Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
454/09.0TVLSB.L1-7
Relator: GRAÇA AMARAL
Descritores: PRETERIÇÃO DO TRIBUNAL ARBITRAL
CLÁUSULA CONTRATUAL GERAL
INSUFICIÊNCIA DE MEIOS ECONÓMICOS
ABUSO DE DIREITO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 11/02/2010
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I – O princípio da Kompetenz-Kompetenz ínsito no art.º 21, n.º1, da LAV, assume-se numa dupla vertente: não só o árbitro tem competência para conhecer da sua própria competência, como tal competência lhe cabe antes de poder ser definida pelo tribunal judicial.
II – A decisão que conhece a excepção de preterição de convenção arbitral limita-se, por isso, à prova da existência de uma convenção de arbitragem que não seja manifestamente nula.
III – A proibição legal de cláusulas contratuais gerais em função do seu conteúdo, tem por subjacente a tutela da entidade aderente e por objectivo último a prossecução de um adequado equilíbrio contratual de interesses, impedindo que uma das partes não vise os seus exclusivos propósitos negociais, sem atender, de forma minimamente adequada, aos interesses da parte contrária.
IV – A lei ao fazer apelo ao quadro negocial padronizado enquanto horizonte de referência, assenta no juízo valorativo não casuístico, isto é, que não pode atender à situação concreta, mas sim ponderar as cláusulas tendo em linha de conta o conjunto contratual respectivo.
V - No âmbito do contrato de concessão de marca de representação de marcas de automóveis, a cláusula que estabelece a escolha de um foro arbitral, cuja constituição acarreta, necessariamente, encargos acrescidos às partes, não enferma de nulidade por referência à alínea g) do art.º 19 do citado DL 446/85.
VI - A superveniência de uma situação de insuficiência económica, que impossibilite uma das partes de suportar as despesas com a constituição e funcionamento da arbitragem, constitui causa legítima de incumprimento da convenção de arbitragem.
VII - A proibição de venire contra factum proprium, que impede a pretensão incompatível ou contraditória com a conduta anterior, cai no âmbito do abuso do direito sempre que o respectivo titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé.
VIII – Não excede manifestamente os limites do direito de acção o comportamento da Autora consubstanciado na instauração de acção em tribunal judicial (onde pretende que seja levantada a excepção de preterição do tribunal arbitral) passado cerca de um ano após ter dirigido à Ré carta onde solicitava a constituição de tribunal arbitral com vista à resolução do litígio existente entre ambas.
(sumário elaborado pela Relatora)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na 7ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa,

I - Relatório

Partes:
SJ, LDA (Autora/Recorrente)
M, LDA (Ré/Recorrida)

Pedido
- Declarar-se o tribunal competente, preterindo-se o tribunal arbitral dada a nulidade das cláusulas compromissórias e a alteração (para minus) das condições económicas da Autora;
- Ser a Ré notificada para juntar aos autos, no prazo de quinze dias, o Contrato identificado nos artigos 119º e 120º da petição;
- Ser notificada a K, SA, para juntar aos autos, no prazo de quinze dias, o Contrato identificado nos artigos 114 e ss da petição;
- Ser produzida tal prova antecipada nos termos do art.º 520, do CPC;
- Declarar-se a nulidade da cláusula contratual inscrita no n.º3 da secção 28 do Acordo de Concessão para Revendedores K e da cláusula contratual inscrita no n.º3 da secção 23 do Acordo de Reparador Autorizado K;
- Declarar-se a ilicitude da resolução do Acordo de Concessão para Revendedores K operada pela Ré;
- Declarar-se a ilicitude da resolução do Acordo de Reparador Autorizado K operada pela Ré;
- Ser a Ré condenada a pagar à Autora indemnização pelos prejuízos causados pela ilicitude das resoluções, no valor de 87.952,76 euros, a título de lucros cessantes (sendo 33.272,54 euros respeitantes ao Acordo de Concessão para Revendedores, e 54.679,22 euros relativos ao Acordo de Reparador Autorizado) e 59.646,74, por danos emergentes;
- Ser a Ré condenada a pagar à Autora, a título de indemnização de clientela, a quantia de 45.490,86 euros respeitantes ao Acordo de Concessão para Revendedores K e de 82.798,22 euros, respeitante ao Acordo de Reparador Autorizado K;
- Ser a Ré condenada a retomar os automóveis e as peças K que a Autora tem em stock, no valor global de 143.773,49 euros, correspondendo 38.639,40 a peças e acessórios e 10.133,69, a automóveis;
- Ser a Ré condenada a pagar juros de mora à taxa de juros comercial sobre os valores peticionados, desde a citação até integral e efectivo pagamento;
- Ser a Ré condenada a pagar à Autora a quantia de 1.920,22 euros por conta das comissões de Garantia Bancária, nos termos do art.º 390 e seguintes, acrescida de juros de mora à taxa comercial, desde a citação até efectivo pagamento;
- Ser a Ré condenada no pagamento de todos os valores que vierem a ser liquidados a qualquer título (juros ou comissões) por força da garantia bancária n.º …, emitida pelo M até que a Ré promova o seu cancelamento;
- Ser a Ré condenada no cancelamento da referida garantia bancária.

Contestação
O Réu defendeu-se por excepção invocando a preterição do tribunal arbitral. Impugnou os factos articulados e pronunciou-se pela total improcedência da acção: Deduziu reconvenção pedindo a condenação da Autora no pagamento da quantia de 101.000,00 euros e juros de mora a contar da notificação da contestação.

Na réplica a Autora sustenta o posicionamento assumido, concluindo ainda pela improcedência do pedido reconvencional.

Decisão
- A pertinência da produção de prova documental requerida pela Autora foi relegada para ulterior apreciação, logo que fixado o objecto da prova.
- A produção antecipada de prova foi indeferida por não se encontrarem reunidos os respectivos pressupostos legais.
- Foi admitido o pedido reconvencional e alterado o valor da causa, que foi fixado no montante de 521.400,29 euros;
- No saneador foi conhecida a excepção de preterição do tribunal arbitral, que foi julgada procedente, tendo a Ré sido absolvida da instância.
- Foi julgada extinta a instância relativamente ao pedido reconvencional deduzido. 

Conclusões da apelação
I – A Recorrente alegou a competência do tribunal judicial para apreciar de eventual nulidade manifesta da convenção de arbitragem, e entende que deverá ser aplicada a tese acolhida por Miguel Teixeira de Sousa, devendo o Tribunal a quo, na qualidade de tribunal estadual, apreciar a validade, a eficácia e a aplicabilidade da convenção de arbitragem.
II - A Recorrente entende que o Digníssimo Tribunal a quo lavrou em erro ao decidir que não se antevê, perante o quadro negocial padronizado do contrato de concessão (aquele que maior semelhanças apresentará com os contratos em causa) que a inserção de uma cláusula compromissória em ambos os contratos crie, em concreto, graves e injustificado inconvenientes a qualquer uma das partes na resolução dos litígios que entre elas subsistam.
III - Salvo o devido respeito pela posição expendida, no quadro negocial padronizado do contrato como os acordos que em causa estão nestes autos é desde logo evidente qual o Outorgante que desempenha um papel de domínio perante o outro - enviando os contratos, com o clausulado já redigido e imutável, para que o outro outorgante os assine.
IV - E, atente-se que este papel de domínio da Concedente face ao Concessionário existe dada a dependência comercial e económica da concedente face ao concessionário – situações que serão tão mais prementes quanto o seja a da exclusividade da representação da marca por parte do Concessionário, e que decorrem das variantes contratuais, como 17/28 Página 16 de 24 sejam as limitações quanto a consignações e as obrigações de aquisição a firme de um determinado número de bens.
V - Será regra que a outorga destes contratos ocorra entre um Concedente que é uma sociedade comercial que acolhe a força comercial e económica da marca mãe – com tentáculos europeus ou até mundiais, e uma cessionária que apresente uma força comercial e financeira bem mais modesta.
VI - No caso em apreço, atente-se, a discrepância referente à exuberância financeira é de tal ordem que se verifica que a concedente detém um capital social de três milhões de euros (Cfr. Documento número 15 junto com a Petição Inicial), ao passo que a Concessionária detém um capital social de vinte e cinco mil euros (Cfr. Documento número 14 junto com a Petição Inicial).
VII - Ora, se é certo que dois contratos de Acordo de Concessão e de Acordo de Reparador Autorizado não constituem um quadro negocial padronizado, não é menos certo que constituem parte desse mesmo quadro, onde se insere conjuntamente um número alcançável de Concessionários que outorgaram tais acordos com a Recorridas com uma representatividade local e correspondente força comercial e económica, conferindo-lhes, igualmente, uma posição de dominadas e de inferioridade económica notória.
VIII – Nos termos da a alínea g) do artigo 19.º do DL n.º 446/85, de 25 de Outubro (sucessivamente alterado), o quadro negocial padronizável é 18/28 Página 17 de 24
apenas o cenário que ambienta a análise dos graves inconvenientes que esta atribuição de competência ao Tribunal Arbitral produz na Recorrente.
IX - Assim o diz Almeno de Sá, conforme citação da douta sentença a quo: é essencial a consideração da situação de interesse contratual-típica e não meramente as vicissitudes particulares do negócio contratual realizado, pois quando o Ilustre Professor Universitário diz: e não meramente interpreta, nos termos acima expostos, a norma legal, ou seja: não se atenta somente/meramente ao negócio concreto, mas atenta-se a este à luz do quadro negocial padronizável.
X - A alínea g) do artigo 19.º do DL 446/85, de 25 de Outubro encerra um conflito de direitos, de um lado, os graves inconvenientes de uma das partes e do outro os interesses da outra parte no recurso ao foro estabelecido.
XI - No caso em análise temos como grave inconveniente da Recorrente a impossibilidade de acesso à justiça; e como interesse da Recorrida, a procura da celeridade processual.
XII - Estamos perante situações juridicamente desniveladas: o grave inconveniente da Recorrente apresenta-se como uma violação de um direito fundamental constitucionalmente consagrado; já o interesse da Recorrida, a celeridade processual, é um direito que lhe assiste, um princípio de natureza processual – inquestionavelmente inferior - daí que jamais este possa prevalecer sobre aquele.
XIII - O acabado de concluir, visto à luz do quadro negocial padronizável, em que o outorgante a quem é imposta a imutável cláusula de convenção arbitral é sempre (sem conceder, será pelo menos maioritariamente) aquele que terá maiores dificuldades económicas, ou uma situação económica menos anafada que a do Concedente,
XIV - Não pode resultar noutra conclusão que não seja a da declaração de nulidade das cláusulas compromissórias constantes dos Acordos de Concessão e de Reparador Autorizado.
XV – A convenção arbitral deve ser afastada, assim sendo competente para a resolução da presente acção o tribunal judicial, dada a notória incapacidade económica e financeira da Recorrente para suportar os encargos decorrentes do recurso ao Tribunal Arbitral do Centro de Arbitragem Comercial da Associação Comercial de Lisboa/Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa.
XVI - A Recorrente alegou e demonstrou documentalmente os seus resultados económicos penosos e negativos até ao exercício de dois mil e sete (atente-se que na data em que a presente acção entrou em juízo a Recorrente ainda não havia entregue a declaração anual de IRC), e bem assim, que tal debilidade económica não derivava de responsabilidade sua, mas ante da ilícita cessação dos Acordos de Concessão e de Reparador Autorizado promovida pela Recorrida e à descida na venda de automóveis da marca K em Portugal (estes últimos demonstrados documentalmente).
XVII – A douta sentença a quo entendeu que não ficou provada a debilidade económica da Recorrente, nem o facto de tal fragilidade não lhe ser imputável, e que como tal, não poderia ser considerado – situação com a qual a Recorrente não se pode conformar.
XVIII - Atentas as regras ínsitas no Código Civil quanto aos meios de prova, não se vislumbra a obrigatoriedade de prova pela via documental dos factos que se encontram alegados nos artigos 41.º a 50.º, (Mormente no que se prende com a directa relação entre a ilícita cessação dos contratos e a queda abrupta dos resultados líquidos da Recorrente), Pelo que, apenas depois da produção de prova testemunhal se poderá com certeza concluir pela não demonstração de tais factos.
XIX - Verifica-se ser assim ante tempo a formulação de qualquer juízo de mérito quanto a este aspecto, por parte do Digníssimo Tribunal a quo.
XX – O Ilustre Tribunal a quo entende que o facto de a Recorrente ter remetido à Recorrida uma carta, no dia 05 de Março de 2008, para que esta indicasse árbitros que comporiam o tribunal arbitral, dando-lhe conta que iria aí fazer valer pretensões essencialmente similares àquelas que agora faz valer em juízo (Cfr. ponto n.º 16 dos factos apurados, e último parágrafo da página 19 da douta sentença recorrida), e, cerca de um ano depois, ter intentado a presente acção no tribunal judicial, corresponde a um abuso de direito, uma actuação contraditória consubstanciadora de venire contra factum proprium - com tal pode a Recorrente conformar-se. XXI - Desde a data em que a Recorrente remeteu a aludida carta à Recorrida, até à data da entrada da presente acção em juízo mediaram mais de onze meses – sem que o Tribunal Arbitral houvesse sido constituído.
XXII - Desde a data em que a Recorrente remeteu aquela missiva à Recorrida até à entrada da presente acção em juízo, aquela verificou que os seus resultados líquidos do exercício de dois mil e sete foram superiores a cinquenta e nove mil euros negativos.
XXIII - A Recorrente, ao enviar a aludida carta, manifestou que era sua intenção fazer valer pretensões (expostas na petição inicial e descritas na mencionada carta) perante o poder jurisdicional.
XXIV - Na esteira da citação efectuada na douta sentença3, o abuso de direito é o comportamento que, aparentando ser exercício de um direito, se traduz na não realização de interesses pessoais de que esse direito é instrumento e na negação de interesses sensíveis de outrem.
XXV - Na situação em apreço a Recorrente, percebendo que a convenção de arbitragem é nula (nos termos acima alegados), que não tem condições económicas para aceder à justiça por meio do Tribunal Arbitral, mantém a sua intenção de aceder à mesma, no tribunal estadual.
XXVI - Não se vislumbra qualquer actuação em abuso de direito, pois a Recorrente não pretende alcançar inviamente fins ilegais por meios legais. Atente-se que ao dar como apurado o facto constante do ponto 11 (Cfr. página 7 da douta sentença a quo) fica demonstrado que é real a penúria económica da Recorrente, e não um facto artificiosamente criado a posteriori por forma a conseguir aceder ao Tribunal Estadual.
XXVII - A Recorrida não viu qualquer direito seu coarctado: o poder jurisdicional conferido quer a Tribunais Arbitrais quer a Tribunais Estaduais prevê que ambos obedeçam à lei em vigor, não existindo, de todo em todo, qualquer limitação da sua esfera de direitos.
XXVIII - Não pode a Recorrente conformar-se com a imputação de se comportar em termos que excedem a boa fé, por ter respondido à excepção dilatória alegada pela Recorrida.
XIX - A Recorrente mantém na resposta à excepção (patente na réplica) a mesma posição que, ab initio alegou na Petição Inicial, e à qual não era obrigada, dada a natureza não oficiosa da verificação da excepção de preterição de tribunal arbitral.
XXX - E não se olvide, a razão de aqui vir (ao tribunal estadual) visa o cumprimento de um direito constitucionalmente consagrado – o acesso à justiça.
XXXI – A Recorrente discorda claramente do vertido na douta sentença (página 23) é de notar que a mesma assume que o que está em causa não é tanto a diferença de custos entre a lide arbitral e os presentes autos.
XXXII - Esta é uma interpretação isolada de um artigo, que não atenta, por exemplo, no artigo 31.º da Petição: O que demonstra de forma inequívoca a precária condição financeira da Autora e a impossibilidade da mesma dispor de €26.462,61 e consequente impossibilidade de aceder à justiça.
XXXIII - Como é razoável, a interpretação do alegado só pode concluir que se a diferença dos valores não conduzisse irremediavelmente à impossibilidade de aceder à justiça, esse facto por si mesmo não seria o inconveniente fulcral.
XXXIV - Pois este, está bem de ver, é a negação do acesso a um direito fundamental e constitucionalmente consagrado e protegido: o livre acesso à justiça!
XXXV - Por tudo o exposto, deviam ter sido declaradas improcedentes a excepção dilatória preterição de tribunal arbitral, a excepção de abuso de direito, e não deveria ter sido declarado que a conduta da Recorrente ultrapassa os limites impostos pela boa fé.
XXXVI – Ao não decidir assim, o Ilustre Tribunal a quo violou as seguintes normas: o artigo 20.º da C.R.P., a alínea g) do artigo 19.º do DL 446/85, de 25 de Outubro, o artigo 334.º e o artigo 790,º, n.º 1 do Código Civil.

Conclusões das contra alegações

1. Vigora no ordenamento português o princípio da competência da competência dos tribunais arbitrais (Kompetenz-Kompetenz), nos termos do qual os tribunais arbitrais são os competentes para apreciar a sua própria competência, ainda que para esse fim seja necessário apreciar a existência, validade ou eficácia da convenção de arbitragem ou do contrato em que ela se insira (cfr. artigo 21.º, nº 1, da LAV).
2. Este princípio tem o “efeito negativo de impor à jurisdição pública o dever de se abster de se pronunciar sobre as matérias cujo conhecimento a lei comete ao árbitro, em qualquer causa que lhe seja submetida e em que se discutam aquelas questões, antes que o árbitro tenha tido oportunidade de o fazer” (LOPES DOS REIS, A Excepção de Preterição do Tribunal Arbitral, in «Revista da Ordem dos Advogados», ano 58, pág.1122).
3. Quando confrontado com um litígio em relação ao qual existe convenção de arbitragem com um mínimo de aparência de aplicabilidade ao caso, está o tribunal judicial obrigado, pois, a abster-se de conhecer do mérito da causa, inclusive no que respeita à validade e eficácia da convenção, salvo “se for manifesta (óbvia, evidente) a nulidade, a ineficácia ou a inaplicabilidade da convenção de arbitragem” (cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 5 de Junho de 2007, in www.dgsi.pt). No mesmo sentido, vide LUÍS DE LIMA PINHEIRO e LOPES DOS REIS, nas obras citadas no texto.
4. .A nulidade invocada pela Recorrente não é manifesta, como bem julgou o Tribunal a quo e como é confessado pela própria Recorrente nos parágrafos 59 a 64 das suas Alegações, maxime no parágrafo 63, uma vez que, nas palavras da Recorrente, ela dependerá da prova testemunhal.
5. A Recorrente pugna pela competência do tribunal judicial conhecer da validade da convenção de arbitragem com base no argumento de que, a não ser assim, criar-se-ia um “beco sem saída” para si, porque a nulidade da cláusula só poderia ser arguida em sede de recurso, não sendo a decisão arbitral a proferir recorrível nos termos do Regulamento de Arbitragem do Centro de Arbitragem Comercial da Associação Comercial de Lisboa.
6. A Recorrente omite, porém, que a impugnação de uma decisão arbitral (ainda que irrecorrível) pode sempre fazer-se por via de anulação, meio processual ao qual as partes não são, aliás, livres de renunciar (artigo 28.º, n.º1, da LAV).
7. De todo o modo, e sem conceder, é evidente que, mesmo que o Tribunal a quo fosse competente para conhecer da nulidade invocada pela Recorrente, nunca poderiam as cláusulas compromissórias dos autos ser consideradas inválidas.
8. Essa nulidade, de acordo com a Recorrente, radicaria na violação do artigo 19.º, alínea g), do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro.
9. Na tese da Recorrente, essa nulidade resultaria desde logo do papel de domínio que seria ocupado pelo outorgante que envia os contratos, com o clausulado já redigido e imutável, para que o outro outorgante os assine.
10. A descrição que a Recorrente faz deste papel de domínio é aquilo que, desde logo, define as cláusulas contratuais gerais (cfr. artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro), pelo que toda e qualquer cláusula contratual geral, sem excepção, seria nula, o que obviamente é incompatível com o regime legal deste tipo de cláusulas.
11. A Recorrida é a responsável por um sistema de distribuição selectiva qualitativa da K, devendo assegurar que os concessionários oficiais da K actuem segundo um conjunto de regras comuns.
12. Os contratos que a Recorrente celebrou com a Recorrida contêm essas regras e têm que respeitar as obrigações que a mesma Recorrida assumiu perante a K
13. É neste enquadramento que tem que ser apreciada a ausência de negociação referida pela Recorrente.
14. Com efeito, a Recorrida não impôs à Recorrente a celebração de um contrato que esta não pretendia assinar.
15. A nulidade invocada pela Recorrente decorreria de a cláusula compromissória dos autos ser relativamente proibida.
16. O desvalor que acompanha as cláusulas relativamente proibidas “tem de ser mediatizado ou coberto pelo quadro negocial padronizado, o que deixa ao juiz a possibilidade de apreciar, no contexto do tipo de contrato em análise, se certa cláusula deve ou não ser considerada nula”(ALMENO DE SÁ, Cláusulas Contratuais Gerais e Directivas sobre Cláusulas Abusivas, 2005, pág.76).
17. A Recorrente funda a nulidade da cláusula compromissória nos inconvenientes que para si advirão da arbitragem, esquecendo “por completo o quadro negocial padronizado para se focar no caso concreto” (cfr. Sentença a quo).
18. Procurando dar uma aparência de quadro negocial padronizado, a Recorrente alega existir um papel de domínio do Concedente em face do Concessionário.
19. Em primeiro lugar, nos autos estão em causa não uma, mas duas cláusulas compromissórias. Essas cláusulas dizem respeito a dois tipos contratuais distintos: contrato de concessão e contrato de reparador autorizado. Ora, a Recorrente limita-se a referir o contrato de concessão, não cuidando de demonstrar a nulidade da cláusula compromissória do contrato de reparador autorizado.
20. Em segundo lugar, o contrato de concessão (e o de reparador autorizado) faz surgir entre as partes uma relação obrigacional complexa, cujo quadro negocial padronizado é difícil de concretizar, como decidiu a Sentença a quo, na medida em que o mesmo não se encontra legalmente tipificado.
21. Sem prejuízo desta dificuldade, o contrato de concessão é geralmente caracterizado pelo facto de o concessionário assumir a obrigação de compra para revenda; pelo facto de o concessionário agir em seu nome e por conta própria, assumindo os riscos da comercialização; e pela existência de outro tipo de obrigações, pelas quais se estabelecem laços de colaboração entre as partes e se coordena a actividade de todos no seio na rede de distribuição.
22. O concessionário, ao contrário do agente, actua em seu nome e por conta própria, gozando de uma autonomia que a Recorrente omite nas suas Alegações e que é factor suficiente e bastante para rebater a dependência alegada pela Recorrente.
23. Por outro lado, a exclusividade não é característica do contrato de concessão, não podendo ser invocada para o definir.
24. A menção ao capital social das Parte sé absolutamente irrelevante para fundar a tese da Recorrente: com efeito, este capital poderá já nada ter a ver nem com o real património da sociedade nem com o valor de mercado da mesma sociedade.
25. A representatividade local dos concessionários da marca é também irrelevante para o caso atento o estipulado na Secção 1.20. do Contrato junto como Doc. n.º 1 da p.i.
26. A escolha de um foro arbitral só não serve os interesses da Recorrente porque esta alegadamente estará numa situação financeira débil, o que não se concede.
27. A aceitar-se repudiar este foro com base neste fundamento, estar-se-ia a olhar para o caso concreto e não para os interesses que normalmente estão presentes no campo dos destinatários desta cláusula, como sejam, a celeridade na obtenção de uma resolução para o litígio que os oponha ao concedente, celeridade própria do foro arbitral.
28. Ora, o preceituado no artigo 19.º do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro, não considera enfermar de nulidade uma cláusula que, no caso concreto e específico de um determinado contrato, conduz à constituição de um tribunal com encargos acrescidos para as partes.
29. Acresce que os inconvenientes graves indicados pela Recorrente são supervenientes à celebração dos Contratos e, por outro lado, estão por demonstrar.
30. O Tribunal a quo não fez nenhum juízo ante tempus quanto a estes factos.
31. O facto de a Recorrente alegar ter declarado um prejuízo de € 59.376,60 relativo ao exercício de 2007 apenas significa que, para efeitos fiscais, terá apresentado esse resultado.
32. Daí não decorre que não tenha fundos que lhe permitam fazer face aos encargos do processo arbitral, ou que não possa, por exemplo, alienar bens ou financiar-se junto de instituições de crédito ou mesmo junto dos seus sócios.
33. A Recorrente procura fundar ainda os inconvenientes do foro arbitral apelando à tese da impossibilidade de acesso à justiça.
34. Se antes de 1 Janeiro de 2008 poderiam eventualmente existir dúvidas sobre se a insuficiência económica de uma sociedade comercial era fundamento para, em certas circunstâncias (que no presente caso não se verificam), legitimar a improcedência da excepção de preterição de tribunal arbitral, desde essa data que é indiscutível que não.
35. Por força das alterações introduzidas pela lei nº 47/2007, de 28 de Agosto, que entrou em vigor em 1 de Janeiro de 2008, na Lei nº 34/2004, de 29 de Julho (Regime de Acesso ao Direito e aos Tribunais), as sociedades comerciais deixaram de ter acesso a protecção jurídica em qualquer das suas modalidades.
36. Tal como seria irrelevante a insuficiência económica da Recorrente que a impedisse de aceder aos tribunais judiciais, é irrelevante a eventual e alegada insuficiência económica que a impeça de participar num processo arbitral.
37. Por outro lado, a Recorrente limita-se a referir a existência de inconvenientes (não atendíveis em face do quadro negocial padronizado), descurando a necessidade de demonstrar que inexistem interesses da outra parte que justifiquem a escolha da instância arbitral.
38. Ora, são manifestos os interesses que justificam que este litígio seja decidido por um tribunal arbitral, em lugar de o ser por um tribunal judicial.
39. Em primeiro lugar, a celeridade processual e a possibilidade de obter uma decisão final que julgue definitivamente o litígio que opõe a Recorrente à Recorrida num curto período de tempo.
40. O interesse da Recorrida em obter uma decisão final no mais curto espaço de tempo é um interesse sério e justificado, atento o facto de a Recorrida desenvolver uma actividade económica, que é afectada pela existência de litígios em tribunal, e uma actividade assente em relações de concessão e numa rede de concessionários.
41. Por outro lado, a sujeição de um litígio a um tribunal arbitral permite que o mesmo seja apreciado por um colégio de árbitros, permitindo que três julgadores apreciem os factos, apreciem a prova e apliquem o direito aos factos.
42. A arbitragem permite ainda às partes a possibilidade de escolherem os julgadores, que serão “juízes por medida”, i.e., “pessoas com especiais conhecimentos técnicos, jurídicos ou outros, apropriados à tecnicidade do litígio, dificilmente apreensível pela generalidade da formação dos magistrados judiciais” (FRANCISCO CORTEZ, A Arbitragem Voluntária em Portugal, in «O Direito», ano 124, 1992, vol. III, pág. 369).
43. A arbitragem tem ainda natureza confidencial, por oposição à publicidade da jurisdição estadual.
44. Por último, às partes é ainda permitido escolher as regras processuais aplicáveis ao litígio, podendo assim libertar-se do espartilho formal e mais rígido do Código de Processo Civil. Esta escolha das regras aplicáveis ao processo arbitral é, por outro lado, potenciadora da celeridade deste processo.
45. Estes interesses, sérios e atendíveis, são-no não apenas no caso concreto, mas também no âmbito do quadro negocial padronizado em que se inserem os contratos dos autos.
46. Da convenção de arbitragem nasce um direito potestativo, para qualquer uma das partes contraentes, de submeter o litígio à decisão do tribunal arbitral.
47. Para tutela desse direito potestativo, a Lei previu a excepção de preterição do tribunal arbitral voluntário, a qual foi invocada pela Recorrida, e que não pode ser paralisada com base em nenhum dos fundamentos invocados pela Recorrente, como já acima se demonstrou.
48. Ainda que fosse procedente algum desses fundamentos, o que não se admite, nem concede, sempre os mesmos teriam que soçobrar no caso concreto, porquanto o comportamento da Recorrente é abusivo.
49. Com efeito, a propositura da presente acção pela Recorrente perante um tribunal judicial consubstancia um venire contra factum proprio, uma vez que a Recorrente interpelou a Recorrida para constituir um tribunal arbitral.
50. Não pode agora a Recorrente, em flagrante contradição com a sua conduta anterior, invocar uma suposta insuficiência económica que, a existir, seria já, de acordo com a sua própria tese, do seu inteiro conhecimento à data do envio da referida carta para constituição do tribunal arbitral.
51. Os resultados negativos do exercício de 2007 já eram conhecidos da Recorrente à data da interpelação que dirigiu à Recorrida com vista à instauração do tribunal arbitral.
52. Por outro lado, esse facto não é demonstrativo da suposta penúria económica da Recorrente, ao contrário do que esta afirma, mas tão só que, naquele ano, a Recorrente declarou aquele prejuízo para efeitos fiscais.
53. Ainda que se pudesse reconhecer formalmente o direito a propor a presente acção nos tribunais judiciais, e manifestamente não pode, o certo é que a conduta da Recorrente é total e injustificadamente contraditória e lesiva das expectativas criadas na Recorrida, o que sempre consubstanciaria um exercício abusivo desse direito (artigo 334º do Código Civil).
54. Conforme dispõe o artigo 406.º do Código Civil, os contratos devem ser pontualmente cumpridos, só podendo modificar-se ou extinguir-se por acordo das partes ou nos casos admitidos na lei.
55. Alegando uma suposta insuficiência económica, não provada, a Recorrente pretende modificar os contratos celebrados com a Recorrida, subtraindo-se ao estipulado nas cláusulas compromissórias constantes desses contratos.
56. Tal comportamento é juridicamente inadmissível.

II - Apreciação do recurso
Os factos:
O tribunal a quo deu como provado o seguinte factualismo:
1. A Autora denomina-se “SJ, Lda.”;
2. A Autora atribuiu à causa o valor de € 420.400,29;
3. Em escrito datado de 30 de Abril de 2004, encimado pela expressão “ACORDO DE CONCESSÃO PARA REVENDEDORES K (CONTRATO de CONCESSIONÁRIO K PARA PORTUGAL)”, a Autora, aí designada como “Concessionário” e a Ré, aí designada como “Importador”, declararam “(…) As partes procurarão resolver litígios em relação a este acordo através de negociações amigáveis. Qualquer litígio entre as Partes em relação a este Acordo, que não tenha sido resolvido através de negociação ao mais tardar dentro do prazo de um mês a contar da solicitação de uma das Partes no sentido de iniciar negociações, será definitivamente resolvido por arbitragem em língua portuguesa, a realizar em Lisboa pelo Centro de Arbitragem Comercial da Associação Comercial de Lisboa/Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa e Associação Comercial do Porto/Câmara de Comércio e Indústria do Porto, de acordo com os respectivos Regulamentos de Arbitragem então vigentes (…) Os litígios que não forem susceptíveis de ser resolvidos por arbitragem, serão resolvidos pelos Tribunais da Comarca de Lisboa, com expressa renúncia a quaisquer outros (…)”;
4. Em escrito datado de 30 de Abril de 2004, encimado pela expressão “ACORDO DE REPARADOR AUTORIZADO K”, a Autora, aí designada como “Reparador Autorizado” e a Ré, aí designada como “Importador”, declararam “(…) As partes procurarão resolver litígios em relação a este acordo através de negociações amigáveis. Qualquer litígio entre as Partes em relação a este Acordo, que não tenha sido resolvido através de negociação ao mais tardar dentro do prazo de um mês a contar da solicitação de uma das Partes no sentido de iniciar negociações, será definitivamente resolvido por arbitragem em língua portuguesa, a realizar em Lisboa pelo Centro de Arbitragem Comercial da Associação Comercial de Lisboa/Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa e Associação Comercial do Porto/Câmara de Comércio e Indústria do Porto, de acordo com os respectivos Regulamentos de Arbitragem então vigentes (…) Os litígios que não forem susceptíveis de ser resolvidos por arbitragem, serão resolvidos pelos Tribunais da Comarca de Lisboa, com expressa renúncia a quaisquer outros (…)”;
5. Os escritos a que aludem os pontos n.ºs 3 e 4 foram redigidos e enviados à Autora para que os seus representantes os assinassem;
6. No artigo 7º do Regulamento de Custas e Preparos do Centro de Arbitragem da Associação Comercial de Lisboa lê-se: “2. Haverá um preparo inicial, a efectuar por cada uma das partes, de montante a fixar pelo Presidente de Conselho de Arbitragem, mas que não poderá exceder, para cada uma, 35% do montante total mínimo das custas do processo. 3. No decurso do processo, o Presidente do Conselho de Arbitragem ordenará o reforço de preparos até perfazer o montante total mínimo das custas do processo. (…)”;
7. De acordo com as tabelas anexas ao Regulamento de Custas e Preparos do Centro de Arbitragem da Associação Comercial de Lisboa e tendo em conta o valor atribuído pela Autora à causa, deverá ser pago a cada árbitro, a título de honorários, o valor de € 5.673,83 mais 0,75% do que exceder € 249.398,95, sendo devidos encargos administrativos de € 4.738,58, mais 0,50% do que exceder € 249.398,95;
8. No ano de 2004, a Autora declarou, em sede de IRC, um resultado líquido de € 2.126,83;
9. No ano de 2005, a Autora declarou, em sede de IRC, um resultado líquido de € 6.080,50;
10. No ano de 2006, a Autora declarou, em sede de IRC, um resultado líquido de € 44.137,78;
11. No ano de 2007, a Autora declarou, em sede de IRC, um resultado líquido de - € 59.376,60;
12. No mês de Dezembro de 2006, a “K” vendeu -65,4% do que em Dezembro de 2005;
13. No ano de 2007, a “K” vendeu mais automóveis do que em 2006;
14. Em escrito datado de 10 de Agosto de 2007 e remetido à Autora pela Ré, esta declarou: “(…) .: Resolução dos acordos de concessão para revendedores e de reparador autorizado K tem, por diversas vezes, alertado a SJ para a deficiente prestação comercial desta sociedade no contexto da relação estabelecida com ‘case nos Acordo de Concessão para Revendedores K e Acordo de Reparador Autorizado K. Sem prejuízo das diligências levadas a cabo pela M a S J. incumpriu reiteradamente nos pagamentos à M e não tem desenvolvido, em termos cabais, a promoção da marca e dos veiculas K. Com efeito, e nomeadamente, a SJs não dispõe de suficientes veículos de demonstração nem dispõe de equipa comercial suficiente dedicada à marca. Semelhante comportamento de notório desinvestimento no negócio é também visível no número de viaturas em stock e encomendadas pela SJ.. Tal circunstancialismo é visível quando a M compara os resultados comerciais de outros parceiros, os quais, com idênticas condicionantes de mercado, apresentam resultados comerciais substancialmente melhores. Desde o ano de 2006 que, não obstante os sucessivos alertas levados a cabo pela M, a SJ vem incumprindo, de forma reiterada e grave, os objectivos de venda. Este resultado, que mais não é do que a tradução da postura comercial já referida, não pode subsistir, sob pena de colocar em causa a própria rede autorizada K. Nestes termos, e com base no disposto nas secções, respectivamente, 27.9, alínea b), e 22.9, alínea b), dos acordos de concessão para revendedores e de reparador autorizado KJA, a M vem pela presente resolver, com efeito imediato, os referidos contratos. (…)”;
15. Em escrito datado de 5 de Março de 2008 e remetido à Ré, a Autora declarou: “(…) Considerando que está ultrapassado o prazo de um mês referido na parte inicial do n. 6, da Secção 29, do ‘Acordo de Concessão para Revenda K Portugal’ e da parte inicial do n. 6, Secção 24, do ‘Acordo de Reparador Autorizado K’, ambos outorgados entre as nossas sociedades, em 30 de Abril de 2004, não se tendo alcançado uma solução negociada para o diferendo entre as partes, não obstante a N/ proposta remetida a V. Exas., por correio electrónico de 05.11.2007. Considerando ainda, por um lado, as V. prezadas cartas datadas de 11.12.2007 e 27.02.08 e, por outro, que V. Exas. já reclamaram ao M o pagamento da Garantia Bancária n.º, prestada por esta empresa, no valor de €175.000,00.Considerando ainda o teor das referidas disposições contratuais e dado que ocorreu – igualmente por V. impulso exclusivo, efectuado por carta datada de 10.08.07 –, uma resolução sem justa causa de ambos os referidos “Acordos K”, vimos comunicar a V. Exas., para os legais efeitos, que vamos fazer analisar o fundado da nossa pretensão, ou seja, a declaração da ilegalidade da cessação dos contratos de revendedor autorizado e de oficina autorizada da marca K operada por V. Exas., a declaração de que a reclamação do pagamento da referida garantia bancária foi ilegal, porque substancial e materialmente infundada e ainda extemporânea, bem como a condenação da V. sociedade no pagamento de um montante indemnizatório dos prejuízos dali decorrentes e ainda na obrigação de aquisição dos bens que temos em ‘stock’, em pretensão a apresentar no CENTRO DE ARBITRAGEM COMERCIAL DA CÂMARA DE COMÉRCIO DA INDÚSTRIA PORTUGUESA – ASSOCIAÇÃO INDUSTRIAL DE LISBOA. Aproveitamos ainda para comunicar a V. Exas. que no âmbito da dedução do pedido indemnizatório acima referido, pretendemos receber a ‘indemnização de clientela’ devida pela cessação dos aludidos ‘Acordos’. Dado que a cláusula compromissória não fixa o número nem o modo de fixação do(s) árbitro(s), vimos solicitar que, em complemento desta, indiquem o número e identidade do(s) mesmo(s). Pela nossa parte, sugeríamos para
presidir – ou árbitro único - o Exmo. Senhor Conselheiro Aposentado do S.T.J., Exmo. Senhor Dr. J, com larga experiência neste tipo de jurisdição. (…)”;
16. Nos presentes autos, a Autora peticiona perante a Ré que seja declarada a nulidade de cláusulas inseridas nos escritos a que aludem os pontos n.ºs 3. e 4., a ilicitude da resolução operada mediante o escrito reproduzido em 14. que aquela seja condenada no pagamento de uma indemnização no valor de € 142.631,98 por lucros cessantes e danos emergentes, de uma indemnização de clientela no valor de € 128.289,08 (ambas reportadas aos escritos supra aludidos), de uma quantia (liquidada provisoriamente em € 1.920,22) a título de comissões pela manutenção da garantia bancária, tudo acrescido de juros moratórios à taxa legal dos juros comerciais, bem como a retomar as peças e automóveis que a Autora têm em stock e a promover o cancelamento da dita garantia;

O direito
Questão a conhecer (delimitada pelo teor das conclusões do recurso e na ausência de aspectos de conhecimento oficioso – art.ºs 690, n.º1, 684, n.º3, 660, n.º2, todos do CPC)

Ø Da preterição do Tribunal Arbitral

De acordo com os elementos fácticos constantes dos autos, a situação sob apreciação assume os seguintes contornos:
A Autora, sociedade comercial, que tem por objecto o comércio de automóveis, celebrou com a Ré, em 30-04-2004, dois contratos: Acordo para concessão para revendedores K e o acordo reparador autorizado K, nos quais consta cláusula que institui a arbitragem em língua portuguesa para resolução definitiva de qualquer litígio referente aos mesmos.
Em Agosto de 2007, a Ré procedeu à resolução dos referidos contratos.
Por considerar ilícita tal resolução, a Autora pretende submetê-la a apreciação jurisdicional responsabilizando a Ré pelas consequências (prejuízos) decorrentes da ilicitude da cessação dos contratos.
Desviando-se da via contratualmente assumida, a Autora, para defesa das suas pretensões, interpôs acção em tribunal judicial (o tribunal a quo), pretendendo que seja preterido o tribunal arbitral, tendo por subjacente a nulidade da cláusula compromissória e a sua impossibilidade económica para aceder ao tribunal contratualmente estipulado.  
A decisão recorrida decidiu no sentido de que a Autora ao propor a presente acção violou, sem fundamento, a convenção de arbitragem, assentando no seguinte raciocínio:
ü Encontrar-se vedada à jurisdição estadual a possibilidade de apreciar a competência do tribunal arbitral sem que este tenha tido a hipótese de se pronunciar sobre a mesma (por aplicação do princípio kompetenz-kompetenz), excepto se estiver em causa convenção manifestamente nula.
ü A nulidade invocada pela Autora com que fundamenta a inaplicabilidade da cláusula compromissória não tem cariz manifesto, pelo que não pode ser conhecida pelo tribunal judicial.
ü Os factos provados (pontos 8 a 11) não permitem concluir pela existência de uma situação de debilidade económico-financeira da Autora que a impeça de recorrer à jurisdição arbitral convencionada.
ü A considerar que a debilidade económica da Autora pudesse existir e que a mesma não lhe era atribuível, o factualismo assente no ponto 15 – interpelação da Autora à Ré para compor o tribunal arbitral - constitui comportamento enquadrável em venire contra factum propprium, já que não é crível que a Autora quando dirigiu à Ré a referida carta, desconhecesse a sua situação económica.
A Apelante insurge-se contra a sentença sustentando a seguinte argumentação:
Ø Partilhando da tese defendida por Miguel Sousa Teixeira, o tribunal a quo, na qualidade de tribunal estadual, deverá apreciar a validade, eficácia e a aplicabilidade da convenção de arbitragem.
Ø A aceitar-se a incompetência do tribunal a quo para apreciar a nulidade da convenção de arbitragem inviabilizar-se-ia a possibilidade da convenção vir a ser apreciada por tribunal judicial, pois que nos termos do Regulamento de Arbitragem do Centro de Arbitragem Comercial da Associação Comercial de Lisboa, as decisões arbitrais proferida pelo mesmo não são passíveis de recurso.
Ø No âmbito da concessão de marca de representação de marcas de automóveis, o papel de domínio da Concedente face ao Concessionário, que dela depende economicamente, consubstancia um quadro negocial padronizado em que a inclusão de uma cláusula não passível de alteração, que impõe o recurso a um Tribunal Arbitral, assume cabimento na alínea g) do art.º 19, do DL 446/85, de 25-10.
Ø A referida alínea encerra um conflito de direitos: de um lado, os inconvenientes de uma das partes (no caso, o da celeridade processual); do outro, os interesses da parte no recurso ao foro estabelecido (no caso, a impossibilidade de acesso à justiça, direito que se encontra constitucionalmente garantido).
Ø O tribunal a quo precipitou a decisão ao concluir pela falta de prova da debilidade económica da Recorrente, pois que na petição mostra-se alegada a situação de debilidade económica e o facto da mesma não lhe ser imputável (mas da ilícita cessação dos Acordos de Concessão e de Reparador autorizado promovida pela Recorrida), sendo que, não ocorrendo obrigatoriedade de prova por via documental, a formulação do juízo decisório quanto ao facto ocorreu sem que tenha sido possibilitada a produção de prova testemunhal para demonstração do factualismo alegado.
Ø Não configura qualquer situação de abuso de direito – na vertente venire contra factum proprium – a circunstância da Recorrente ter remetido à Recorrida, em 05 de Março de 2008, missiva para que esta indicasse árbitros que comporiam o tribunal arbitral e, decorridos cerca de onze meses, ter dado entrada da petição no tribunal judicial, uma vez que foi nesse período que constatou (verificando que os seus resultados líquidos do exercício de 2007 haviam sido superiores a 59.000,00 euros negativos) a sua debilidade económica para enveredar pela via arbitral, mantendo, porém, inalterado propósito de se socorrer da via jurisdicional com vista a acautelar os seus interesses: Não ocorre, por isso, a pretensão de alcançar fins ilegais por meios legais.
A análise da questão em litígio, atenta a argumentação sustentada, impõe a abordagem das seguintes questões:

1. Competência do tribunal judicial para apreciar a nulidade substancial das cláusulas compromissórias
2. Nulidade da convenção de arbitragem
3. Carência superveniente de meios financeiros da Autora
4. Abuso do direito

1. Competência do tribunal judicial para apreciar a nulidade substancial das cláusulas compromissórias 

Não se suscitam dúvidas de que as partes estipularam, em ambos os contratos, uma convenção de arbitragem, na modalidade de cláusula compromissória, visto que tem por objecto “litígios eventuais emergentes de uma determinada relação jurídica contratual” (cfr. art. 1º/2 da Lei 31/86, de 29 de Agosto), no caso, os decorrentes dos contratos firmados. Por outro lado, a situação não está submetida por lei especial exclusivamente a tribunal judicial ou a arbitragem necessária, nem se reporta a direitos indisponíveis, encontra-se inserida em documentos escritos (nos contratos) e especifica a relação jurídica a que os litígios respeitam. Nessa medida, os requisitos quanto à arbitrabilidade, à forma e ao conteúdo[1] encontram-se, inequivocamente, verificados no caso em análise, o que permite concluir que, à partida, se mostra totalmente válido o estabelecimento, entre as partes, de uma cláusula compromissória, vinculando, por isso, as partes ao seu acatamento e cuja violação constitui excepção dilatória que implica a absolvição do réu da instância.
Importa pois determinar qual o alcance que pode assumir a procedência da excepção de preterição do tribunal arbitral a decidir pelo tribunal judicial. A resposta tem a ver com a própria eficácia da convenção de arbitragem e terá, necessariamente, de ser encontrada no contexto do ordenamento jurídico, designadamente, no regime preceituado na Lei da Arbitragem Voluntária (LAV – DL 31/86, de 29-08).
            O art.º 21, n.º1, da Lei 31/86, de 29-08 (LAV), ao estatuir que o tribunal arbitral pode pronunciar-se sobre a sua própria competência, mesmo que para esse fim seja necessário apreciar a existência, a validade ou a eficácia da convenção de arbitragem ou do contrato em que ela se insira, ou a aplicabilidade da referida convenção, estabelece o denominado princípio da Kompetenz-Kompetenz, atribuindo ao tribunal arbitral competência para decidir sobre a sua própria competência. O n.º4 do mesmo preceito, dispõe que a decisão pela qual o tribunal arbitral se declara competente só pode ser apreciada pelo tribunal judicial depois de proferida decisão sobre o fundo da causa e pelos meios especificados nos artigos 27º e 31. Por sua vez o n.º1 do art.º 29 da citada Lei prescreve a regra da irrecorribilidade das decisões arbitrais que não sejam decisão final.
Trata-se, sem dúvida, de um mecanismo legal de estrita defesa da esfera de competência do árbitro[2].
            Neste contexto, suscita-se a questão de saber se para decidir sobre a procedência (ou improcedência) da excepção de preterição do tribunal arbitral, o tribunal judicial terá de apreciar a validade e eficácia da convenção de arbitragem; nessa medida, a absolvição da instância decidida pelo tribunal judicial teria como efeito vincular o tribunal arbitral ao reconhecimento da sua competência para apreciação do mesmo objecto, significando dessa forma cercear o tribunal arbitral dos seus poderes de cognição. A não ser assim, deverá o juiz, na decisão a proferir quanto ao conhecimento da excepção de preterição do tribunal arbitral, limitar-se tão só à prova da existência de convenção de arbitragem que não seja manifestamente nula?
            Não é pacífica a solução a dar pois estão em causa duas posições doutrinárias, ambas sustentadas por argumentação consistente:
            Para os que defendem que o tribunal judicial ao decidir a excepção de preterição do tribunal arbitral terá de apreciar a validade e a eficácia da convenção de arbitragem[3], não há dúvida de que a decisão proferida vincula o tribunal arbitral quanto à fixação da sua competência para apreciar aquela relação, atento o pressuposto do reconhecimento quanto à validade da convenção de arbitragem. É o entendimento acolhido por Miguel Teixeira de Sousa, que a Recorrente pretende que vingue.
Um outro posicionamento, seguido na sentença recorrida, entende que a decisão que conhece a excepção limita-se à prova da existência de uma convenção de arbitragem que não seja manifestamente nula. Nessa medida, a decisão do tribunal judicial só vincula o tribunal arbitral quando verificar a manifesta nulidade da convenção de arbitragem. E dessa forma, como salienta Luís de Lima Pinheiro, Se o tribunal arbitral se considerar incompetente, a acção pode ser novamente proposta no tribunal judicial, que se deve considerar vinculado à decisão do tribunal arbitral sobre a invalidade ou ineficácia da convenção de arbitragem; por sua vez, Se o tribunal arbitral se considerar competente a sua decisão não vincula o tribunal judicial, mas este só pode apreciar a questão depois de proferida a decisão sobre o fundo da causa em acção de anulação, recurso ou oposição à execução da decisão arbitra[4]..
Em defesa da sua tese Miguel Teixeira de Sousa põe acento tónico no risco de existência de um conflito negativo de competências caso o tribunal arbitral não estivesse vinculado a aceitar a competência que lhe foi reconhecida na decisão do tribunal judicial. Aduz ainda como argumento a necessidade de se estabelecer correspondência com a decisão de extinção da instância por superveniência de compromisso arbitral, por entender que, neste caso, seria muito difícil defender que o tribunal arbitral não está vinculado à apreciação da validade e aplicabilidade da convenção de arbitragem realizada pelo tribunal judicial. Por conseguinte e segundo o mesmo, tal deverá acontecer quando a apreciação pelo tribunal judicial for a absolvição da instância com fundamento na preterição de tribunal arbitral[5].
Na sequência do entendimento tendencial que tem vindo a ser sufragado na jurisprudência[6], não nos parece ser esta a posição que encontra acolhimento na LAV. Para além disso, os argumentos defendidos por Miguel Teixeira de Sousa têm por subjacente um equívoco - o risco de existência de um conflito negativo de competência. Ora, a violação de convenção de arbitragem ou preterição do tribunal arbitral voluntário não é uma questão de competência. O que se discute está ainda a montante da questão de competência: discute-se se o litígio introduzido em juízo pode ser submetido à jurisdição pública ou se, pelo contrário, não está (ainda) em condições de ser apreciado por um tribunal judicial (…) A preterição do tribunal arbitral voluntário, ou violação de convenção de arbitragem, nada tem a ver com a incompetência do tribunal judicial para conhecer do mérito. Tem a ver exclusivamente com a própria jurisdição. Isto é, a lei admite que as partes, através da convenção de arbitragem, renunciem ao princípio do juiz natural.[7]
Por outro lado e no que se reporta ao paralelismo da apreciação da excepção de preterição de tribunal arbitral voluntário com o julgamento da extinção da instância por superveniência de compromisso arbitral, importa ter em linha de conta que o julgamento da validade do compromisso que o n.º 2 do art.º 290 do CPC impõe ao julgador apreciar, reporta-se à validade do compromisso no que toca a avaliar se as partes na acção cujo julgamento lhe estava cometido decidiram entregar a decisão a árbitros. Isto é, a lei reconhece competência ao juiz da causa para o julgamento do acto que lhe retira jurisdição (...) Por isso a lei restringe tal julgamento da validade do compromisso arbitral que determina a extinção da instância à forma do acordo das partes, ao seu objecto e à qualidade das pessoas. E a decisão respectiva não pode deixar de vincular o árbitro nessa medida.[8]. Reconduz-se, no fundo, à própria aplicação do princípio da Kompetenz-Kompetenz.
O entendimento que mais se compagina com o alcance a dar ao princípio da Kompetenz-Kompetenz ínsito no art.º 21, n.º1, da LAV, é o que considera que o julgamento da excepção não é, nem comporta o julgamento do tribunal judicial, pois que o referido princípio não se assume apenas no sentido de que o árbitro tem competência para conhecer da sua própria competência, decorre também que tal competência lhe cabe antes de poder ser definida pelo tribunal judicial[9].
Como se encontra salientado no Acórdão da Relação de Lisboa de 10-02-2009, outro entendimento seria dificilmente compatível com o disposto no art.º 12º, n.º 4 da LAV, que constitui o único caso em que a lei admite que um tribunal judicial aprecie a convenção de arbitragem antes de proferida a decisão final do árbitro, já que permite ao juiz (presidente do tribunal da relação) que declare não haver lugar à designação de árbitros em caso de nulidade manifesta da convenção de arbitragem.
Não podemos deixar de concordar com João Luís Lopes dos Reis quando afirma que estas cautelas da lei significam que ela quis que o tribunal judicial olhasse a convenção de arbitragem como um sinal de proibição: há convenção de arbitragem, é plausível que ela vincule as partes no litígio, então, quanto ao litígio entre elas, o tribunal judicial não pode intervir senão em sede de impugnação da decisão arbitral. Para que esse limite fique claro, para que fique nitidamente delimitada essa fronteira estabelecida ao poder do juiz, questões relativas à própria convenção, como a sua validade, a sua eficácia, a sua aplicabilidade, só podem ser apreciadas pelo tribunal judicial depois de o árbitro proferir a sua decisão final. Só se ocorrer nulidade manifesta da convenção de arbitragem o tribunal judicial pode decidir de outro modo.[10]  Por conseguinte há que concluir que o julgamento da procedência da excepção de preterição do tribunal arbitral reconduz-se apenas ao julgamento da existência de convenção de arbitragem não manifestamente nula e eventualmente aplicável à situação concreta em causa.
Improcede por isso, quanto a este aspecto, a argumentação defendida pela Recorrente.

2. Nulidade da convenção de arbitragem

A decisão recorrida decidiu que não lhe competia avaliar da nulidade substancial das referidas cláusulas compromissória por não estar em causa nulidade manifesta (por a situação não ter cabimento na alínea g) do art.º 19 do DL 446/85, de 25-10). Estribou-se no seguinte raciocínio:
            - As proibições relativas ínsitas no art.º 19 do DL 446/85, de 25-10, têm como horizonte de referência o tipo de negócio em causa e os elementos que normativamente o caracterizam (quadro negocial padronizado, na linguagem utilizada pelo legislador), não podendo ser avaliadas em função das circunstâncias do caso concreto.
            - Sendo difícil de concretizar o quadro negocial padronizado no âmbito dos contratos em causa, por os mesmos não se encontrarem padronizados, cabe proceder à avaliação perante no quadro negocial padronizado do contrato de concessão.
            - Nesse quadro, não se verifica que a inserção de uma cláusula compromissória crie concretos, graves e injustificados inconvenientes a qualquer uma das partes na resolução do litígio.
            Persiste, porém, a Recorrente entendendo que, ao invés do considerado na sentença, o quadro negocial padronizado evidencia desde logo o papel notório de domínio (jurídico, comercial e financeiro) do Concedente relativamente ao Concessionário, que se encontra em situação de dependência e inferioridade. Considera ainda que a análise dos graves inconvenientes para uma das partes a que alude a alínea g) do art.º 19, do DL 446/85, de 25.10, terá de ser feita no concreto, não na abstracção do quadro negocial padronizável, uma vez que este constitui apenas o cenário que ambienta a análise dos graves inconvenientes que a atribuição da competência ao Tribunal Arbitral produz na parte
            Vejamos.
            De acordo com os elementos dos autos, designadamente, o factualismo apurado, não parecer ocorrer dúvida de que os contratos em apreço foram celebrados com recurso a cláusulas padronizadas, previamente elaboradas pela entidade Concedente, que a Autora, enquanto Concessionaria, se limitou a aceitar. Está-se, assim, perante contratos de adesão, sujeitos, genericamente, ao regime da Lei das Cláusulas Contratuais Gerais, aplicando-se-lhes, nessa medida, a proibição legal de cláusulas em função do seu conteúdo, tendo por subjacente a tutela da entidade aderente. Trata-se de um controle que tem por objectivo último a prossecução de um adequado equilíbrio contratual de interesses, impedindo que uma das partes não vise os seus exclusivos propósitos negociais, sem atender, de forma minimamente adequada, aos interesses da parte contrária.
Nessa ponderação a lei adoptou um sistema de distinguir duas categorias de cláusulas: as que considera proibidas em absoluto (que não se admitem nos contrato celebrados qualquer que seja o respectivo contexto) e as que apelida de relativamente proibidas, por se apresentarem susceptíveis de serem válidas para certos contratos dependendo de um juízo valorativo suplementar que a isso conduza, realizado em face das próprias cláusulas, encaradas no seu conjunto – não a partir dos negócios concretos - e de acordo com os padrões considerados.[11]
No caso sob apreciação a questão que se coloca é a de saber se as cláusulas compromissórias inseridas nos contratos violam o disposto no art.º 19, alínea g), do DL 446/85, de 25-10, ou seja, se o estipulado quanto à atribuição de competência a Tribunal Arbitral viola o desígnio da norma de proibição, na composição de direitos e deveres resultantes da conformação dos contratos, considerados no seu todo, e tendo em conta o quadro negocial padronizado.
O juízo valorativo subjacente à apreciação do desequilíbrio das condições que envolvem o contrato, ao contrário do pugnado pela Recorrente, não passa por atender à situação concreta. Na verdade, o sentido da lei nunca poderia ser o de impor um juízo casuístico já que isso seria eliminar a possibilidade de declarar inválida uma cláusula relativamente proibida[12], por isso, a lei define o critério ao fazer apelo ao quadro negocial padronizado enquanto horizonte de referência.
O significado a dar a esse juízo valorativo é o de considerar a cláusula em concreto à luz do tipo contratual em que se insere, ou seja, há que ponderar as cláusulas colocadas em causa tendo em linha de conta o conjunto contratual respectivo - valorando os interesses típicos normalmente implicados nos acordos dessa espécie considerada.
Por conseguinte, nessa ponderação, a apreciação a levar a cabo é a situação do interesse contratual-típico, isto é, tendo em conta o tipo negocial abstractamente predisposto e não as condições particulares do negócio individual realizado[13]; nessa medida, os interesses individuais das partes não podem assumir qualquer directo relevo.
Neste contexto não é possível concluir que no contrato de concessão[14] (extensível quanto ao contrato de reparador autorizado), ainda que no âmbito da concessão de marca de representação de marcas de automóveis, ocorra uma posição de domínio da Concedente em contraposição com a debilidade (económica, comercial e jurídica) do Concessionário de forma a poder afirmar-se que a escolha de um foro arbitral envolve graves inconvenientes para uma das partes, sem que os interesses da outra o justifiquem.
Com efeito, não há que confundir situação de dependência económica, que ocorre necessariamente neste quadro contratual, com a de debilidade num contexto contratual típico, pois que no contrato de concessão (onde a exclusividade não é característica do tipo contratual[15]), o concessionário actua em seu nome, por conta própria, e com total autonomia (embora sujeito a coordenação da actividade no seio da rede de distribuição). De outro modo e a atender-se os aspectos salientados pela Recorrente – capital social e património de cada uma das partes, representatividade local dos concessionários da marca – que a fazem concluir no sentido das suas dificuldades económicas e na impossibilidade de aceder à justiça (e no conflito de interesses subjacente à estatuição constante da alínea g) do art.º 19 do DL 446/85, de 25-10), estar-se-ia a avaliar a situação tendo por subjacente o caso concreto, ao contrário do que a lei impõe.
Acresce que a alegada força de impor condições contratuais descrita pela Recorrente reconduz-se à própria realidade que se encontra subjacente à generalidade do clausulado contratual geral, que, no caso, assume pleno cabimento tendo em conta o âmago de funcionamento da concessão comercial neste domínio e que tem sustentação na necessidade dos concessionários oficias da marca agirem segundo um conjunto de regras comuns; daí que não faria cabimento qualquer negociação.  
Entendemos, por isso, que no âmbito deste contrato tipo – o da concessão de marca de representação de marcas de automóveis -, a cláusula que estabelece a escolha de um foro arbitral, cuja constituição acarreta, necessariamente, encargos acrescidos às partes, não enferma de nulidade por referência à alínea g) do art.º 19 do citado DL 446/85.    
Nestes termos, tal como decidido pelo tribunal a quo, não é possível considerar-se como manifestamente nulas tais cláusulas compromissórias.
Improcedem ainda, nesta parte, as conclusões das alegações.

3. Carência superveniente de meios financeiros da Autora

Mostra-se posicionamento pacífico[16] considerar que a superveniência de uma situação de insuficiência económica, que impossibilite uma das partes de suportar as despesas com a constituição e funcionamento da arbitragem, constituirá causa legítima de incumprimento da convenção. Consequentemente, a parte impossibilitada poderá submeter a apreciação do litígio nos tribunais estaduais.
Este entendimento, porém, não possui resposta directa na lei, mas assume acolhimento legal a nível constitucional (a justiça não pode ser denegada por carência de meios económicos - cfr. art.º 20, n.º4, da CRP) e da legislação ordinária[17] que, no direito das obrigações, contém norma que prevê a extinção da obrigação fundada na impossibilidade do seu incumprimento por causa não imputável ao devedor - art.º 790, n.º1, do Código Civil.
Embora no caso não se esteja no âmbito da impossibilidade da obrigação em sentido técnico (a obrigação de recorrer a tribunal arbitral, não se tornou impossível, o que se tornou impossível foi o pagamento das despesas da arbitragem, que constitui como que uma obrigação acessória da principal), o certo é que tal enquadramento é transponível à convenção de arbitragem se nos socorrermos do direito fundamental de aplicação directa acima referenciado – acesso ao direito e aos tribunais. Com efeito, quando uma das partes, sem culpa sua, deixa de ter meios de custear as despesas relativas à arbitragem, não pode ficar impedida de ver satisfeito o seu direito de acesso à justiça para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, pois estar-se-ia a denegar justiça por insuficiência de meios económicos (o que a Lei Fundamental, como vimos, não permite), pelo que a obrigação de recorrer à arbitragem se extingue relativamente a ela.
No caso sob apreciação o tribunal a quo entendeu que os elementos fácticos constantes do processo não permitiam concluir pela existência de debilidade económico-financeira impeditiva da Autora recorrer à jurisdição arbitral convencionada.
Insurge-se a Recorrente contra tal entendimento fazendo, nesta sede, assentar a sua discordância pelo facto do tribunal a quo ter produzido um juízo antecipado relativamente à questão. Defende, por isso, que não existindo, no caso, obrigatoriedade de demonstração dos factos por via documental, só após a produção de prova testemunhal se poderia decidir em conformidade, designadamente no que se reporta à relação directa entre a ilícita cessação dos contratos e a queda abrupta dos seus resultados líquidos.
Não podemos concordar com a Apelante.
Tal como referido na sentença recorrida, os elementos fácticos evidenciados nos autos não permitem concluir pela existência de debilidade económica-financeira da Autora incapacitante de suportar as despesas acrescidas decorrentes da via arbitral na solução do litígio, pois o que resultou apurado reporta-se apenas ao facto da mesma ter declarado para efeitos fiscais (IRC) resultado líquido negativo de 59.376,60 euros, sendo certo que nos anos anteriores (desde 2004) a declaração de IRC foi sempre de resultados positivos. Este factualismo – declaração para efeitos de IRC - mostra-se manifestamente insuficiente para se poder avaliar da efectiva realidade económico-financeira da empresa.
Por outro lado, importa salientar que, atendendo à estrutura jurídica da Autora enquanto entidade empresarial (sociedade comercial), não podia deixar de se privilegiar para os pretendidos efeitos a prova documental[18]. Na verdade, a mesma possui, necessariamente, escrita organizada (escrituração comercial) nela contendo todos os elementos documentais que lhe permitiriam, com adequação, espelhar nos autos a sua realidade económica e financeira de forma a demonstrar a alegação produzida; nessa medida, a via da prova testemunhal só poderia ser considerada como coadjuvante (e nunca substitutiva dessa prova documental, como se infere da posição pretendida pela Recorrente) no sentido de poder esclarecer quaisquer dúvidas.
Não conseguiu, por isso, a Autora demonstrar, conforme lhe competia em termos de ónus de prova, a sua impossibilidade económica de cumprir a obrigação assumida nos contratos celebrados com a Ré no que se refere à convenção de arbitragem neles estabelecida, falecendo, assim e quanto a esta questão, as conclusões do seu recurso.

4. Abuso do direito

Decidiu-se na sentença recorrida que a conduta da Autora configura uma situação de abuso do direito, na vertente venire contra factum proprium.
Entendeu o tribunal a quo que a Autora ao dirigir (em 5 de Março de 2008) carta à Ré, abrindo o caminho para a constituição de tribunal arbitral (indicando desde logo um árbitro), necessariamente já tinha conhecimento da sua realidade económica e, ainda assim, assumiu comportamento gerador da confiança legítima da outra parte, pelo que consubstancia comportamento contraditório invocar a insuficiência económica nesta acção (intentada em Fevereiro de 2009) para obstar à procedência da excepção de preterição do tribunal arbitral.
            Conclui ainda a decisão objecto de recurso que em face dos padrões de referência ético-jurídicos da nossa sociedade, a conduta da Autora deve ser censurada por o exercício do direito de acção, neste caso, exceder claramente os limites impostos pela boa fé.
            Não subscrevemos este entendimento.
            Em primeiro lugar, o tribunal a quo ao inferir que a Autora, em Março de 2008, quando enviou a carta à Ré comunicando-lhe a sua intenção de solucionar o litígio, solicitando e indicando a designação de árbitros para composição do tribunal arbitral, tinha pleno conhecimento da sua situação (de insuficiência) económica, extravasou o que lhe era permitido (cfr. art.º351, do Código Civil).
Na verdade, a lei impõe que o relatório de gestão, as contas do exercício e demais documentos de prestação de contas (que espelham a realidade económica da empresa) devam ser apresentados ao órgão competente da sociedade (e por este apreciados) no prazo de três meses a contar da data do encerramento de cada exercício anual (ou no prazo de cinco meses a contar da mesma data quando se trate de sociedades que devam apresentar contas consolidadas ou que apliquem o método da equivalência patrimonial) – art.º 65, n.º5, da Lei das Sociedades Comerciais -, pelo que, na ausência de quaisquer outros elementos, para além da declaração de IRC do ano de 2007, não dispunha o tribunal de factualismo suficiente (base de presunção) para, por mero raciocínio lógico e tendo por referência as regras da experiência, extrapolar no sentido de que, no início de Março de 2008, a Autora se encontrava na posse de todos os elementos que lhe permitiam ter a visão real e efectiva da sua situação financeira. 
Não se podendo partir deste pressuposto – de que a Autora, em Março de 2008, quando enviou carta à Ré, manifestando intenção de se socorrer de tribunal arbitral para solução do litígio, tinha conhecimento da situação de debilidade económica em que se encontrava –, fica sem qualquer sustentação a construção levada a cabo de imputar à Autora comportamento contraditório ao accionar judicialmente a Ré afastando o funcionamento da excepção de preterição do tribunal arbitral.
Acresce que, ainda que ocorresse tal conhecimento, muitas dúvidas se nos suscitam quanto ao enquadramento do comportamento da Ré na figura do abuso do direito.
De acordo com o disposto no art.º 334 do Código Civil, é ilegítimo o exercício de um direito quando o seu titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelo fim económico desse direito. 
            Esta figura constitui uma válvula de segurança do sistema ditada pela consciência jurídica que tem por finalidade contemporizar a injustiça clamorosa decorrente dos efeitos da rígida estrutura das normas sempre que ocorram particularidades ou circunstâncias especiais do caso concreto. Pretende-se pois com este expediente técnico afastar o direito sempre que o mesmo seja exercitado em termos clamorosamente ofensivos da justiça, ainda que em termos ajustados ao conteúdo formal atribuído pela lei.
            A proibição de venire contra factum proprium que impede a pretensão incompatível ou contraditória com a conduta anterior, cai no âmbito do abuso do direito sempre que o titular do direito exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé.   
            O princípio da boa fé significa, enquanto princípio normativo, que as pessoas devem ter um comportamento honesto, correcto legal, nomeadamente no exercício dos direitos e deveres, não defraudando a legítima confiança ou expectativa dos outros [19].
            Está subjacente à proibição da denominada conduta contraditória a necessidade da tutela da confiança justificada pela boa fé; nessa medida, impõe-se acautelar a situação de confiança que determine que uma pessoa acredite estavelmente em determinada conduta alheia entendida como tomada de posição em relação a dada situação futura.
Do factualismo apurado e ao invés do defendido no recurso, não resulta da matéria provada que a Apelante, com a sua actuação, tenha criado em relação à Ré expectativas relativamente ao compromisso arbitral (para além das que resultavam da estipulação contratual) que agora, para além dos limites da boa fé, tenha defraudado com a sua actuação através da instauração da presente acção.
Na verdade, tendo em conta as circunstâncias dos autos, (particularmente o facto de durante o período que mediou entre o envio da carta e a instauração da presente acção o tribunal arbitral não ter sido constituído, o que se mostra contrário ao interesse de celeridade que, à partida, está subjacente à opção da via arbitral), ainda que a carta enviada pela Autora ao solicitar e indicar árbitros para constituição de tribunal arbitral consubstancie comportamento susceptível de ter levado a Ré a crer que a mesma poderia não vir a colocar em causa a cláusula compromissória acordada, não a podemos considerar em si realidade capaz de criar uma situação objectiva de confiança na prossecução da via arbitral de modo a que o exercício do direito de acção pela via estadual tenha largamente excedido os limites impostos pela boa fé à luz do que assume impacto para efeitos do art.º 334, do Código Civil. Na verdade, cumpre salientar, no que se refere ao fim social ou económico do direito de exercício de acção, radicado sobretudo nas concepções ético-jurídicas dominantes da colectividade, há a ponderar a circunstância de que quer a via arbitral, quer a via jurisdicional estadual constituem formas de exercício da função jurisdicional. Consequentemente, o excesso cometido pela Autora no que se reporta ao fim económico ou social do direito de acção radica no não cumprimento de uma cláusula contratual respeitante à forma de composição do litígio, que não cai fora do âmbito dos tribunais (e foi esse o âmago da vontade manifestada na carta), pelo que a preterição do tribunal arbitral não pode, nessa medida, assumir uma leitura de limite manifestamente excedido.
Não consideramos, por isso, que a actuação da Autora possa ser integrada na figura do abuso do direito.
Por todo o exposto e não obstante o entendido relativamente ao argumento sustentado na figura do abuso do direito de acção, impõe-se concluir, tal como na sentença, que a Autora não conseguiu contrariar a procedência da excepção de preterição do tribunal arbitral.

III – Decisão

Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação de Lisboa em julgar improcedente a apelação, confirmando a sentença recorrida.
            Custas pela Autora.

Lisboa 2 de Novembro de 2010

Graça Amaral
Ana Maria Resende
Dina Monteiro
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[1] A Lei 31/86, de 29-08, considera arbitrável todo o litígio que não esteja submetido por lei especial exclusivamente a tribunal judicial ou a arbitragem necessária e que não diga respeito a direitos indisponíveis (n.º1, do art.º 1); e arbitráveis são, não apenas as questões de natureza contenciosa em sentido estrito, mas quaisquer outras, designadamente s relacionadas com a necessidade de precisar, completar, actualizar ou mesmo rever os contratos ou as relações jurídicas que estão na origem da convenção de arbitragem (n.º3 do art.º1). Em matéria de forma, exige a lei a redução a escrito da convenção de arbitragem (art.º 2, n.º1), entendida esta exigência de acordo com o disposto no n.º 2 do mesmo art. 2º. No que se refere ao respectivo conteúdo, a convenção de arbitragem deverá ser determinada - deve determinar com precisão o objecto do litígio; a cláusula compromissória deve especificar a relação jurídica a que os litígios respeitem – art.º 3, n.º2.
[2] Cfr. João Luís Lopes dos Reis, “Excepção da Preterição do Tribunal Arbitral (voluntário), ROA n.º 58, pág. 1120.
[3] Cfr. Luís de Lima Pinheiro, Arbitragem Internacional. A determinação do Estatuto da Arbitragem, 2005, pg. 135.
[4] Obra citada pág. 135/136
[5] Estudos sobre o Novo Processo Civil, Lex, Lisboa, 1997, pg. 134/135, citado no Acórdão da Relação de Lisboa de 10-02-2009, processo n.º 3859/2008-7, acessível através das Bases Documentais do ITIJ
[6] Entre outros e para além do citado Acórdão da Relação de Lisboa de 10-02-2009, Acórdão desta mesma Relação de 05-06-2007, processo n.º 1380/2007-1, acessível através das Bases Documentais do ITIJ
[7] João Luís Lopes dos Reis, obra citada, pág. 1126/1127.
[8] João Luís Lopes dos Reis, obra citada, pág. 1130.
[9] João Luís Lopes dos Reis, obra citada, pág. 1122.
[10] Obra citada, pág. 1123.
[11] Almeida e Costa, síntese do regime jurídico vigente das cláusulas contratuais gerais, 2ª Edição, Universidade Católica Editora, pág. 25.
[12] Não se encontra excluída a acção inibitória relativamente às cláusulas relativamente proibidas – cfr. art.º 25, do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25-10
[13] Almeno de Sá, Cláusulas Contratuais Gerais e Directiva sobre Cláusulas Abusivas, 1999, Almedina, pág. 218
[14] Contrato pelo qual uma das partes – o concessionário – se obriga a adquirir mercadoria à outra parte – o concedente – pelas quais paga um preço e que venderá, em nome próprio, por ser mercadoria sua, assumindo os riscos dessa operação. 
[15] Não é possível fazer a leitura do artigo 15º da Contestação como pretendido pela Autora no sentido de estar em causa uma “confissão” por parte da Ré relativamente à sua posição de domínio.
[16] Como, aliás, resulta da indicação da Jurisprudência citada na decisão recorrida, pelo que nos escusamos de o fazer. 
[17] De salientar ainda o disposto no n.º1 do art.º 87 do Código de Insolvência e Recuperação de Empresas que prevê a suspensão da eficácia das convenções arbitrais em que o insolvente seja parte, relativamente aos litígios de cariz patrimonial.
[18] Carecendo de cabimento (até em termos processuais) a produção de prova testemunhal para aferir da situação económica da Autora. 
[19] Coutinho de Abreu, “Do Abuso do Direito”, Almedina, Coimbra 1999, pág. 55.