Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
3759/10.3TCLRS-A.L1-7
Relator: MARIA JOÃO AREIAS
Descritores: ALIMENTOS A FILHO MAIOR
ALIMENTOS PROVISÓRIOS
TRIBUNAL COMPETENTE
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 11/15/2011
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: A incompetência material do tribunal para julgar a acção principal pela qual o autor pede a fixação de uma pensão de alimentos, por tal competência recair sobre os tribunais comuns, acarretará a incompetência material do mesmo tribunal para julgar a providência cautelar de alimentos provisórios instaurada por apenso e na pendência daquela
(Sumário da Relatora)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa (7ª Secção):

I - RELATÓRIO

A (…), instaura o presente procedimento cautelar de Alimentos Provisórios na pendência de Acção de Alimentos a Filhos Maiores e a correr por apenso a esta, nos termos do nº3 do art. 383º do CPC, contra
B (…),
pedindo a condenação do réu a pagar à Autora a quantia de 400,00 € mensais a título de pensão de alimentos provisórios, a actualizar anualmente de acordo com a taxa de inflação anual indicada pelo INE e cujo pagamento deverá ser processado mediante desconto na pensão de reforma de velhice que o R. aufere na CNP.
Após ter sido proferido despacho nos autos principais a julgar a incompetência do tribunal de família e menores, indeferindo liminarmente a petição inicial, do qual foi interposto recurso,
pelo juiz a quo foi igualmente proferido despacho a julgar tal tribunal absolutamente incompetente para conhecer da presente procedimento cautelar, absolvendo o réu da instância.
Inconformado com tal decisão, o Réu dela interpôs recurso de apelação, concluindo a respectiva motivação, com as seguintes conclusões, que aqui se reproduzem por súmula:
1. A apelante é maior de idade, sofre de paralisia cerebral que lhe afecta a capacidade motora numa percentagem de 95% e é aluna do 3º ano do Curso de Geografia na Faculdade de Letras de Lisboa.
2. Apesar de ter 34 anos de idade, a apelante sofre de uma paralisia cerebral que lhe causa uma incapacidade de 95% que não lhe permite progredir na sua formação como uma pessoa medianamente capacitada.
3. Em 12.05.2010 intentou acção especial de alimentos a filhos maiores, nos termos do art. 1412º do CC, junto do Tribunal de Família e Menores e de comarca de Loures.
4. Em 27.05.2010, a ora apelante instaurou a presente providência cautelar de alimentos provisórios, ao abrigo do art. 399º do CPC.
5. Em 18.08.2010 foi a apelante notificada da sentença proferida no âmbito da acção principal, a qual indeferia liminarmente a pretensão da autora, com fundamento na incompetência absoluta do tribunal, tendo a mesma dado entrada do recurso desta decisão em 30.08.2010.
6. A 09.10.2010, o juiz a quo proferiu sentença na qual absolvia o requerido do pedido, com fundamento, novamente, na incompetência daquele tribunal para apreciar do mérito da causa.
7. O requerido é uma das pessoas legalmente obrigadas a prestar alimentos à requerente.
8. Sendo a apelante maior de idade, não tendo completado a sua formação profissional e não dispondo de meios económicos que lhe permitam fazer face ás despesas comuns de alimentação, vestuário, saúde e formação, a situação integra-se na previsão que o art. 1880º visa tutelar.
9. Não nos encontramos perante uma acção de alimentos a filho maior, com fundamento no art. 2009º do CC, para as quais os tribunais comuns são competentes, mas sim perante uma acção de alimentos a filho maior, com fundamento no art. 1880º do CC.
10. O tribunal competente para apreciar a presente providência é o Tribunal de Família de Loures.
8. A sentença recorrida violou, assim, entre outras, as normas conjugadas dos arts. 82º, nº1, al. c), da Lei nº 3/99, de 13 de Outubro, 101º, 102º, nº1, 103º, 105º, nº1, 234º, 1880º, 2003º e 2009º, do CC.
Citado o R. editalmente e o M.P., não foram apresentadas contra-alegações.
Dispensados que foram os vistos legais, ao abrigo do disposto no nº4 do art. 707º, do CPC, há que decidir.

II – DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO.
Considerando que as conclusões da alegação de recurso delimitam os poderes de cognição deste tribunal, a questão a decidir  é uma única: competência do tribunal em razão da matéria para a apreciação do presente procedimento cautelar.

III – APRECIAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO.
            Competência do tribunal em razão da matéria.  
 “As causas que não sejam atribuídas por Lei a alguma jurisdição especial são da competência do tribunal comum” – art. 66º do C.P.C – ou dos Tribunais Judiciais, na terminologia da Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais – art. 18º nº1 da Lei nº 3/99 de 13.01.
A competência concreta do tribunal comum em razão da matéria determina-se por exclusão.
“Só pode afirmar-se com segurança depois de ter-se percorrido o quadro dos tribunais especiais e de se ter verificado que nenhuma disposição da lei submete a acção em vista à jurisdição de qualquer tribunal especial[1]”.
A competência dos tribunais comuns constitui a regra e a competência dos tribunais especiais constitui a excepção.
No caso concreto, levanta-se a questão de saber se a competência material pertence ao tribunal Comum ou ao tribunal de Família.
Tratando-se de providência cautelar, instaurada na pendência e por apenso a acção para fixação de alimentos, e dadas as características de instrumentalidade e de dependência face à acção principal (nº1 do art. 383º do CPC), será competente para a presente providência cautelar o tribunal ao qual seja atribuída competência para a acção principal.
Nos autos principais, foi nesta data proferido acórdão a confirmar a decisão da primeira instância de incompetência material do tribunal de família e menores para conhecimento da mesma, com fundamento em que, peticionando-se em tal acção a fixação de uma pensão de alimentos sem qualquer limitação temporal com fundamento numa incapacidade permanente de prover ao seu sustento, nos encontramos fora do âmbito da acção prevista na al. f), do art. 82º da Lei nº 3/99 de 13.01, recaindo tal competência sobre os tribunais comuns.
Como tal, recaindo a competência da acção principal sobre os tribunais comuns, sobre eles recairá igualmente a competência para a presente providência cautelar que daquela constitui um mero incidente[2].
Aliás, note-se que, caso nos encontrássemos perante uma verdadeira acção de alimentos interposta ao abrigo do disposto no art. 1412º, consistente num processo de jurisdição voluntária que segue o regime previsto para os menores, o autor nem sequer carecia de instaurar qualquer providência cautelar uma vez que, por força do art. 157º da OTM é possível a fixação de alimentos a título provisório, quando na conferência não se chegue a acordo e as necessidades do interessado o justifiquem.
A apelação terá, necessariamente, de improceder.


IV – DECISÃO
Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a decisão recorrida.
Custas pela recorrente.

Lisboa, 15 de Novembro de 2011
                                                                                   
Maria João Areias                                                                        
Luís Lameiras   
Roque Nogueira
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[1] Cfr., Alberto dos Reis, “Código de Processo Civil, Anotado e Comentado”, 2º Vol., pag 38.
[2] A solução diversa chegaríamos no caso de acção de alimentos com escopo educativo proposta na Conservatória de Registo Civil ao abrigo do disposto no art. 1880º do CPC, nos termos da al. a) do nº1 do art. 5º do DL nº 272/2001, de 01 de Outubro – em tal caso, não gozando a Conservatória de competência para a fixação de alimentos provisórios em caso de desacordo entre as partes, poderia o credor de alimentos instaurar desde logo a competente providência cautelar no tribunal de família, procedimento a apensar ao processo instaurado na Conservatória logo que remetido ao tribunal de família nos termos do art. 8º do citado diploma.