Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
3890/08.4TBBRR.L1-7
Relator: ANA RESENDE
Descritores: DOAÇÃO ENTRE CÔNJUGES
NULIDADE
RESERVA DE USUFRUTO
CASAMENTO
REGIME DE BENS
NULIDADE DE SENTENÇA
MÁ FÉ
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 04/23/2013
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: 1. As doações entre cônjuges só podem ter por objeto bens próprios do doador, proibidas estando assim as doações de bens comuns, entendidas como verdadeira violação do princípio da imutabilidade do regime de bens, numa defesa efetiva do património comum em termos da respetiva certeza, com relevância, nomeadamente, na salvaguarda dos direitos de credores de ambos os cônjuges.
2. Admite-se, contudo, que os cônjuges façam a doação a terceiros de bens comuns, com cláusula de reserva de usufruto desses bens até à morte do último doador, surgindo como situação paradigmática, o caso dos pais fazerem a doação aos filhos de determinado bem comum, com cláusula de reserva de usufruto desses bens, até à morte do sobrevivente dador.
3. Não consubstancia tal situação a doação dum imóvel aos filhos, realizada pelos pais, com reserva de usufruto apenas para um dos progenitores.
4. É inválida a doação exclusiva do usufruto para um dos progenitores.
(Sumário da Relatora)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: ACORDAM NA 7ª SECÇÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA
           
I - Relatório
            1. G demandou N, pedindo que seja declarado parcialmente nulo o contrato de doação, e em consequência seja declarado que o direito de usufruto em nome da R., relativo à fração identificada, constituído por escritura pública de doação, faz parte do património comum do dissolvido casal formado pelo A. e R., e retificado o registo predial, anulando-se a inscrição, e inscrevendo-se oficiosamente o usufruto da identificada fração a favor do A. e da R., atualmente divorciados.
            2. Alega para tanto que contraiu casamento civil com a R. no dia 30 de julho de 1992, sem convenção antenupcial, tendo por escritura de 14 de julho de 1999 adquirido a fração autónoma identificada. Também por escritura pública de doação de 20 de maio de 2004, foi doado por conta da sua quota disponível, com dispensa de colação, a nua propriedade da fração autónoma aos filhos menores de ambos, com reserva de usufruto somente a favor da R., doadora.
            Por decisão proferida em 8 de março de 2005, no âmbito de processo de divórcio por mútuo consentimento foi dissolvido o casamento entre o A. e a R.
            A doação exclusiva do usufruto à R. é inválida, uma vez que a reserva de usufruto em benefício da mesma coenvolveu uma doação do marido à mulher à custa de bens comuns do casal, sendo parcialmente nula, e consequentemente o usufruto reservado deve ser considerado incluído nos bens comuns, ainda não partilhados, do dissolvido casal.
            O princípio da livre e irrenunciável revogabilidade da doação entre casados, permite a conclusão no sentido de que mesmo que a presente doação não estivesse parcialmente ferida de nulidade, a sua revogação pelo A., seria sempre possível a todo o tempo.
3. Citada veio a R. contestar.
4. Foi proferido saneador sentença que julgou procedente a ação, declarando parcialmente nulo o contrato de doação celebrado entre A. e R., determinando-se que o direito de usufruto titulado em nome da R, relativo à fração identificada, faz parte do património comum do dissolvido casal formado por aquela e pelo A., atualmente divorciados, determinando-se a retificação do registo predial por forma a que seja anulada a inscrição e oficiosamente inscrito o usufruto da identificada da fração a favor da A e R, atualmente divorciados.
5. Inconformada, veio a R. interpor recurso de apelação, formulando nas suas alegações as seguintes conclusões:
§ Há manifesta omissão de pronúncia, pois a sentença não trata e nem sequer refere o regime excecional da validade da doação nos termos e ao abrigo do disposto pelo art.º 1763, n.º 3, do CC – o que torna a decisão nula nos termos do preceituado no art.º 668, n.º1, d) do CPC.
§ A Recorrente e o Recorrido não quiseram doar e receber o usufruto do bem e, antes escolheram essa forma para partilhar os bens.
§ O Recorrido recebeu os valores dos saldos bancários do casal, tendo-os exigido previamente.
§ A doação do bem aos filhos do casal com reserva de usufruto para a ora Recorrente é permitido excecional e expressamente pelo disposto no art.º 1763, n.º 3, do CC.
§ O ora Recorrente, ao vir agora a Juízo, evidencia clamorosa má fé.
§ Deve ser condenado em multa e em indemnização a favor da Recorrente, a fixar pelo prudente arbítrio do Tribunal.
§ Revogando-se a decisão recorrida, como confiadamente se espera.
            6. Nas contra-alegações o A. pronunciou-se no sentido da manutenção do decidido, não podendo ser considerado o factualismo alegado em sede de alegações, nem atendidos os documentos também ali apresentados.
7. Cumpre apreciar e decidir.
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            II – Os factos
            Na sentença sob recurso foram considerados como provados os seguintes factos:
1. Autor e Ré contraíram, entre si, casamento civil, no dia 30 de julho, de 1992, sem convenção antenupcial.
2. Por escritura pública de compra e venda de 14 de julho de 1999, A. e Ré adquiriram a fração autónoma designada por letra “D”, correspondente ao primeiro andar esquerdo para habitação do prédio urbano em propriedade horizontal,…..
3. A fração identificada no artigo anterior, composta por cozinha, 2 casas-de-banho, cinco assoalhadas, arrecadação, era a residência e o lar conjugal do casal formado nessa data pelo A. e Ré.
4. Por escritura pública de doação de 20 de maio de 2004, A. e Ré doaram por conta da quota disponível, com dispensa de colação, a nua propriedade da fração autónoma identificada no artigo anterior aos filhos menores de ambos, com reserva de usufruto somente a favor da ora Ré, doadora.
5. Por decisão proferida em 8 de março de 2005, no âmbito de processo de divórcio por mútuo consentimento que correu termos na Conservatória do Registo Civil de 2005, data em que transitou em julgado, foi dissolvido o casamento entre A. e Ré.
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III – O Direito
Como se sabe o objeto do recurso é definido pelas conclusões apresentadas pelo recorrente, importando em conformidade decidir as questões nelas colocadas, bem como as que forem de conhecimento oficioso, artigos 684.º, n.º 3, 660.º, n.º 2, e 713.º, todos do CPC, pelo que nessa consideração, a apreciar está se a sentença padece da arguida nulidade, se deveria ter improcedido a pretensão formulada, não sendo declarada a nulidade parcial da doação, bem como saber se o Recorrido litiga de má fé.

Da nulidade 
Pretende a Apelante que a sentença enferma de nulidade, no atendimento do disposto no n.º1, d) do art.º 668, do CPC, na mediada em que na mesma não foi apreciado o regime excecional da validade da doação ao abrigo do disposto no art.º 1763, n.º 3, do CC.
Conhecendo, no concerne a tal nulidade, nos termos do art.º 668, n.º1, d) do CPC, verifica-se a mesma, quando o juiz deixa de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar, em violação do disposto no art.º 660, n.º 2, do CPC, isto é, do dever, por parte do juiz, de não ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras, assim como de resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.
Refira-se que as questões que o juiz deve conhecer se reportam às pretensões formuladas, não estando obrigado a apreciar todos os argumentos ou fundamentos que as partes indiquem para fazer valer o seu ponto de vista, sendo certo que, quanto ao enquadramento legal, não está o mesmo sujeito às razões jurídicas invocadas pelas partes, pois o julgador é livre na interpretação e aplicação do direito, art.º 664, do CPC.
Retenha-se que o conhecimento duma questão pode ser feito com uma tomada de posição direta sobre a mesma, mas também muitas vezes resulta da apreciação de outras com ela conexionadas, por a incluírem ou excluírem, sendo assim decidida de forma implícita, advindo da apreciação global da pretensão formulada em juízo, o respetivo afastamento.
Por último saliente-se que as nulidades da sentença, como seus vícios intrínsecos, devem ser apreciados em função do texto e discurso lógico nela desenvolvida, não se confundindo com os erros na apreciação da matéria de facto, e possíveis ilações dela retirada, ou com a errada aplicação das normas jurídica aos factos dados como apurados, que constituem erros de julgamento, a sindicar noutro âmbito.
Na decisão sob recurso, apreciando os termos em que são permitidas as doações entre casados, considerou-se que a situação sob análise não estava contemplada, no atendimento do princípio da imutabilidade das convenções antenupciais e dos regimes de bens, concluindo-se em conformidade, pela nulidade da doação em referência.
Avulta assim, que no enquadramento jurídico realizado foi atendido o normativo que se entendeu aplicável ao caso dos autos, e desse modo, implicitamente afastando o entendimento divergente realizado pela Recorrente, no sentido da validade da doação realizada, pelo que, sem prejuízo da bondade do decidido, a sindicar em momento oportuno, não resulta que tenha ficado por conhecer questões que o devessem ser, inexistindo a arguida nulidade.

Da nulidade da doação.
Como já acima se mencionou, entendeu-se na decisão sob recurso que a doação de quota parte de usufruto do Recorrido à Recorrente enquanto violadora de norma imperativa era nula, nos termos do art.º 280, do CC, por o usufruto fazer parte dos bens comuns do dissolvido casal, tendo presente o princípio da imutabilidade dos regimes de bens.
Insurge-se a Recorrente contra o decidido invocando o disposto no art.º 1763, n.º 3, do CC, afastando a proibição no concerne às reservas de usufruto, referindo ser possível aos cônjuges fazerem doações de bens próprios, mas também de bens comuns, mais aduzindo que no caso concreto, em rigor, não se tratou de uma doação do usufruto do Recorrido a seu favor, mas sim uma efetiva partilha, pois este último exigiu-lhe previamente a emissão de duas declarações obrigando-a a abdicar da metade que lhe pertencia nas contas existentes nas instituições bancárias, acrescido do facto de a casa doada suportar ainda o peso de parte da dívida hipotecária resultante da sua aquisição, que os pais da Apelante pagaram, sendo que a doação do usufruto e as declarações para o Banco foram as condições essenciais para os então cônjuges se divorciarem.
Apreciando.
Resulta do enunciado que a Recorrente pretende invocar que o negócio efetivamente visado com a celebração da doação do imóvel nos termos realizados, maxime com a exclusiva reserva do usufruto a seu favor, se consubstancia numa verdadeira partilha do património comum do casal, anterior à dissolução do casamento e mesmo condição para o mesmo.
Como se sabe constitui princípio básico e elementar em matéria de recursos, a reapreciação de decisões proferidas pelos tribunais recorridos, art.º 676, n.º 1, do CPC, e assim a respetiva modificação através do reexame da matéria nela constante, e não a criação de decisão sobre matéria nova, resultando da natureza e função processual do recurso, que ao tribunal ad quem está vedada a possibilidade de se pronunciar sobre matéria não submetida à apreciação do tribunal a quo, por não devidamente enunciada, em tempo oportuno nos articulados.
Admitindo-se que não se está no estrito âmbito de uma questão ex novo, na medida que ainda abrangida numa ampla discussão da validade da doação efetuada, por referenciada em sede de contestação, certo é, que em tal articulado, a Recorrente limitou-se a mencionar que deveria tal doação ser entendida como uma verdadeira partilha dos bens do casal, ficando para o Apelado, como resultado da partilha realizada, subentende-se, as contas bancárias, carteiras de títulos e diversos bens móveis.
Ora, o assim afirmado, e controvertido[1] não tem a dimensão do que agora em sede de alegações a Recorrente vem desenvolver, afirmando que a vontade das partes foi efetivamente a de realizar uma partilha, diremos, antecipada, dos bens do casal, constituindo a condição para o divórcio, com a exigência prévia de declarações abdicando das contas bancárias, e sendo suportado, posteriormente, pelos pais da Apelante, o pagamento dos encargos ainda existentes sobre o imóvel em causa.
Evidenciado se torna que não pode ser atendido o factualismo invocado pela Recorrente para fazer valer a sua pretensão, e em conformidade de igual modo irrelevam os documentos juntos com as alegações, reportando-se a declarações que previamente lhe teriam sido exigidas pelo Recorrido, obrigando-a a abdicar de contas de que era titular, datadas de 3 de fevereiro de 2005[2], como resulta, aliás do disposto nos artigos 524.º, e 693.º-B, do CPC[3].
Assim sendo, o enquadramento a realizar terá de ater-se, necessariamente, ao negócio que foi efetuado e que resultou apurado, cuja existência não é questionado, e que se prende com a realização da doação em causa, tendo desse modo presente que estamos perante um contrato pelo qual alguém, por espírito de liberdade, e à custa do seu património, dispõe, gratuitamente, de uma coisa, ou de um direito, ou assume uma obrigação em benefício do outro contratante, art.º 940, do CC, configurando-se, sobretudo, como um ato pelo qual se atribui a outrem uma vantagem patrimonial, com uma efetiva diminuição do património do doador, num verdadeiro espírito de liberalidade, isto é, em termos de simples generosidade ou espontaneidade, sem qualquer outra intenção[4], importando apenas sacrifícios económicos para o mesmo[5].
Previu também a lei, no art.º 958, do CC, que o doador possa reservar para si ou para terceiro o usufruto dos bens doados, sem prejuízo, claro está, da aceitação em termos gerais, pelo donatário da nua propriedade, conforme o art.º 945, n.º1, do CC[6].
Ora, no concerne às doações entre cônjuges, reguladas nos artigos 1761 a 1766, do CC, a que se aplica subsidiariamente as disposições constantes dos já mencionados artigos 940 a 979, também do CC, facto desde logo indiciador da especialidade do regime em causa, a respetiva admissão não é feita sem reservas, a que subjazem razões que estão presentes quanto à proibição dos cônjuges alterarem livremente o seu regime de bens, razões essas que respeitam, sobretudo, ao receio da existência de um ascendente ou influência de um dos cônjuges sobre o outro, numa beneficiação irrefletida, a que não será estranha a vivência comum, com a ideia que tudo “fica em família”, mas também considerando os interesses de terceiros, maxime os credores dos cônjuges, transformando, segundo a conveniência de momento, bens comuns em próprios ou vice versa[7].
Estabelecida um proibição genérica de os cônjuges fazerem doações um ao outro em todas as situações em que vigore o regime de separação de bens, art.º 1762, do CC, bem como a livre revogabilidade, art.º 1765, n.º1, do CC, vedadas estão também as doações recíprocas no mesmo ato, art.º 1763, n.º2, ainda do CC, neste caso pretendo o legislador com tal proibição preservar a liberdade e espontaneidade da vontade do doador, afastando as possíveis pressões entre os condoadores, assim como a eventual ideia de reciprocidade, que impondo-se também aos cônjuges, levará a que seja contrariada a referenciada livre revogabilidade[8].
Admite-se, contudo que os cônjuges façam a doação a terceiros de bens comuns, com cláusula de reserva de usufruto desses bens até à morte do último doador, pois embora tal cláusula se consubstancie numa verdadeira doação, no mesmo ato, de cada um dos cônjuges aos outros, a mesma reporta-se à atribuição de usufruto feita a favor do outro, sobrevivendo ao cônjuge doador, conforme o disposto no art.º 1763, n.º 3, do CC, surgindo como situação paradigmática, o caso dos pais fazerem a doação aos filhos de determinado bem comum, com cláusula de reserva de usufruto desses bens até à morte do último dador.
Sem prejuízo de tal situação, as doações entre cônjuges só podem ter por objeto bens próprios do doador, art.º 1764, n.º1, do CC, proibidas estando assim as doações de bens comuns, entendidas como verdadeira violação do princípio da imutabilidade do regime de bens, como resulta do art.º 1714, do CC, numa defesa efetiva do património comum em termos da respetiva certeza, com relevância nomeadamente na salvaguarda dos direitos de credores de ambos os cônjuges[9].
Reportando-nos aos autos, contrariamente ao que pretende a Recorrente, no atendimento dos factos atendíveis porque apurados, não se evidencia que a doação realizada pelas aqui partes a favor dos seus filhos, com reserva de usufruto apenas quanto à Apelante se traduza na situação enunciada no mencionado disposto no art.º 1763, n.º 3, do CC, tendo em conta o que naquele normativo se estipula.
Por sua vez, não se questionando a natureza comum do bem objeto de doação, manifesto se torna, que conforme o decidido carece a mesma de validade, pois o direito de usufruto faz parte do património comum do dissolvido casal, inexistindo assim fundamento para acolher a pretensão formulada pela ora Recorrente.

Da má fé
Pretende a Recorrente que o Apelado seja condenado como litigante de má fé, em multa e indemnização a seu favor, a fixar pelo Tribunal, considerando o alegado pela mesma no presente recurso, e tendo em conta a atuação daquele, traduzida na interposição da presente ação.
Apreciando.
Determina o art.º 456, do CPC, que deverá ser considerado como litigante de má fé, e como tal condenado em multa e indemnização à parte contrária, se a pedir, quem, com dolo ou negligência grave, incorrer em algumas das condutas descritas no n.º2 do mesmo preceito.
A condenação prevista em tais termos, consubstancia um verdadeiro juízo de censura sobre a atitude processual das partes, face ao uso que as mesmas possam ter feito dos mecanismos legais postos ao seu dispor.
Ora, em termos breves não se configura que o facto de o Recorrido ter vindo a juízo, formulando o pedido que fez, assente nas razões aduzidas, se consubstancie em alguma das condutas que permitam a formulação do juízo de censura determinativo da condenação do mesmo como litigante de má fé, pelo que sem mais considerações, por despiciendas, não se justifica a condenação em tais termos.
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Improcedem, decorrentemente, e na totalidade, as conclusões formuladas.
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IV – DECISÃO
Nestes termos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação, em julgar improcedente a apelação, confirmando a sentença recorrida.
Custas pela Apelante, sem prejuízo do apoio judiciário concedido.
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Lisboa, 23 de abril de 2013

Ana Resende
Dina Monteiro
Luís Espírito Santo      
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[1] Na ata da audiência preliminar, a fls. 71, fez-se constar que “De seguida foi facultado às partes a possibilidade de discussão de facto e de direito nos termos do art.º 508.º-A 1 al. b) do CPC ao que os Ilustres Mandatários reafirmaram o alegado de facto e de direito nos respetivos articulados. Após o debate sobre as questões de direito que o processo suscita foi proferido o seguinte despacho: O Tribunal e as partes concordam que o processo contém todos os elementos necessários para proferir o despacho saneador/sentença até porque se trata de uma questão de apreciação de Direito, sem necessidade de produção de mais provas para além da documental e da que resulta do acordo das partes. Termos em que, determino que se abra conclusão para proferir sentença, sendo que as partes oportunamente serão notificadas da mesma”.
[2] A escritura pública de doação, foi celebrada em 20 de maio de 2004.
[3] As partes podem juntar documentos às alegações nos casos excecionais a que se refere o art.º 524, do CPC, no seu n.º1, referindo que depois do encerramento da discussão só são admitidos, no caso do recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível, até àquele momento e no n.º 2, os documentos destinados a provar factos posteriores aos articulados, ou cuja apresentação se tenha tornado necessária, podem ser oferecidos em qualquer estado do processo. Da articulação das disposições legais referenciadas, resulta que é admissível, ou se justifica, a junção de documentos com as alegações de recurso em duas situações distintas, a saber, no caso de não ter sido possível a sua apresentação até ao encerramento da discussão da 1ª instância, ou, segunda situação, quando a junção apenas se torne necessária em virtude do julgamento proferido na 1ª instância. Na primeira das hipóteses, compreendem-se os casos de a parte não ter conhecimento da existência do documento, ou conhecendo-a, não lhe ter sido possível fazer uso dele, bem como quando o documento se formou ulteriormente, sendo necessário, para que a junção se considere lícita, que a parte que apresenta o documento demonstre que não lhe foi possível juntar os documentos até ao encerramento da discussão na 1ª instância. Já na segunda hipótese, não se pretende contemplar as situações em que a parte ficou surpreendida com o desfecho da causa, maxime, não ter obtido o respetivo ganho, quando acreditava que tal fosse ocorrer, pois nesse caso já podia, e deveria, ter apresentado o documento em 1ª instância.
[4] Cfr. Luís Menezes Leitão, Direito das Obrigações, Vol III, pag. 194 e segs.
[5] Não existe qualquer contrapartida pecuniária em relação à transmissão dos bens ou da assunção das dívidas, não se verificando a onerosidade mesmo no caso da doação com encargos, nos termos do art.º 963, do CC, que segundo o Autor acima referenciado, não constituem contrapartidas da atribuição patrimonial do doador, mas meras restrições à liberalidade (fls. 198)
[6] Relativamente às doações puras, isto é, as que não têm encargos, quanto àqueles que por incapacidade não podem contratar, a lei dispensa a intervenção dos respetivos representantes, ou aceitação do incapacitado – menor, interditado ou inabilitado – pois produzem efeitos, independentemente dessa aceitação, em tudo o que aproveitar a tais donatários, art.º 951, n.º2, do CC.
[7] Cfr. Francisco Pereira Coelho e Guilherme de Oliveira, in Curso de Direito da Família, volume I, pag. 457 e seguintes, que neste segmento de perto se segue.
[8] Cfr. Autores e obra acima referenciados, a fls. 458.
[9] Cfr. neste sentido, para além dos Autores já mencionados, na obra mencionada, Pires de Lima e Antunes Varela, in Código Civil Anotado, vol. IV, pag. 492, Luís Menezes Leitão, obra citada, fls. 228, Jorge Duarte Pinheiro, in Direito de Família Contemporâneo, fls. 611.