Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
10632/2006-1
Relator: FOLQUE DE MAGALHÃES
Descritores: PENHORA
CONTA BANCÁRIA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 05/15/2007
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: AGRAVO
Decisão: REVOGADA A DECISÃO
Sumário: I - A nomeação à penhora de saldos bancários, reveste para o exequente certas dificuldades, uma vez que vigorando o «sigilo bancário», não tem por via de regra direito quer à identificação da conta, quer aos elementos da mesma.
II - Relativamente a depósitos bancários, não havendo possibilidade da sua completa identificação pelo exequente, basta, quando este o nomeie à penhora, que indique o estabelecimento respectivo e o titular da conta.
(F.G.)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa:
1. RELATÓRIO:
1.1. Das partes:
1.1.1. Agravante:
1º - BANCO, S.A.
1.1.2. -Agravada:
1º - J... e mulher.
1.2. Acção e processo:
Acção executiva com processo sumário, para pagamento de quantia certa.
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1.3. Objecto do agravo:
A decisão de fls. 88, pela qual foi inferido o requerimento de penhora de saldos de todas e quaisquer contas de depósito que os executados possuam em quaisquer bancos ou instituições financeiras.
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1.4. Questões a decidir: enunciado sucinto:
1. Da penhora dos saldos das contas bancárias dos Executados.
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2. SANEAMENTO:
A decisão recorrida foi mantida.
Foram colhidos os vistos.
Não se vislumbram obstáculos ao conhecimento do mérito do recurso, pelo que cumpre apreciar e decidir.
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3. FUNDAMENTOS:
3.1. De facto:
Factos que este Tribunal considera provados:
1. O Exequente requereu a penhora de saldos de todas e quaisquer contas de depósito que os executados possuam em quaisquer bancos ou instituições financeiras.
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3.2. De direito:
1. O requerimento tal como foi formulado pelo Exequente deve ser indeferido?
2. O fundamento do indeferimento nestes autos cifrou-se na consideração de que tal requerimento não pode ser considerado como “nomeação de bens”, mas antes como “indicação do tipo de bens que se pretende ver penhorados”.
3. É sabido que a lei não afasta da possibilidade de constituir objecto da penhora as quantias depositadas em instituições bancárias ou parabancárias. Tais quantias estão, normalmente, depositadas em contas bancárias que são identificadas por um número que a entidade bancária lhes atribui.
4. Ora, o conhecimento dos elementos identificadores das contas bancárias só cabe às respectivas entidades bancárias, aos respectivos titulares, e, eventualmente, a quem estes autorizarem que seja facultado tal conhecimento.
5. Assim sendo, a não ser que um não titular da conta tenha conhecimento da respectiva identificação, está vedada a possibilidade do conhecimento da identificação das contas em geral, a quem delas não for o seu titular.
6. Quer isto dizer que, pretendendo um exequente nomear à penhora as quantias que eventualmente se encontrem depositadas em contas abertas nas instituições bancárias ou parabancárias, não poderá efectuar uma indicação mais precisa do que a mera referência aos “saldos de contas que o executado seja titular”.
7. Do mesmo modo, como corolário do princípio do sigilo bancário relativamente à identificação da conta, também a própria entidade bancária onde a conta eventualmente esteja aberta está fora do conhecimento do exequente.
8. O que tudo vale por dizer que, em princípio, o exequente não conhece nem a identidade bancária, nem a identificação das contas de que o executado possa ser titular.
9. Daí que não lhe seja possível concretizar mais o objecto da penhora quando pretenda ver penhorado um saldo bancário do que aludir à sua mera referência, tal como o fez o Exequente, sob pena de ficar afastada a penhora de saldos bancários por falta de maior concretização.
10. Vistas as coisas por outro prisma: aos exequentes não lhes é permitido irem de porta em porta averiguar junto de cada instituição bancária da existência de contas concretamente identificadas em que sejam titulares os executados, pois tal informação deve ser recusada, por força do sigilo bancário.
11. Assim sendo, parece que não é possível formular o pedido de penhora em saldos de contas bancárias de modo mais concreto, devendo, por isso, ser deferido, sob pena de só excepcionalmente se poderem penhorar tais contas, ou seja, só quando por acaso o exequente saiba a identificação da conta e da entidade bancária.
12. O comentário à disposição do art. 837º-A do C.P.C. (entretanto revogado) feita por Abílio Neto no seu C.P.C.ANOTADO, 14ª edição, vai exactamente nesta direcção: a razão de ser do preceito encontra a sua justificação na dificuldade, para não dizer impossibilidade, de obter mais elementos identificadores das contas bancárias, por virtude da observação das regras do sigilo bancário.
13. O nº 1 daquele preceito exige que o exequente justificadamente alegue séria dificuldade na identificação de bens penhoráveis do executado para que incumba ao juiz determinar a realização das diligências adequadas. Porém, no caso da penhora de saldos bancários a justificação resulta do facto da vigência da lei do sigilo bancário que é de todos conhecida.
14. A disposição do art. 861º-A do C.P.C., aludida no despacho recorrido, não tem aplicação na resolução deste caso, porque apenas regula o modo de concretizar a penhora de depósitos bancários, ou seja, só tem aplicação ordenada que tenha sido a penhora dos ditos depósitos bancários.
15. Julga-se, por isso, procedente a posição do Recorrente.
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4. DECISÃO:
1. Por tudo o exposto, concede-se provimento ao agravo, e, em consequência, revoga-se a decisão recorrida, a qual é substituída pela seguinte:
“Solicite às entidades bancárias e instituições financeiras a informação da identificação de contas dos Executados, com saldo positivo.”
2. Sem custas (art. 2º nº 1 o) CCJ).

Lisboa, 15 de Maio de 2007.
(Eduardo Folque de Sousa Magalhães)
(Eurico José Marques dos Reis)
(Paulo Jorge Rijo Ferreira)