Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
1971/08.4TBMFR.L2-6
Relator: TERESA PARDAL
Descritores: FUNDO DE GARANTIA AUTOMÓVEL
SUB-ROGAÇÃO
PRESCRIÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 11/12/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Sumário: - O direito do Fundo de Garantia Automóvel a reclamar o reembolso de uma indemnização paga pelos prejuízos causados com um veículo sem seguro não é um direito de regresso, mas sim um direito de sub-rogação, resultante de lhe ter sido transmitido o direito do credor originário.
- A este direito de sub-rogação é aplicável o prazo de prescrição previsto no artigo 498° do CC e não o prazo geral previsto no artigo 309°.
- Não se tendo provado a culpa do condutor do veículo, este responde só pelo risco do
veículo e não culposamente, não lhe sendo aplicável o prazo alargado do artigo 498° n°3 do CC, pelo que está prescrito o direito do autor, por terem decorrido mais de três anos entre o pagamento da indemnização e a propositura da acção.
(Sumário elaborado pela Relatora)
Decisão Texto Parcial: Acordam os juízes do Tribunal da Relação de Lisboa:



RELATÓRIO:


Fundo de Garantia Automóvel intentou contra A… a presente acção declarativa com processo sumário, alegando, em síntese, que no dia 15 de Novembro de 2002 ocorreu um acidente de viação em que um veículo automóvel, sem dispor de seguro, conduzido pelo réu e por culpa deste, atropelou um peão numa passagem de peões, causando danos no valor de 18 946,81 euros, que o autor ressarciu e relativamente aos quais tem direito a ser reembolsado.

Concluiu pedindo a condenação do réu a pagar-lhe a quantia de 18 946,81 euros acrescida de juros vencidos no valor de 2 230,01 euros e dos juros vincendos. 

O réu contestou, impugnando o valor da acção, arguindo a excepção da prescrição por já ter decorrido o prazo legal de três anos e a excepção de ilegitimidade passiva, por ser titular de um seguro de garagista e impugnou os factos relativos à dinâmica do acidente.  

Concluiu pedindo a procedência das excepções e a improcedência da acção.

O autor replicou opondo-se às excepções, mas admitindo o valor da acção atribuído pelo réu.

Concluiu rectificando o valor do pedido para 13 927,93 euros acrescido de juros vencidos de 1 675,95 euros e dos juros vincendos e pedindo a intervenção principal como ré de Companhia de Seguros….

Admitida a intervenção principal de seguradora, veio esta contestar, arguindo a ilegitimidade passiva, por o contrato de seguro celebrado com o réu ser um seguro de garagista, não estando os danos em causa cobertos pelo mesmo, por não terem sido causados no âmbito da actividade de garagista e arguindo a excepção da prescrição por já ter decorrido o respectivo prazo. 

Concluiu pedindo a absolvição do pedido. 

O autor replicou, de novo se opondo à excepção da prescrição.

No despacho saneador foi fixado o valor de 15 603,86 euros à acção, foi julgada improcedente a excepção de ilegitimidade e foi relegado para final o conhecimento da excepção de prescrição.

Procedeu-se a julgamento, após o que foi proferida sentença que absolveu a chamada do pedido e condenou o réu a pagar ao autor as quantias reclamadas na petição inicial.

Interposto recurso pelo réu, foi proferido despacho que rectificou a sentença, onde ficou a constar a condenação do réu a pagar ao autor a quantia de 13 927,93 euros e juros de mora à taxa legal sobre 10 627, 07 euros, desde 01/12/2005, até efectivo pagamento.

Subidos os autos a este Tribunal da Relação, foi anulada a sentença e determinada a repetição parcial do julgamento, por haver contradição nas respostas aos artigos 5º, 6º e 7º da base instrutória.

Reaberta a audiência, após ser dada resposta aos artigos em causa, foi proferida nova sentença que absolveu a chamada do pedido e condenou o réu a pagar ao autor a quantia de 13 927,93 euros acrescida de juros de mora à taxa legal calculados sobre 10 627,07 euros desde 01.12.2005 até integral pagamento e juros de mora à taxa legal sobre 3 300,86 euros desde a citação até efectivo pagamento, absolvendo-o do demais peticionado.  
                                                         
Inconformado, o réu interpôs recurso, formulando as seguintes conclusões:

I. Entende o recorrente que o Juiz “a quo” julgou incorrectamente os factos, incorrendo, por conseguinte, em erro na apreciação da prova e, por essa via, erro na interpretação da norma jurídica aplicável, como vai demonstrar-se.

II. Ora, tal como decorre dos elementos constantes da Participação de acidente elaborada pelas autoridades e confirmada pela testemunha que a elaborou, o atropelamento terá ocorrido a 70 cms da berma direita, atento o sentido Bucelas/Venda do Pinheiro, bem como que o peão estava de frente para o veículo.

III. Mais, tendo o réu afirmado que a sua frente já estava na estrada principal (EN 116), mas que não conseguia precisar se os rodados da frente já estariam na mesma via, quer isto dizer que o veículo ainda não estava totalmente na EN 116, mas sim que ainda estava a efectuar a manobra de mudança de direcção à direita.

IV. Tudo conjugado com o facto de o peão estar de frente para o veículo, não é possível que o mesmo estivesse a proceder à travessia da EN 116, mas sim que circulava na faixa de rodagem da mesma.

V. Assim, a resposta à matéria dos quesitos 6º devia ter sido dada como não provada.

VI. No tocante à prescrição da indemnização suportada pela autora a lei é terminante em qualificar o direito de reembolso da indemnização que satisfez que lhe assiste, como direito de regresso.

VII. Aquele prazo de prescrição é sempre de apenas 3 anos, contados do cumprimento da obrigação de indemnização que, por força do contrato de seguro, vincula o pagador, Fundo de Garantia Automóvel.

VIII. Neste mesmo sentido e em favor da referida interpretação temos os Acórdãos do STJ relativos aos Procº nº 1507/10.7TBPNF.P1.S1, 6ª Secção, de 2011.11.29, Procº nº 32/09.3TBSRQ.L1.S1, 6ª Secção, de 2012.06.05 e Procº nº 157-E/1996.G1.S1, 2ª Secção, de 2013.01.10, todos no sítio DGSI, donde resulta inequívoco que o alongamento do prazo de prescrição do direito à indemnização em consequência de danos ocasionados por facto ilícito que constitua crime (artº 498º, nº do CC) não vale para o exercício do direito de regresso.

IX. Por tudo isto, o direito do autor deveria ter sido considerado prescrito, pois mesmo considerando a data dos pagamentos efectuados pelo autor, todos no decurso o ano de 2004, o prazo de 3 anos terminaria em 2007, sendo que a acção só deu entrada em 2008.11.25, quando o direito já se encontrava prescrito, o que o recorrente alegou.

X. Assim, a sentença violou o disposto no nº1 do artº 498º do C.Civil.  
                                                          
O recorrido FGA contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso e este foi admitido como apelação, com subida imediata, nos autos e efeito devolutivo.

As questões a decidir são:

I)Impugnação da matéria de facto.
II) Se estão verificados os requisitos da responsabilidade civil do réu.
III)Natureza do direito invocado pelo autor e excepção de prescrição.
                                                          
FACTOS:

A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:

1. No dia 15.11.2002, pelas 14 horas e 30 minutos, na estrada Nacional 116, Vale de S. Gião, Mafra, ocorreu um embate entre o veículo ligeiro de passageiros de matrícula HR, da propriedade do réu e por si conduzido e o peão B… (1 e 2).
2. Imediatamente antes do embate, o HR circulava na Estrada Nacional 374, sentido Póvoa da Galega - Vale de S. Gião, em local na qual a via apresenta um cruzamento com a EN 116 (3 e 4).
3. Pretendendo o réu, ao volante do HR, mudar de direcção à direita nesse cruzamento, no sentido Venda do Pinheiro, embateu com a frente do HR no peão B…, que se encontrava a atravessar a via (5 e 6).
4. A faixa de rodagem da EN 116, no local do embate, tem 7,20 metros de largura.
5. Momentos antes, B… iniciou a travessia da Estrada Nacional 116.
6. Após o embate, B… teve de ser transportada para o Centro Hospitalar de Torres Vedras, a fim de receber assistência médica em virtude dos ferimentos causados por aquele, consubstanciados na fractura luxação do úmero esquerdo (8 e 9).
7. As lesões acima descritas determinaram um período de incapacidade temporária geral de 15.11.2002 a 05.05.2003, com um quantum doloris no grau III/VII 08.12.2004, e uma incapacidade permanente parcial de 0.12, a partir de 06.05.2003 e tem um dano estético de grau II/VII (10).
8. O autor pagou a B… o montante de 8 000,00 euros a título de danos não patrimoniais a 27.07.2004 (11).
9. O autor pagou ao Centro Hospitalar de Torres Vedras a quantia de 10 896,93 euros referente à assistência médica prestada a B… a 04.07.2004 e a 04.08.2004 (11).
10. O autor pagou a 15.05.2004 ao Centro Médico da Quinta das Flores a quantia de 49,88 euros pela assistência médica prestada a B… (11).
11. O autor, por carta datada de 23.11.2005, recebida pelo réu, solicitou o pagamento o prazo de 10 dias da quantia de 10 627,07 euros a título de restituição do que até àquela data havia pago a B… (12).
12. À data do embate ora em apreciação, o réu utilizava o HR fora da sua actividade profissional (13).
13. À data dos acontecimentos em julgamento, o réu beneficiava de contrato de seguro de responsabilidade civil de garagista (A).
14. A presente acção deu entrada na secretaria judicial do extinto Tribunal Judicial da Comarca de Mafra a 26.11.2008.
                                                          
ENQUADRAMENTO JURÍDICO:

I) Impugnação da matéria de facto:

Com a repetição parcial do julgamento, pretendia-se que fosse ultrapassada a contradição na resposta aos artigos 5º, 6º e 7º da BI, mediante uma nova resposta a estes artigos, bem com ao artigo 16º, cuja matéria estava relacionada.

É a seguinte a redacção dos referidos artigos e respectivas respostas que agora foram dadas:

Artigo 5º- O veículo HR, conduzido pelo réu, ao pretender mudar de direcção à direita, no sentido da Venda do Pinheiro, embateu com a lateral direita sobre a frente do HR no peão B…, como consta do doc de fls 7-10?

Resposta – O veículo HR, conduzido pelo réu, ao pretender mudar de direcção à direita, no sentido da Venda do Pinheiro, embateu com a frente do HR no peão B… (ponto 3 dos factos provados).

Artigo 6º- O peão efectuava a travessia da Estrada Nacional 116, da direita para a esquerda, atento o sentido de marcha do HR, como consta do doc de fls 7-10.

Resposta - Provado que o peão efectuava a travessia da Estrada Nacional 116 (ponto 3 dos factos provados).

Artigo 7º- Quando se dá o embate entre o HR e o peão, este já se encontrava na berma do lado esquerdo, atento o sentido de marcha do HR, como consta do doc de fls 7-10?

Resposta – Não provado.

Artigo 16º- O peão caminhava dentro da faixa de rodagem, cerca de 0,70 m, junto à berma e pretendia atravessar a EN 374?

Resposta – Não provado.

O apelante vem impugnar a matéria de facto, alegando que, face à prova produzida, a resposta ao artigo 6º da BI deveria ter sido “não provado” e que não é possível que o peão estivesse a proceder à travessia da EN 116, pois caminhava na faixa de rodagem.

Assim, embora o apelante só mencione o quesito 6º, é manifesto que impugna também a resposta ao artigo 16º da BI.

Passando a apreciar, desde logo se constata que o ponto 5 dos factos provados não corresponde a nenhum artigo da BI e o seu conteúdo não foi considerado provado na resposta aos artigos 5º e 6º (tendo os artigos 7º e 16º sido considerados não provados).

Deverá, assim, ser eliminado o ponto 5 dos factos provados.

No que diz respeito aos impugnados artigos 6º e 16º da BI, a prova produzida consiste no depoimento de parte do réu, cujas declarações estão consignadas, no essencial, na acta da audiência de julgamento, na participação e croquis de fls 7 a 10, nas declarações escritas de fls 11 e 12 do réu e do peão, recolhidas pela seguradora chamada e no depoimento das testemunhas JM, AA, CC e PC.

No seu depoimento, o réu declarou que, ao mudar a direcção do veículo vindo de uma via secundária, para entrar numa estrada principal, fê-lo muito devagar por ter pouca visibilidade e, já dentro da estrada onde pretendia entrar, embateu com a frente do seu carro no peão, que estava de frente para o seu veículo, não conseguindo precisar de onde o mesmo surgiu.

Nenhuma das testemunhas ouvidas assistiu ao acidente, tendo a testemunha JM elaborado o auto de participação, cuja cópia ilegível se encontra a fls 7 a 10.

Esta testemunha confirmou ter elaborado o auto e o croquis, mas, naturalmente, já não se recordava das circunstâncias que condicionaram a participação, não conseguindo precisar qual o sentido de circulação do veículo e muito menos qual o trajecto do peão e não se recordando, igualmente, se foi o réu, condutor do veículo, quem lhe deu as indicações que o levaram a consignar a descrição do acidente e o croquis (cuja cópia no processo é ilegível), ou se foi o marido da vítima do embate quem lhe forneceu essas indicações.

As testemunhas AA e CC, ambos gestores de sinistros da seguradora chamada, declararam nunca ter tido contacto com os intervenientes no acidente, só conhecendo o processo tramitado na seguradora e nada sabendo sobre a dinâmica do acidente.

A testemunha PC, perito avaliador que contactou com o réu e com o peão, tomou as declarações escritas por estes e cujas cópias ilegíveis constam a fls 11 e 12, não conseguindo extrair destas cópias o respectivo conteúdo e não sabendo nada sobre a dinâmica do acidente.

Tudo ponderado, conclui-se que apenas se apurou que o veículo embateu no peão na faixa de rodagem logo após ter entrado na estrada principal, mas não está provado que o peão estava a atravessar a via, ou que estava a caminhar na estrada, devendo ser alterada a resposta ao artigo 6º da BI para “não provado”.

Deste modo, mantendo-se a resposta ao artigo 5º da BI, mas não se provando o conteúdo do artigo 6º e mantendo-se não provados os artigos 7º e 16º, o ponto 3 dos factos provados deverá ficar com a seguinte redacção: “o veículo HR, conduzido pelo réu, ao mudar a direcção à direita, no sentido da Venda do Pinheiro, embateu com a sua frente no peão B…”.

Não se provando os artigos 6º, 7º e 16º da BI, deverá também ser eliminado o ponto 5 dos factos provados, conforme acima se expôs.

Procede, pois a impugnação da matéria de facto nos termos supra expostos.       
                                                         
II) Requisitos da responsabilidade civil do réu.

Fixados os factos, haverá que apreciar se os mesmos integram os requisitos do artigo 483º do CC e se o réu incorre em responsabilidade civil.

A responsabilidade civil extracontratual prevista no artigo 483º pressupõe a ocorrência de um facto ilícito, culposo, do dano e do nexo causal.

No presente caso, apesar de se terem provado os restantes requisitos, não se provou a culpa do agente, o ora réu apelante.

Com efeito, apenas se provou que, ao mudar de direcção para a direita, entrando noutra via, o veículo conduzido pelo réu embateu no peão, mas não se provou em que circunstâncias se encontrava o peão na faixa de rodagem:

- A atravessar a estrada vinda do lado esquerdo considerando o sentido de marcha do veículo e visível para o condutor deste?
A iniciar a travessia da estrada direito considerando o sentido do veículo e visível para o condutor?
- A iniciar a travessia do lado direito considerando o sentido do veículo e entrando na faixa de rodagem de forma inesperada para o condutor do veículo?
- A caminhar na faixa de rodagem sem ser visível para o condutor?

Não se apurando como o peão entrou na faixa de rodagem, não existem elementos para concluir pela culpa do condutor do veículo, não se podendo concluir que existe responsabilidade civil culposa prevista no artigo 483º, mas sim e apenas responsabilidade civil pelo risco prevista nos artigos 501º e seguintes, também do CC.     
                                                       
III) Natureza do direito invocado pelo autor e prescrição.

Com a presente acção, o autor Fundo Garantia Automóvel pretende receber do réu as quantias que pagou à vítima embatida pelo veículo por este conduzido, a título de indemnização pelos danos sofridos com o embate.

Efectivamente, decorre dos factos provados que o veículo conduzido pelo réu e que embateu o peão era objecto de um contrato de seguro de garagista, não incluindo os sinistros ocorridos fora do âmbito desta actividade, como é o caso do acidente dos autos, pelo que o autor satisfez as referidas indemnizações ao abrigo do artigo 21º do DL 522/85 de 31/12 (entretanto revogado e substituído pelo DL 291/2007 de 21/8, mas em vigor à data dos factos).

Estabelece o artigo 25º nº1 do DL 522785 aplicável (a que corresponde o actual artigo 54º nº1 do DL 291/2007) que “satisfeita a indemnização, o Fundo de Garantia Automóvel fica sub-rogado nos direitos do lesado, tendo ainda direito ao juro de mora legal e ao reembolso das despesas que houver feito com a liquidação e cobrança”.

É este direito de sub-rogação legal (a que se refere o artigo 592º do CC), que o autor vem invocar, ao reclamar o reembolso das indemnizações que pagou.

Na verdade, a figura da sub-rogação constitui uma forma de transmissão das obrigações, está prevista nos artigos 589º e 590º do CC e tem como consequência que o terceiro que cumpre junto do credor a obrigação do devedor, fica sub-rogado nos direitos daquele, ou seja, é-lhe transmitido o crédito na medida do seu cumprimento (artigo 593º do CC).

O réu, ora apelante invocou a excepção de prescrição, alegando que já decorreu o respectivo prazo de três anos, previsto no artigo 498º nº1 do CC.

A prescrição tem o efeito de, mediante o decurso de um prazo, conferir ao seu beneficiário a faculdade de recusar o cumprimento da prestação ou de se opor ao exercício do direito prescrito (artigo 304º do CC); o prazo ordinário da prescrição é de vinte anos (artigo 309º do CC) e começa a correr quando o direito puder ser exercido (artigo 306º nº1 do CC).

Mas no âmbito da responsabilidade extra contratual, o prazo de prescrição está fixado no nº1 do artigo 498º do CC e é de três anos, a contar da data do conhecimento do lesado do direito que lhe assiste, mesmo com desconhecimento da pessoa do responsável e da extensão integral dos danos.

Por seu lado, o nº2 do artigo 498º, fixa igualmente o prazo de três anos para a prescrição do direito de regresso entre os responsáveis, a contar do cumprimento e o nº3 do mesmo artigo estabelece que, se o facto ilícito constituir crime para o qual a lei estabeleça prazo de prescrição mais longo, é esse o prazo aplicável.

No presente caso, ficando o autor sub-rogado na posição da credora lesada a quem pagou a indemnização, o prazo de prescrição é o que resulta do artigo 498º e não o prazo geral previsto no artigo 309º.

Tendo o acidente em causa ocorrido em 2002 e tendo as indemnizações sido pagas no ano de 2004, já haviam decorrido mais de três anos desde qualquer um destes factos quando, em Novembro de 2008, foi intentada presente acção, defendendo o apelante que já ocorreu a prescrição, já que ao direito de regresso não é aplicável o alargamento do prazo previsto no nº3 do artigo 498º.

É certo que tem sido entendido por larga jurisprudência que aos titulares de direito de regresso não aproveita o prazo previsto no artigo 498º nº3 quando o facto ilícito constitui também ilícito criminal, uma vez que o direito de regresso não sucede ao direito original, sendo antes um direito novo que surge na esfera jurídica do titular (entre outros, acs RL de 9/12/2008, p. 9784/08, 26/05/2009, p. 2491/06, RP de 4/10/2001, p. 0131154, 31/03/2009, p. 2665/07, STJ de 4/11/2008, p. 08A3119, 17/11/2011, p. 1372/10, 29/11/2011, p. 1507/10, todos em www.dgsi.pt).

Mas, como acima se referiu, o direito do autor é um direito de sub-rogação – em que o titular sucede no direito do credor – e não um direito de regresso – em que um dos devedores cumpre mais do que aquilo que lhe cabia, extinguindo aquela obrigação e fazendo surgir um direito novo, de reembolso perante os restantes devedores, que não corresponde ao direito original do credor (conferir sobre a diferença entre estas duas figuras, A. Varela, “Das obrigações em geral”, vol II, págs 343 e sgts e ac. STJ 17/11/2011 acima citado).

Ao direito de sub-rogação só tem sido considerado aplicável o regime do direito de regresso no âmbito do nº2 do artigo 498º, ou seja, para considerar que o início do prazo de prescrição só começa a contar a partir do cumprimento que dá lugar à sub-rogação, pois tal decorre dos critérios previstos no artigo 306º (entre outros, ac STJ 25/03/2010, p. 2195/06 em www.dgsi).

Voltando ao caso dos autos, resulta dos factos que não se provou a culpa do condutor do veículo, réu ora apelante, que só pode ser considerado responsável pelo risco.

Deste modo, não está demonstrado que os factos constituem ilícito criminal e não pode prazo de prescrição ser alargado nos termos do nº3 do artigo 498º.

O prazo de prescrição aplicável é, assim, de três anos, concluindo-se que já prescreveu o direito do autor. 
 
A prescrição é uma excepção peremptória, que consiste na invocação de factos extintivos do direito invocado pelo autor e cuja procedência determina a absolvição do pedido (artigo 493 nº1 e nº3 do CPC vigente à data em que a excepção foi deduzida e a que corresponde o actual artigo 576º).
                                                          
DECISÃO:

Pelo exposto, acorda-se em julgar procedente a apelação, revogando-se a sentença recorrida e absolvendo-se o apelante do pedido.                                                            
Sem custas, por o autor apelado estar isento.
 
                                                         
Lisboa, 2015-11-12
 
                                                                
Maria Teresa Pardal
Carlos Marinho
Anabela Calafate                               
Decisão Texto Integral: