Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
528/19.9T8PDL-C.L1-1
Relator: CARLOS CASTELO BRANCO (VICE-PRESIDENTE)
Descritores: CONFLITO DE COMPETÊNCIA
TRÂNSITO EM JULGADO
RECURSO
INDEFERIMENTO DO PEDIDO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 03/05/2024
Votação: DECISÃO INDIVIDUAL
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: CONFLITO DE COMPETÊNCIA
Decisão: INDEFERIDO
Sumário: Pressuposto necessário para que haja lugar a conflito de competência é que ambas as decisões proferidas pelos tribunais em conflito tenham transitado em julgado, pois, conforme estatui o n.º 3 do artigo 109.º do CPC, “não há conflito enquanto forem suscetíveis de recurso as decisões proferidas sobre a competência”.
Não tendo transitado em julgado uma das decisões, verifica-se causa de indeferimento do pedido – cfr. artigo 113.º, n.º 1, do CPC.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: “A” instaurou contra “B”, ação de regulação das responsabilidades parentais, relativamente à filha de ambos, “C”, nascida em (…)-03-2023.
Em 31-01-2024, o Juízo de Família e Menores de Ponta Delgada – Juiz “X” declarou-se incompetente para manter consigo o processo, argumentando existir um outro processo tutelar cível respeitante a outras duas crianças, irmãos uterinos de “C”, determinando ao abrigo do disposto no nº. 4 do art. 11º do RGPTC, se procedesse à apensação de ambos os autos, com remessa ao Juiz “Y” do mesmo tribunal.
Remetidos os autos ao Juízo de Família e Menores de Ponta Delgada – Juiz “Y”, aí foi proferido, em 29-02-2024, despacho de onde consta, nomeadamente, o seguinte:
“(…) Ora, a decisão de declaração de incompetência do Juiz-“X” encontra o seu fundamento na interpretação e aplicação do regime da competência por conexão estabelecido no art.º 11º da RGPTC, convocando as normas conjugadas dos seus números 1 e 4, estabelecendo o n.º 1, que «se, relativamente à mesma criança, forem instaurados, separadamente, processo tutelar cível e processo de promoção e proteção, incluindo os processos perante a comissão de proteção de crianças e jovens, ou processo tutelar educativo, devem os mesmos correr por apenso, independentemente do respetivo estado, sendo competente para deles conhecer o juiz do processo instaurado em primeiro lugar» e o n.º 4 que «Quando o processo tutelar cível respeitar a mais do que uma criança, pode ser instaurado um único processo e, tendo sido
instaurados processos distintos, pode proceder-se à apensação de todos eles ao que foi instaurado em primeiro lugar, se as relações familiares assim o justificarem».
Sucede que o artigo 11º/1 apenas prevê a apensação ao processo instaurado em primeiro lugar entre processos tutelares cíveis, ou entre estes e processos de promoção e proteção ou entre aqueles e estes a processos tutelares educativos, a qual opera em qualquer estado dos processo (mesmo que findos).
Todavia, o processo de regulação das responsabilidades parentais n.º (…)8/19.9T8PDL-A findou sem prolação de decisão de mérito, não existindo por isso fundamento para apensação ao mesmo do processo de regulação das responsabilidades parentais n.º (…)4/23.7T8PDL, não sendo a norma ínsita no n.º 1 do art.º 11º do RGPTC aplicável ao caso, porquanto a apensação entre o processo de divórcio (um processo comum) e o processo de regulação do regime de exercício das responsabilidades parentais (ele próprio um processo tutelar cível), não se mostra incluída no catálogo dos processos a apensar (obrigatoriamente) do citado artigo 11º/1 do RGPTC.
Ademais a apensação de ação tutelar cível a processo de divórcio apenas poderá ocorrer no circunstancialismo previsto no artigo 11º/3 do RGPTC, nos termos do qual «Estando pendente ação de divórcio ou de separação judicial, os processos de regulação do exercício das responsabilidades parentais, de prestação de alimentos e de inibição do exercício das responsabilidades parentais correm por apenso àquela ação», ou seja, verificada a condição da apensação - a pendência da ação de divórcio, pressuposto que não se verifica no caso presente, porquanto a ação de divórcio findou com sentença homologatória proferida a 11 de Abril de 2019, estando encerrada, com visto em correição posto em 18-11-2019.
Assim, não sendo aplicável o disposto no art.º 11º n.º 1/3 do RGPTC, não tem o Juiz “Y” do Juízo de Família e Menores de Ponta Delgada competência, por conexão, para tramitar a presente ação de regulação das responsabilidades parentais.
Em conformidade com o exposto, declaro a incompetência do Juízo de família e menores de Ponta Delgada – Juiz “Y” para tramitar os presentes autos, e competente o Juízo de família e menores de Ponta Delgada – Juiz “X”, a quem a ação foi inicialmente distribuída.
Em virtude do declínio de competência pelos J”X” e J”Y” deste Juízo de Família e Menores de Ponta Delgada para tramitar a presente ação de regulação das responsabilidades parentais, determina-se a remessa dos autos ao Exmo. Senhor Presidente do Tribunal da Relação de Lisboa, ao abrigo do disposto no artigo 109º/2, 110º/2 e 111º/1 do CPC, em vista à resolução do conflito negativo de competência, que se requer”.
Foi suscitado o presente conflito negativo de competência.
Foram notificados a Patrona da requerente e o Ministério Público.
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Vejamos:
Nos termos do disposto no artigo 109.º, n.º 2, do CPC, há conflito, positivo ou negativo, de competência quando dois ou mais tribunais da mesma ordem jurisdicional se consideram competentes ou incompetentes para conhecer da mesma questão.
Pressuposto necessário para que haja lugar a conflito de competência é que ambas as decisões proferidas pelos tribunais em conflito tenham transitado em julgado, pois, conforme estatui o n.º 3 do artigo 109.º do CPC, “não há conflito enquanto forem suscetíveis de recurso as decisões proferidas sobre a competência”.
A decisão considera-se transita em julgado logo que não seja suscetível de recurso ordinário ou de reclamação (cfr. artigo 628.º do CPC).
Assim, o conflito de competência apenas se materializa quando ambas as decisões se revelarem definitivas (assim, Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa; Código de Processo Civil Anotado, vol. I, Almedina, 2018, p. 137).
Ora, o despacho de 29-02-2024, embora notificado, ainda não transitou em julgado.
Verifica-se, pois, causa de indeferimento do pedido – cfr. artigo 113.º, n.º 1, do CPC.
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Assim sendo, por não estarmos perante uma situação de conflito suscetível de ser conhecido por esta Presidência, indefiro o pedido formulado pelo Juízo de Família e Menores de Ponta Delgada - Juiz “Y”.
Notifique-se (art. 113.º, n.º 3, do CPC). 
Baixem os autos.

Lisboa, 05-03-2024,
Carlos Castelo Branco (Vice-Presidente, com poderes delegados).