Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
1491/08-5
Relator: NUNO GOMES DA SILVA
Descritores: ALCOOLÉMIA
CONDUÇÃO SOB O EFEITO DE ÁLCOOL
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 04/08/2008
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NÃO PROVIDO
Sumário: Se a decisão recorrida não pôs em causa a aprovação do aparelho utilizado no exame de pesquisa de álcool no ar expirado, as condições normais de utilização desse aparelho e o procedimento de fiscalização utilizado pelo agente de autoridade, não há fundamento para concluir que o TAS indicado pelo aparelho utilizado na pesquisa de álcool no ar expirado do arguido padece de erro.
Decisão Texto Integral:
1. – No processo sumário 578/07.8PTPDL do 2º Juízo de Ponta Delgada, J. foi julgado e condenado pela prática de um crime de condução em estado de embriaguez na pena de 120 dias de multa à taxa diária de 5 €, perfazendo a multa global de 600 € e na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor pelo período de 5 meses.
Interpôs recurso formulando na sua motivação as seguintes conclusões:
1º - Foi dado como provado que o arguido "efectuou a condução dos autos para se dirigir a casa dos pais para obter ajuda económica" (14º facto provado). No entanto não foi ponderado este aspecto nem feita menção como r circunstância favorável a ter e conta na determinação da medida concreta da perna, pelo que violou a douta sente o disposto no art. 71º n° 2, alínea c) e nº 3 do C.P.
2° - O recorrente está desempregado nem tão pouco poderá um dia vir a trabalhar, em virtude de padecer de uma artrose crónica na anca e no joelho e duas hérnias discais, tendo graves dificuldades de locomoção.
3º - O arguido apenas conduzia o veículo em estado de embriaguez, para se dirigir a casa dos pais e obter ajuda económica para o seu agregado familiar, atentas as difíceis e trágicas condições económicas.
4º - Ajuda que é indispensável para fazer face aos diversos encargos que diariamente surgem, e que nem sempre são previsíveis, motivo pelo qual o arguido ao ingerir bebidas alcoólicas não contava que naquele dia iria necessitar de se deslocar de viatura a casa dos pais, senão jamais teria adoptado tal conduta.
5º - A duração da pena de proibição de condução de veículos com motor implicará irreparáveis consequências para o arguido atentas as suas difíceis condições de locomoção e aos tratamentos que diariamente lhe têm que ser ministrados no Hospital de Ponta Delgada.
6º - É manifestamente elevado o montante de 120 dias de pena de multa tal como os 5 meses de proibição de condução de veículos com motor a que o tribunal a quo condenou o arguido.
7º - Por todo o exposto entende-se que uma pena de multa fixada no limite mínimo de dias, tal como a pena acessória, cumprirão os seus propósitos e as finalidades de prevenção e punição, por justa, proporcional e adequada.
8º - Não o tendo feito a douta sentença violou o disposto nos arts 72° e 410 ° nº 2, alínea b).
O magistrado do Ministério Público respondeu defendendo a manutenção da decisão recorrida.
Neste Tribunal, a Sra. procuradora-geral adjunta deu parecer no mesmo sentido.
Foi cumprido o art. 417º, nº 2 CPP sem que houvesse resposta.

*

2. – O resultado do julgamento quanto aos factos provados e quanto à fundamentação foi o seguinte:

2.1. – Factos provados (transcrição):

1. No dia 17 de Novembro de 2007, pelas 16:45 horas, o arguido seguia na condução do veículo ligeiro de passageiros, de matrícula RG, na Rua das Necessidades, freguesia de Livramento, concelho de Ponta Delgada.
2. Tendo sido submetido a exame para determinação da taxa de alcoolemia, pelas 17:39 horas, através do aparelho Drager Alcootest modelo 7110MKIII (aprovado pelo IPQ (D.R. 111 Série º 223 de 25SET96 e D.R. 111 Série nº 54 de 05MAR98) e cuja utilização é permitida através da Autorização n° 001/DROPTT/ALC/98 de 25AGO98 à temperatura ambiente de 19° C acusou uma taxa de álcool no sangue (TAS) de 2,23 g/1.
3. O arguido conduziu com uma TAS de, pelo menos, 2,06 g/I.
4. O arguido sabia que conduzia com a mencionada taxa de álcool no sangue, e quis conduzi-lo, apesar de saber que tal facto é proibido e punido por lei.
5. Agiu sempre livre, voluntária e conscientemente.
6. O arguido foi interveniente num embate de traseira com um outro veículo, na Rua das Necessidades, à entrada da rotunda do Peixe Assado, de que resultaram estragos ligeiros no pára-choques do veículo embatido.
7. O arguido padece de artrose na anca e joelho e duas hérnias discais, estando prevista a realização de 3 operações cirúrgicas nos próximos meses.
8. É divorciado mas vive há cerca de 25 anos com uma companheira que trabalha com idosos mas que está actualmente desempregada.
9. Têm 3 filhos de 23, 20 e 11 anos de idade, sendo que o mais velho e o mais novo são estudantes e a filha do meio empregada comercial.
10. Vive em casa alugada pela qual paga de renda mensal o valor de 350,00 euros.
11. Recebe 54,00 euros de abono de família.
12. Recebem ajuda económica dos pais do arguido, em quantias variáveis, por regra não inferior a 350,00 € mensais.
13. O arguido tem o 8° ano de escolaridade.
14. Efectuou a condução dos autos para se dirigir a casa dos pais para obter ajuda económica.
15. Ingeriu as bebidas alcoólicas que determinaram a TAS dos autos para alívio das dores e indução do sono.
16. Foi condenado por sentença de 29-11-2001, pela prática de um crime de burla e um crime de falsificação praticados em 01-11-1997, na pena única de 250 dias de multa à taxa diária de 600$00 já declarada extinta.
17. Foi condenado por sentença de 01-04-2003, pela prática de um crime de condução em estado de embriaguez praticado em 08-03-2003, na pena de 100 dias de multa à taxa diária de 4,00 euros, já declarada extinta.

2.2. – Fundamentação da matéria de facto (transcrição):

Quanto aos factos constantes da acusação, o tribunal alicerçou a sua convicção nas declarações prestadas pelo erguido, o qual os confessou de forma espontânea, livre, integralmente e sem reservas, o que determinou fosse dispensada a produção de prova suplementar.
Foram também as suas declarações que fundamentaram os factos relativos à sua situação sócio-económica, uma vez que se revelaram sinceras e credíveis, não existindo nos autos quaisquer elementos que as pudessem infirmar.
Quanto à TAS apurada, no talão do aparelho “Dräger”, de fls. 10, em conjugação com o disposto na portaria 748/94, de 13 de Agosto, com remissão para a norma NFX 20-7O1 e também nas recomendações da Organização Internacional de Metrologia Legal.
Finalmente, foi ainda valorada a participação do acidente de fls. 11 a 13 e o teor do CERTIFICADO DE REGISTO CRIMINAL de fls. 22 e 23.


3. – A primeira constatação a fazer é a de que a decisão recorrida sofre de erro notório na apreciação da prova, vício esse previsto no art. 410º, nº 2, c) CPP que é de conhecimento oficioso e que importa corrigir porque os autos contêm elementos para tal.
Radica na circunstância de o tribunal ter dado como provado que sendo o arguido submetido a exame de pesquisa de álcool no sangue o resultado desse exame foi de 2,23 g/l (ponto 2 dos factos provados) e de a seguir dar como provado do mesmo passo que o arguido conduzia com uma TAS de pelo menos 2,06 g/l.
A questão coloca-se por se considerar, embora na fundamentação tal não seja referido expressamente a existência de um eventual erro de medição no alcoolímetro por meio do qual foi feita na pessoa do arguido a fiscalização da condução sob influência do álcool.
É sabido em que termos essa questão se coloca.
Com base num ofício do Director Geral de Viação (nº 14811, de 2006.07.11) tem-se vindo a considerar que só é possível, com base no valor registado pelos alcoolimetros, apurar que o examinando apresenta uma TAS compreendida entre x e y, sendo x o valor correspondente à TAS registada menos a margem máxima de erro e y o valor correspondente à TAS registada mais a margem de erro máxima admissível. Por aqui chega a decisão recorrida à conclusão que deduzido o erro máximo admissível a taxa registada de 1,21 corresponde a uma taxa efectiva de 1,12 g/l
De forma unânime, crê-se, esta tese tem sido rejeitada por este Tribunal com argumentos aproximados. Entre outros foram nesse sentido os seguintes acórdãos com sumário ou texto integral publicado:
- de 2007.06.26, em www.pgdlisboa.pt, (proc 3769/07
- de 2007.10.03, em www.dgsi.pt/jtrl, (proc 4223/07)
- de 2007.10.09, em www.pgdlisboa.pt; (5112/07)
- de 2007.10.18, em www.pgdlisboa.pt; (7895/07)
- de 2007.10.23, em www.dgsi.pt/jtrl (proc 7226/2007)
- de 2007.10.23, em www.dgsi.pt/jtrl (proc 7089/2007)
- de 2007.10.29, em www.pgdlisboa.pt, (proc 8661/07)
- de 2008.02.19, em www.pgdlisboa.pt, (proc 4226/07).
- de 2008.02.21, em www.pgdlisboa.pt, (proc 10259/07).
Além destes pode citar-se o acórdão de 2008.02.12, proferido no proc. 9621/07 pelo relator do presente. Nele se reproduziu o essencial da argumentação do acórdão de 2008.01.29, no proc 9383/07 também da 5ª Secção deste Tribunal que, por sua vez, se abordoou com plena oportunidade, na comunicação apresentada por M. Céu Ferreira e António Cruz ao 2º Encontro Nacional da Sociedade Portuguesa de Metrologia com o título «Controlo Metrológico de Alcoolímetros do Instituto Português da Qualidade» (disponível no sítio www.spmet.pt/) www.spmet.pt/comunicacoes_2_encontro/Alcoolimetros_MCFerreira.pdf:
Daí se transcreve o seguinte:
«O Decreto Regulamentar n° 24/98, de 30 de Outubro, que regulamentava os procedimentos para a fiscalização da condução sob o efeito do álcool ou de substâncias estupefacientes ou psicotrópicas Revogado pelo art. 2º da Lei nº 18/2007, de 17 de Maio. Tendo esta Lei entrado em vigor em 2007.08.15 conclui-se que na data da prática dos factos ainda estava em vigor aquele Decreto Regulamentar, estabelecia no n.° 2 do seu artigo 12° que a aprovação, por despacho do director-geral de viação, dos analisadores utilizados nos testes quantitativos de álcool no ar expirado, era precedida de aprovação de marca e modelo, a efectuar pelo Instituto Português da Qualidade, nos termos do Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros.
O Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros em vigor na altura dos factos era o que constava em anexo à Portaria n.° 748/94, de 13 de Agosto Esta Portaria foi revogada pelo nº 2 da Portaria nº 1556/2007, de 10 de Dezembro, que aprovou o novo “Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros” e que naquilo que se discute nada alterou..
É certo que neste Regulamento definiam-se erros máximos admissíveis nos alcoolímetros. Assim dispunha-se no n° 6 nesse Regulamento:
"Nos alcoolímetros, os erros máximos admissíveis, em cada indicação, são definidos pelos seguintes valores:
a) Aprovação de modelo - os erros máximos admissíveis na aprovação de modelo são os definidos na norma NF X 20 - 701;
b) Primeira verificação - os erros máximos admissíveis da primeira verificação são os definidos para a aprovação de modelo;
c) Verificação periódica os erros máximos admissíveis da verificação periódica são uma vez e meia os da aprovação de modelo".
Porém, a definição pelo Regulamento acima referido de determinados erros máximos admissíveis, quer para a aprovação de modelo e primeira verificação, quer para a verificação periódica, não significava que os valores do TAS indicados pelos alcoolímetros devidamente aprovados estivessem errados.
Na verdade, conforme escrevem M. Céu Ferreira e António Cruz (…):
"A definição, através da Portaria n.° 748/94, de determinados erros máximos admissíveis, quer para a Aprovação de Modelo e Primeira Verificação, quer para a Verificação Periódica, visa definir barreiras dentro das quais as indicações dos instrumentos de medição, obtidas nas condições estipuladas de funcionamento, são correctas. Ou seja, um alcoolímetro de modelo aprovado e com verificação válida, utilizado nas condições normais, fornece indicações válidas e fiáveis para os fins legais. (negrito e sublinhados acrescentados)
"Os EMA “Erros Máximos Admissíveis” são limites definidos convencionalmente em função não só das características dos instrumentos, como da finalidade para que são usados. Ou seja, tais valores limite, para mais e para menos, não representam valores reais de erro, numa medição concreta, mas um intervalo dentro do qual, com toda a certeza (uma vez respeitados os procedimentos de medição), o valor da indicação se encontra". (negrito e sublinhados acrescentados).
"De acordo com os resultados laboratoriais obtidas durante as operações de controlo metrológico, demonstra-se que os EMA não são uma "margem de erro", nem devem ser interpretados como tal."
"O valor da indicação do instrumento é, em cada situação, o mais correcto. O eventual erro da indicação, nesse momento, nessa operação, com o operador que a tiver efectuado, nas circunstâncias de ambiente locais, qualquer que tenham sido outros factores de influência externos ou contaminados do ar expirado, seja ele positivo ou negativo, está com toda a probabilidade contido nos limites do EMA".
Interpretando os erros máximos admissíveis constante da Portaria n.° 748/94, de 13 de Agosto, com o alcance que se acaba de expor é inequívoco que não pode subsistir a decisão recorrida quanto ao TAS de que era portador o arguido.
Na verdade, se a decisão recorrida não pôs em causa a aprovação do aparelho utilizado no exame de pesquisa de álcool no ar expirado, as condições normais de utilização desse aparelho e o procedimento de fiscalização utilizado pelo agente de autoridade, não há fundamento para concluir que o TAS indicado pelo aparelho utilizado na pesquisa de álcool no ar expirado do arguido padece de erro» (sublinhado acrescentado).
Acresce a isto, como também se argumenta no acórdão citado, que, por um lado, o arguido aceitou o resultado do teste, como se deduz da circunstância de não ter requerido contraprova (art. 153º, nº 3 C. Estrada) e, por outro, o tribunal fundou a sua convicção na confissão integral e sem reservas dos factos imputados entre os quais figurava que aquele apresentava “uma taxa de álcool no sangue registada de 1,21 g/l”, renunciando, por isso, à produção da restante prova (cfr acta a fls 114). Impunha-se, assim, como determina o art. 344º, nº 2, al. a) CPP que o tribunal considerasse provado que o arguido era portador daquela TAS.
Ao desvalorizar a prova que consiste no resultado do controlo feito nos precisos termos em que a lei o determina e ao acabar por não considerar a confissão integral e sem reservas o tribunal incorreu no vício de erro notório na apreciação da prova que importa corrigir alterando parcialmente a matéria de facto no tocante aos pontos 2 e 3 e dando como provado que, como resulta dos documentos de fls 5 e 10, no dia, hora (17:39 horas) e local descritos na sentença, o arguido foi submetido a exame para determinação da taxa de alcoolemia, pelas 17:39 horas, através do aparelho Drager Alcootest modelo 7110MKIII (aprovado pelo IPQ (D.R. 111 Série º 223 de 25SET96 e D.R. 111 Série nº 54 de 05MAR98) e cuja utilização é permitida através da Autorização n° 001/DROPTT/ALC/98 de 25AGO98 à temperatura ambiente de 19° C verificando-se que conduzia com uma taxa de álcool no sangue (TAS) de 2,23 g/1.
Feita esta correcção do mencionado vício cabe dizer ainda muito brevemente que se não vislumbra me que possa consistir o vício de contradição insanável na fundamentação (art. 410º, nº 2, al. b) CPP) que o recorrente invoca na 8ª conclusão da sua motivação embora nada referira a esse respeito. Como é por demais sabido os vícios a que alude o citado nº 2 do art. 410º dizem respeito apenas e só a deficiências da matéria de facto. Ora, toda a motivação do recorrente se baseia na sua discordância relativamente à medida da pena de multa e da pena acessória o que é manifestamente matéria de direito.


4. – Vejamos então se foram adequadas as penas impostas mesmo na perspectiva de um grau de alcoolemia de 2,06 g/l dada até a circunstância de se não poder agravar a situação do recorrente (art. 409º CPP).
Há, desde logo um aspecto que se afigura ser de salientar.
Se se atentar no art. 81º do C. Estrada verifica-se que a condução sob o efeito do álcool com taxa igual ou superior a 0,5 gr/l e inferior a 0,8 gr/l é considerada contra-ordenação grave (art. 145º, al. l) do C. Estrada) e punida com coima de 250 € a 1250 €, além da sanção acessória de inibição de conduzir (art. 147º do diploma citado). E que a condução com taxa igual ou superior a 0,8 gr/l e inferior a 1,2 gr/l é considerada contra-ordenação muito grave (art. 146º, al. j) do C. Estrada) e punida com coima de 500 € a 2500 €, além da sanção acessória de inibição de conduzir.
Ora, frequentemente, este Tribunal tem afirmado o seu entendimento de que quando aplicada a pena de multa, o quantitativo fixado deve constituir um sacrifício real para o condenado sem, no entanto, deixar de lhe serem asseguradas as disponibilidades indispensáveis ao suporte das suas necessidades e do respectivo agregado familiar. É esta a sua jurisprudência corrente. E isto para que a aplicação concreta da pena de multa não represente “uma forma disfarçada de absolvição ou o Ersatz de uma dispensa de pena ou isenção de pena que se não tem coragem de proferir” (cfr. Figueiredo Dias, Dirto. Penal Português, “As Consequências Jurídicas do Crime”, p. 119).
Esta ideia tem de ser conjugada com a globalidade das regras do sistema onde sobressai, para o caso concreto, a possibilidade de o recorrente poder pagar a multa no prazo de um ano ou de a poder pagar em prestações ao longo de dois anos (art. 47º, nº 3 C. Penal).
Tudo isto para dizer que sendo embora modesta a condição económica do arguido, de acordo com o que se provou, a pena de multa não deve ser inferior à que foi fixada e seguramente não no «limite mínimo de dias» como pretende o recorrente. Isso equivaleria a condená-lo numa pena de multa no montante de 50 € (cfr art. 47º, nº 1 C. Penal) o mesmo é dizer a «premiá-lo» relativamente a uma eventual condenação (em coima) pela condução com uma taxa de álcool inferior a 1,2 g/l.
Seria, pois, aceitável supor que nos cafés e bares de Ponta Delgada onde o arguido reside se acabasse por concluir que entre beber pouco e correr o risco de cometer uma contra-ordenação e beber muito e cometer um crime valeria bem mais optar por esta última via!!!
Sempre se dirá, além disso, que a argumentação baseada na alegação de um facto provado como o de o arguido se ter dirigido a casa dos pais para obter ajuda económica é absurda. Para ponderar uma eventual circunstância atenuante ligada à premência da deslocação nada ficou provado no sentido de ter por certo que essa ajuda económica fosse indispensável (o arguido teria dinheiro para as bebidas com que se embriagou e para o combustível para o veículo em que se deslocava), que não pudesse ser providenciada de outra forma que não fosse a deslocação do arguido e, finalmente, que a deslocação não pudesse ocorrer através de qualquer outro meio que não fosse a deslocação em veículo próprio.
Quanto à pretensão de redução da pena acessória também ela não pode proceder.
Como é ponto assente na jurisprudência, a medida da pena acessória deve também, como a pena principal, ser fixada segundo as circunstâncias do caso e em conexão com o grau de culpa do agente em obediência ao princípio orientador fixado no art. 40º, nº 2 C. Penal e, por conseguinte, com recurso aos critérios gerais previstos no art. 71º C. Penal, ainda que a essa pena se atribua a finalidade essencial de prevenção da perigosidade do dito agente.
Ora, na ponderação destas duas vertentes destaca-se insiste-se, o grau de alcoolemia detectado que está muito acima do referido limite mínimo (aproximando-se mesmo do dobro) e que impõe que se sobreleve a prevenção da perigosidade do agente.
Ao que acresce, o que o recorrente omite de todo, a circunstância de ter antecedentes criminais, além do mais pela prática do mesmo crime o que não pode deixar de influenciar negativamente no juízo que tem de fazer-se precisamente acerca do seu grau de perigosidade e das exigências acrescidas de prevenção especial.

Quanto à questão da necessidade da carta de condução para as suas deslocações e aos inconvenientes que advêm da impossibilidade de conduzir poderiam ter alguma relevância mas esses inconvenientes também (e principalmente) o recorrente os devia ter ponderado antes de conduzir embriagado e bem embriagado, pode dizer-se.
Porque como o indica a própria epígrafe do art. 292º do C. Penal do que se trata numa situação como a que se aprecia é de conduzir não sob influência do álcool mas embriagado. E perante uma taxa de alcoolemia de 2,23 g/l, (ou mesmo que se considerasse a de 2,03 g/l) bem acima daquela a partir da qual se tem um condutor como embriagado (1,2 g/l), nem sequer se pode dizer que tudo aconteceu por mero descuido mercê da ingestão de apenas mais um copo.
De resto, face a uma medida acessória que tem como limites abstractos o mínimo de 3 meses e o máximo de 3 anos (art. 69º, nº 1 C. Penal) e em que a medida concreta da sanção foi fixada pouco acima do limite mínimo não se afigura fundada a crítica de excesso.


5. – Em face do exposto decide-se negar provimento ao recurso confirmando – com a ressalva assinalada quanto à matéria de facto – a decisão recorrida.
Pagará o recorrente 4 UC’s de taxa de justiça.