Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
| Processo: |
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| Relator: | IVO NELSON CAIRES B. ROSA | ||
| Descritores: | OMISSÃO DE PRONÚNCIA FACTOS RELEVANTES FACTOS CONCLUSIVOS | ||
| Nº do Documento: | RL | ||
| Data do Acordão: | 11/06/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Texto Parcial: | N | ||
| Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
| Decisão: | NÃO PROVIDO | ||
| Sumário: | Sumário (da responsabilidade do Relator): I. Quando a lei, na alínea c) do nº 1 do artigo 379º do CPP, fala em questões que devesse apreciar, está, naturalmente, a referir-se a questões ou matérias de direito substantivo ou processual e não aos factos alegados na acusação, na contestação ou no pedido de indemnização civil. É importante realçar, também, que a nulidade de sentença por omissão de pronúncia refere-se a questões e não a razões ou argumentos invocados pelos sujeitos processuais. II. Os factos inócuos, irrelevantes para a qualificação do crime ou para a graduação da responsabilidade do arguido, mesmo que descritos na acusação ou na contestação, estão, naturalmente, excluídos da atividade probatória do julgador. III. No caso em apreço, a peça acusatória, na parte que aqui releva, contém factos inócuos, juízos de valor e conceitos jurídicos e conclusões. Na verdade, ao utilizar as expressões “exerceu força física” “colocando-o na impossibilidade de resistir e reagir às suas condutas” a acusação recorreu a conceitos jurídicos e conclusivos, os quais, por não constituírem factos, mas ilações a extrair de factos concretos, e por estarem desacompanhados desses mesmos factos concretos, não podem, como de forma correta fez o tribunal recorrido, ser levados à fundamentação de facto. | ||
| Decisão Texto Parcial: | |||
| Decisão Texto Integral: | Em conferência, acordam os Juízes na 9ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa: I – Relatório Por acórdão proferida a ... de ... de 2025, foi decidido o seguinte: - Absolve o arguido, AA, da prática de um crime de roubo, p. e p. pelo art. 210º, nº 1 do Cód. Penal; - Condena o arguido, AA: Pela prática de um crime de furto, previsto e punido pelo artigo 203.º, n.º 1 do Código Penal (NUIPC 20/24.0PDFUN), na pena de 7 (sete) meses de prisão; Pela prática de um crime de furto (desqualificado pelo valor), previsto e punido pelos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 2, alínea e) e n.º 4, por referência à alínea d) do artigo 202.º todos do Código Penal (NUIPC 245/24.8...), na pena de 9 (nove) meses de prisão; Pela prática de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 1, alínea b), por referência à alínea d) do artigo 202.º todos do Código Penal (NUIPC 250/24.4..., ocorrido no ...), na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão; Pela prática de um crime de furto (desqualificado pelo valor), previsto e punido pelos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 1, alínea b) e n.º 4, por referência à alínea d) do artigo 202.º todos do Código Penal (NUIPC 250/24.4..., ocorrido no veículo Seat), na pena de 5 (cinco) meses de prisão; Pela prática de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelo artigo 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 2, alínea e), por referência à alínea d) do artigo 202.º, todos do Código Penal (NUIPC 249/24.0...), na pena de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de prisão; Pela prática de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 1, alínea b), por referência à alínea d) do artigo 202.º todos do Código Penal (NUIPC 254/24.7... – no veículo ...), na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão; Pela prática de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 1, alínea b), por referência à alínea d) do artigo 202.º todos do Código Penal (NUIPC 254/24.7... – no veículo Mercedes C), na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão; Pela prática de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelo artigo 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 2, alínea e), por referência à alínea d) do artigo 202.º, todos do Código Penal (NUIPC 264/24.4...), na pena de 2 (dois) anos e 2 (dois) meses de prisão; Pela prática de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 1, alínea b), por referência à alínea d) do artigo 202.º todos do Código Penal (NUIPC 271/24.7...), na pena de 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de prisão; Pela prática de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 1, alínea b), por referência à alínea d) do artigo 202.º todos do Código Penal (NUIPC 1168/24.6...), na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão; Pela prática de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 1, alínea b), por referência à alínea d) do artigo 202.º todos do Código Penal (NUIPC 301/24.2...), na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão; Em cúmulo jurídico das sobreditas penas parcelares, na pena única de 6 (seis) anos de prisão. *** Não se conformando com essa decisão, o MP recorreu para este Tribunal da Relação tendo formulado as seguintes conclusões (transcrição): 1. O Ministério Público entende que a matéria de facto provada tem de ser alterada, por ser contrária à prova efetivamente produzida, existindo ainda um erro notório na apreciação dessa mesma prova, padecendo a decisão recorrida, nessa medida, do vício previsto no artigo 410.º, n.º 2, al. b) e c) do Código de Processo Penal. 2. Esclarece o artigo 410.º, n.º 2, alínea b) e c) do Código de Processo Penal, que “b) A contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão; e c) O recurso pode ter como fundamento, desde que o vício resulte do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum: erro notório na apreciação da prova”. 3. “O vício em apreço [contradição insanável de fundamentação], como resulta da letra do art. 410, fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão, o que significa que nem toda a contradição é suscetível de o integrar, mas apenas a que se mostre insanável, ou seja, aquela que não possa ser ultrapassada ou esclarecida de forma suficiente com recurso á decisão recorrida no seu todo, por si só ou com o auxílio das regras da experiência”, cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 21-05-2015, in www.dgsi.pt. 4. “O erro notório na apreciação da prova, vício da decisão previsto no art. 410.º, n.º 2, al. c), do CPP, verifica-se quando no texto da decisão recorrida se dá por provado, ou não provado, um facto que contraria com toda a evidência, segundo o ponto de vista de um homem de formação média, a lógica mais elementar e as regras da experiência comum. Porém, o vício, terá de constar do teor da própria decisão de facto, não da motivação dessa decisão, ou da fundamentação de direito.” Cf. Ac. STJ-02-02-2011, Relator: Maia Costa, in www.dgsi.pt. 5. Como, de forma clara, resulta dos factos transcritos da acusação e dos factos dados como provados e não provados no Acórdão recorrido, o Tribunal “a quo” não deu como provada nem não provada parte dos factos constantes do artigo 3. da acusação - “e que só o conseguiu porque exerceu força física contra aquele, colocando-o na impossibilidade de resistir e reagir às suas condutas, de forma a apropriar-se dos bens que aquele tivesse consigo.”, padecendo assim, salvo melhor entendimento, o dito Acórdão dos vícios de omissão de pronúncia (cfr. artigo 379.º, n.º 1, alínea c) do Código de Processo Penal). 6. Ora, e apesar de não se saber como formou a sua convicção (por não constar da motivação da sentença), afirma o Tribunal recorrido que a formou quanto à matéria de facto provada e não provada, no que aqui releva, nas “declarações prestadas pelo arguido em sede de julgamento, em que tal confessou integralmente e sem reservas, assim permitindo a sua inequívoca aquisição processual.”, declarações essas que de per si, impõem decisão n.º 2 al. b) do CPP, só se deve e pode ter por verificado quando ocorre uma contradição insanável na fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão, isto é, um conflito inultrapassável na inversa. 7. Atento o exposto, entendemos não ser possível ao Tribunal a quo, por um lado, formar a sua convicção com base da confissão integral e sem reservas do arguido e, por outro, não dar como provado (nem como não provado) que “3. O arguido agiu com o propósito concretizado de fazer seu o telemóvel de BB, bem sabendo que aquele aparelho não lhe pertencia e que agia contra a vontade daquele, e que só o conseguiu porque exerceu força física contra aquele, colocando-o na impossibilidade de resistir e reagir às suas condutas, de forma a apropriar-se dos bens que aquele tivesse consigo.” 8. Afigura-se incompreensível o processo de raciocínio do Tribunal a quo, existindo aqui uma manifesta incompatibilidade, insuscetível de ser ultrapassada, conduzindo à nulidade da sentença nos termos do artigo 410.º, n.º 2, alínea b), do CPP e um erro notório na apreciação da prova, nos termos do disposto no artigo 410.º, n.º 2, al. c), do CPP, relativamente aos mencionados factos. 9. Pelo exposto, entendemos que o Acórdão proferido deverá, nesta parte, ser declarado nulo. 10. No âmbito dos presentes autos foi deduzida acusação contra o arguido, além do mais, pela prática em autoria material e na forma consumada de um crime de roubo, previsto e punido pelo artigo 210.º, n.º 1 do Código Penal (NUIPC 20/24.0PDFUN), tendo contudo, entendido o Tribunal recorrido absolver o arguido pela prática do mencionado crime, condenando-o antes, pela prática de um crime de furto, previsto e punido pelo artigo 203.º, n.º 1 do Código Penal, na pena de 7 (sete) meses de prisão. 11. Ora, sem prejuízo de o Ministério Público entender que a matéria de facto provada tem de ser alterada, por ser contrária à prova efetivamente produzida, existe ainda um erro notório na apreciação dessa mesma prova, padecendo a decisão recorrida, nessa medida, do vício previsto no artigo 410.º, n.º 2, al. b) e c) do Código de Processo Penal. 12. Resulta da acusação proferida: "1. No dia ...-...-2024, pelas 11h30, BB encontrava-se no cruzamento da ... com o ..., em ..., a falar ao telemóvel. 2. Em execução de um plano previamente traçado visando apropriar-se do telemóvel de BB, o arguido aproximou-se daquele puxando-lhe da mão o telemóvel, da marca ..., modelo MI 10 T Lite 18,00, com dois cartões SIM no seu interior, um da operadora ... com o n.º de série ... e o outro da operadora ..., com o n.º de série ..., fazendo-o seu e abandonando o local de seguida. 3. O arguido agiu com o propósito concretizado de fazer seu o telemóvel de BB, bem sabendo que aquele aparelho não lhe pertencia e que agia contra a vontade daquele, e que só o conseguiu porque exerceu força física contra aquele, colocando-o na impossibilidade de resistir e reagir às suas condutas, de forma a apropriar-se dos bens que aquele tivesse consigo. (...) 43. Em todas as situações acima descritas (1. a 42), o arguido agiu de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei e tendo capacidade para se determinar de acordo com esse conhecimento." 13. Aquando do julgamento, foram dados por provados pelo Tribunal a quo os seguintes factos: "1. No dia ...-...-2024, pelas 11h30, BB encontrava-se no cruzamento da ... com o ..., em ..., a falar ao telemóvel. 2. Em execução de um plano previamente traçado visando apropriar-se do telemóvel de BB, o arguido aproximou-se dele puxando-lhe da mão o telemóvel, da marca ..., modelo MI 10 T Lite, no valor de € 800,00 e respetiva capa, no valor de € 18,00, com dois cartões SIM no seu interior, um da operadora ... com o n.º de série ... e o outro da operadora ..., com o n.º de série ..., fazendo-o seu e abandonando o local de seguida. 3. O arguido agiu com o propósito concretizado de fazer seu o telemóvel de BB, bem sabendo que aquele aparelho não lhe pertencia e que agia contra a sua vontade. (...) 41. Em todas as situações acima descritas, o arguido agiu de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei e tendo capacidade para se determinar de acordo com esse conhecimento." 14. Não existem factos dados como não provados, sendo que "Os demais factos vertidos na acusação e atrás não elencados como provados e/ou não provados, não o foram por consubstanciar matéria de direito e/ou conclusiva." 15. O Tribunal a quo formou a sua convicção quanto à matéria de facto provada e não provada, no que aqui releva, nas "declarações prestadas pelo arguido em sede de julgamento, em que tal confessou integralmente e sem reservas, assim permitindo a sua inequívoca aquisição processual." 16. Atenta a matéria de facto dada por provada e a sua motivação, entendeu o Tribunal a quo, no ponto "Do Crime de Roubo", que "(...) Outrossim, é um crime de dano e de resultado. Desse modo, para o tipo legal se preencher, é necessária a verificação de efetiva subtração de coisa móvel alheia. Mas é também necessário que se verifique um efetivo constrangimento, levado a cabo por um dos meios descritos no tipo legal. Saliente-se, a este respeito, que a ameaça é também uma violência psíquica que terá de específico o facto de constranger através da provocação de medo, inquietação, insegurança, de forma a afetar a liberdade de decisão e ação do ameaçado. Todavia, no tipo legal de roubo apenas releva a ameaça com perigo iminente para a vida ou integridade física. A ameaça de que se trata é grave, capaz, no caso concreto, de paralisar a reação contra o agente. (sublinhado nosso). Ora, dos factos provados e não provados resulta, à saciedade, que o crime em apreço não pode ser assacado ao arguido. É que, é certo, como vimos, que se apropriou do telemóvel pertença do referido ofendido, contra a sua vontade. Mas, os factos provados (vertidos na acusação), revelam que o fez sem um efetivo constrangimento, sem uma qualquer violência, que, em nosso entender, nessa indevida apropriação se não vislumbra" (sublinhado nosso). E a se assim, como o é, considerando ainda a intencionalidade nela posta, o que se impõe concluir é que, com tal conduta, o arguido se tornou incurso num (outro) crime de furto, p. e p. pelo citado art. 203º, nº 1 do Código Penal, que já sabemos ser punível com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa." 17. Não pode o MINISTÉRIO PÚBLICO conformar-se com o enquadramento jurídico-penal efectuado. 18. Aquando da audiência de discussão e julgamento, o arguido confessou integralmente e sem reservas, os factos 1. a 3 e 43. constantes da acusação e supra se transcreveram (ponto 12 das conclusões). 19. Não obstante a confissão integral e sem reservas e sem mais, entendeu o Tribunal a quo, dar como provado que "O arguido agiu com o propósito concretizado de fazer seu o telemóvel de BB, bem sabendo que aquele aparelho não lhe pertencia e que agia contra a sua vontade.", considerando, quanto a nós mal, que a circunstância de o arguido se aproximar do ofendido e lhe puxar o telemóvel da mão, fazendo-o seu, "revelam que o ez sem um efetivo constrangimento, sem uma qualquer violência, que, em nosso entender, nessa indevida apropriação se não vislumbra." 20. Discordamos. Entendemos que o Tribunal recorrido, deveria, antes, ter dado como provado que: "O arguido agiu com o propósito concretizado de fazer seu o telemóvel de BB, bem sabendo que aquele aparelho não lhe pertencia e que agia contra a vontade daquele, e que só o conseguiu porque exerceu força física contra aquele, colocando-o na impossibilidade de resistir e reagir às suas condutas, de forma a apropriar-se dos bens que aquele tivesse consigo.", tal como consta da acusação proferida. 21. Com efeito e como tem sido entendimento pacifico dos Tribunais Superiores e tomando por exemplo o disposto no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, processo: 959/17.9PCOER.L1-3, datado de 18-09-2020: “O conceito de violência abrange tanto a violência física exercida sobre a pessoa, como a violência especialmente direcionada ao objeto, aqui se incluindo a situação dos roubos por esticão.”, o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, processo: 523/18.5PRPRT.P1, datado de 16-12-2020: “ao arrancar as notas bancárias da mão do motorista de táxi, apropriando-se das mesmas contra a vontade do ofendido (…) o arguido exerceu a violência estritamente necessária para se apoderar do objeto do roubo, arrancando as notas da mão que as estava a segurar, vencendo assim a sua resistência. É certo que o arguido não agrediu o ofendido, mas o tipo legal de crime não exige tal intensidade e modalidade de violência para o preenchimento do tipo legal de crime.”, o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, proc. nº 821/10.6PHMTS.P1, datado de 04-07-2012, o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, proc. nº 570/12.0GBAVV.G1, datado de 31-03-2014 ou o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 3-04-2013 (CJ, 2013, T2, p. 212), com o seguinte enunciado: “I. O crime de roubo exige que a apropriação de coisa alheia seja feita com recurso á violência. II. Violência, para este efeito, consiste no desenvolvimento de força física para vencer a resistência (real ou suposta) da vítima. III. Comete o crime de roubo aquele que, aproximando-se por trás, arranca das mãos do ofendido o telemóvel que, na altura, ele utiliza na via pública, apoderando-se dele”. 22. Do acervo fáctico supra dado como provado resulta claramente, quanto a nós, a prática pelo arguido, de atos de violência e constrangimento exercidos sobre o ofendido, porquanto o arguido aproxima-se do ofendido e puxa-lhe o telefone da mão, colocando o na impossibilidade de resistir e reagir, com o propósito concretizado de o fazer seu contra a vontade daquele, agindo de forma deliberada, livre e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei, e abandonando o local de seguida. 23. Considerando tudo o acima exposto, entendemos haver uma contradição insanável da fundamentação e da fundamentação e da decisão, bem como um erro notório na apreciação da prova produzida e violadora do disposto no artigo 210.º, n.º 1 do Código Penal. 24. Devendo assim, a matéria de facto provada ser alterada, dando-se como provado que “o arguido agiu com o propósito concretizado de fazer seu o telemóvel de BB, bem sabendo que aquele aparelho não lhe pertencia e que agia contra a vontade daquele, e que só o conseguiu porque exerceu força física contra aquele, colocando-o na impossibilidade de resistir e reagir às suas condutas, de forma a apropriar-se dos bens que aquele tivesse consigo.” 25. Face ao tudo o supra exposto, entendemos que a decisão proferida, nesta parte – condenação do arguido, numa pena de 7 meses de prisão pela prática de um crime de furto, previsto e punido pelo artigo 203.º, n.º 1 do Código Penal, deverá ser revogada e substituída por outra que alterando a matéria de facto provada nos termos supra expostos, condene o arguido AA pela prática de um crime de roubo, previsto e punido pelo artigo 210.º, n.º 1 do Código Penal com as legais consequências. Nestes termos e nos demais de Direito que V. Excias. doutamente suprirão, deve a decisão proferida, quanto a estes factos, ser revogada e substituída por outra que alterando a matéria de facto provada nos termos supra expostos, condene o arguido AA pela prática de um crime de roubo, previsto e punido pelo artigo 210.º, n.º 1 do Código Penal. *** O arguido não respondeu ao recurso. *** A Sra. PGA junto deste Tribunal da Relação pronunciou-se pela procedência do recurso aderindo à resposta apresentada pelo MP em primeira instância. *** Não foi cumprido o artº 417º, n.º 2 do C.P. em virtude de não ter sido proferido um parecer autónomo. *** II - Questões a decidir: Conforme jurisprudência constante e amplamente pacífica, o âmbito dos recursos é delimitado pelas conclusões formuladas na motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cf. Art.º 119º, nº 1; 123º, nº 2; 410º, n.º 2, alíneas a), b) e c) do CPP, Acórdão de fixação de jurisprudência obrigatória do STJ de 19/10/1995, publicado em 28/12/1995 e, entre muitos, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 25/6/1998, in BMJ 478, pp. 242, e de 3.2.1999, in B.M.J. 484, p. 271). Tendo em conta este contexto normativo e o teor das conclusões apresentadas pelo arguido recorrente, há que analisar e decidir: Da omissão de pronúncia (cfr. artigo 379.º, n.º 1, alínea c) do Código de Processo Penal). Erro notório na apreciação da prova. Contradição insanável de fundamentação. Da subsunção ao crime de roubo, previsto e punido pelo artigo 210.º, n.º 1 do Código Penal. *** III – FUNDAMENTAÇÃO O acórdão recorrida tem o seguinte teor (transcrição): 1. No dia ...-...-2024, pelas 11h30, BB encontrava-se no cruzamento da ... com o ..., em ..., a falar ao telemóvel. 2. Em execução de um plano previamente traçado visando apropriar-se do telemóvel de BB, o arguido aproximou-se dele puxando-lhe da mão o telemóvel, da marca ..., modelo MI 10 T Lite, no valor de € 800,00 e respetiva capa, no valor de € 18,00, com dois cartões SIM no seu interior, um da operadora ... com o n.º de série ... e o outro da operadora ..., com o n.º de série ..., fazendo-o seu e abandonando o local de seguida. 3. O arguido agiu com o propósito concretizado de fazer seu o telemóvel de BB, bem sabendo que aquele aparelho não lhe pertencia e que agia contra a sua vontade. NUIPC 245/24.8... 4. Em execução de um plano previamente traçado visando apropriar-se dos bens que lhe interessassem e que pudesse transportar consigo, no dia ...-...-2024, pelas 03h16, o arguido deslocou-se ao restaurante “...”, sito na ..., na ..., em .... 5. Uma vez ali, e em execução do dito plano, o arguido utilizando uma escotilha metálica de água públicas, arremessou-a de encontro à porta de vidro de acesso ao restaurante, partindo-a e acedeu ao seu interior. 6. De seguida, o arguido retirou do interior do estabelecimento comercial: - Uma garrafa de ...; - Uma garrafa de Tequilla; - Uma garrafa de whisky Jack Daniels; - Uma garrafa de whisky JB; - Uma garrafa de licor Beirão; Bens no valor total de € 80,00, que o arguido fez seus, abandonando o local de seguida. 7. Ao proceder como descrito, o arguido agiu com o propósito concretizado de se introduzir no interior do restaurante pela forma descrita – partindo o vidro da porta de acesso - visando apropriar-se dos bens e das quantias monetárias que encontrasse no seu interior, bem sabendo que não se encontrava autorizado a entrar naquele espaço e que os bens que dali retirou, não lhe pertenciam e que atuava contra a vontade e em prejuízo do seu legítimo dono. NUIPC 250/24.4... 8. No período compreendido entre as 20h00 do dia ...-...-2024 e as 10h10 do dia ...-...-2024, em execução de um plano que previamente havia traçado visando apropriar-se dos bens que lhe interessassem e que pudesse transportar consigo, o arguido deslocou-se à ..., em .... 9. Uma vez aí, o arguido aproximou-se do veículo ... com a matrícula ..-..-XZ e partiu o vidro estático traseiro do lado direito, abrindo-o e, por aí, acedeu ao seu interior. 10. Do interior do veículo, o arguido retirou duas bolsas, uma das quais em cabedal contendo pertences pessoais, um powerbank, cabos de alimentação e adaptadores, bens esses no valor total de € 250,00, que fez seus, abandonando o local de seguida. 11. Após, o arguido aproximou-se do veículo Seat com a matrícula ..-VG-.. que também ali se encontrava e partiu o vidro estático traseiro do lado direito, abrindo-o e, dessa forma, acedeu ao seu interior. 12. Do interior do veículo o arguido retirou a quantia monetária de € 5,00 e um colete refletor, que fez seus, abandonando o local de seguida. 13. Ao proceder como descrito, o arguido agiu com o propósito concretizado de se introduzir no interior dos mencionados veículos automóveis, pela forma descrita – partindo o vidro da porta, e apropriar-se dos bens supra descritos, bem sabendo que não lhe pertenciam e que deles se apropriava contra a vontade e sem o consentimento dos seus legítimos donos, como efetivamente fez. NUIPC 249/24.0... 14. Pelas 04h03, do dia ...-...-2024, em execução de um plano que previamente havia traçado visando apropriar-se dos bens que lhe interessassem e que pudesse transportar consigo, o arguido deslocou-se à ...”, sita na .... 15. Uma vez ali, e em execução do dito plano, o arguido utilizando uma escotilha metálica de água públicas, arremessou-a de encontro à porta de acesso ao restaurante, em vidro, partindo-a, e, dessa forma, acedeu ao seu interior. 16. De seguida, o arguido retirou do interior do estabelecimento comercial: - Um mealheiro das gorjetas contendo no seu interior a quantia monetária de € 400,00; e, - Duas garrafas de whisky, da marca ...; - Uma garrafa de tequila morango, da marca ...; - Duas garrafas de whisky, da marca J. ...; - Uma garrafa de whisky, da marca J. ...; - Uma garrafa de whisky, da marca J. ...; - Duas garrafas de aguardente de cana, da marca J. Faria; - Uma garrafa de licor, da marca ...; - Uma garrafa de brandy, da marca ...; - Uma garrafa de brandy, da marca ...; -Duas garrafas de aguardente, da marca ...; - Uma garrafa de aguardente, da marca C.R. & F reserva; - Uma garrafa de licor, da marca ..., todas no valor total de € 211,28. 17. Após fazer suas as sobreditas quantia e garrafas, no valor total de € 611,28, o arguido abandonou o local de seguida. 18. Ao proceder como descrito, o arguido agiu com o propósito concretizado de se introduzir no interior do restaurante pela forma descrita – partindo o vidro da porta de acesso - visando apropriar-se dos bens e das quantias monetárias que encontrasse no seu interior, bem sabendo que não se encontrava autorizado a entrar naquele espaço e que os bens que dali retirou não lhe pertenciam e que atuava contra a vontade e em prejuízo do seu legítimo dono. NUIPC 254/24.7... 19. No período compreendido entre as 19h00 e as 19h50 do dia ...-...-2024, em execução de um plano que previamente havia traçado visando apropriar-se dos bens que lhe interessassem e que pudesse transportar consigo, o arguido deslocou-se à zona do ..., em .... 20. Uma vez aí, o arguido aproximou-se do veículo ... com a matrícula CC e, utilizando uma pedra, partiu o vidro da porta dianteira direita, dessa forma acedendo ao seu interior. 21. De seguida e do interior do veículo, o arguido retirou e fez seus, um colete refletor, um perfume da marca ..., uma espátula da marca ..., uma chave de grifo para canalização, um alicate, uns óculos com respetivo estojo, bens esses no valor total de € 180,00, que fez seus, abandonando o local. 22. De seguida, aproximou-se do veículo Mercedes C com a matrícula BB-..-JC e, utilizando uma escotilha metálica das águas públicas, partiu o vidro da porta da .... 23. De seguida e do interior desse veículo o arguido retirou e fez seus, uma mini bolsa da ..., no valor de € 165,00, que continha no seu interior um cartão de crédito titulado por DD, um cartão de débito titulado por EE e a quantia monetária de € 10,00, um porta-chaves em formato de cão, bens esses que fez seus, abandonando o local de seguida. 24. Ao proceder como antes descrito, o arguido agiu com o propósito concretizado de se introduzir no interior dos mencionados veículos automóveis, pela forma descrita – partindo os vidros das portas e abrindo-os, e apropriar-se dos bens em causa, bem sabendo que não lhe pertenciam e que deles se apropriava contra a vontade e sem o consentimento dos seus legítimos donos, como efetivamente fez. NUIPC 264/24.4... 25. Em execução de um plano previamente traçado visando apropriar-se dos bens que lhe interessassem e que pudesse transportar consigo, no dia ...-...-2024, pelas 01h02, o arguido deslocou-se ao snack-bar “...”, sito no ..., em .... 26. Uma vez ali, e em execução do dito plano, o arguido partiu o vidro da porta de acesso ao snack-bar, acedendo ao seu interior. 27. De seguida, o arguido retirou do seu interior: - Uma garrafa de aguardente, da marca ..., no valor de 12,00; - Duas garrafas de aguardente, da marca 1920, no valor unitário de € 18,00; - Uma garrafa de rum, da marca ..., no valor de € 12,00; - Uma garrafa de Grant´s, Triple Wood, no valor de € 17,00; - Duas garrafas de whisky, da marca ..., no valor unitário de € 15,00; - Uma garrada de aguardente, da marca CRF, reserva, no valor de € 20,00, tudo no valor total de € 127,00, que o arguido fez seus, abandonando o local de seguida. 28. Ao proceder como descrito, o arguido agiu com o propósito concretizado de se introduzir no interior do snack-bar pela forma descrita – partindo o vidro da sua porta de acesso - visando apropriar-se dos bens e das quantias monetárias que encontrasse no seu interior, bem sabendo que não se encontrava autorizado a entrar naquele espaço e que os bens que dali retirou não lhe pertenciam e que atuava contra a vontade e em prejuízo do seu legítimo dono. NUIPC 271/24.7... 29. No período compreendido entre as 20h45 e as 23h00 do dia ...-...-2024, em execução de um plano que previamente havia traçado visando apropriar-se dos bens que lhe interessassem e que pudesse transportar consigo, o arguido deslocou-se à ..., em .... 30. Uma vez aí, aproximou-se do veículo BMW com a matrícula ..-RB-.. e partiu o vidro da porta dianteira do lado direito, abrindo-o e assim acedendo ao seu interior. 31. Do interior do veículo o arguido retirou e fez seus, uns óculos de sol da marca ... e respetivo estojo, no valor de € 180,00, um estojo da marca ..., contendo produtos de beleza, no valor de € 70,00, uma nota do BCE de valor facial de € 5,00, e um saco de comida para papagaio, no valor de € 5,00, bens esses no valor total de € 260,00, que fez seus, abandonando o local de seguida. 32. Ao proceder como descrito, o arguido agiu com o propósito concretizado de se introduzir no interior do mencionado veículo automóvel, pela forma descrita – partindo o vidro da porta, e apropriar-se dos bens em causa, bem sabendo que não lhe pertenciam e que deles se apropriava contra a vontade e sem o consentimento dos seus legítimos donos, como efetivamente fez. NUIPC 1168/24.6... 33. No período compreendido entre as 19h30 do dia ...-...-2024 e as 03h00 do dia ...-...-2024, em execução de um plano que previamente havia traçado visando apropriar-se dos bens que lhe interessassem e que pudesse transportar consigo, o arguido deslocou-se à ..., no .... 34. Uma vez aí, o arguido aproximou-se do táxi da marca ... com a matrícula FF e, utilizando uma escotilha metálica das águas públicas, partiu o vidro da sua porta traseira do lado direito, abrindo-o e acedendo ao seu interior. 35. De seguida e do interior do veículo, o arguido retirou e fez seus, a quantia monetária de € 80,00, um terminal de pagamentos automáticos (TPA), da marca ..., no valor de € 40,00 e uma carta de condução titulada por GG, abandonando o local de seguida. 36. Ao proceder como descrito, o arguido agiu com o propósito concretizado de se introduzir no interior do mencionado veículo automóvel, pela forma descrita – partindo o vidro da porta, e apropriar-se dos bens atrás referidos, bem sabendo que não lhe pertenciam e que deles se apropriava contra a vontade e sem o consentimento dos seus legítimos donos, como efetivamente fez. NUIPC 301/24.2... 37. No dia ...-...-2024, pelas 19h30, em execução de um plano que previamente havia traçado visando apropriar-se dos bens que lhe interessasse e que pudesse transportar consigo, o arguido deslocou-se à ..., em .... 38. Uma vez aí, o arguido aproximou-se do veículo Renault Clio com a matrícula ... e, utilizando uma pedra, partiu o vidro da sua porta dianteira direita e acedeu ao seu interior. 39. De seguida e do interior do veículo, o arguido retirou e fez seu, o auto-rádio da marca ..., com leitor de CD, no valor de € 150,00, daí saindo de seguida. 40. Ao proceder como descrito, o arguido agiu com o propósito concretizado de se introduzir no interior do mencionado veículo automóvel, pela forma descrita – partindo o vidro de uma sua a porta e abrindo-o, e apropriar-se do auto-rádio atrás identificado, bem sabendo que não lhe pertencia e que dele se apropriava contra a vontade e sem o consentimento do seu legítimo dono, como efetivamente fez. 41. Em todas as situações acima descritas, o arguido agiu de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei e tendo capacidade para se determinar de acordo com esse conhecimento. 42. Dos bens e quantias monetárias subtraídos pelo arguido só não se logrou recuperar uma parte, no valor total de € 236,50, que foram utilizados e afetados por ele, como o entendeu. Resultantes da Discussão da Causa 43. O arguido confessou livre, integralmente e sem reservas a sua conduta delituosa, de que se revelou sinceramente arrependido e justificou com o facto de ser consumidor de “...” (Alfa-PHP) e de “...” (drogas sintéticas) à data dos factos, consumo que custeava com essa conduta. De acordo com o Relatório Social a ele referente: 44. O arguido encontra-se no EPF desde .../.../2024, primeiro na condição de preso preventivo à ordem do presente processo e agora em cumprimento de pena. Antes de recluído encontrava-se fora de casa, resultado da deterioração das condições de vida. A morada indicada para fins oficiais é a da família de origem, onde vivem os pais (sexagenários, já reformados) e uma irmã (HH, de 40 anos, trabalhadora fabril). No mesmo bairro, no ...., reside a companheira, II, de 37 anos, empregada hoteleira, com os dois filhos do casal, de 1 ano e meio e 6 anos, mais 3 filhos de relação anterior dela, de 10, 14 e 18 anos. Quer com os pais, quer com a companheira, as despesas com a habitação são reduzidas, tratando-se de um bairro social, com rendas apoiadas. 45. Foi manifesto o propósito de apoio familiar ao arguido, ainda que nos seis meses que precederam a prisão a desregulação comportamental, consumo abusivo de substancias estupefacientes sintéticas e estilo de vida delinquencial em se encontrava, o tenha inviabilizado. Embora tenha saído da casa da companheira, não é assumida a separação do casal. Esta mantém a expectativa de melhoria dos problemas aditivos do arguido, sem os quais descreve uma relação positiva. 46. Nos dois anos que precederam a prisão, AA deixou de ter um trabalho regular, mas antes mostrava competências de desempenho, alternando entre o sector da construção civil e o da restauração. Chegou a trabalhar também em ..., onde esteve emigrado durante 5 anos no passado. 47. Tem como habilitações o 9º ano. 48. O percurso de vida do arguido tem sido significativamente comprometido por hábitos de consumo abusivo de substâncias psicoactivas, designadamente, no tocante à família, trabalho e envolvimentos criminais, embora tenham sido reportados períodos de melhoria. As iniciativas de tratamento não tiveram continuidade. Antes do atual relacionamento faz menção a outros, mal-sucedidos, com dois filhos, com quem perdeu o contacto. 49. Tende a desvalorizar a sua responsabilidade criminal, atribuindo-lhe a causalidade às necessidades de consumo de produtos estupefacientes, associação a pares desviantes e desestruturação das suas condições de vida. 50. Encara com relativo conformismo a situação de reclusão. Não obstante, tem-se mostrado pouco cooperante/participativo no contexto prisional, o que se traduz em vários registos disciplinares, entre acessos de cólera, dano e posse de substâncias proibidas. Conta com visitas regulares da família. 51. De acordo com o seu Certificado de Registo Criminal, junto a fls. 242 a 243 verso dos autos, o arguido, por decisão de 2012, transitada em julgado em ..., pela prática, em .../.../2011, de um crime de roubo, foi condenado na pena de 3 anos e 10 meses de prisão, suspensa na sua execução, com submissão a regime probatório, pena que veio a ser declarada extinta. Motivação da decisão de facto A convicção do tribunal para dar como provados os factos relacionados com a conduta delituosa do arguido, seu circunstancialismo e consequências, vertidos nos pontos 1. a 42., inclusive, resultou das declarações por ele prestadas em sede de julgamento, em que tal confessou integralmente e sem reservas, assim permitindo a sua inequívoca aquisição processual. Valorados foram ainda, nesta sede, os autos de apreensão de fls. 7, 16 e verso, 25 e 32 e verso e os termos de entrega de fls. 8, 17 e 35 (NUIPC 20/24.0PDFUN); os autos de apreensão de fls. 7, 36 e verso e 38 e o termo de entrega de fls. 41 (NUIPC 245/24.8...); o auto de apreensão de fls. 23 e 24 e verso e o termo de entrega de fls. 25 (NUIPC 250/24.4...); os autos de apreensão de fls. 10 a 11 verso e os termos de entrega de fls. 12 e verso e 64 (NUIPC 254/24.7...); o auto de apreensão de fls. 8 e verso e o termo de entrega de fls. 10 e verso (NUIPC 264/24.4...); auto de apreensão de fls. 6 e verso e o termo de entrega de fls. 8 (NUIPC 271/24.7...); o auto de apreensão de fls. 28 e o termo de entrega de fls. 31 (NUIPC 1168/24.6...); auto de apreensão de fls. 15 e o termo de entrega de fls. 22 (NUIPC 301/24.2...). Do mesmo modo, nessas declarações denotou o seu sincero arrependimento e assumiu a seu então consumo ativo de drogas sintéticas, “...” e “...”, consumo que não foi alheio à prática dos factos típicos ajuizados, assim permitindo a aquisição processual da factualidade vertida no ponto 43. Quanto à factualidade respeitante à personalidade, situação pessoal, económica e familiar do arguido e seu percurso de vida, vertida nos pontos 44. a 50., inclusive, foi valorado o relatório social a ele referente, com que os autos foram instruídos. No que se refere aos antecedentes criminais do arguido, a que se aludiu no ponto 51., baseou o tribunal o seu convencimento na análise do seu Certificado de Registo Criminal, constante de fls. 242 a 243 verso, que os atestam. Factos Não Provados Não existem. Os demais factos vertidos na acusação e atrás não elencados como provados e/ou não provados, não o foram por consubstanciar matéria de direito e/ou conclusiva. *** Cumpre apreciar os fundamentos do recurso O recorrente, na conclusão 5.ª, arguiu a nulidade do acórdão recorrido, por omissão de pronúncia, em virtude do tribunal a quo não se ter pronunciado, nos factos provados e não provados, quanto ao constante no artigo 3 da acusação ou seja, “..e que só o conseguiu porque exerceu força física contra aquele, colocando-o na impossibilidade de resistir e reagir às suas condutas, de forma a apropriar-se dos bens que aquele tivesse consigo.”, padecendo assim o Acórdão dos vícios de omissão de pronúncia (cfr. artigo 379.º, n.º 1, alínea c) do Código de Processo Penal). De acordo com o artigo 379.º, n.º 1, alínea c), primeira parte, do Código de Processo Penal, é nula a sentença quando o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar. A omissão de pronúncia significa a ausência de tomada de posição ou de decisão por parte do tribunal sobre matérias em que a lei obriga que o juiz tome posição expressa no acórdão. Quando a lei fala em pronunciar-se sobre questões isso significa aquelas que os sujeitos processuais submeteram à apreciação do tribunal, bem como aquelas que sejam de conhecimento oficioso. De acordo com o Ac. do STJ de 16/02/2022, Proc. nº 333/14.9TELSB.L1-A.S1, a “Omissão de pronúncia significa, fundamentalmente, ausência de posição ou de decisão do tribunal sobre questões ou matérias, de direito substantivo ou processual, que conformam o objeto da concreta pretensão de justiça penal. A omissão de pronúncia causadora de nulidade de sentença ou acórdão, prevista no art. 379.º, n.º 1, al. c), do CPP, preenche-se com a falta de pronúncia sobre questão ou questões que, suscitadas pelos sujeitos processuais ou de conhecimento oficioso, o tribunal devia ter apreciado. Omitir pronúncia sobre determinada questão é, simplesmente, nada dizer sobre a mesma, não tomar sobre essa concreta questão, substantiva ou processual, qualquer posição, expressa ou implícita, mas claramente entendível, a não ser que resulte claramente prejudicada pela decisão de outras.” Segundo o Ministério Público, aqui recorrente, a omissão de pronúncia ter-se-á verificado relativamente ao facto de o tribunal recorrido não ter dado como provado ou não provado parte do alegado no artigo 3º da acusação, ou seja, a alegada omissão seria por um facto alegado na acusação, ou melhor dizendo, parte de um facto não ter sido objeto de apreciação por parte do tribunal recorrido. Tendo em conta o que acabamos de mencionar, bem como o que resulta do disposto nos artigos 339º nº 4, 368º nº 2 e 374º nº 2, todos do CPP, o tribunal deve indagar e tomar posição sobre todos os factos que tenham sido alegados pela acusação, pela contestação ou que resultem da discussão da causa e se mostrem relevantes para a decisão. Daqui decorre que, ainda que para a solução de direito que o tribunal tem como adequada para o caso se afigure irrelevante a prova de determinado facto, o tribunal não pode deixar de se pronunciar sobre a verificação ou não de determinados factos, o que pressupõe a sua indagação se tal facto se mostrar relevante num outro entendimento jurídico plausível. Como resulta claramente no disposto no nº 4 do artigo 339º do CPP, o objeto do processo está delimitado, antes de mais, pela acusação. Há que relembrar, ainda, que para além de fazerem parte da discussão e da decisão, a lei impõe, conforme resulta do artigo 374º nº 2 do CPP, que o juiz leve esses factos (provados ou não provados) à sentença. Na verdade, diz o nº 2 da norma em causa que ao relatório segue-se a fundamentação, que consta da enumeração dos factos provados e não provados. A razão de ser destas exigências legais prende-se, em primeiro lugar, com as finalidades do julgamento penal que é, em síntese, o momento onde são apresentados todas as provas e argumentos com vista a que o Tribunal possa alcançar a verdade histórica e decidir justamente a causa, mas, também, em dar concretização prática ao estabelecido no artigo 205º da CRP – dever de fundamentação das decisões dos tribunais – sendo que esse dever, relativamente à sentença, visa, nas palavras de Germano Marques da Silva, In “Curso de Processo Penal”, Editorial Verbo 2008, 4ª Edição Revista e atualizada, II Volume, páginas 153 e 154. em «lograr obter uma maior confiança do cidadão na Justiça, no autocontrolo das autoridades judiciárias e no direito de defesa a exercer através dos recursos.». Para além disso, pretende-se assegurar as garantias de defesa do arguido, previstas no artigo 32º da CRP, de modo a que este possa ficar a conhecer e tomar posição sobre todas questões de facto e de direito abordadas pelo tribunal, assim como evitar a necessidade de repetição de novo julgamento, com todas os prejuízos para a realização da justiça que daí resultam, nas situações em que o tribunal a quo decidiu não tomar posição sobre determinados factos, quer sejam da acusação, quer sejam da defesa e o tribunal ad quem vir a considerar que esses factos ignorados são, afinal, relevantes para a decisão. Quando a lei, na alínea c) do nº 1 do artigo 379º do CPP, fala em questões que devesse apreciar, está, naturalmente, a referir-se a questões ou matérias de direito substantivo ou processual e não aos factos alegados na acusação, na contestação ou no pedido de indemnização civil. É importante realçar, também, que a nulidade de sentença por omissão de pronúncia refere-se a questões e não a razões ou argumentos invocados pelos sujeitos processuais. Na verdade, a omissão quanto a factos alegados na acusação, na contestação, no pedido cível ou que resultem da discussão da causa, desde que se mostrem relevantes para a decisão, ainda que para a solução de direito que o tribunal tem como adequada para o caso se afigure irrelevante, conduz a nulidade da sentença, por falta de fundamentação, nos termos do artigo 379º nº 1 al. a) do CPP conjugado com o artigo 374º nº 2 do CPP e não ao vício de omissão de pronúncia. Assim, não se reconhecendo a nulidade da sentença, por omissão de pronúncia, nos termos do art.379.º, n.º1, al. c), do C.P.P., improcede, nesta parte, o recurso. Quanto a este aspeto cumpre referir, ainda, que a fundamentação de uma sentença, na parte da enumeração dos factos provados e não provados, apenas deve conter factos; não juízos de valor, conceitos ou conclusões, que são matéria de direito. Que factos devem ser enumerados na sentença? Naturalmente, os factos sujeitos a julgamento, cujo âmbito é definido pela acusação, pronúncia, pedido cível (quando o houver), contestação e os que resultarem da prova produzida em audiência, com relevância para a existência ou inexistência do crime, a punibilidade ou não punibilidade do agente e a determinação da pena ou da medida de segurança ou da responsabilidade civil – artigo 283º nº 3 do CPP. De acordo com o artigo 124º do CPP '' constituem objeto da prova os factos juridicamente relevantes para existência ou inexistência do crime, punibilidade ou não do arguido e a determinação da pena, medida de segurança ou responsabilidade civil que ao caso couber''. Deste modo, os factos inócuos, irrelevantes para a qualificação do crime ou para a graduação da responsabilidade do arguido, mesmo que descritos na acusação ou na contestação, estão, naturalmente, excluídos da atividade probatória do julgador. Na verdade, de harmonia com o art. 368º nº 2 do CPP o tribunal deve pronunciar-se sobre os factos alegados pela acusação e pela defesa, e bem assim sobre os que resultarem da discussão da causa, relevantes para as questões de saber: a) Se se verificaram os elementos constitutivos do tipo de crime; b) Se o arguido praticou o crime ou nele participou; c) Se o arguido atuou com culpa; d) Se se verificou alguma causa que exclua a ilicitude ou a culpa; e) Se se verificaram quaisquer outros pressupostos de que a lei faça depender a punibilidade do agente ou a aplicação a este de uma medida de segurança; f) Se se verificaram os pressupostos de que depende o arbitramento da indemnização civil. No caso em apreço, a peça acusatória, na parte que aqui releva, contém factos inócuos, juízos de valor e conceitos jurídicos e conclusões. Na verdade ao utilizar as expressões “exerceu força física” “colocando-o na impossibilidade de resistir e reagir às suas condutas” a acusação recorreu a conceitos jurídicos e conclusivos o quais, por não constituírem factos, mas ilações a extrair de factos concretos, e por estarem desacompanhados desses mesmos factos concretos, não podem, como de forma correta fez o tribunal recorrido, ser levados à fundamentação de facto. Na verdade, o facto concreto descrito na acusação “puxando-lhe da mão o telemóvel” é que constitui o verdadeiro facto e será a partir deste facto, conjugado com os factos atinentes ao elemento subjetivo, que será possível ao tribunal concluir pela presença, ou não, dos elementos constitutivos do crime de roubo. Em face do que resulta do acórdão recorrido, constata-se que o tribunal a quo expurgou, como não poderia deixar de ser, essa matéria da atividade probatória, razão pela qual, apesar de descrita na acusação não tinha que constar da fundamentação da matéria de facto. Da contradição insanável e do erro notório na apreciação da prova. Como resulta da lei, o Tribunal da Relação pode conhecer da questão de facto por duas vias: a primeira através da impugnação alargada com apelo à prova gravada, se tiver sido suscitada, conforme resulta do artigo 431º do CPP; - a segunda pela análise dos vícios do nº 2 do art. 410º do CPP. Quanto à primeira situação, estamos perante um típico erro de julgamento, previsto no artigo 412º/3 – que ocorre quando o tribunal considere provado um determinado facto, sem que dele tivesse sido feita prova pelo que deveria ter sido considerado não provado ou quando dá como não provado um facto que, face à prova que foi produzida, deveria ter sido considerado provado. Neste caso - erro de julgamento - o recurso pretende a reapreciação da prova gravada ou documentada perante o tribunal recorrido, havendo que a ouvir em sede de recurso. Numa situação como esta, a apreciação do recurso não se restringe ao texto da decisão, alargando-se à análise do que se contém e pode extrair da prova gravada ou constante de documentos ou outros meios de prova inseridos no processo, mas sempre dentro dos limites fornecidos pelo recorrente no estrito cumprimento do ónus de especificação imposto pelos nºs 3 e 4 do art. 412º do CPP. Cumpre precisar que nestas situações, o recurso da matéria de facto não visa a realização de um novo julgamento sobre aquela matéria a ter lugar perante o tribunal da relação, com base na audição de gravações, antes constituindo um mero “remédio para obviar a eventuais erros ou incorreções da decisão recorrida na forma como apreciou a prova, na perspetiva dos concretos pontos de facto identificados pelo recorrente. Quanto ao recurso da decisão facto com base nos vícios do artigo 410º, nº 2 do CPP, que é que a está aqui em causa, cumpre referir que esta norma legal estabelece que, mesmo nos casos em que a lei restringe a cognição do tribunal, o recurso pode ter como fundamentos, desde que o vício resulte do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum: a insuficiência para a decisão da matéria de facto provada; a contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão; e o erro notório na apreciação da prova. Tais vícios implicarão para o tribunal de recurso, como resulta do artigo 426º do CPP, o reenvio do processo, caso não os possa suprir, para novo julgamento. Conforme resulta das conclusões de recurso, o recorrente apontou à decisão recorrida os vícios decisórios previstos nas alíneas b) e c) do nº 2 do artigo 410º do CPP, ou seja, contradição insanável da fundamentação e o erro notório na apreciação da prova. Segundo o MP, aqui recorrente, o tribunal recorrido, por um lado, ao formar a sua convicção com base na confissão integral e sem reservas do arguido e, por outro, não dar como provado (nem como não provado) que “3. O arguido agiu com o propósito concretizado de fazer seu o telemóvel de BB, bem sabendo que aquele aparelho não lhe pertencia e que agia contra a vontade daquele, e que só o conseguiu porque exerceu força física contra aquele, colocando-o na impossibilidade de resistir e reagir às suas condutas, de forma a apropriar-se dos bens que aquele tivesse consigo.”, cometeu uma contradição insanável na fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão. O vício de contradição insanável na fundamentação verifica-se quando, “fazendo um raciocínio lógico, for de concluir que a fundamentação leva precisamente a uma decisão contrária àquela que foi tomada ou quando, de harmonia com o mesmo raciocínio, se concluir que a decisão não é esclarecedora, face à colisão entre os fundamentos invocados...” (Manuel Simas Santos e Manuel Leal-Henriques, in Recursos em Processo Penal, 4.ª edição, Rei dos Livros, 72 e 73). Quanto ao vício da contradição insanável, a que alude a alínea b) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP, refere-se no acórdão deste Supremo Tribunal, de 12 de março de 2015, Proc. n.º 418/11.3GAACB.C1.S1 - 3.ª Secção, que «[o] vício da contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão verifica-se quando no texto da decisão constem posições antagónicas ou inconciliáveis, que se excluam mutuamente ou não possam ser compreendidas simultaneamente dentro da perspetiva de lógica interna da decisão, tanto na coordenação possível dos factos e respetivas consequências, como nos pressupostos de uma solução de direito». No caso em apreço, procedendo à análise da decisão recorrida, do texto da mesma não resulta qualquer incompatibilidade entre os factos provados acima descritos, sendo que não existem factos não provados. Compulsada a fundamentação de facto, dela decorre que a factualidade foi dada como provada com base nas declarações do arguido através das quais confessou, de forma integral e sem reservas, os factos dados como provados, motivo pelo qual também não se vê qualquer facto dado como provado em oposição com a referida confissão. Não se verifica, pois, contradição insanável da fundamentação (artigo 410.º, n.º 2, alínea b), do CPP) improcedendo, deste modo, o apontado vício decisório. Quanto ao erro notório previsto no artigo 410º nº 2 al. c) do CPP é o erro que se vê logo, que ressalta evidente da análise do texto da decisão por si só ou conjugada com as regras da experiência. Como é jurisprudência pacífica só há erro notório na apreciação da prova quando for de tal modo evidente que não passa despercebido ao comum dos observadores e resulta do próprio texto da decisão. Existe este erro quando no texto da decisão recorrida se dá por provado, ou não provado, um facto que contraria, com toda a evidência, segundo o ponto de vista de um homem de formação média, a lógica mais elementar e as regras da experiência comum. Este vício ocorre quando o tribunal, no seu processo de apreciação da prova, valoriza e dá como provado ou não provado certos factos, contra as regras da experiência comum ou contra critérios legalmente fixados e isso é percetível pela simples leitura da decisão e não passa despercebido ao cidadão comum. Isto é, o erro tem de ser detetável no próprio texto e contexto da decisão recorrida, quando existam e se revelem distorções de ordem lógica entre os factos provados e não provados, ou traduza uma apreciação manifestamente ilógica, arbitrária, de todo insustentável, e por isso incorreta, e que, em si mesma, não passe despercebida imediatamente à observação e verificação comum do homem médio. Segundo Simas Santos e Leal Henriques, in Recursos em Processo Penal, 6ª Ed., 74, tal erro ocorrerá "quando se retira de um facto dado como provado uma conclusão logicamente inaceitável, quando se dá como provado algo que notoriamente está errado, que não podia ter acontecido, ou quando, usando um processo racional e lógico, se retira de um facto dado como provado uma conclusão ilógica, arbitrária e contraditória, ou notoriamente violadora das regras da experiência comum, ou ainda quando determinado facto provado é incompatível ou irremediavelmente contraditório com outro dado de facto (positivo ou negativo) contido no texto da decisão recorrida”. Consideram os mesmos autores que “existe igualmente erro notório na apreciação da prova quando se violam as regras sobre o valor da prova vinculada, as regras da experiência ou as legis artis, como sucede quando o tribunal se afasta infundadamente do juízo dos peritos. Mas, quando a versão dada pelos factos provados é perfeitamente admissível, não se pode afirmar a verificação do referido erro”. Este erro não ocorre se a discordância resultar da forma como o tribunal recorrido apreciou a prova. Na verdade, o simples facto de a versão do recorrente sobre a matéria de facto não coincidir com a versão seguida pelo tribunal recorrido não conduz ao vício de erro notório na apreciação da prova. Tendo em conta o caso concreto, da leitura feita à decisão recorrida, em particular do “facto” e motivação colocados em causa pelo recorrente, não resulta nos factos provados algo que não possa ter acontecido, ou que exista algum facto provado, ou não provado, obtido através de uma valoração da prova feita contra as regras da experiência ou contra critérios legais previamente fixados. Na verdade, os factos estão descritos de forma clara e percetível, mostram-se fundamentados de forma lógica e com base em prova produzida, estando em conformidade com a mesma. Em suma, da simples leitura direta e objetiva do acórdão sob recurso, considerado em si mesmo, não ressalta a verificação do vício de erro notório na apreciação da prova. Cumpre dizer que a apreciação deste invocado vício não consiste numa apreciação e julgamento da prova, mas apenas verificar se a decisão contém alguns dos vícios acima apontados. Improcede, deste modo, o recurso quanto a este segmento. Vejamos agora o último segmento do recurso, ou seja, saber se os factos provados preenchem os elementos constitutivos do crime de roubo. Segundo o recorrente os factos provados, nomeadamente o facto de o arguido ter-se aproximado do ofendido e ter-lhe puxado o telefone da mão, configura a prática de atos de violência e constrangimento exercidos sobre o ofendido colocando-o na impossibilidade de resistir e reagir estando, deste modo, preenchidos os elementos constitutivos do crime de roubo. O tribunal recorrido justificou o enquadramento jurídico-penal, quanto aos factos em causa, pelo seguinte modo: “Dispõe o artigo o artigo 210º, nº 1 do Cód. Penal, que: l. Quem, com ilegítima intenção de apropriação para si ou para outra pessoa subtrair, ou constranger a que lhe seja entregue, coisa móvel alheia, por meio de violência contra uma pessoa, de ameaça com perigo iminente para a vida ou para a integridade física ou pondo-a na impossibilidade de resistir, é punido com pena de prisão de l a 8 anos.” O crime de roubo é um crime complexo que visa proteger tantos bens jurídicos patrimoniais (direito de propriedade e detenção de coisas móveis) como bens jurídicos pessoais (liberdade de decisão e ação, integridade física). Outrossim, é um crime de dano e de resultado. Desse modo, para o tipo legal se preencher, é necessária a verificação de efetiva subtração de coisa móvel alheia. Mas é também necessário que se verifique um efetivo constrangimento, levado a cabo por um dos meios descritos no tipo legal. Saliente-se, a este respeito, que a ameaça é também uma violência psíquica que terá de específico o facto de constranger através da provocação de medo, inquietação, insegurança, de forma a afetar a liberdade de decisão e ação do ameaçado. Todavia, no tipo legal de roubo apenas releva a ameaça com perigo iminente para a vida ou integridade física. A ameaça de que se trata é grave, capaz, no caso concreto, de paralisar a reação contra o agente. Ora, dos factos provados e não provados resulta, à saciedade, que o crime em apreço não pode ser assacado ao arguido. É que, é certo, como vimos, que se apropriou do telemóvel pertença do referido ofendido, contra a sua vontade. Mas, os factos provados (vertidos na acusação), revelam que o fez sem um efetivo constrangimento, sem uma qualquer violência, que, em nosso entender, nessa indevida apropriação se não vislumbra. E a se assim, como o é, considerando ainda a intencionalidade nela posta, o que se impõe concluir é que, com tal conduta, o arguido se tornou incurso num (outro) crime de furto, p. e p. pelo citado art. 203º, nº 1 do Código Penal, que já sabemos ser punível com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa.” São elementos objetivos do tipo de crime em causa, por um lado, a subtração de coisa móvel alheia e, por outro, o constrangimento dessa pessoa a entregar a coisa, através da utilização de violência contra a pessoa, ou da utilização da ameaça com perigo iminente para a vida ou para a integridade física, ou na colocação da vítima na impossibilidade de resistir. No caso em apreço, de acordo com o recorrente, está em causa uma situação de violência direta sobre o ofendido, ou seja, um atuação física sobre a vitima. Em todo o caso, da factualidade apurada, ( ou da descrita na acusação), não se percebe qualquer tipo de ameaça com o objetivo de intimidar a vítima e/ou perturbar a sua liberdade de atuação. Na verdade, analisando a factualidade apurada não se descortina que, juntamente com o gesto de retirar o telemóvel das mãos do ofendido, o arguido tenha exercido qualquer tipo de ação sobre o corpo da vítima. O que sobressai dos factos provados é que, de forma súbita e inesperada, o arguido retira o telemóvel das mãos do ofendido. Em todo o caso, ao contrário do defendido pelo Ministério Público, o facto de o arguido ter retirado o telemóvel de forma repentina, não significa e nem se confunde com uma situação de colocar a vítima na impossibilidade de resistir. Como diz Paulo Pinto de Albuquerque in Comentário do Código Penal à luz da CRP e da CEDH, 3ª edição, pág. 826, citando diversos autores, a colocação da pessoa na situação de impossibilidade de resistir “não inclui o ardil e a surpresa”. Foi por isto que o tribunal a quo compreendeu e concluiu que o crime praticado não foi um roubo, mas sim um furto e também é este o entendimento que integralmente mantemos, razão pela qual nenhum reparo nos merece a decisão recorrida. IV–Dispositivo Pelo exposto, acordam os juízes da 9ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa em negar provimento ao recurso mantendo-se na íntegra a decisão recorrida. Sem custas por o MP estar isento. Notifique Lisboa, 6-11-2025 (Elaborado e integralmente revisto pelo relator) Ivo Nelson Caires B. Rosa Diogo Coelho de Sousa Leitão Paula Cristina Borges Gonçalves |