Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | CARLOS ALMEIDA | ||
Descritores: | DIFAMAÇÃO OFENSAS À HONRA PESSOA COLECTIVA CRIME SEMI-PÚBLICO ASSISTENTE | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 10/10/2007 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | REJEITADO | ||
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Sumário: | I – A «ofensa a pessoa colectiva, organismo ou serviço» (artigo 187º do Código Penal) é uma incriminação distinta da «difamação» (artigo 180º do mesmo diploma), não podendo ambas ser confundidas. Não existe, portanto, qualquer crime de difamação «do tipo legal p. e p. nos artigos 180º, n.º 1, 183º, n.º 2, 184º, 187º, n.ºs 1 e 2» do Código Penal. II – Eventuais ofensas à honra destas duas distintas pessoas, cometidas por causa ou no exercício das suas funções, serão, se se tiverem verificado, qualificadas por força dos artigos 184º e 132º, n.º 2, alínea j), do Código Penal, o que implica que os crimes de difamação tenham natureza semi-pública, de acordo com a alínea a), do n.º 1 do artigo 188º do mesmo diploma legal, o mesmo sucedendo quanto ao crime de «ofensa a pessoa colectiva, organismo ou serviço», neste caso atento o disposto na alínea b) do n.º 1 desse mesmo preceito. III – Se apenas a pessoa singular foi admitida a intervir nos autos como assistente apenas ela, e no que respeita ao eventual crime de difamação de que se considerou ofendida, poderia ter recorrido do despacho de não pronúncia. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Lisboa 1 – (A), Presidente do Instituto de Meteorologia, «por si e ainda na qualidade de legal representante do IM», apresentou, no dia 7 de Abril de 2004, uma queixa contra (B) na qual lhe imputava a prática de factos que entendia consubstanciarem, «sob forma continuada», «dois crimes de difamação, do tipo legal p. e p. nos artigos 180º, n.º 1, 183º, n.º 2, 184º, 187º, n.ºs 1 e 2» do Código Penal (fls. 2 a 5). Apreciando pedido formulado, a sr.ª juíza de instrução proferiu, no dia 30 de Abril seguinte, um despacho através do qual admitiu «o Presidente do Instituto de Meteorologia a intervir nos autos como assistente» (fls. 33)[1]. No dia 28 de Outubro de 2004, o Ministério Público, no termo da fase de inquérito, decidiu arquivar os autos na parte em que eles tinham por objecto um crime de difamação[2], tendo determinado o cumprimento do artigo 285º, n.º 1, do Código de Processo Penal relativamente ao crime p. e p. pelo artigo 187º do Código Penal[3] (fls. 148 a 150). No dia 22 de Novembro de 2004 (fls. 168), na sequência da notificação que lhe foi feita, «(A), Presidente do Instituto de Meteorologia», deduziu acusação particular contra o arguido (A) imputando-lhe a prática, «sob a forma continuada», de «dois crimes de difamação, do tipo legal p. e p. nos artigos 180º, n.º 1, 183º, n.º 2, 184º, 187º, n.º 1 e n.º 2, todos do Código Penal, pelos quais o queixoso ofendido, por si e na qualidade de legal representante do IM foi lesado» (fls. 156 a 163). O Ministério Público não acompanhou essa acusação, entendendo que a mesma não devia ser sequer recebida porque tinha dado entrada fora de prazo (fls. 175). No mesmo dia 22, o referido «(A), Presidente do Instituto de Meteorologia», requereu a abertura de instrução pretendendo que o tribunal pronunciasse o arguido pela prática, «sob a forma continuada», de «dois crimes de difamação, do tipo legal p. e p. nos artigos 180º, n.º 1, 183º, n.º 2, e 184º do Código Penal» (fls. 205 a 212). Por decisão do Ministério Público (fls. 222), e na sequência de manifestação de vontade do assistente em sanar a irregularidade da entrega da acusação particular fora de prazo (fls. 203/4)), veio a ser paga a multa devida pela apresentação tardia dessa peça processual (fls. 225). No dia 25 de Fevereiro de 2005, o arguido (A) requereu também a abertura de instrução (fls. 228 a 231), suscitando, como questão prévia, a nulidade do procedimento no que respeita à admissão da acusação particular pela prática de um crime p. e p. no artigo 187º do Código Penal (ofensa a pessoa colectiva, organismo ou serviço), que considerou ter também natureza semi-pública. No fim da instrução, a sr.ª juíza proferiu o despacho que se transcreve (fls. 330 a 337): «Declaro encerrada a instrução. O Assistente requereu abertura de instrução requerendo a pronúncia do arguido pela prática do crime de ofensa a pessoa pública, organismo ou serviço p. e p. no artigo 187° do Código Penal. O Arguido requereu abertura de instrução, alegando, em síntese, que os factos constantes da acusação não podem ter o enquadramento descrito na acusação e requer a prolação de despacho de não pronúncia. Foram realizados os actos de instrução requeridos por ambas as partes, conforme resulta da consulta dos autos. Cumpre apreciar e decidir. 2 - A conduta não é punível quando: a) A imputação for feita para realizar interesses legítimos; e b) O agente provar a verdade da mesma imputação ou tiver tido fundamento sério para, em boa fé, a reputar verdadeira. a) A ofensa for praticada através de meios ou em circunstâncias que facilitem a sua divulgação; ou, Da factualidade indiciariamente provada resulta que: - O Serviço Nacional de Protecção Civil, nesse mesmo dia 6 de Outubro emitiu dois comunicados com os números 149, 150 dando nota das previsões do I.M. (documentos de fls. 142 e 143). No dia seguinte foi prestada informação que a forte precipitação se tinha deslocado para nordeste, facto impossível de conhecer antecipadamente (Doc. de fls. 146 que no mais se reproduz). «o queixoso age sobre aparente pressão corporativa» «fazer defesas corporativas sem se ir aos factos não será o melhor caminho» - Teor do artigo junto aos autos a fls. 13 «A meteorologia também acerta». A difamação define-se doutrinariamente como a atribuição a alguém de facto ou conduta, ainda que não criminosos, que encerrem em si uma reprovação ético-social, isto é, que sejam ofensivos da reputação do visado. É nessa linha que se situa o n.º 2, do artigo 180°, ao declarar a imputabilidade da conduta quando: - a imputação vise realizar interesses legítimos - como sucede, por exemplo quando se exerce o direito de informar ou qualquer outro direito, bem como quando se actua no cumprimento de um dever, como é o caso da prestação de um depoimento em juízo.(...) - se faça a prova da verdade da imputação ou a mesma seja tida, de boa fé, como verdadeira (inexiste boa fé quando se omitem os cuidados de informação acerca da verdade da imputação.) Dos 1° comunicado enviados pelos Serviço Nacional de Bombeiros resulta a previsibilidade de aguaceiros fortes, com possibilidades de trovoadas associadas e que o vento soprará fraco a moderado de nordeste, por vezes com rajadas». No 2° comunicado 150/2003, consta expressamente «A depressão centrada a Sul do Algarve progredia em movimento lento para Cádiz em Espanha e poderá provocar aguaceiros que serão pontualmente fortes, durante a tarde ou noite ultrapassando os limites de alerta meteorológico. A verificarem-se estes aguaceiros deverão ter especial incidência nas zonas de Faro, Tavira, S. Brás de Alportel, e em geral nas povoações da encosta Norte e Este da Serra do Caldeirão». Com se disse, os aguaceiros vieram a ocorrer no mar, e em Espanha, a uma distância de cerca de 40 quilómetros do Algarve, informações de que o Arguido facilmente dispunha e não fez menção no seu artigo, limitando-se a criticar o erro não esclarecendo se o mesmo é normal admissível e tolerável do ponto de vista científico, conforme deveria ter feito, caso tivesse tido a diligência de se informar. Desse modo imputou falhas graves aos serviços de meteorologia, falhas estas que não se verificaram, tão pouco com a gravidade que lhes foi conferida pelo arguido. No entanto, entende-se que tal não basta para se julgar que esta actuação do arguido extravasa a crítica e se reveste de responsabilidade jurídico-penal. «Também o exercício do direito de crítica, intimamente associado à liberdade de imprensa, tende a provocar situações de conflito potencial com bens jurídicos como a honra e cuja relevância jurídico-penal está à partida excluída por razões de atipicidade. Tal vale designadamente para os juízos de apreciação e valoração crítica vertidos sobre realizações científicas, académicas, artísticas, profissionais etc. Ou sobre prestações conseguidas nos domínios do desporto e espectáculo. Segundo o entendimento hoje dominante, na medida em que não se ultrapassa o âmbito da crítica objectiva - isto é: enquanto valoração e censuras críticas se atêm exclusivamente às obras, realizações ou prestações por si, não se dirigindo directamente à pessoa dos seus autores ou criadores - aqueles juízos caem fora da atipicidade de incriminações como a Difamação. Já porque não atingem a honra pessoal do cientista, artista ou desportista, etc., já porque não a atingem com a dignidade penal e a carência de tutela penal que definem e balizam a pertinente área de tutela típica. Num caso e noutro, a atipicidade afasta, sem mais e em definitivo, a responsabilidade criminal do crítico, não havendo por isso lugar à busca da cobertura de uma qualquer dirimente da ilicitude» (“Liberdade de Imprensa e Inviolabilidade Pessoal”, Manuel da Costa Andrade, Coimbra Editora, 1996, pág. 233). De acordo com a posição assumida pela doutrina, explanada na citação que antecede, entendemos que o artigo de 29-10-2003, não mais consubstancia que uma crítica, ainda que errónea, (conforme resulta da prova trazida a estes autos pelas testemunhas, técnicas do Instituto de Meteorologia) mas que por estar a coberto do exercício do direito à crítica, o que não exclui a crítica de má qualidade, de pouca profundidade ou pouco séria, como parece ser a agora em análise, não se pode concluir que esteja violada a tutela penal da honra pessoal do Senhor Presidente do Instituto, nem da instituição por este presidida, uma vez que o artigo em apreço pela pouca precisão e cientificidade que contém, encerra uma inocuidade que não chega sequer a beliscar a honra profissional dos queixosos. Assim, em face do exposto, não pronuncio o Arguido pelos crimes de que vem acusado, nem acolho a pronúncia requerida pelo Assistente no seu requerimento de abertura de instrução, determinando o arquivamento dos autos. Notifique». A. «O direito à informação ou à crítica não implica o uso de expressões objectivamente ofensivas, como as que foram utilizadas pelo arguido, em relação aos Assistentes. B. O arguido, apesar de ter sido esclarecido pelo Assistente e Presidente do IM, insistiu em denegrir a imagem e credibilidade dos Assistentes imputando-lhe factos que sabia serem falsos e ofensivos da sua honra, atingindo o seu bom nome, credibilidade e prestígio com a publicação de vários artigos. C. A liberdade de informação ou direito à crítica tem como limites os que decorrem da Constituição e da Lei, de forma a salvaguardar o rigor e a objectividade da informação e a garantir os direitos ao bom-nome e à imagem. F. A causa de justificação revista naquele n.º 2 do artigo 180° do Código Penal apenas é aplicável à imputação de factos, pelo que não abrange a formulação de juízos ofensivos. L. A Constituição da República Portuguesa garante o direito ao bem nome dos cidadãos, v.g. artigo 26° CRP. M. O aliás douto despacho recorrido violou o disposto no artigo 180° e artigo 187° do Código Penal ao considerar a conduta do arguido um mero exercício do direito à critica e portanto não punível e que aquelas imputações não beliscaram a honra profissional dos Assistentes. N. A interpretação e aplicação do n.º 2 do artigo 180° do CP segundo a qual, apesar de se verificarem os pressupostos subjectivos e objectivos do crime ali previsto e punido, se dever considerar que a conduta que o perpetrou não é punível e o agente não deverá ser punido, nomeadamente quando se trate de juízos ofensivos, é inconstitucional na medida em que colide estrepitosamente com o disposto no artigo 26° da CRP. Nestes termos e nos demais de Direito deve o presente recurso ser aceite e julgado procedente e em consequência ser a decisão instrutória de não pronúncia revogada e substituída por outra que pronuncie o arguido pelos crimes constantes no artigo 180° e artigo 187° do CP e assim se fará a costumada justiça». 5 – Neste tribunal, o sr. procurador-geral-adjunto, quando o processo lhe foi apresentado, emitiu o parecer de fls. 404 a 407, no qual defende que o recurso não merece provimento. 6 – Foi cumprido o disposto no artigo 417º, nº 2, do Código de Processo Penal. II – FUNDAMENTAÇÃO 7 – Uma vez que o recurso interposto pelo assistente é manifestamente improcedente, o tribunal limitar-se-á, nos termos dos n.°s 1 e 3 do artigo 420° do Código de Processo Penal, a especificar sumariamente os fundamentos da decisão. 8 – Antes de nos debruçarmos sobre as concretas questões suscitadas pelo recorrente, não podemos deixar de dizer que a actuação de diversos sujeitos processuais nestes autos nos suscita alguma perplexidade. Desde logo, quanto à individualização dos queixosos. Embora a queixa não se revista da adequada precisão, percebe-se perfeitamente que ela foi apresentada por duas pessoas distintas, a saber, (A), pessoa singular que se considerava ofendida pelo comportamento do arguido, que teria atingido a sua honra, e o Instituto de Meteorologia, pessoa colectiva representada pelo seu presidente[4], o referido (S), instituto público que se queixou de factos que considerou lesarem a sua honra[5] e/ou o seu bom nome[6]. Em segundo lugar, quanto à qualificação jurídica do comportamento imputado ao arguido. Disseram os queixosos, através da sua mandatária, que os factos que eram imputados ao arguido consubstanciavam, «sob forma continuada», «dois crimes de difamação, do tipo legal p. e p. nos artigos 180º, n.º 1, 183º, n.º 2, 184º, 187º, n.ºs 1 e 2» do Código Penal, qualificação essa que foi sendo aceite sem reparo, ou sem o necessário reparo, ao longo do processo. Parece-nos que não merece qualquer dúvida que no invocado artigo 187º se contém uma incriminação autónoma e diferente da constante do artigo 180º do Código Penal. Dito de outro modo. A «ofensa a pessoa colectiva, organismo ou serviço» (artigo 187º) é uma incriminação distinta da «difamação» (artigo 180º), não podendo ambas ser confundidas. Não existe, portanto, qualquer crime de difamação «do tipo legal p. e p. nos artigos 180º, n.º 1, 183º, n.º 2, 184º, 187º, n.ºs 1 e 2» do Código Penal. Em terceiro lugar, se, como parece indiscutível, o IM é um instituto público e (S) o seu presidente, eventuais ofensas à honra destas duas distintas pessoas, cometidas por causa ou no exercício das suas funções, serão, se se tiverem verificado, qualificadas por força dos artigos 184º e 132º, n.º 2, alínea j), do Código Penal, o que implica que os crimes de difamação tenham natureza semi-pública, de acordo com a alínea a), do n.º 1 do artigo 188º do mesmo diploma legal, o mesmo sucedendo quanto ao crime de «ofensa a pessoa colectiva, organismo ou serviço», neste caso atento o disposto na alínea b) do n.º 1 desse mesmo preceito. É o que resulta do exercício da autoridade pública por parte da pessoa colectiva, de que o referido (S) é presidente. Por fim, não se pode deixar de assinalar que apenas (S), pessoa singular, Presidente do Instituto de Meteorologia, foi admitido como assistente neste processo. É o que resulta do teor do despacho de fls. 33, conjugado com o facto de apenas ter sido paga a taxa de justiça devida (artigo 83º, n.º 1, do Código das Custas Judiciais) pela constituição de uma pessoa como assistente. 9 – Dito isto, importa extrair daí as necessárias consequências em termos processuais. Se nenhum dos crimes que poderão integrar o objecto destes autos[7] tem natureza semi-pública, a acusação deduzida na sequência da notificação realizada ao abrigo do artigo 285º do Código de Processo Penal é nula por falta de promoção do processo pelo Ministério Público, devendo ser oficiosamente declarada em qualquer fase do procedimento – artigo 119º, alínea b) do Código de Processo Penal[8]. Daí que o objecto do processo se restringisse necessariamente aos crimes de difamação porque apenas a eles se referiu o despacho de arquivamento do Ministério Público e, por isso, só quanto a essa matéria poderia ser requerida a abertura de instrução [alínea b) do n.º 1 do artigo 287º do Código de Processo Penal]. Por outro lado, se apenas o mencionado (S) foi admitido a intervir nos autos como assistente apenas ele, e no que respeita ao eventual crime de difamação de que se considerou ofendido, poderia ter recorrido do despacho de não pronúncia[9]. Por isso, o presente recurso apenas pode ter esse crime por objecto. 10 – Delimitado, desta forma, o objecto do presente recurso, vejamos agora quais são os factos que se encontram suficientemente indiciados nestes autos. Da nota à comunicação social elaborada pelo Instituto de Meteorologia[10], constante de fls. 14 a 18, extrai-se que o arguido (A), enquanto presidente da AMAL, fez declarações ao “Diário de Notícias” sobre «um alerta meteorológico não comprovado» e sobre «uma situação de precipitação intensa não alertada» pelo referido instituto que foram inseridas na edição deste jornal do dia 14 de Outubro de 2003, as quais estiveram na origem da elaboração e difusão por parte do IM dessa mesma nota. No dia 25 de Outubro, um sábado, foi publicado nesse jornal um artigo, da autoria do assistente (S), intitulado “A meteorologia também acerta” (fls. 13). No dia 29 desse mesmo mês, foi publicado nesse jornal um escrito do arguido intitulado “A propósito da credibilidade meteorológica” (fls. 12). No dia 31 seguinte foi aí publicado, sob o título “Comportamento das ‘grandezas’ meteorológicas”, um escrito da autoria do assistente (fls. 11). No dia 7 de Novembro, foi publicado no mesmo jornal um outro escrito redigido pelo arguido intitulado “Rectificação da verdade meteorológica” (fls. 7). Deste último escrito e do publicado no dia 29 de Outubro constavam os seguintes trechos que o assistente considera penalmente relevantes: Do de 29 de Outubro (fls. 12) «Num longo artigo publicado no passado sábado, o Senhor Presidente do Instituto de Meteorologia (IM), por aparente pressão corporativa, vem tentar colocar uma nuvem sobre as falhas graves de actuação deste serviço público no Algarve, há semanas atrás». … «Na verdade, no dia 6 de Outubro, o Instituto de Meteorologia deu informações sucessivas, segundo os comunicados do Serviço Nacional de Bombeiros e Protecção Civil (SNBPC), com alarme progressivo, indicando horas e locais, com uma precisão nunca vista. Foi anunciado em que concelhos, a que horas e com que dimensão o caso se ia dar». … «Só às 9 horas do dia seguinte, quando o caso já era motivo de risos e graçolas por todo o lado é que chegou a comunicação oficial a dizer que o temporal anunciado para a tarde do dia anterior tinha passado». … «Fazer defesas corporativas sem se ir aos factos, não será o melhor caminho». Do de 7 de Novembro (fls. 7) «Por que razão é o signatário atacado pessoalmente na sua dignidade por alguém que omite intencionalmente documentos oficiais? Que pensará o presidente do Instituto de Meteorologia (IM) quando o DN de sexta-feira passada diz que só foi emitido um comunicado no dia 6 de Outubro, quando sabe que tal não é verdade?» … «Às 17:56 do dia 6 o comunicado 150 (segundo no próprio dia) do SNBPC, citando o Instituto de Meteorologia, refere “aguaceiros fortes”, “ultrapassando os limites de alerta” com “especial incidência nas zonas de Faro, Tavira, S. Brás de Alportel e em geral nas povoações da encosta norte e este da Serra do Caldeirão”, donde a necessidade de alertar as autoridades e as populações …». O Instituto de Meteorologia elaborou e difundiu, no dia 6 de Outubro de 2003, o comunicado n.º 123/2003 (fls. 21). O “Serviço Nacional de Bombeiros e Protecção Civil” elaborou e difundiu, nesse mesmo dia 6, os comunicados n.ºs 149 e 150/2003 (fls. 142 e 143) e, no dia seguinte, o comunicado n.º 151/2003 (fls. 144). São estes, em suma, os comportamentos exteriores dos sujeitos processuais que têm relevo para a decisão a proferir. Ora, embora reconheçamos que pode ter existido alguma confusão entre as actuações do IM e as do SNBPC, não conseguimos vislumbrar em nenhum dos trechos transcritos, que são, como se disse, aqueles que o assistente considerou penalmente relevantes, qualquer agressão da honra do assistente, o que nos parece manifesto. Por isso, o recurso por ele interposto não pode deixar de ser rejeitado. 11 – Uma vez que o assistente decaiu no recurso que interpôs é responsável pelo pagamento de taxa de justiça (artigo 515º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Penal). De acordo com o disposto na alínea b) do nº 1 e no nº 3 do artigo 87º do Código das Custas Judiciais a taxa de justiça varia entre 1 e 15 UC. Tendo em conta a complexidade do processo, julga-se adequado fixar essa taxa em 5 UC. Para além disso, uma vez que o recurso foi considerado manifestamente improcedente, deve o recorrente, como medida dissuasória, pagar uma importância entre 3 e 10 UC (nº 4 do artigo 420º do Código de Processo Penal). Atendendo aos factores considerados na graduação da taxa de justiça e ainda ao grau de abuso do direito de recurso, julga-se adequado fixar essa importância em 4 UC. III – DISPOSITIVO Face ao exposto, acordam os juízes da 3ª secção deste Tribunal da Relação em: a) Rejeitar, por ser manifestamente improcedente, o recurso interposto pelo assistente (A). b) Condenar o recorrente no pagamento das custas do recurso, com taxa de justiça que se fixa em 5 (cinco) UC. c) Condenar o assistente na sanção processual correspondente a 4 (quatro) UC. ² Lisboa, 10 de Outubro de 2007 (Carlos Rodrigues de Almeida) (Horácio Telo Lucas) (Pedro Mourão) _______________________________________________________________ [1] Anote-se que apenas tinha sido paga uma taxa de justiça, no valor de 178 €, o que correspondia a 2 UC (fls. 29). [2] E apenas quanto a este porque só à difamação atribuiu natureza semi-pública. [3] Que considerou ter natureza particular. [4] Nos termos da alínea d) do artigo 9º do então vigente Decreto-Lei n.º 220/2003, de 20 de Setembro (hoje revogado pelo Decreto-Lei n.º 157/2007, de 27 de Abril). [5] Porque, pelo mesmo na redacção do Código Penal então vigente, se considerava que as pessoas colectivas também eram titulares de honra e podiam ser vítimas de crimes de difamação (neste sentido, veja-se COSTA, José Francisco de Faria, in «Comentário Conimbricense do Código Penal», Tomo I, Coimbra Editora, Coimbra, 1999, p. 675/6). [6] Bem jurídico heterogéneo protegido pelo artigo 187º do Código Penal que engloba a tutela da credibilidade, prestígio e confiança (neste sentido, veja-se COSTA, José Francisco de Faria, ob. cit., p. 677). [7] Um crime de difamação de (S), um crime de difamação do Instituto de Meteorologia e um crime de «ofensa a pessoa colectiva, organismo ou serviço» em que o ofendido seria este instituto público. [8] Trata-se de questão que foi tempestivamente suscitada pelo arguido, mas não decidida no despacho recorrido. [9] Tanto mais que apenas foi paga uma taxa devida pela interposição de recurso (fls. 371). [10] Uma vez que não vemos que se encontre junto o correspondente exemplar do “Diário de Notícias” ou qualquer fotocópia da parte pertinente. |