Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
3920/2007-6
Relator: FERNANDA ISABEL PEREIRA
Descritores: SUSPENSÃO DE DELIBERAÇÃO SOCIAL
INDEFERIMENTO LIMINAR
DIREITO REAL DE HABITAÇÃO PERIÓDICA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 07/12/2007
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: AGRAVO
Decisão: REVOGADA A DECISÃO
Sumário: I – Tendo sido ordenada a citação da requerida para os termos do recurso e da causa no despacho que admitiu o recurso de agravo do indeferimento liminar da petição do procedimento cautelar interposto pelos requerentes, sobre este despacho, que não foi impugnado e versou unicamente sobre a relação processual, formou-se caso julgado formal, adquirindo força obrigatória dentro do processo (artigo 672º), não sendo já passível de qualquer juízo de reponderação.
II – Vindo a requerida, na sequência do mesmo despacho, oferecer a sua oposição, à qual os requerentes responderam através da apresentação de nova alegação de recurso, é manifesto que a oposição da requerida é extemporânea por ter sido apresentada antes de tempo, visto que o prazo para a prática de tal acto só se iniciaria com a notificação em primeira instância da eventual revogação do despacho de indeferimento liminar.
(nº 4 do artigo 234º-A).
III - Dessa extemporaneidade não deriva qualquer consequência, designadamente a sua inadmissibilidade. Tal como sucede quando as partes oferecem os meios de prova com a petição inicial nos casos em que deveriam fazê-lo apenas no momento previsto no artigo 512º, praticado o acto antes de tempo, apenas se aguardará que surja o momento processual adequado para ser tomado em consideração e, nesse caso, dele extrair as consequências legais.
IV - Assim, a oposição apresentada não conferia aos requerentes o direito de apresentar nova alegação de recurso, ainda que sob o pretexto do exercício do direito do contraditório, só podendo agir dentro do quadro legal subsequente ao exercício do contraditório previsto nos artigos 385º a 388º.
V - Fixando a citação “os elementos definidores da instância”, é lícito ao autor ou requerente proceder à modificação subjectiva ou objectiva da instância desde que a mesma preceda a citação, só sendo a instância alterável, depois da citação ocorrer, se a lei geral ou especial o permitir, nomeadamente o disposto nos artigos 269º a 273º.
VI - Aos titulares de direito real de habitação periódica é reconhecido o direito de integrar a respectiva assembleia geral, pressupondo a sua participação nesta o prévio conhecimento das questões que nela serão objecto de discussão e que lhes sejam facultados todos os elementos necessários a essa participação, nomeadamente, as contas respeitantes à utilização das prestações periódicas pagas pelos referidos titulares e as dotações do fundo de reserva (artigos 34º e 35º do DL nº 275/93, de 5 de Agosto, alterado pelo DL 180/99, de 22 de Maio, e pelo DL 22/2002, de 31 de Janeiro), diploma que teve, além do mais, em vista reforçar o grau de protecção dos adquirentes de direitos reais de habitação periódica.
VII – Tendo a requerida pedido a suspensão das deliberações e tendo ocorrido a citação de, pelo menos, um dos requeridos no respectivo procedimento cautelar, não podem tais deliberações ser executadas, pelo que não permitem que os requerentes nelas se fundamentem para alcançar o que propõem com o presente procedimento cautelar (artigo 397º nº 3).
VIII – Donde a falta a demonstração, mesmo sumária, da existência de lesão grave ou dificilmente reparável do direito invocado pelos requerentes, o que não significa desprotecção dos direitos que se arrogam, uma vez que podem sempre impugnar as deliberações que vierem eventualmente a ser tomadas e que considerem contrárias à lei e lesivas dos seus interesses.
F.G.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:
1. Relatório:
Associação de Titulares de Direitos Reais de Habitação Periódica do Aparthotel (…) e outros, moveram a presente providência cautelar inominada contra D,
pedindo que, sem audição desta, se ordene que a mesma:
- envie, até 25 de Maio de 2006, a todos os titulares de semanas constituídas em Direitos Reais de Habitação Periódica do Aparthotel … , novas cartas registadas de convocação para a continuação da assembleia geral do empreendimento em 24 de Junho de 2006, a realizar em Lisboa, no local que entretanto for escolhido pelo presidente da mesa da assembleia geral, a comunicar à R;
- faça constar da referida convocatória a Ordem de Trabalhos, definida e assinada pelo presidente da mesa da assembleia geral;
- nas novas contas a apresentar forneça a indicação de todas as semanas cujas taxas de manutenção relativas ao ano de 2005 foram pagas e bem assim de todas as que não foram pagas relativas ao mesmo ano, incluindo a identificação de todas as semanas, pagas e não pagas, por número de apartamento e por número de semanas, conforme consta da deliberação aludida no artigo 51°, supra;
- faça seguir, com a convocatória, um extracto da acta da sessão da assembleia geral de 30.03.2006 e todo o material informativo exigido pela deliberação de suspensão da discussão dos pontos 1 °, 2°, 4° e 5° da assembleia convocada para 30.03.2006, deliberação essa aludida no artigo 51°, supra, a saber:
- cópia do Regulamento Interno da Associação de Titulares do Aparthotel, aprovado pela assembleia geral em 30.03.2006;
- cópia dos considerandos justificativos da necessidade de aprovação de um Regulamento Interno da Associação de Titulares do P que o titular J apresentou com o requerimento dirigido ao presidente da assembleia geral em 31.01.2006 e que este comunicou à R. por carta registada com aviso de recepção de 08.02.2006;
- entregue ao presidente da mesa da assembleia geral uma lista geral de titulares de semanas constituídas em Direitos Reais de Habitação Periódica do Aparthotel por nomes, moradas, números de semanas e números de apartamentos respectivos, e bem assim uma lista geral das semanas de que é proprietária a R, por números de semanas e respectivos apartamentos;
- essas listas sejam entregues ao presidente da mesa, com pelo menos oito dias de antecedência em relação à data da continuação da assembleia geral, em 24 de Junho de 2006;
- quando assim se não entenda, deve a Requerida ter disponível, na assembleia geral a continuar em 24 de Junho de 2006, urna lista geral de titulares de semanas constituídas em Direitos Reais de Habitação Periódica do Aparthotel, por nomes, moradas, números de semanas e números de apartamentos respectivos, e bem assim uma lista geral das semanas de que é proprietária a R, por números de semanas e respectivos apartamentos.
Para tanto, alegaram, em suma, que:
- a Requerida é dona da nua propriedade do prédio urbano sito em Vilamoura, freguesia de Quarteira, concelho de Loulé, constituído em regime de Direitos Reais de Habitação Periódica, e gestora do empreendimento turístico denominado Aparthotel (…) tem por objecto aquele prédio;
- em 30.03.2006 realizou-se a assembleia geral de titulares do P, que ficou suspensa para continuar em 24 de Junho de 2006;
- nessa assembleia geral de 30.03.2006 foi aprovada a constituição da Associação de Titulares de Direitos Reais de Habitação Periódica do Aparthotel … e o seu Regulamento Interno;
- os requerentes são titulares de semanas vendidas;
- na anterior assembleia geral do P, realizada em 31.03.2005, o presidente da assembleia geral, o requerente S, exigiu que a Ordem do Dia fosse por si elaborada, a qual incluía o Relatório de Gestão e as Contas apresentadas pela requerida sem que esta colocasse qualquer obstáculo ou objecção;
- nessa assembleia geral de 31.03.2005 foi, além do mais, deliberado que a assembleia geral de 2006 se realizasse em Lisboa, no último sábado de Março ou no primeiro sábado de Abril, tendo a requerida instaurado procedimento cautelar de suspensão dessa deliberação, mas só na parte em que foi deliberado que a assembleia se realizasse em Lisboa;
- a requerida impediu que a Ordem de Trabalhos da assembleia geral de 2006 fosse elaborada e assinada pelo presidente da assembleia geral;
- a requerida convocou a assembleia geral para Vilamoura e para o dia 30 de Março de 2006;
-a requerida omitiu da convocatória pontos cuja inclusão havia sido ordenada pelo presidente da assembleia geral pela carta de 08.02.2006, fazendo incluir na convocatória outros pontos do interesse dela própria;
- a requerida também não cumpriu a ordem do presidente da assembleia geral, dada por carta registada com A/R de 24.02.2006;
- a requerida não forneceu ao presidente da mesa uma lista de todos os titulares de semanas em DRHP do Aparthotel, pelos seus nomes, moradas, números de semanas e respectivos apartamentos;
- a requerida recusa-se a entregar ao presidente da mesa da assembleia geral listas de todos os titulares de semanas em DRHP por aquele solicitadas;
- a requerida recusa-se a cumprir deliberações tomadas na assembleia geral de 31.03.2005;
- a requerida nunca deu conhecimento aos titulares de semanas constituídas em RDHP de que era proprietária apenas da raiz ou nua propriedade do edifício;
- e nunca prestou contas aos titulares do uso e fruição de todos os espaços do edifício que têm vindo a usar e usufruir com seu benefício exclusive;
- na assembleia geral de 30.03.2006 foi aprovado, por unanimidade, que a requerida fosse convidada a prestar contas desse uso e fruição e, bem assim, cópia de todos os contratos celebrados no uso e fruição dos referidos espaços;
- e foi convidada a elaborar novas contas;
- foi também deliberado que a convocatória para a continuação da assembleia geral de 30.03.2006, em 24 de Junho de 2006, fosse elaborada e assinada pelo presidente da mesa da assembleia geral;
- e foi deliberado que fossem enviadas novas cartas aos titulares de semanas constituídas em DRHP, com as novas contas apresentadas e a dar notícia de que a assembleia geral continuaria em 24 de Junho de 2006;
- apesar de ter abandonado os trabalhos da assembleia geral de 30.03.2006, a requerida tem conhecimento dessa deliberação de suspensão da discussão em virtude de o presidente da mesa da assembleia geral lhe ter enviado cópia dessa deliberação;
- todo o comportamento da requerida cria o fundado receio de que a R persista em não cumprir as determinações do presidente da assembleia geral e as deliberações da assembleia geral;
- e a falta das listas e o incumprimento das deliberações impedem os titulares de semanas constituídas em DRHP de exercer na plenitude os seus direitos nas assembleias gerais;
- nem existe a garantia de que a requerida cumpra a deliberação da assembleia geral de 30.03.2006 de enviar novas cartas aos titulares de semanas em DRHP a dar conta de que a assembleia geral continua em 24 de Junho de 2006, e em Lisboa, e os titulares de semanas em DRHP não tem meios adequados a compelir a requerida, em tempo útil, a enviar as cartas convocatórias.

Por despacho proferido em 31 de Outubro de 2006 (fls. 382) determinou-se a apensação a estes autos do procedimento cautelar instaurado, em 4 de Maio de 2006, pelo Dr. e J, por se verificar uma situação de litisconsórcio voluntário.

Invocando a pendência do citado procedimento cautelar de suspensão de deliberação social movido pela requerida e de procedimento cautelar não especificado também por esta requerido com vista à convocação de uma assembleia geral extraordinária, vieram os requerentes deduzir a ampliação do seu pedido inicial, de modo a que:
-se ordene à gestora do empreendimento P, D, S.A., que a convocatória da assembleia geral a realizar no primeiro trimestre de 2007, incluindo a sua Ordem de Trabalhos, seja elaborada e assinada pelo presidente da assembleia geral do P;
- se ordene à gestora do empreendimento P, D., S. A., que entregue ao presidente da assembleia geral uma lista geral de titulares de semanas constituídas em direitos reais de Habitação Periódica do Aparthotel, por nomes, moradas, números de semanas e números de apartamentos respectivos, e bem assim uma lista geral das semanas de que é proprietária a R, por números de semanas e respectivos apartamentos;
- que essas listas sejam entregues ao presidente da mesa com pelo menos oito dias de antecedência em relação à data da realização da assembleia geral;
- quando assim se não entenda, deve a Requerida ter disponível, na referida assembleia geral, uma lista geral de titulares de semanas constituídas em direitos Reais de Habitação Periódica do Aparthotel, por nomes, moradas, números de semanas e números de apartamentos respectivos, e bem assim uma lista geral das semanas de que é proprietária a R, por números de semanas e apartamentos.

A ampliação do pedido foi indeferida com fundamento em que se não verificava o circunstancialismo previsto na parte final do n.°2, do artigo 274°, do Código de Processo Civil.
O procedimento cautelar foi liminarmente indeferido por falta de alegação de um dos requisitos para a sua eventual procedência – a lesão grave ou dificilmente reparável do direito dos requerentes.
Destas decisões agravaram os requerentes.

Alegaram e formularam as seguintes conclusões:
1ª A ampliação do pedido inicial, efectuada pelos Requerentes a fls. 381 e segs., é legal, visto que a Requerida ainda não fora citada, pelo que, ao contrário do decidido pelo tribunal a quo, não é aplicável o disposto no art° 273°, do C. P. Civil, sendo que, antes da citação do réu, os autores podem livremente alterar qualquer elemento da relação jurídica processual, nos termos do preceituado no art° 268° do mesmo diploma; 2ª As convocatórias das assembleias gerais de titulares de direitos reais de habitação periódica e, bem assim, a definição das respectivas Ordens do Dia competem ao presidente da mesa da assembleia geral e não ao administrador do empreendimento;
3ª Os Requerentes têm o direito de exigir que a convocatória e a definição da Ordem do Dia da assembleia geral do P a realizar no 1° trimestre de 2007, nos termos do disposto no n° 4 do art° 34° do DL n° 275/99, de 5 de Agosto, na redacção do DL n° 180/99, de 22 de Maio, seja elaborada e assinada pelo presidente da mesa da assembleia geral e, bem assim, o direito de exigir que a Requerida forneça as listas referidas nos números 2°, 3° e 4° do pedido ampliado, formulado a fls. 381 e segs.;
4ª Os Requerentes têm direito a que, nas contas a apresentar pela Requerida relativas ao exercício de 2005, esta forneça a indicação de todas as semanas cujas taxas de manutenção relativas ao mesmo ano foram pagas e, bem assim, de todas as que não foram pagas, com identificação de todas as semanas, pagas e não pagas, por números de apartamentos e por números de semanas, conforme consta da deliberação a que se refere o ad° 51° do Requerimento da providência;
5ª Os Requerentes têm direito a que, com a convocatória da assembleia geral em continuação da de 30 de Março de 2006, seja enviado um extracto da acta desta última assembleia geral e todo o material informativo exigido pela deliberação de suspensão da discussão dos pontos 1°, 2°, 4° e 5° da assembleia convocada para 30 de Março de 2006, deliberação essa aludida no art° 51° do Requerimento da providência;
6ª Os Requerentes têm direito a que a Requerida forneça os elementos referidos nos números 5°, 6° e 7° do pedido inicial;
7ª O comportamento da Requerida, descrito nos artigos 13° a 70° do Requerimento da providência constitui uma grave lesão dos direitos dos Requerentes;
8ª Tal comportamento da Requerida faz presumir que a ela persistirá no comportamento gravemente lesivo dos direitos dos Requerentes, pelo que se verifica o fundado receio destes de que essa grave lesão continue a verificar-se, quer em relação à convocatória da assembleia geral do 1° trimestre de 2007 quer no que toca à convocação da assembleia geral de continuação da assembleia geral de 30 de Março de 2006;
9ª Tal grave lesão é de difícil reparação, em virtude de, se a Requerida convocar qualquer dessa assembleias em violação dos direitos dos Requerentes, já não haver possibilidade prática de conseguir que os tribunais, através de qualquer providência, ordenem que essas assembleias não se realizem nos termos definidos pela Requerida.
Termos e que deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, devem ser revogados os despachos sob censura e deve o despacho de indeferimento liminar ser substituído por decisão final que conceda provimento ao pedido de providência, quer o pedido ampliado, formulado a fls. 381 e segs., quer o pedido inicial.
E relação ao pedido ampliado a fls. 381 e se s., deve ser decidido:
a) que se ordene à gestora do empreendimento P, a Requerida, que a convocatória da assembleia geral ordinária a realizar no primeiro trimestre de 2007, incluindo a sua Ordem de Trabalhos, seja elaborada e assinada pelo presidente da mesa da assembleia geral;
b) que se ordene à gestora do empreendimento que entregue ao presidente da mesa da assembleia geral uma lista geral de titulares de semanas constituídas em Direitos Reais de Habitação Periódica do Aparthotel, por nomes, moradas, números de semanas e números de apartamentos respectivos, e bem assim uma lista geral das semanas de que é proprietária a Requerida, por números de semanas e respectivos apartamentos;
c) que essas listas sejam entregues ao presidente da mesa da assembleia geral com, pelo menos, oito dias de antecedência em relação à data da realização da assembleia geral;
d) quando assim se não entenda, deve a Requerida ter disponível, na referida assembleia geral, uma lista geral de titulares de semanas constituídas em Direitos Reais de Habitação Periódica do Aparthotel, por nomes, moradas, números de semanas e números de apartamentos respectivos, e bem assim uma lista geral das semanas de que é proprietária a Requerida, por números de semanas e respectivos apartamentos.
Foram violadas as seguintes disposições legais:
- Os artigos 268° e 273°, ambos do Código de Processo Civil, quanto ao indeferimento da ampliação do pedido;
- Os 381° e 387°, n° 1, do mesmo diploma, no que toca ao indeferimento liminar da providência;
- O artigo 234°-A, n° 3, do mesmo código, uma vez que não ocorre o pressuposto referido na parte final do preceito invocado pelo Mm° Juiz para ordenar a citação da Requerida para os termos do recurso e para os termos da causa.

Citada a requerida para os termos do recurso e da causa, veio deduzir oposição.
Notificada desta, apresentaram os requerentes novas alegações de recurso.
Por despacho proferido em 19 de Fevereiro de 2007 (fls. 784) foi ordenado o desentranhamento destas novas alegações com fundamento em que tal consubstancia a prática de acto anómalo, não previsto na lei, nos termos do disposto no artigo 201º nº 1 do Código de Processo Civil.

De novo inconformados, agravaram os requerentes, os quais formularam na alegação de recurso apresentada a seguinte síntese conclusiva:
1ª O tribunal a quo não deveria ter ordenado a citação da Requerida, antes de os Recorrentes apresentarem a sua Alegação dos recursos que havias interposto;
2ª Assim como não deveria ter ordenado a citação da Requerida antes de ser dada aos Recorrentes a oportunidade de se pronunciarem sobre a legalidade dessa citação;
3ª Tendo sido citada a Requerida - não o devendo ter sido - e tendo esta apresentado Oposição à providência requerida, os Recorrentes tinha, o direito de, na sua Alegação dos recursos que haviam interposto, se pronunciarem sobre o conteúdo da Oposição, mercê do princípio do contraditório;
4ª Donde resulta a ilegalidade do despacho recorrido a ordenar o desentranhamento da nova Alegação dos Recorrentes.
Foram violadas as seguintes disposições legais:
Artigos 234°-A, n° 3, parte final, e 3°, n° 3, ambos do Código de Processo Civil.
Nestes termos, deve revogar-se o despacho que ordenou o desentranhamento dos autos da nova Alegação dos Recorrentes.

Não houve contra alegações.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

2. Fundamentos:
2.1. De facto:
Face à prova documental junta aos autos, única que foi oferecida pelos requerentes, consideraram-se indiciariamente assentes na 1ª instância os seguintes factos:
a) a R. é dona tão somente da raiz ou nua propriedade do prédio referido;
b) em 30.03.2006, realizou-se a assembleia geral de titulares de direitos de habitação
periódica do aparthotel, em Vilamoura, que ficou suspensa para continuar em 24 de Junho de 2006;
c) nessa assembleia geral de 30.03.2006 foi aprovada a constituição de Titulares de semanas constituídas em direitos Reais de Habitação Periódica, vendidas do Aparthotel e o seu Regulamento Interno;
d) os requerentes são titulares de semanas vendidas;
e) em relação à assembleia geral do P de 31.03.2005, o presidente da assembleia geral, o requerente S, exigiu que a Ordem do Dia da assembleia geral fosse por si elaborada, a qual incluía o Relatório de Gestão e as Contas apresentadas pela ora R, e sem que esta colocasse qualquer obstáculo ou objecção;
f) a ora R, discordando da deliberação de que a assembleia geral de 2006 se realizasse em Lisboa, no último Sábado de Março ou no primeiro Sábado de Abril, interpôs providencia cautelar, pedindo a suspensão da dita deliberação, mas só na parte em que foi deliberado que a assembleia se realizasse em Lisboa;
g) a ora R impediu que a Ordem de Trabalhos da assembleia geral de 2006 fosse elaborada e assinada pelo presidente da assembleia geral;
h) a ora R convocou a assembleia geral para Vilamoura e para o dia 30 de Março de 2006;
i) a ora Ré omitiu da convocatória pontos cuja inclusão havia sido ordenada pelo presidente da assembleia geral pela carta de 08.02.2006, fazendo incluir na convocatória outros pontos do interesse dela própria;
j) a ora R também não cumpriu a ordem do presidente da assembleia geral, dada por carta registada com A/R de 24.02.2006;
k) a ora R não forneceu ao presidente da mesa uma lista de todos os titulares de semanas em DRHP do Aparthotel, pelos seus nomes, moradas, números de semanas e respectivos apartamentos;
l) na assembleia geral de 30.03.2006 foi aprovado, por unanimidade, que a requerida fosse convidada a prestar contas desse uso e fruição e bem assim cópia de todos os contratos celebrados no uso e fruição dos referidos espaços;
m) e foi convidada a elaborar novas contas;
n) foi também deliberado que a convocatória para a continuação da assembleia geral de 30.03.2006, em 24 de Junho de 2006, fosse elaborada e assinada pelo presidente da mesa da assembleia geral;
o) e foi deliberado que fossem enviadas novas cartas aos titulares de semanas constituídas em DRHP, com as novas contas apresentadas e a dar notícia de que a assembleia geral continuaria em 24 de Junho de 2006;
p) a requerida abandonou os trabalhos da assembleia geral de 30.03.2006.
Além destes, mostra-se ainda documentalmente provado (fls. 391-427 e 714-719) com relevo para o conhecimento do recurso estoutro facto:
q) A requerida instaurou procedimento cautelar de suspensão de deliberações sociais visando a suspensão das deliberações tomadas na assembleia que se realizou no dia 30 de Março de 2006, nela tendo sido citado, na qualidade de requerido, pelo menos o ora requerente Porfírio Santos.

2.2. De direito:
No âmbito deste processo importa conhecer em primeiro lugar, por uma questão de precedência lógica, do agravo interposto em último lugar, apreciando-se, em seguida, os outros pela ordem da sua interposição.

2.2.1. Está em causa neste recurso o despacho que ordenou o desentranhamento das segundas alegações de recurso apresentadas pelos requerentes, aqui agravantes, sob invocação do exercício do direito do contraditório relativamente à oposição deduzida pela requerida.
Nos procedimentos cautelares o legislador faz depender a citação de prévio despacho judicial, afastando-se do regime geral instituído pelo DL nº 329-A/95, de 12 de Dezembro, que procedeu à eliminação do sistemático controlo jurisdicional liminar em todas as causas logo que apresentada a petição inicial (artigo 234º nº 4 al. b) do Código de Processo Civil, ao qual se referirão todos os preceitos doravante citados sem outra menção expressa).
Consagrando neste caso o regime do indeferimento liminar da petição “quando o pedido seja manifestamente improcedente ou ocorram, de forma evidente, excepções dilatórias insupríveis e de que o juiz deva conhecer oficiosamente”, generalizou os fundamentos do indeferimento liminar, que deixaram de estar reféns de uma enumeração taxativa como até então sucedia.
Do despacho de indeferimento liminar da petição é admissível recurso até à Relação, ainda que o valor da causa esteja contido na alçada dos tribunais de primeira instância, ordenando o despacho que admita o agravo a citação do réu ou requerido, “tanto para os termos do recurso como para os da causa, salvo se o requerido no procedimento cautelar não dever ser ouvido antes do seu decretamento”, e iniciando-se o prazo para a contestação ou oposição com a notificação em primeira instância de que foi revogado o despacho de indeferimento liminar (nºs 2, 3 e 4 do artigo 234º-A).
No caso dos autos, ordenou-se a citação da requerida para os termos do recurso e da causa no despacho que admitiu o recurso de agravo do indeferimento liminar da petição do procedimento cautelar interposto pelos requerentes.
Sobre este despacho, que não foi impugnado e versou unicamente sobre a relação processual, formou-se caso julgado formal, adquirindo força obrigatória dentro do processo (artigo 672º), não sendo já passível de qualquer juízo de reponderação.
Cumprido que foi tal despacho, veio a requerida, na sequência do mesmo, oferecer a sua oposição, à qual os requerentes responderam através da apresentação de nova alegação de recurso.
É manifesto que a oposição da requerida é extemporânea por ter sido apresentada antes de tempo, visto que, como se referiu, o prazo para a prática de tal acto só se iniciaria com a notificação em primeira instância da eventual revogação do despacho de indeferimento liminar (nº 4 do artigo 234º-A).
Dessa extemporaneidade não deriva qualquer consequência, designadamente a sua inadmissibilidade. Tal como sucede quando as partes oferecem os meios de prova com a petição inicial nos casos em que deveriam fazê-lo apenas no momento previsto no artigo 512º, praticado o acto antes de tempo, apenas se aguardará que surja o momento processual adequado para ser tomado em consideração e, nesse caso, dele extrair as consequências legais. Quer isto significar que a oposição só será tomada em consideração em caso de revogação, na procedência do recurso, do despacho de indeferimento liminar.
Assim, a oposição apresentada não conferia, pois, aos requerentes o direito de apresentar nova alegação de recurso, ainda que sob o pretexto do exercício do direito do contraditório, só podendo agir dentro do quadro legal subsequente ao exercício do contraditório previsto nos artigos 385º a 388º.
Logo, a apresentação da nova alegação consubstancia a prática de um acto que a lei não admite, pelo que o despacho recorrido merece inteira confirmação.

2.2.2. Questão essencial a apreciar no recurso do despacho que rejeitou a ampliação do pedido, também interposto pelos requerentes, é a de saber se, no caso sub judice, a sua admissibilidade dependia da verificação dos pressupostos enunciados no artigo 273º.
Ao autor ou requerente cabe conformar inicialmente a instância na petição inicial quer quanto aos elementos subjectivos (quanto às pessoas), quer quanto aos elementos objectivos (pedido e causa de pedir), operando a citação, por força do princípio da estabilidade da instância consignado no artigo 268º, a fixação desses elementos, que devem manter-se, salvas as possibilidades de modificação consignadas na lei.
Porém, como escreve Lebre de Freitas, “Até ao momento da citação o autor pode ainda alterar a conformação por si efectuada, mediante modificação dos sujeitos ou do objecto da acção, sem prejuízo da não retroactividade dos efeitos da proposição que se reportem apenas à nova petição apresente.”(1)
Quer isto significar que, fixando a citação “os elementos definidores da instância”, é lícito ao autor ou requerente proceder à modificação subjectiva ou objectiva da instância desde que a mesma preceda a citação, só sendo a instância alterável, depois da citação ocorrer, se a lei geral ou especial o permitir, nomeadamente o disposto nos artigos 269º a 273º.
Sendo assim, tem de considerar-se admissível a ampliação do pedido deduzida pelos requerentes porque anterior à citação da requerida, não estando, por isso, tal ampliação sujeita à verificação dos pressupostos enunciados no artigo 273º.
Procedem, por conseguinte, as conclusões da alegação dos requerentes nesta parte, pelo que deverá dar-se provimento a este agravo e admitir-se a pretendida ampliação do pedido, o qual se apresenta como o desenvolvimento ou consequência do pedido primitivo.

2.2.3. Resta apreciar o agravo respeitante ao despacho que indeferiu liminarmente o procedimento cautelar.
Os procedimentos cautelares “Representam uma antecipação ou garantia de eficácia relativamente ao resultado do processo principal e assentam numa análise sumária (summaria cognitio) da situação de facto que permita concluir pela provável existência do direito (fumus boni juris) e pelo receio de que tal direito seja seriamente afectado ou inutilizado se não for decretada uma determinada medida cautelar (periculum in mora).”(2)
O procedimento cautelar comum, meio de tutela provisória destinado a acautelar o risco de lesão não especialmente prevenido por alguma das providências tipificadas na lei adjectiva (nº 3 do artigo 381º), pressupõe o fundado receio de lesão grave e dificilmente reparável de um direito (periculum in mora), cabendo ao requerente a demonstração sumária do direito ameaçado e do receio da lesão (artigos 381º nº 1 e 384º nº 1 do Código de Processo Civil).
No caso vertente, os requerentes visam com o presente procedimento cautelar garantir o envio de novas convocatórias para a continuação no dia 24 de Junho de 2006 da assembleia geral de titulares de direitos reais de habitação periódica realizada no dia 30 de Março de 2006, que foi suspensa para continuar naquele dia, com ordem de trabalhos definida e assinada pelo presidente da mesa da assembleia geral e, bem assim, a menção nas contas a apresentar pela requerida, enquanto administradora do empreendimento a que respeitam os títulos reais de habitação periódica em causa, que indicam, o envio de material informativo exigido por deliberação tomada na assembleia de 30 de Março de 2006, de cópia dos considerandos justificativos da necessidade de aprovação do regulamento interno da primeira requerente. Visam ainda garantir a entrega ao presidente da mesa da assembleia geral pela requerida de uma lista geral de titulares de semanas constituídas em direitos reais de habitação periódica do referido empreendimento e das semanas de que a requerida é proprietária ou, pelo menos, que tal lista esteja disponível na assembleia geral a continuar nesse dia 24 de Junho de 2006.
Não se tendo concretizado a continuação da assembleia geral em causa na data prevista nem posteriormente, os requerentes, ampliando o pedido, pretendem que o inicialmente peticionado se verifique também em relação à assembleia geral a realizar no primeiro trimestre de 2007.
Como se escreveu no despacho recorrido, aos titulares de direito real de habitação periódica é reconhecido o direito de integrar a respectiva assembleia geral, pressupondo a sua participação nesta o prévio conhecimento das questões que nela serão objecto de discussão e que lhes sejam facultados todos os elementos necessários a essa participação, nomeadamente, as contas respeitantes à utilização das prestações periódicas pagas pelos referidos titulares e as dotações do fundo de reserva.
É o que decorre do disposto nos artigos 34º e 35º do DL nº 275/93, de 5 de Agosto, (alterado pelo DL 180/99, de 22 de Maio, e pelo DL 22/2002, de 31 de Janeiro), diploma que teve, além do mais, em vista reforçar o grau de protecção dos adquirentes de direitos reais de habitação periódica, atendendo a que os respectivos contratos exigem, na maior parte das vezes, uma tutela particular da parte mais fraca e com tal objectivo aperfeiçoou e/ou completou alguns mecanismos e regras introduzidas já pela legislação anterior, institucionalizando, por exemplo, uma assembleia geral de titulares de direitos reais de habitação periódica, com competências específicas, a fim de lhes atribuir uma adequada, e desejável, participação na vida do empreendimento, sem, contudo, contender com a administração deste pelo proprietário ou cessionário da exploração.
No caso, é seguro, pelo menos quanto aos requerentes titulares de direito real de habitação periódica, o seu direito a participar quer na continuação da assembleia geral prevista para 24 de Junho de 2006, que se não realizou, quer na que, em princípio, previa realizar-se no primeiro trimestre de 2007, daí advindo o seu direito à informação.
Sem entrar na questão de saber se esse direito tem o âmbito que os requerentes lhe atribuem e independentemente da actualidade dos pedidos que formularam, o certo é que não lograram alegrar e demonstrar através da prova documental, única que ofereceram, que a invocada lesão do seu direito é grave e de difícil reparação, como se entendeu no despacho recorrido.
E sobre os requerentes recaía o ónus de alegação e prova, ainda que indiciária, dessa factualidade.
Acresce que alguns dos pedidos formulados, se não mesmo a totalidade, radicam em deliberações tomadas pela assembleia geral realizada no dia 30 de Março de 2006, que foi suspensa para continuar no dia 24 de Junho desse ano.
Ora, tendo a requerida pedido a suspensão dessas deliberações e tendo ocorrido a citação de, pelo menos, um dos requeridos no respectivo procedimento cautelar, não podem tais deliberações ser executadas, pelo que não permitem que os requerentes nelas se fundamentem para alcançar o que propõem com o presente procedimento cautelar (artigo 397º nº 3).
Do exposto decorre, como se concluiu no despacho recorrido, que falta a demonstração, mesmo sumária, da existência de lesão grave ou dificilmente reparável do direito invocado pelos requerentes, pelo que não podem obter a tutela provisória que reclamam.
Tal não significa desprotecção dos direitos que se arrogam, uma vez que os requerentes podem sempre impugnar as deliberações que vierem eventualmente a ser tomadas e que considerem contrárias à lei e lesivas dos seus interesses.
Improcedem, assim, as conclusões da alegação respeitante a este recurso.

3. Decisão:
Nesta conformidade, acorda-se em conceder provimento ao agravo interposto do despacho que não admitiu a ampliação do pedido e revoga-se o mesmo, admitindo-se tal ampliação, e em negar provimento aos restantes agravos, confirmando-se as decisões a que respeitam.
Custas pelos agravantes.
12 de Julho de 2007
Fernanda Isabel Pereira
Maria Manuela Gomes
Olindo Geraldes
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1 In Código de Processo Civil Anotado, Coimbra Editora, vol. 1º, pág. 477.
2 Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, III vol., Almedina, pág. 35.