da justa indemnização considerando os índices previstos na Deliberação da Câmara Municipal de Almada de 15.03.1995 que aponta para índices de construção “3” para os lotes previstos para habitação plurifamiliar e o índice “0,544” para os lotes previstos para habitação unifamiliar”, a razão de ser de tal decisão funda-se na constatação de que o cálculo da justa indemnização a que respeita o art.º 23º do Código das Expropriações impõe que se atenda ao “valor real e corrente do bem de acordo com o seu destino efectivo ou possível, numa utilização económica normal”, para que a indemnização corresponda ao “valor de mercado das parcelas expropriadas” e que, no caso concreto, obriga a que se considere o potencial edificativo das mesmas por referência aos índices de construção de 3 (habitação plurifamiliar) e de 0,544 (habitação unifamiliar) previstos para os lotes a constituir nas parcelas expropriadas, segundo o processo de loteamento existente e aprovado em reunião camarária de 15/3/1995 (e que é aquele a que se reportam os pontos F) a I) da fundamentação de facto), e não por referência ao índice de 0,35 que foi considerado na primeira instância.
Dito de outra forma, e continuando a seguir de perto a fundamentação do acórdão de 12/4/2018, a indemnização a fixar tem de ter em consideração a existência de uma operação de loteamento aprovada camarariamente, embora ainda não produzindo efeitos jurídicos, porque o alvará de loteamento não foi emitido.
Do mesmo modo, e tendo presente o circunstancialismo que rodeia a existência dessa operação de loteamento, designadamente a circunstância de ter sido requerida a emissão do alvará respectivo, a circunstância de a entidade administrativa competente (a Câmara Municipal de Almada) nunca ter indeferido a prorrogação do prazo para a satisfação das condições determinantes da emissão desse alvará, e bem ainda a circunstância de não ter sido declarada camarariamente a caducidade da operação de loteamento (mesmo depois da expropriação de uma parcela de terreno destacada de um dos prédios objecto da operação de loteamento), fica decisivamente afirmada a existência da legítima expectativa dos expropriados a constituir os lotes de terreno emergentes dessa operação de loteamento.
Ou seja, é essa legítima expectativa quanto à constituição dos lotes, desde logo aqueles identificados no ponto 7) da fundamentação de facto (porque directamente afectados pela expropriação, uma vez que os limites da área expropriada atravessam os polígonos de implantação dos edifícios que nesses lotes seria possível construir, inviabilizando a construção projectada), que corresponde ao potencial edificativo que se frustrou, sendo nesta medida que se impõe densificar o conceito de destino efectivo ou possível numa utilização económica normal do bem expropriado, presente no art.º 23º do Código das Expropriações.
Isso mesmo já afirmou o Supremo Tribunal de Justiça, como no acórdão de 31/1/2012 (relatado por Serra Baptista e disponível em www.dgsi.pt), quando refere ser de considerar, “na esteira de jurisprudência constitucional e de Tribunais comuns, que o jus aedificandi, sem embargo de não possuir tutela constitucional directa no direito de propriedade, deverá ser considerado como um dos factores de fixação valorativa, sendo lícito tê-lo em conta se a situação concreta e objectiva do imóvel o justificar”.
Assim sendo, e se é certo que, como ficou a constar da sentença recorrida (recuperando o que já havia sido afirmado na sentença revogada pelo acórdão de 12/4/2018), “as considerações da expropriante sobre a eventual caducidade e abandono do processo de loteamento são irrelevantes para a presente decisão, porquanto não compete a este tribunal, nem é da sua jurisdição, sindicar a vigência ou caducidade do licenciamento em questão”, também não é menos certo que não se pode acompanhar o aí igualmente afirmado, quando se aí afirma que a “metodologia defendida pelos expropriados, e pelo perito por si indicado, assenta num pressuposto que, no entendimento deste tribunal não se verifica, que é a existência de lotes de terreno da propriedade dos expropriados com potencial edificativo devidamente consolidado”.
É que a consolidação do potencial edificativo da parcela expropriada, ainda que não seja aquela que se verificaria se a operação de loteamento já estivesse concluída e os lotes respectivos já estivessem juridicamente constituídos, não deixa de se verificar, face à aprovação camarária da operação de loteamento, e tendo presente que tal potencial edificativo assenta numa expectativa séria e fundada dos expropriados em construir, porque qualquer pessoa, colocada na posição dos mesmos, alcançava que a normalidade da situação que se verificava com a operação de loteamento fazia concluir pela constituição dos lotes e pela correspondente verificação da possibilidade de aí edificar as unidades prediais previstas nessa operação, segundo os índices de construção fixados camarariamente.
E, por isso, é que no acórdão de 12/4/2018 se determinou que tais índices teriam de ser considerados como um dos elementos preponderantes para o apuramento do valor indemnizatório.
Assim, e do mesmo modo, não se pode afirmar, como ficou a constar da sentença recorrida, que a “circunstância do projecto prever a constituição de sete lotes para construção na parcela expropriada não determina (…) a constituição de qualquer direito ou mera expectativa dos expropriados à titularidade futura e exclusiva dos lotes desenhados no que é actualmente o seu prédio (…)”.
Do mesmo modo, não é possível afirmar, como ficou a constar da sentença recorrida, que “no entendimento deste tribunal, da decisão do Tribunal da Relação de Lisboa não resulta a determinação de que o cálculo da indemnização deverá ser efectuado de acordo com os referidos índices, o que no essencial corresponderia, aliás, à realização de mera operação aritmética, mas sim a determinação de que no cálculo da justa indemnização deve ser ponderada a aplicação dos referidos índices, bem assim como de outros elementos preponderantes que não tenham sido considerados”.
E, do mesmo modo, não é possível afirmar, como ficou a constar da sentença recorrida, que o índice de construção máxima a considerar para a zona onde se insere a parcela expropriada não é aquele de 3 (para edifícios de habitação plurifamiliar) e de 0,544 (para edifícios de habitação unifamiliar), mas sim aquele que resulta do art.º 91º do Regulamento do PDM de Almada publicado em 14/1/1997 e em vigor à data da declaração de utilidade pública), pois que, nos termos que ficaram expressamente afirmados no acórdão de 12/4/2018, são de aplicar os índices de construção máxima previstos na deliberação camarária de 15/3/1995, sob pena de violação do princípio tempus regit actum consagrado no art.º 67º do RJUE.
Assim, e como já ficou afirmado, a valoração do direito dos expropriados a edificar na parcela expropriada passa pela consideração dos índices de construção máxima em questão, na medida em que só assim se respeita o comando do nº 5 do art.º 23º do Código das Expropriações, quando prescreve que “o valor dos bens calculado de acordo com os critérios referenciais constantes dos artigos 26.º e seguintes deve corresponder ao valor real e corrente dos mesmos, numa situação normal de mercado, podendo a entidade expropriante e o expropriado”. E da mesma forma, tais índices só não deviam ser considerados na medida em que houvesse que atender a “outros critérios para alcançar aquele valor”.
Ou, dito de outra forma, tendo presente que o nº 1 do art.º 26º do Código das Expropriações prescreve que o “valor do solo apto para a construção calcula-se por referência à construção que nele seria possível efectuar se não tivesse sido sujeito a expropriação, num aproveitamento económico normal, de acordo com as leis e os regulamentos em vigor, nos termos dos números seguintes e sem prejuízo do disposto no n.º 5 do artigo 23.º”, e na medida em que ficou já determinado que o referido aproveitamento económico normal passa pela consideração do potencial edificativo da parcela expropriada, por referência aos índices de construção máxima previstos para os lotes a constituir na mesma, tal como decorrem da aprovação da operação de loteamento pela deliberação camarária de 15/3/1995, não há qualquer razão para afastar a aplicação dos critérios dos nº 4 e seguintes do referido art.º 26º.
É, que não obstante tais critérios se apresentem como “referenciais” (na expressão do nº 5º do art.º 23º), tal não significa que sejam meramente supletivos, mas antes significa que se apresentam como elementos densificadores do conceito da aptidão construtiva numa utilização económica normal.
O que é o mesmo que concluir que a determinação do valor da parcela expropriada deve observar os critérios dos nº 4 e seguintes do art.º 26º do Código das Expropriações. E só perante a constatação de um desvio evidente ao valor real e corrente da parcela expropriada, apurado de acordo com o seu destino efectivo ou possível, numa utilização económica normal, é que devem ser utilizados outros critérios, assim respeitando tal princípio e alcançando, por esta forma, a justa indemnização.
Assim, e tendo presente os pontos 6)  e 7) da fundamentação de facto, constata-se que a área máxima de construção dos sete lotes directamente afectados pela expropriação, apurada com recurso aos referidos índices de 3 (para edifícios de habitação plurifamiliar) e de 0,544 (para edifícios de habitação unifamiliar) ascende a 2.629 m2 (correspondente à soma da área parcelar de 1.989 m2, respeitante aos três futuros lotes afectados directamente pela expropriação e onde se previa a construção de edifício plurifamiliar, com a área parcelar de 640 m2, respeitante aos futuros quatro lotes afectados directamente pela expropriação e onde se previa a construção de edifício unifamiliar).
Mais resulta da fundamentação de facto que o custo de construção por metro quadrado a que respeitam os nº 4 e 5 do art.º 26º do Código das Expropriações ascende a € 980,00.
Resulta ainda da mesma fundamentação de facto que o índice fundiário a que respeitam os nº 6 e 7 do mesmo art.º 26º corresponde a 20,75%, respeitando 12% à consideração da localização da parcela expropriada, da qualidade ambiental e aos equipamentos existentes na zona, e respeitando 8,75% à consideração das infra‑estruturas urbanísticas existentes.
E resulta ainda da mesma fundamentação de facto que, tendo por referência a conjuntura económica recessiva atravessada pelo sector imobiliário, o factor correctivo a que respeita o nº 10 do mesmo art.º 26º do Código das Expropriações foi fixado em 5%.
Ou seja, tendo presente a aplicação de todos os critérios acima enunciados, o valor do solo da parcela expropriada ascende a € 507.876,79.
E há ainda a acrescentar a tal valor o montante dos encargos estimados com a reformulação do projecto do loteamento (€ 25.000,00, nos termos do ponto 15) da fundamentação de facto) e o montante dos prejuízos causados pela destruição de algumas das infra‑estruturas implantadas na parcela expropriada, no âmbito da operação de loteamento (€ 28.460,00, nos termos do ponto 16) da fundamentação de facto), nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 29º, nº 2, do Código das Expropriações.
Ou seja, concretizando o critério geral previsto no art.º 23º do Código das Expropriações, através dos parâmetros constantes do art.º 26º do mesmo Código das Expropriações, apura-se que a indemnização devida aos expropriados deve ser fixada no valor global de € 561.336,79, tendo por referência a construção máxima que seria possível efectuar na parcela expropriada, num aproveitamento económico normal da mesma, tal como decorre da aprovação da operação de loteamento e do potencial edificativo que a mesma assim passou a apresentar, e com referência à data da declaração de utilidade pública.
E foi esse o valor apurado no relatório pericial apresentado em 7/12/2018 (embora não pela unanimidade dos peritos, porque o perito indicado pelos expropriados manteve a posição anteriormente assumida), e que mais não é que aquele elaborado na sequência do ordenado pelo acórdão de 12/4/2018 e de acordo com os critérios de cálculo da indemnização aí expostos, desde logo no que respeita à observância dos referidos índices de construção máxima de 3 e de 0,544.
Reafirmam os expropriados que o cálculo da indemnização não devia ser efectuado com respeito pelos critérios enunciados no art.º 26º do Código das Expropriações, mas antes atendendo ao “valor de mercado dos lotes em questão nos presentes autos”, não obstante nunca ter sido emitido o alvará de loteamento, mas tendo sido aprovada camarariamente a operação de loteamento, e sob pena de a indemnização não corresponder ao “valor real e corrente das parcelas expropriadas nos presentes autos numa situação normal de mercado”.
Na sentença recorrida ficou afirmado o acompanhamento da posição dos peritos indicados pelo Tribunal e pela expropriante, em sede de resposta à reclamação e pedido de esclarecimentos ao relatório apresentado em 7/12/2018, nos seguintes termos:
Declarando não perfilhar as abordagens avaliativas fundadas nos índices “3” e “0,544” e no valor de mercado dos lotes projectados, mas admitindo que os critérios do artigo 26.º, do CE possam não corresponder ao valor real de mercado da parcela atendendo à eventual possibilidade de aproveitamento das infra-estruturas existentes ainda que precárias, e à expectativa gerada pelo projecto de loteamento, os peritos indicados pelo tribunal, sob os pontos 2.1.10 e 2.1.11 do relatório complementar, apresentaram duas novas abordagens.
A primeira, sob o ponto 2.1.10, reportada ao critério do aproveitamento económico normal do prédio dos expropriados, procurou apurar o valor de mercado do prédio dos expropriados (12.036m2) tal como o mesmo se encontra, mais concretamente, quanto estaria um investidor disposto a pagar pela aquisição do mesmo com a finalidade de o transformar e colocar no mercado os lotes infra‑estruturados.
Para tanto, estabeleceram a proporção, relativamente ao projecto de loteamento aprovado, quanto à área de implantação dos lotes e área bruta de construção, que calcularam respectivamente em 5.245m2 e 3.950m2.
Com base nesses valores, tendo em consideração as infra-estruturas executadas no prédio dos expropriados e os parâmetros de cedência de áreas de equipamentos colectivos e espaços verdes de utilização colectiva impostos pelo PDM de Almada para aprovação do projecto, concluíram que seria possível a constituição de 18 lotes de terreno, com a área global de implantação de 4.392m2 e a área bruta de construção de 3.536m2.
Tendo por base os valores de mercado determinados pelo perito indicado pelos expropriados com referência a Setembro de 2013, que qualificaram como correcto mas carecido de conversão para Dezembro de 2009 de acordo com o Índice de Preços no Consumidor, obtiveram o valor de mercado para o terreno infra-estruturado, de € 1.382.520,00.
Seguidamente calcularam em € 375.881,28 o valor global dos encargos com a aquisição do terreno natural, custos de reparação das infra-estruturas existentes, custos indirectos de construção, encargos com a venda dos lotes e lucro do promotor, a deduzir no valor de venda do terreno infra-estruturado, obtendo o valor de € 1.006.639,39 para o prédio e o valor de 238.027,23 para a parcela expropriada.
Somaram o montante de € 28.460,00 referenciado no ponto 18) dos factos provados, correspondente ao prejuízo atinente à destruição de algumas das infra‑estruturas instaladas, concluindo que o valor da justa indemnização corresponderá a € 266.487,23.
(…)
A segunda, sob o 2.1.11, reportada ao critério da legítima expectativa no loteamento n.º ___/1985 globalmente considerado, tem por base os mesmos valores de mercado determinados pelo perito indicado pelos expropriados com referência a Setembro de 2013, que depois de convertido para Dezembro de 2009 de acordo com o Índice de Preços no Consumidor, liquidaram em € 2.786.836,59.
Com a mesma metodologia usada no critério anterior, calcularam em € 375.881,28 o valor global dos encargos com a aquisição do terreno natural, custos de reparação das infra-estruturas existentes, custos indirectos de construção, encargos com a venda dos lotes e lucro do promotor, a deduzir no valor de venda do terreno infra-estruturado, obtendo o valor de € 2.098.109,73 para o conjunto dos prédios com a área global de € 22.139m2, e o valor de 269.715,00 para a parcela expropriada de € 2.846m2.
A esse valor somaram igualmente o montante de € 28.460,00 referenciado no ponto 18) dos factos provados, correspondente ao prejuízo atinente à destruição de algumas das infra-estruturas instaladas, concluindo que o valor da justa indemnização assim calculado corresponderá a € 298.175,00.
(…)
Donde, subsistem as abordagens avaliativas antes resumidas, desenvolvidas no relatório complementar sob as posições 2.1.10 e 2.1.11.
A diferença que em concreto se verifica existir entre as mesmas prende-se com a circunstância da primeira assentar num projecto hipotético, enquanto a segunda assenta num projecto aprovado, cuja concretização final depende essencialmente do preenchimento pelos interessados de um conjunto de condições definido na decisão de aprovação.
Essa diferença, no nosso entendimento, é crucial para o caso, na medida em que o que leva a afastar a aplicação singela dos critérios previstos no citado artigo 26.º não é a possibilidade de submeter à aprovação um projecto adequado às dimensões do prédio dos expropriados, mas sim a efectiva existência de um projecto que, apesar de não ter alvará emitido, está aprovado e tem infra-estruturas provisoriamente recebidas pela entidade competente.
O valor calculado com base no valor de mercado dos prédios que integram o loteamento aprovado, e na proporção que do mesmo corresponderá ao prédio dos expropriados mostra-se assim como o mais adequado, por se mostrar fundado na realidade existente.
Conclui-se, assim, que o método desenvolvido pelos Srs. Peritos indicados pelo Tribunal sob o ponto 2.1.11 do relatório complementar apresentado em 23/03/2020 é que melhor permite o cálculo da justa indemnização em conformidade com o valor real e corrente da parcela expropriada, de acordo com o seu destino efectivo ou possível numa utilização económica normal.
Não havendo outros elementos a ponderar além dos contemplados pelos Srs. Peritos na referida abordagem será, por conseguinte, de fixar o valor da justa indemnização em € 298.175,00, em conformidade com o cálculo apresentado pelos Sra. Peritos indicados pelo Tribunal na 9.ª abordagem avaliativa, ponto 2.1.11.”.
Todavia, e se é certo que o “valor real e corrente do bem expropriado” deve ser observado como princípio que norteia a indemnização a fixar, importa igualmente não esquecer que, como já referiu este Tribunal da Relação de Lisboa, no acórdão de 29/11/2012 (relatado por Carla Mendes e disponível em www.dgsi.pt), “a indemnização, que advém do acto expropriativo que priva o expropriado do uso e fruição de um determinado bem jurídico, para que possa ser apelidada de justa tem, necessariamente, de cobrir a totalidade dos prejuízos sofridos, que terão de ser calculados de acordo com o valor real do bem, com o seu valor resultante do mercado normal ou habitual, não especulativo”.
Ora, tendo presente que, não obstante a aprovação da operação de loteamento, os sete lotes de terreno acima referidos nunca chegaram a ter existência jurídica, não se pode afirmar, sem mais, que para efeitos de cálculo da indemnização devida pela expropriação da parcela onde os mesmos iriam surgir se deva considerar o valor dos mesmos, obtido através do recurso a métodos utilizados para situações distintas, a saber, o cálculo do valor de lotes já existentes e aptos a ser colocados no mercado imobiliário.
Ou, dito de outra forma, afirmar a possibilidade de apurar o valor venal de um bem imóvel, que não existe enquanto tal, não passa de um exercício especulativo e, nesta medida, desconforme aos princípios que regem a determinação da indemnização devida aos expropriados.
O que é o mesmo que afirmar que a pretensão indemnizatória dos expropriados não pode valer com a expressão pecuniária indicada pelos mesmos, já que para alcançarem tal expressão os mesmos recorrem à estimativa do valor de cada um dos lotes projectados (mas não constituídos), no pressuposto (não verificado) de que cada um dos lotes constituía uma unidade predial independente e susceptível de ser colocada à venda, “lutando” com todas as demais unidades prediais de características idênticas igualmente colocadas no mercado imobiliário, segundo os princípios da oferta e da procura.
Nessa medida, nunca poderia tal método ser apto à determinação do valor real e corrente da parcela expropriada, nem tão pouco teria a virtualidade de fazer afastar a aplicação dos critérios densificadores do art.º 26º do Código das Expropriações, nos termos em que os mesmos foram acima aplicados.
Mas, do mesmo modo, não pode subsistir o afirmado na sentença recorrida, quanto à adopção de um critério de fixação da indemnização que, afastando-se decisivamente dos critérios do art.º 26º do Código das Expropriações, mais não representa que uma variação do método comparativo ensaiado pelos expropriados (rectius, pelo perito indicado pelos mesmos), porque parte também da consideração dos mesmos valores do mercado imobiliário, relativamente a lotes de terreno constituídos, e acabando por desprezar a circunstância de, no caso da parcela expropriada, inexistirem lotes constituídos, mas apenas lotes projectados.
O que significa que, pese embora não se possa manter o decidido na sentença recorrida, quanto à fixação da indemnização devida aos expropriados no valor de € 298.175,00, também não procede integralmente a pretensão destes, no sentido da indemnização dever ser fixada no valor de € 1.323.600,00, antes devendo a indemnização ser fixada no referido montante de € 561.336,79 (actualizado nos termos constantes da sentença recorrida e que não mereceram qualquer impugnação, não sendo assim tal parte decisória objecto do presente recurso), desde logo porque foi aquele a que os peritos chegaram, quando observaram integralmente o decidido anteriormente por este Tribunal da Relação de Lisboa, quanto aos critérios que deviam nortear o cálculo dessa indemnização.
***
DECISÃO
Em face do exposto julga-se parcialmente procedente o recurso, revogando-se a sentença recorrida e substituindo a mesma por esta outra decisão em que se fixa o montante da indemnização devida aos expropriados em € 561.336,79 (quinhentos e sessenta e um mil trezentos e trinta e seis euros e setenta e nove cêntimos), a qual será actualizada de acordo com os índices de preços no consumidor (excluindo habitação) publicados no I.N.E., desde a data da publicação da declaração de utilidade pública até à data do trânsito em julgado da presente decisão.
Custas (em ambas as instâncias) por expropriante e expropriados, na proporção do respectivo decaimento.

14 de Setembro de 2023
António Moreira
Carlos Castelo Branco
Orlando Nascimento