Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
866/13.4YRLSB-2
Relator: JORGE LEAL
Descritores: ARBITRAGEM NECESSÁRIA
MEDICAMENTO
PATENTE
PROPRIEDADE INDUSTRIAL
HONORÁRIOS
ENCARGOS DA ARBITRAGEM
CUSTAS
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 02/06/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIAL PROCEDÊNCIA
Sumário: I – Embora a arbitragem necessária prevista nos artigos 2.º e 3.º da Lei n.º 62/2011, de 12.12 (que cria um regime de composição dos litígios emergentes de direitos de propriedade industrial quando estejam em causa medicamentos de referência e medicamentos genéricos) seja desencadeada pela publicitação de um concreto pedido de autorização de introdução de um medicamento genérico no mercado, a defesa dos direitos de propriedade industrial pode ser alargada, pelo respetivo titular, a todos os atos que razoavelmente possam ser configurados (na ação) como podendo vir a ocorrer e que ponham em perigo os referidos direitos, nomeadamente o fabrico, a importação, a oferta, a armazenagem, a introdução no comércio ou a utilização de qualquer medicamento genérico objeto da ou das patentes invocadas ou do respetivo certificado complementar de proteção.
II – Nos termos do art.º 69.º n.º 1 da Convenção sobre a Concessão de Patentes Europeias, interpretado à luz do respetivo Protocolo Interpretativo, o âmbito de proteção da patente europeia define-se pelo teor das reivindicações, interpretadas à luz da descrição, sem sujeição ao estrito texto ou letra das reivindicações, abarcando aquilo que deva ser considerado equivalente a elemento ou elementos especificados nas reivindicações, procurando-se uma posição de equilíbrio, que assegure simultaneamente uma proteção justa ao titular da patente e um grau razoável de segurança jurídica para terceiros.
III - Na avaliação do âmbito de proteção de uma patente, em confronto com o produto, o processo ou a utilização apresentados por terceiro, importa levar em consideração o problema técnico cuja resolução se visa com a invenção patenteada.
IV – Se os requerentes de uma patente apresentam o produto inventado como um sal que apresenta vantagens ao nível da manipulação e conservação, relativamente à forma livre da respetiva substância base, já conhecida à data da apresentação do pedido ou da prioridade requerida, o medicamento genérico que contenha tão só, como princípio ativo, essa substância na forma livre e não o sal objeto da patente, não integra elemento equivalente ao patenteado, para o efeito de se lhe estender o âmbito de proteção à luz da designada doutrina dos equivalentes ou da equivalência.
V – O referido em IV não é invalidado pelo facto de se ter provado que o sal e a substância base, na forma livre, produzem o mesmo efeito depois de administrados no organismo humano.
VI - Na arbitragem necessária, nem as partes podem impor aos árbitros o montante da sua remuneração, nem os árbitros podem impô-lo às partes; caso sobre a matéria não tiver sido concluído qualquer acordo entre as partes e os árbitros, caberá aos árbitros fixar o montante dos seus honorários e despesas, mas as partes poderão sujeitar tal decisão à apreciação do tribunal estadual.
VII – Se na ata de instalação do tribunal arbitral os juízes-árbitros fixaram o valor dos encargos de arbitragem, incluindo os respetivos honorários, e subsequentemente as partes deram sinais explícitos de aceitação dos valores e regras a este respeito consignados na ata de instalação do tribunal arbitral, não poderão depois venire contra factum proprium.
VIII – Nem a Lei de Arbitragem Voluntária nem o CPC cominam com nulidade ou anulabilidade a decisão arbitral que não indique expressamente os motivos por que se fixou a repartição dos encargos com a arbitragem pelas partes numa determinada proporção.
IX – No silêncio da lei e na falta de acordo entre as partes e os árbitros aceita-se que na fixação da repartição dos encargos com a arbitragem se atenda ao critério da percentagem do decaimento, sem prejuízo de correções decorrentes de situações casuísticas, que justifiquem desvios à regra geral.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Parcial:Acordam os juízes no Tribunal da Relação de Lisboa

RELATÓRIO
Em 15.5.2012, na Faculdade de Direito de Lisboa, foi declarada a instalação do Tribunal Arbitral (TA) constituído para dirimir o litígio entre “A” UK Limited, “B” Limited, “C” Group Limited, “D” UK Limited e “E” Unipessoal Lda, como demandantes e “F” Pharma BV, como demandada, tendo sido elaborada a ata que consta a fls 3 a 9 do processo e aí fixado, como objeto do litígio, o seguinte: “exercício dos direitos que as Demandantes possuem, decorrentes da Patente Portuguesa n.º ... e respectivo Certificado Complementar de Protecção n.º 55 e bem assim das Patentes Europeias n.º ... e n.º ..., relativamente a medicamentos genéricos, nomeadamente os indicados na lista publicada pelo Infarmed – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, I.P no seu sítio eletrónico, em 11 de Janeiro de 2012, com a substância activa “Abacavir+Lamivudina+Zidovudina”, conforme identificado na carta endereçada à Demandada em 8 de Fevereiro de 2012 (anexa a esta ata)”.
Na referida ata foi fixado o prazo de 30 dias para apresentação da petição inicial e igual prazo para a apresentação da contestação.
Em 06.9.2012 “A” UK Limited apresentou petição inicial, contra “F” Nederland B.V. e “F” Pharma – Produtos Farmacêuticos, Lda.
A demandante alegou, em síntese, ser uma empresa farmacêutica a nível mundial que se dedica ao tratamento do HIV (vírus da SIDA). Entre os produtos da “A” encontra-se o T..., medicamento para o tratamento farmacêutico da infeção pelo HIV. T... é a marca de uma formulação farmacêutica combinada de dose fixa de três medicamentos anti-retrovirais: Abacavir, Lamivudina (também designado 3TC) e Zidovudina (ou AZT). Em Portugal, a demandante obteve autorização para a introdução no mercado (AIM) para os medicamentos contendo Abacavir + Lamivudina + Zidovudina como substância ativa, na dosagem de 300 mg + 150 mg + 300 mg, os quais são comercializados em Portugal com a marca T.... A demandante é titular de três patentes e um certificado suplementar de proteção relativos ao T...: Patente Portuguesa n.º ... (PT ...) e respectivo Certificado Complementar de Protecção n.º 55 (CCP 55), Patente Europeia n.º ... (EP ...) e Patente Europeia n.º ... (EP ...). A PT ... protege um processo para a preparação, nomeadamente, da substância farmacêuticamente ativa Abacavir, nos termos do conteúdo das suas reivindicações. A PT ... vigorará até 30.3.2013. Por força do CCP 95 a substância ativa Abacavir (isolada ou em combinação com outros princípios ativos) fica protegida até 28.6.2014, desde que seja produzida de acordo com o processo descrito nas reivindicações da PT .... A EP ... protege o sal hemissulfato de Abacavir ou um seu solvato, formulações farmacêuticas contendo esse composto e a sua utilização em medicina, especificamente no tratamento de infeção pelo vírus de HIV e pelo vírus da hepatite B. A EP ... vigorará até 14.5.2018. A EP ... protege, nomeadamente, a invenção de combinações terapêuticas anti-HIV de Abacavir, Zidovudina e Lamivudina (T...), composições farmacêuticas contendo as referidas combinações e a sua utilização no tratamento de infeções por HIV incluindo infeções com mutantes de HIV com resistência a inibidores nucleosídicos e/ou não nucleosídicos. A EP ... vigorará até 28.3.2016. A Lei n.º 62/2011, de 12.12 força os titulares de direitos de propriedade industrial a iniciarem ações arbitrais para exercerem contenciosamente os seus direitos, no prazo de 30 dias a contar da publicitação pelo Infarmed de pedidos de AIM que aqueles entendam afetá-los. Conforme lista publicada na página oficial do Infarmed, a 1.ª demandada solicitou autorização para introdução no mercado (AIM) de um medicamento genérico que tem como medicamento de referência o T..., contendo a combinação de sulfato de abacavir, zidovudina e lamivudina como substâncias ativas. Tal genérico cai no âmbito de proteção das ditas patentes e do CCP. O pedido de AIM significa que a primeira demandada irá lançar o dito genérico no mercado, logo que obtenha as necessárias autorizações administrativas, o que constituirá uma violação dos direitos da demandante emergentes das referidas patentes e do mencionado CCP. Quer o pedido de AIM quer a respetiva AIM, após concedida, poderão ser transferidos pelas demandadas para terceiros.
Consequentemente, a demandante concluiu pedindo que a ação fosse julgada procedente e por isso:
a) As demandadas fossem condenadas a abster-se, em território português, ou tendo em vista a comercialização nesse território, de importar, fabricar, armazenar, introduzir no comércio, vender ou oferecer o medicamento genérico referido no artigo 77.º da p.i. ou, sob estas ou quaisquer outras designações ou marcas, qualquer outro medicamento contendo abacavir ou sulfato de abacavir, zidovudina e lamivudina como princípio ativo enquanto os direitos de propriedade industrial acima referidos se encontrarem em vigor, ou seja, até 14 de maio de 2018;
b) Fossem as demandadas condenadas, com vista a garantir o exercício dos direitos da demandante, a não transmitir a terceiros a sua posição de requerente no pedido de AIM identificado no artigo 77.º da petição, até à referida data de caducidade dos direitos ora exercidos;
c) Ao abrigo do disposto no art.º 384.º do CPC e no art.º 829.º-A do Código Civil, as demandadas fossem condenadas no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória no valor, pelo menos, de € 3 561,00 por cada dia de incumprimento da sentença que viesse a ser proferida nos termos acima peticionados.
Por despacho de 13.9.2012 o Tribunal Arbitral declarou extinta a instância, por inutilidade superveniente da lide, relativamente à demandada “F” Pharma B.V. e admitiu a intervir, em substituição desta, as sociedades “F” Nederland B.V. e “F” Pharma – Produtos Farmacêuticos, Lda.
Em 18.9.2102 as sociedades “F” Nederland B.V. e “F” Pharma – Produtos Farmacêuticos, Lda declararam aceitar intervir na ação arbitral, em substituição da demandada “F” Pharma, B.V. e mais declararam aceitar o tribunal arbitral já constituído, bem como as regras processuais acordadas entre as partes e os senhores árbitros.
Em 22.10.2012 as demandadas apresentaram contestação. Nela arguiram a ilegitimidade da demandada “F” Nederland B.V., a falta de interesse em agir da demandante, a invalidade da EP ..., a falta de fundamento da peticionada condenação na não transmissão da AIM, a incompetência do tribunal arbitral para condenação na sanção pecuniária compulsória, e impugnaram os factos alegados pela demandante para sustentar os direitos de propriedade industrial invocados.
As demandadas concluíram pela absolvição da instância, por ilegitimidade, da demandada “F” Nederland B.V., pela improcedência da ação, com a consequente absolvição dos pedidos, por a titularidade de AIM sobre medicamentos genéricos contendo Abacavir/Lamivudina/Zidovudina não consubstanciar qualquer ato de infração ou de ameaça de infração e que fosse reconhecida a invalidade da EP ..., por via de exceção ou de reconvenção; subsidiariamente, que a presente ação arbitral fosse suspensa com a condição de que fosse proposta ação judicial com vista à obtenção de decisão de declaração de nulidade da EP ..., no prazo de 30 dias e até ao trânsito em julgado da referida decisão; em qualquer caso, a demandante deveria ser condenada no pagamento dos encargos da arbitragem, incluindo honorários e despesas dos árbitros e do secretário e, ainda, no pagamento dos honorários dos advogados das demandadas.
Em 22.01.2013 foi proferido acórdão saneador (no qual se menciona a existência de resposta da demandante à contestação que, porém, não consta nos autos) em que se relegou para momento posterior à audiência de discussão e julgamento o conhecimento e decisão da exceção dilatória inominada da falta de interesse em agir, se julgou improcedente a exceção da ilegitimidade processual da demandada “F” Nederland B.V., julgou-se (por maioria) o tribunal arbitral incompetente em razão da matéria para conhecer e decidir a exceção relativa à vigência e validade da patente europeia (EP ...) invocada pela demandante e julgou-se o tribunal arbitral competente para apreciar e conhecer o pedido de condenação em sanção pecuniária compulsória, relegando, porém, para a decisão final a correspondente pronúncia. Seguidamente foi formulado “guião de prova”.
As demandadas recorreram do despacho saneador, na parte em que o tribunal arbitral se julgou incompetente para conhecer a exceção da invalidade da patente europeia invocada pela demandante e arguiram a nulidade por omissão de pronúncia sobre o pedido subsidiário de suspensão do processo.
Por despacho de 01.3.2013 o recurso foi rejeitado, por ser julgado inadmissível.
Por decisão interlocutória de 07.3.2013 foi indeferido o pedido de suspensão condicional da instância arbitral peticionado pelas demandadas.
Em 14.3.2013 as demandadas anunciaram que não iriam proceder ao pagamento de reforço da provisão solicitado, aceitando a consequência de se verem impossibilitadas de intervir na fase de produção de prova, bem como de apresentar alegações e requerendo que, em consequência, se procedesse à revisão do montante de encargos fixado no ponto 7 da ata de instalação (€ 75 000,00) e fosse emitida, de imediato, decisão final.
Em 04.4.2013 teve lugar a audiência de julgamento, no decurso da qual foram ouvidas as testemunhas indicadas pela demandante.
Em 05.4.2013 o tribunal arbitral proferiu acórdão em que reduziu para o montante de € 60 000,00 o valor dos encargos com a presente arbitragem.
A demandante apresentou alegações escritas de facto e de direito.
Em 02.5.2013 foi proferido acórdão que culminou com a seguinte decisão:
1) Julga-se improcedente a exceção dilatória inominada da falta de interesse em agir da Demandante, invocada pelas Demandadas.
2) Condenam-se as Demandadas “F” Nederland, B.V., e “F” Pharma – Produtos Farmacêuticos, Lda, a absterem-se de importar, fabricar, oferecer, armazenar, introduzir no comércio ou utilizar, em Portugal, medicamentos genéricos com combinação das três substâncias ativas Abacavir, Zidovudina e Lamivudina como princípio ativo, enquanto os direitos de propriedade industrial das Demandantes se encontrarem em vigor, ou seja, até 14 de Maio de 2018;
3) Absolvem-se as referidas Demandadas dos pedidos de não transmissão de AIM a terceiros e de condenação em sanção pecuniária compulsória.
Custas a suportar pelas partes na proporção de ¾ pelas Demandadas “F” Nederland, B.V. e “F” Pharma – Produtos Farmacêuticos, Lda, e de ¼ pela Demandante (“A” UK Limited).
Comunique-se ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial e ao Infarmed, nos termos do artigo 3.º da Lei n.º 62/2011, de 12 de dezembro.
As demandadas apelaram deste acórdão, tendo apresentado motivação em que terminaram com as seguintes conclusões:
1.ª O presente recurso vem interposto, em primeiro lugar, da decisão arbitral de condenação das Demandadas na proibição de "importar, fabricar, oferecer, armazenar, introduzir no comércio ou utilizar, em Portugal, medicamento genéricos com a combinação das três substâncias ativas Abacavir, Zidovudina e Lamivudina como princípio ativo, enquanto os direitos de propriedade industrial das Demandantes se encontrarem em vigor, ou seja, até 14 de Maio de 2018"; uma vez que o Tribunal Arbitral, ao decidir como decidiu, excedeu, manifestamente, os poderes nos quais se encontra investido, por força do regime de arbitragem necessária previsto na Lei n.º 62/2011.
2.ª Da conjugação dos artigos 3.º, n.º 1 da Lei n.º 62/2011 e do artigo 15.º-A, n.ºs 1 e 2 (bem como do artigo 9º, n.º 2, aplicável in casu) do Estatuto do Medicamento resulta que o âmbito do processo arbitral está limitado, exclusivamente, aos medicamentos genéricos cujo pedido de AIM, tendo sido publicitado pelo INFARMED e que gerou o direito de iniciar a arbitragem em questão pelo "interessado" que pretenda invocar os seus direitos de propriedade industrial.
3.ª Tal publicação, ao identificar o medicamento genérico em causa, no que respeita, entre outros, à sua substância activa, à respectiva dosagem, à data do pedido e à forma farmacêutica do mesmo, tem por consequência excluir do âmbito da arbitragem e, consequentemente, da decisão arbitral que nela venha a ser proferida, quaisquer outros medicamentos genéricos que contenham a mesma substância activa ou combinação de substâncias activas constante da publicação, bem como medicamentos genéricos cujos elementos não correspondam, na totalidade, aos indicados nessa mesma publicação.
4.ª Faz-se notar que não está em causa o respeito pelos direitos de propriedade industrial de terceiros porquanto a lei é clara nesta matéria: a AIM, o preço e a comparticipação do medicamento genérico não violam direitos de propriedade industrial de terceiros, pelo que tais pedidos, a existirem, não implicam qualquer violação do direito de exclusivo. Do que aqui se trata é da inadmissibilidade de condenação, através de um meio legal excepcional – o regime consagrado na Lei n.º 62/2011 é um regime de excepção no contexto do direito de patentes – in futurum, sem que ao requerente de uma eventual futura AIM para um medicamento contendo a combinação de abacavir, lamivudina e zidovudina seja assegurado o correspondente direito de defesa.
5.ª O entendimento contrário, como permitindo aplicar uma proibição de comercialização ou exploração industrial a qualquer medicamento contendo a combinação de abacavir, lamivudina e zidovudina como substâncias activas, não tem qualquer suporte legal, nem pode corresponder a qualquer interpretação do referido artigo 3.º da Lei n.º 62/2011, sob pena de a referida Lei, assim interpretada, ser inconstitucional, por violação do elementar direito de acesso ao direito e de defesa previsto no artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa, e bem assim por constituir uma restrição infundada do direito fundamental constitucionalmente protegido, de livre iniciativa económica (cfr. artigos 61.º, n.º 1 e 80.º, alínea c) da Constituição da República Portuguesa), inconstitucionalidades que, para todos os efeitos, se arguem.
6.ª Se tal amplitude da condenação pudesse ser acolhida, isso significaria também que se estaria perante uma violação gritante do princípio do contraditório, consagrado expressamente no artigo 16.º, alínea c) da LAV, que é apanágio de qualquer Estado de direito.
7.ª Com efeito, não tendo sido identificados quaisquer outros pedidos de AIM para um medicamento genérico contendo a combinação de abacavir, lamivudina e zidovudina mas não sendo certo que os mesmos não possam ter sido, ou não venham a ser, apresentados, o tribunal arbitral já antecipou, relativamente a esses pedidos "futuros", uma condenação - uma verdadeira condenação "em branco" sem que sobre os factos subjacentes à mesma se tenham pronunciado as demandadas, ora Recorrentes.
8.ª Ao decidir como decidiu, a decisão arbitral viola, para além do artigo 3.º da Lei n.º 62/2011, os artigos 2.º, n.º 3 e 11.º, n.º 3 da LAV e directamente o direito de defesa consagrado no artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa, assim como o princípio do contraditório expressamente previsto no artigo 16.º, alínea c) dessa mesma LAV.
9.ª A não se entender tal como acima exposto, o que apenas por cautela de patrocínio se admite, diga-se que, em todo o caso, tal decisão arbitral é anulável, uma vez que o Tribunal Arbitral veio conhecer de questões de que não deveria conhecer, proferindo uma decisão anulável, nos termos do disposto no artigo 27.º, n.º 1 alínea c) e e) da LAV.
10.ª - Sem conceder, a decisão arbitral sempre será anulável no que concerne à extensão a quaisquer medicamentos contendo a combinação de abacavir, lamivudina e zidovudina por falta de fundamentação porquanto se acaso o Tribunal Arbitral entende que a Lei n.º 62/2011 permite a ampliação do litígio a futuros pedidos de AIM, então teria que especificamente fundamentar tal abrangência, fundamentação esta que é totalmente inexistente, o que configura anulabilidade da decisão, nos termos do disposto no artigo 27.º, n.º 1 alínea d) e artigo 23.º, n.º 3 da LAV.
11.ª Vem o presente recurso interposto, em segundo lugar, da condenação na proibição de importar, fabricar, oferecer, armazenar, introduzir no comércio ou utilizar em Portugal genéricos de abacavir, zidovudina e lamivudina até 14 de Maio de 2018, por contradição com a matéria de facto dada como assente e com a fundamentação da decisão pelo Tribunal Arbitral.
12.ª Resulta da matéria assente que:
O abacavir é um produto novo e o processo descrito nas reivindicações da PT ... é um processo para obtenção de um produto novo — alínea Z) da factualidade assente;
A PT ... foi pedida a 21.12.1990 e concedida a 30.03.1998 — alínea N) da factualidade assente;
O CCP 55 estende a protecção conferida pela PT ..., relativamente ao Abacavir "opcionalmente na forma de um sal ou de um derivado farmacêuticamente aceitável, incluindo o sulfato de abacavir" — alínea BB) da factualidade assente;
A PE 271 protege o sal hemissulfato de abacavir, ou um seu solvato, formulações farmacêuticas contendo esse composto e a sua utilização em medicina, reivindicando também um processo para a sua produção (reivindicação 7) — alíneas GG) e II) da matéria assente;
A PE 271 foi pedida a 14.05.1998 e concedida a 09.01.2004 — alínea KK) da factualidade assente;
De acordo com a certidão emitida pelo lnfarmed em 22.10.2012, o genérico das Demandadas contém como substância activa o abacavir (forma livre) e não o sulfato de abacavir também designado por hemissulfato de abacavir - alínea XXX) da factualidade assente.
13.ª No que concerne à fundamentação da decisão lê-se nas passagens de texto a págs. 52 que o Tribunal Arbitral formou a convicção de que o medicamento genérico de abacavir, lamivudina e zidovudina que está na base do pedido de AIM com base na qual a Demandante inicia a presente arbitragem, inclui o abacavir na sua forma livre, protegido nos termos da PT ..., actualmente pelo CCP 55.
14.ª E, no que respeita à PE 271, o Tribunal Arbitral conclui, na pág. 45 da sua fundamentação que a testemunha Professor ... referiu que "usar o sal hemisulfato de abacavir ou a forma livre era a mesma coisa, porquanto, tanto um como outro, depois de administrados produzem o mesmo efeito. Segundo a mesma testemunha embora o sal hemissulfato de abacavir ou a forma livre sejam distintos do ponto de vista químico, são porém idênticos do ponto de vista farmacêutico, podendo considerar-se que a única diferença está no facto de o sal de hemissulfato de abacavir ser mais fácil de manusear do ponto de vista químico de que o abacavir na forma livre" [negrito dos apelantes].
15.ª Dispõe o artigo 51.º do Código da Propriedade Industrial ("CPI") que podem ser objecto de patente as invenções novas, implicando actividade inventiva, se forem susceptíveis de aplicação industrial (…)", pelo que se considerássemos para efeitos de aferição de direitos de propriedade industrial que o abacavir resultante do processo protegido pela PT ... e o hemissulfato de abacavir protegido pela PE 271 são idênticos, então a PE 271 não revelava qualquer invenção nova e, consequentemente seria nula!
16.ª Tendo em conta os direitos de propriedade industrial invocados, a factualidade assente e a fundamentação do Tribunal Arbitral nunca a decisão proferida poderia ter condenado as Demandadas, ora Recorrentes, na proibição de comercialização até 14.05.2018, porquanto resulta da matéria assente e da fundamentação da decisão que a eventual comercialização do medicamento genérico abacavir+lamivudina+zidovudina objecto da AIM requerida ao infarmed não viola a PE 271.
17.ª A decisão no que concerne à extensão do período do proibição de comercialização até à caducidade da PE 271 enferma assim de nulidade, por efeito do artigo 668.º, n.º 1, alínea c) do CPC, nulidade esta que, desde já, se argui para os devidos efeitos legais e que constitui fundamento do presente recurso, nos termos do n.º 4 do artigo 668.º.
18.ª Em terceiro lugar, o presente recurso vem interposto da decisão do Tribunal Arbitral que fixou os encargos da arbitragem.
19.ª Os encargos da presente arbitragem foram inicialmente fixados em € 75.000,00 de forma unilateral pelos Exmos. Senhores Árbitros, conforme consta da Acta de Instalação datada de 15 de Maio de 2012, aliás desconsiderando a proposta conjunta das partes para um valor entre € 40.000,00 e € 50.000,00.
20.ª As Demandadas, ora Recorrentes, contestaram em 22.10.2012 e, no que concerne especificamente aos direitos de propriedade industrial invocados, vieram defender-se utilizando, em suma, argumentos de não infracção quanto ao CCP 55 e excepcionando a validade e vigência da PE 637.
21.ª Em 22.01.2013, o Tribunal Arbitral proferiu acórdão saneador julgando-se, desde logo, incompetente para apreciar a excepção de validade e vigência arguida quanto à PE 637 e elaborando guião de prova, cujo questionário se reconduziu a questões referentes à PT 321 e ao CCP 55 (vide, acórdão saneador e também pág. 7 do acórdão final). As ora demandadas interpuseram recurso daquela decisão do Tribunal Arbitral, na parte em que se considerou incompetente para conhecer e decidir a referida excepção relativa à vigência e validade da PE ..., recurso este cuja admissão foi rejeitada peio Tribunal Arbitral.
22.ª Na sequência da decisão proferida em sede de acórdão saneador e do conjunto subsequente de despachos do Tribunal Arbitral, em 14.03.2013 vieram as Demandadas informar o Tribunal Arbitral que a não apreciação e julgamento da excepção de validade e vigência da PE 637 - assim como a não suspensão da instância — bem como o guião de prova a produzir (vide por maior facilidade, pág. 7 do acórdão final), determinava que o processo arbitral se centrasse apenas na apreciação dos direitos das Demandantes relativos à PT 321 e ao CCP 55 e da posição das Demandadas face aos mesmos.
23.ª Nesta medida e no que aos encargos concerne, constatando-se que não iriam ser debatidas questões complexas, nomeadamente sobre não infração ou validade e vigência de direitos de propriedade industrial, vieram as Demandadas, ora Recorrentes, pedir a revisão do montante de encargos fixado no ponto 7 da Acta de instalação.
24.ª Em 05.04.2013 veio o Tribunal Arbitral responder, fixando o montante dos encargos em € 60,000,0, ou seja num valor ainda assim superior em € 10.000,00 ao valor máximo proposto inicialmente pelas partes.
25.ª Para que o acesso ao direito garantido no artigo 20.º da CRP seja plenamente assegurado, é necessário que o processo seja equitativo e que os custos a pagar por tal acesso sejam, para além de proporcionais e adequados aos serviços prestados, também razoáveis face ao cidadão médio; por isso o legislador previu um regime de custas processuais nos processos que correm seus termos nos tribunais judiciais e a maioria dos centros de arbitragens institucionalizadas terem criado o seu próprio regulamento com critérios de fixação dos respetivos encargos processuais, baseando em ambos os casos tais critérios nos princípios da proporcionaiidade, de igualdade entre as partes e adequação.
26.ª Tais princípios de igualdade, proporcionalidade e adequação, ganham ainda maior relevância quando estamos perante uma arbitragem necessária, como é o caso dos presentes autos, em que uma das partes – no caso as ora Recorrentes - se vê obrigada a intervir num processo, sem ter praticado qualquer facto ilícito. Os encargos da presente arbitragem deveriam, por isso, e atenta também a simplificação processual decorrente da falta de comparência das Recorrentes em audiência de julgamento, ser reduzidos para um valor mais razoável, adequado e proporcional ao desenrolar concreto do processo ao serviço efetivamente prestado pelos Senhores Árbitros, o que, com o devido respeito, não foi, manifestamente, o caso.
27.ª Em bom rigor, na presente arbitragem, as tarefas do Tribunal Arbitral, foram substancialmente simplificadas a partir do momento em que as Demandadas indicaram não pretender participar na audiência de produção de prova referente ao guião apresentado. É certo que houve audiência de julgamento e os Senhores Árbitros pronunciaram-se ainda quanto aos pedidos de condenação em transmissão de AIM e sanção pecuniária compulsória, mas tal apreciação e fundamentação não implicou no entender da ora Recorrente elevada complexidade técnica e, ademais, tais questões foram já tratadas em outras arbitragens em que os Senhores Árbitros também participam.
28.ª Assim, por dever considerar-se manifestamente excessivo face à actividade desenvolvida e complexidade inerente à mesma pelo Tribunal Arbitral na presente arbitragem, deve o montante de € 60.000,00, fixado pelo Tribunal Arbitral a título de encargos com a mesma, ser reduzido para montante que não seja superior a € 30.000,00, atenta - e apenas por força da especial qualificação dos Senhores Árbitros, se a mesma se dever considerar uma "circunstância relevante".
29.ª Em último lugar, o presente recurso vem interposto da decisão de condenação da Demandada em encargos e da sua repartição, na proporção de 3/4 pelas Demandadas e de 1/4 pelas Demandantes, sem que para tal tenha o Tribunal Arbitral apresentado qualquer fundamento.
30.ª Estabelece o artigo 23.º, n.º 4 da LAV que "da decisão constará a fixação e repartição pelas partes dos encargos resultantes do processo", determinando o n.º 3 do mesmo artigo que a decisão deverá ser fundamentada, sendo a decisão assim, quanto à repartição de encargos, anulável, por força de falta de fundamentação, de acordo com as disposições conjugadas dos artigos 23.º n.º 3 e 27.º n.º 1 alínea d) da LAV.
31.ª Em qualquer caso, a decisão enferma de nulidade por efeito dos artigos 668º, nº 1, alínea c) e 158º do CPC, nulidade esta que, desde já, se argui para os devidos efeitos legais e que constitui fundamento do presente recurso, nos termos do n.º 4 do artigo 668º.
32.ª Mas ainda que tudo o anteriormente referido não seja considerado procedente, o que apenas se admite por mera cautela e subsidiariamente, tal como resulta da decisão condenatória, não existe nem ficou demonstrada qualquer violação ou acto preparatório de violação dos direitos de propriedade industrial invocados pela Demandante, tal como previstos, designadamente, no artigo 101.º do Código da Propriedade Industrial ("CPI").
33.ª Nos termos da regra geral estabelecida no artigo 446.º, n.º 1 do CPC, conjugada com o regime constante da Lei n.º 62/2011, a ora Recorrente não deu causa à presente arbitragem, nem foi parte vencida na mesma na proporção de 3/4, como resulta amplamente de todo o supra exposto.
34.ª Assim, também neste ponto a decisão arbitral, pela qual se condenou em encargos a Recorrente, viola o disposto no artigo 446º do CPC, devendo, em consequência, ser revogada por uma outra que conclua pela condenação em custas da Demandante, ora Recorrida, pelo menos na proporção de 2/3.
35.ª Mas se tudo o que acima se expôs for diferentemente entendido, o que apenas se admite subsidiariamente e por mera cautela, tal significa que o artigo 3.º da Lei n.º 62/2011 estará a ser interpretado no sentido de permitir o estabelecimento obrigatório de encargos adicionais – os inerentes às acções arbitrais - para as entidades requerentes de AlMs de medicamentos genéricos, apenas pelo mero facto de as terem requerido o que acarreta um tratamento desigual das entidades requerentes de AlMs face aos restantes países da União Europeia.
36.ª Assim, tal interpretação dada ao disposto na Lei n.º 62/2011, no sentido de deverem ser as empresas de genéricos as entidades a suportar os custos das arbitragens necessárias ali previstas pelo mero facto de terem requerido uma AIM para um medicamento genérico em Portugal, viola não só a Directiva 2001/83/CE, como o Regulamento n.º 726/2004 e os artigos 4.º e 34.º do Tratado de Funcionamento da União Europeia e, por essa via, então o regime da arbitragem necessária previsto na referida Lei n.º 62/2011, concretamente o seu artigo 3.º, n.º 1, é inconstitucional, por violação do artigo 8.º da Constituição da República Portuguesa, que consagra o primado do direito comunitário no seu número 4, o que desde já se argui para todos os devidos efeitos.
As apelantes terminaram pedindo que fosse dado provimento ao recurso.
A demandante contra-alegou, tendo apresentado motivação em que (sem formular conclusões) pugnou pela improcedência do recurso e consequente confirmação in totum da decisão recorrida.
Foram ouvidos os senhores juízes árbitros e o senhor secretário da arbitragem sobre a questão dos encargos da arbitragem, tendo os senhores juízes árbitros pugnado pela manutenção do valor fixado.
Foram colhidos os vistos legais.
FUNDAMENTAÇÃO
As questões a apreciar neste recurso, tal como emergem das respetivas conclusões, são as seguintes: exercício excessivo dos seus poderes por parte do tribunal arbitral; anulabilidade da decisão recorrida; nulidade do acórdão arbitral, por contradição entre os fundamentos e a decisão; montante dos encargos da arbitragem; ilegalidade da decisão de condenação nos encargos e repartição dos encargos da arbitragem.
Na apreciação do recurso levar-se-á em conta a seguinte matéria de facto, fixada pelo tribunal recorrido e que não foi impugnada:
A) A Demandante obteve, em Portugal, AIM para os medicamentos contendo Abacavir + Lamivudina + Zidovudina como substância ativa, na dosagem de 300mg + 150mg + 300mg, os quais são comercializados no nosso País com a marca "T..." (documento n.º 1, junto pela Demandante com petição inicial e informação constante do website do INFARMED).
B) "T..." é a marca usada pela Demandante para identificar uma formulação farmacêutica combinada de dose fixa de três medicamentos anti-retrovirais - Abacavir (ou "1592U89"), Lamivudina (também designada "3TC") e Zidovudina (ou "AZT").
C) O "T..." é um medicamento usado para o tratamento farmacêutico da infeção pelo HIV.
D) A Zidovudina (ou "AZT") é o nome genérico utilizado em farmácia (DCI – Designação Comum Internacional) para o composto com o nome químico 3´-azido-3´-desoxitimidina e tem a seguinte estrutura molecular [remete-se para a representação gráfica constante no acórdão recorrido].
E) A Zidovudina é um agente quimioterapêutico bem estabelecido para o tratamento e profilaxia de infeções por HIV, incluindo patologias clínicas relacionadas como a SIDA, complexo relacionado com a SIDA (ARC), complexo de demência da SIDA (ADC) e também para o tratamento de doentes que têm uma infeção assintomática por HIV ou que são positivos a anticorpos anti-HIV.
F) O Abacavir (ou "1592U89") é um inibidor da transcriptase inversa análogo de nucleosido.
G) O Abacavir tem o nome químico (1S,4R)-cis-4-[2-amino-6-(ciclopropetição iniciallamino)-9H-purin-9-il]-2-ciclopenteno-1-metanol e tem a seguinte estrutura molecular [remete-se para a representação gráfica constante no acórdão recorrido].
H) O Abacavir é um agente quimioterapêutico potente anti-HIV de baixa toxicidade e excelente penetração no cérebro, que é importante para o tratamento de SIDA e doenças do sistema nervoso central associadas à SIDA como ADC.
I) A Lamivudina (ou "3TC") é outro retovírico da classe dos inibidores de transcriptase inversa análogos de nucleosidos (NRTI).
J) Lamivudina é o nome genérico utilizado em farmácia (DCI – designação comum internacional) para o composto com o nome químico (2R,cis)-4-amino-(2-hidroximetil-1,3-oxatiolan-5-il)-(1H)-pirimidin-2-ona e a seguinte estrutura molecular [remete-se para a representação gráfica constante no acórdão recorrido].
K) O desenvolvimento dos medicamentos acima referidos fez surgir um novo medicamento poderoso anti-HIV, combinando as substâncias ativas Abacavir, Lamivudina e Zidovudina, ativo como anti-viral, que se demonstrou proporcionar uma supressão viral mais completa durante um período mais longo, limitar o aparecimento de mutantes de HIV resistentes a fármacos e permitir uma melhor gestão de toxicidades relacionadas com os fármacos.
L) A Demandante é titular de três patentes e um certificado suplementar de proteção relativo ao T...: Patente Portuguesa n.º ... ("PT ...") e respetivo Certificado Complementar de Proteção n.º 55 ("CCP 55"), Patente Europeia n.º ... ("EP ...") e Patente Europeia n.º ... ("EP ...") (documentos n.ºs 2 a 8, juntos pela Demandante com a petição inicial, certidões juntas com o requerimento apresentado em 27 de março de 2013 e documentos juntos em audiência).
M) A PT ... foi pedida pela “B” Limited, tendo mais tarde a sua titularidade sido transferida para a “A” UK LIMITED (documento n.ºs 2 e 3, juntos pela Demandante com a petição inicial e certidão junta com o requerimento apresentado em 27 de março de 2013).
N) A PT ... foi pedida a 21 de dezembro de 1990 e concedida a 30 de março de 1998 (documentos n.ºs 2 e 3, juntos pela Demandante com a petição inicial e certidão junta com o requerimento apresentado em 27 de março de 2013).
O) A PT ... vigorará até 30 de março de 2013 (documentos n.ºs 2 e 3, juntos pela Demandante com a petição inicial, certidão junta com o requerimento apresentado em 27 de março de 2013 e documentos juntos em audiência).
P) A PT ... reivindica a prioridade do pedido de patente US ..., de 22.12.1989 (documento n.º 2, junto pela Demandante com a petição inicial e certidão junta com o requerimento apresentado em 27 de março de 2013).
Q) As reivindicações da PT ... dizem respeito e protegem um processo para a preparação de nucleosidos terapêuticos de fórmula geral (I) com substituintes definidos, incluindo a substância farmaceuticamente ativa Abacavir, nos termos do conteúdo das suas reivindicações (documento n.º 2, junto pela Demandante com a petição inicial e certidão junta com o requerimento apresentado em 27 de março de 2013).
R) A PT ... tem nove (9) reivindicações que apresentam a seguinte redação:
1.ª Processo para a preparação de compostos enantioméricos de fórmula geral (I) [remete-se para a representação gráfica e correspondente legendagem constantes no acórdão recorrido], estando qualquer desses compostos e seus derivados sob a forma de um enantiómero essencialmente isento do correspondente enantiómero, caracterizado por
A) se tratar um composto enantiomérico de fórmula geral (II): [remete-se para a representação gráfica e correspondente legendagem constantes no acórdão recorrido], ou
B) fazer-se reagir um composto enantiomérico de fórmula geral (III): [remete-se para a representação gráfica e correspondente legendagem constantes no acórdão recorrido], ou
C) fazer-se reagir um composto enantiomérico de fórmula geral (IV): [remete-se para a representação gráfica e correspondente legendagem constantes no acórdão recorrido].
2.ª
Processo de. acordo com a. reivindicação 1, caracterizado pelo facto de o composto enantiomérico de fórmula geral (I) ser o composto (1S,4R)-cis-4-[2-amino-6-(ciclopropil-amino)-9H-purin-il]-2-ciclopenteno-1-metanol substancialmente do correspondente enantiómero (1R,4S).
3.ª
Processo de acordo com a reivindicação 1, caracterizado pelo facto de o composto enantiomérico de fórmula geral (I) ser o composto (1S,4R)-cis-4-[2-amino-6-(N-ciclopropil-N-metil-amino)-9H-purin-9-il]-2-ciclopenteno-1-metanol substancialmente isento do correspondente enantiómero (1R,4S).
4.ª
Processo de acordo com a. reivindicação 1, caracterizado por se obterem os sais, esteres e sais de esteres farmaceuticamente aceitáveis dos compostos enantioméricos (1S,4R) de fórmula geral (I).
5.ª
Processo de acordo com a reivindicação 1, caracterizado por se obterem os derivados fosfatos dos compostos enantioméricos (1R,4S) de fórmula geral (I).
6.ª
Processo para a preparação dos compostos enantioméricos de fórmula geral (IV), de acordo com a reivindicação 1, caracterizado pelo facto de se fazer reagir um composto enantiomérico de fórmula geral (IV) [remete-se para a representação gráfica e correspondente legendagem constantes no acórdão recorrido].
7.ª
Processo para a preparação dos compostos enantioméricos de fórmula geral (VI), de acordo com a reivindicação 6, caracterizado pelo facto de se fazer reagir um composto enantiomérico de fórmula geral (V) [remete-se para a representação gráfica e correspondente legendagem constantes no acórdão recorrido].
8.ª
Processo para a preparação dos compostos enantioméricos de fórmula geral V, de acordo com a reivindicação 7, caracterizado pelo facto de se fazer reagir um composto enantiomérico de fórmula geral (VII) [remete-se para a representação gráfica e correspondente legendagem constantes no acórdão recorrido].
9.ª
Processo para a preparação de compostos de fórmula geral (VII), de acordo com a reivindicação 8, caracterizado pelo facto de se reduzir um composto de fórmula geral (IX) [remete-se para a representação gráfica e correspondente legendagem constantes no acórdão recorrido] (documento n.º 2, junto pela Demandante com a petição iniciai e certidão junta com o requerimento apresentado em 27 de março de 2013).
S) Na redação da reivindicação 2 da PT ... houve um lapso de escrita, porquanto foi omitida a palavra "isento" que devia encontrar-se entre as palavras "substancialmente" e "do correspondente", sendo a redação correta a seguinte:
"Processo de acordo com a reivindicação 1, caracterizado peio facto de o composto enantiomérico de fórmula geral (1) ser o composto (IS,4R)-cis-4-[2-amino-6(ciclopropilamino)-9H-purin-il]-2-ciclopenteno-1-metanol substancialmente isento do correspondente enantiómero (IR, 4S) (documento n.º 2, junto pela Demandante com a petição inicial e certidão junta com o requerimento apresentado em 27 de março de 2013).
T) O Abacavir corresponde à fórmula geral (I) quando R representa ciclopropetição iniciallamina e A representa o grupo 2-ciclopenteno-1-metanol-4-ilo na configuração (1S,4R), descrita na reivindicação 1 e está abrangido pela reivindicação 1 e todas as reivindicações dela dependentes (reivindicações 2, 3 e 4) (documento n.º 2, junto pela Demandante com a petição inicial e certidão junta com o requerimento apresentado em 27 de março de 2013).
U) O Processo de obtenção do Abacavir está especialmente reivindicado na reivindicação 3 da PT ..., onde é mencionado pelo seu nome químico (1S,4R)-cis-4-[2-amino-6-(ciclopropetição iniciallamino)-9H-purin-9-il]-2-ciclopenteno-1-metanol (documento n.º 2, junto pela Demandante com a petição inicial e certidão junta com o requerimento apresentado em 27 de março de 2013).
V) O Abacavir é diretamente obtido pelo processo reivindicado na PT ....
X) À data da apresentação do pedido da PT ..., em 21 de dezembro de 1990, e da prioridade nela reivindicada de 22 de dezembro de 1989, a substância ativa Abacavir nunca tinha sido explorada ou tornada acessível ao público por meio de descrição, utilização ou qualquer outro meio, de modo a que pudesse ser conhecido ou explorado por um especialista na matéria, não estando compreendida no estado da técnica.
Z) O Abacavir é um produto novo e o processo descrito nas reivindicações da PT ... é um processo para a obtenção de um produto novo.
AA) A Demandante é ainda a titular do certificado complementar de proteção n.º 55, requerido em 24 de setembro de 1999 e concedido pelo INPI em 6 de Dezembro de 1999 (documentos n.ºs 4 e 5, juntos pela Demandante com petição inicial e certidão junta com o requerimento apresentado em 27 de março de 2013).
BB) O CCP 55 estende a proteção conferida pela PT ..., relativamente ao Abacavir, "opcionalmente na forma de um sal ou de um derivado farmaceuticamente aceitável incluindo o Sulfato de Abacavir" (documento 4, junto pela Demandante com a petição inicial e certidão junta com o requerimento apresentado em 27 de março de 2013).
CC) O CCP 55 foi concedido tendo por base a PT ... e por referência à primeira autorização de introdução no mercado na União Europa do medicamento contendo como substância ativa Abacavir, que data de 28 de junho de 1999 (documento n.º 4, junto pela Demandante com a petição iniciai e certidão junta com o requerimento apresentado em 27 de março de 2013).
DD) O CCP 55 vigorará até 28 de junho de 2014 (documento n.º 4, junto pela Demandante com a petição inicial e certidão junta com o requerimento apresentado em 27 de março de 2013).
EE) A Demandante é também titular da Patente europeia n.º ... ("EP ...") com o título "Hemissulfato Carbocíclico Nucleosidico e a Sua Utilização no Tratamento de Infecções Virais" (documento n.º 7 junto pela Demandante com a petição inicial e documentos juntos em audiência).
FF) A patente "EP ..." tem dezanove (19) reivindicações que apresentam a seguinte redação:
1. Sal hemissulfato de (1S,4R)-cis-4-[2-amino-6-(ciclopropilamino)-9H-purin9-il]-2-ciclopenteno-1-metanol ou um seu solvato.
2. Composto como reivindicado na Reivindicação 1 para utilização em medicina.
3. Utilização de um composto como reivindicado na Reivindicação 1 para o fabrico de um medicamento para o tratamento de uma infecção viral.
4. Utilização de um composto como reivindicado na Reivindicação 3, em que a referida infecção viral é uma infecção por VIH ou VHB.
5. Processo para a preparação do composto reivindicado na Reivindicação 1, processo esse que compreende:
a mistura de ácido sulfúrico e de (1S,4R)-cis-4-[2-amino-6-(ciclopropilamino)-9H-purin-9-il]-2-ciclopenteno-1-metanol numa razão estequiométrica de aproximadamente 1:2.
6. Processo para a preparação do composto reivindicado na Reivindicação 1, processo esse que compreende:
a mistura de sulfato de (1S,4R)-cis-4-[2-amino-6-(ciclopropilamino)-9H-purin-9-il]-2-ciclopenteno-1-metanol (sal 1:1) e de (1S,4R)-cis-4-[2-amino-6-(ciclopropilamino)-9H-purin-9-il]-2-ciclopenteno-1-metanol numa razão molar praticamente de 1:1 em solução.
7. Processo para a preparação do composto reivindicado na Reivindicação 1, processo esse que compreende uma mistura de ácido sulfúrico e de um sal de (1S,4R)-cis-4-[2-amino-6-(ciclopropilamino)-9H-purin-9-il]-2-ciclopenteno-1-metanol diferente do sal hemissulfato.
8. Processo como reivindicado na Reivindicação 7, em que o referido ácido sulfúrico e o referido sal estão presentes aproximadamente na razão estequiométrica necessária para formar o composto.
9. Processo como reivindicado em qualquer uma das reivindicações 7 ou 8, em que o sal de (1S,4R)-cis-4-[2-amino-6-(ciclopropilamino)-9H-purina-9-il]-2-ciclopenteno-1-metanol é um sal com um ácido dicarbolíxico.
10. Processo como reivindicado na Reivindicação 9, em que o referido sal com um ácido dicarbolíxico é seleccionado a partir do grupo que consiste nos sais succinato, glutarato, hemissuberato, adipato, fumarato, hemissebacato e pimelato e qualquer mistura destes.
11. Processo como reivindicado em qualquer uma das reivindicações 7 ou 8 em que o sal de (1S,4R)-cis-4-[2-amino-6-(ciclopropilamino)-9H-purina-9-il]-2-ciclopenteno-1-metanol é seleccionado a partir do grupo que consiste nos sais benzoato e salicilato e qualquer mistura destes.
12. Processo como reivindicado em qualquer uma das reivindicações 7 a 11, em que a pureza óptica do hemissulfato é maior do que a do sal de partida.
13. Formulação farmacêutica compreendendo um composto como reivindicado na Reivindicação 1 e um transportador farmaceuticamente aceitável para este.
14. Formulação farmacêutica como reivindicado na Reivindicação 13 na forma de um comprimido, de uma cápsula, ou de uma formulação líquida.
15. Formulação farmacêutica como reivindicado na Reivindicação 13 adaptada para administração parentérica.
16. Formulação farmacêutica como reivindicado em qualquer uma das Reivindicações 13 a 15 compreendendo adicionalmente um ou mais agentes terapêuticos seleccionados a partir do grupo que consiste em inibidores da transcriptase reversa nucleosídicos, inibidores da transcriptase reversa não-nucleosídicos, inibidores de protease, imuno moduladores e interferões.
17. Sal dicarboxilato de (1S,4R)-cis-4-[2-amino-6-(ciclopropilamino)-9H-purin-9-il]-2-ciclopenteno-1-metanol, em que o referido dicarboxilato é seleccionado a partir do grupo que consiste em glutarato, hemissuberato, adipato, fumarato, hemissebacato e pimelato.
18. Sal glutarato de (1S,4R)-cis-4-[2-amino-6-(ciclopropilamino)-9H-purin-9-il]-2-ciclopenteno-1-metanol.
19. Sal monossulfato, benzoato ou salicilato de (1S,4R)-cis-4-[2-amino-6-(ciclopropilamino)-9H-purin-9-il]-2-ciclopenteno-1-metanol (documento n.º 7 junto pela Demandante com a petição inicial e documentos juntos em audiência).
GG) A EP ... protege o sal hemissulfato de Abacavir [(IS,4R)-cis-4-[2-amino-6-(ciclopropetição iniciallamino)-9H-purin-9-il]-2-ciclopenteno-1-metanol] ou um seu solvato, formulações farmacêuticas contendo esse composto e a sua utilização em medicina, especificamente no tratamento de infeção pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV) e pelo vírus da hepatite B (HBV) (documento n.º 7 junto pela Demandante com a petição inicial e documentos juntos em audiência).
HH) O sal hemissulfato de Abacavir encontra-se protegido, per se, na EP 983 271 pela reivindicação 1, bem como as suas formulações farmacêuticas pelas reivindicações 13, 14, incluindo a associação com inibidores da transcriptase inversa nucleosídicos (reivindicação 16) (documento n.º 7 junto pela Demandante com a petição inicial e documentos juntos em audiência).
II) A EP 983 271 protege ainda a utilização do sal hemissulfato de Abacavir para o fabrico de um medicamento (reivindicação 3) e a sua utilização para o tratamento de uma infeção viral, designadamente, por HIV, através das reivindicações 3 e 4 (documento n.º 7 junto pela Demandante com a petição inicial e documentos juntos em audiência).
JJ) A EP ... reivindica também um processo para a preparação do sal hemissulfato de abacavir (reivindicação 7) (documento n.º 7 junto pela Demandante com a petição inicial e documentos juntos em audiência).
KK) A EP ... foi pedida em 14 de maio de 1998 e concedida em 9 de janeiro de 2004, encontrando-se em vigor até 14 de maio de 2018 (documento n.º 7 junto pela Demandante com a petição inicial e documentos juntos em audiência).
LL) A tradução da EP ..., tal como concedida, foi apresentada junto do INPI (documento n.º 7 junto pela Demandante com a petição inicial e documentos juntos em audiência).
MM) A Demandante é igualmente titular da EP ..., a qual protege a invenção de várias combinações de inibidores de transcriptase inversa nucleosídicos a saber: a zidovudina ("AZT"), a lamivudina ("3TC") e o abacavir ("1592U89"), formulações galénicas contendo esses produtos como substâncias ativas, o processo para a preparação das suas formulações galénicas e a utilização terapêutica das referidas substâncias ativas e formulações como medicamentos para SIDA (documento n.º 8 junto pela Demandante com a petição inicial e documentos juntos em audiência).
NN) A EP ..., que designa Portugal como um dos Estados de proteção, foi pedida em 28 de março de 1996, invocando como prioridade as patentes britânicas GB9506489 e GB9506490, ambas de 30.03.1995, tendo sido concedida em 6 de junho de 2002 e estando em vigor até 28 de março de 2016 (documento n.º 8 junto pela Demandante com a petição inicial e documentos juntos em audiência).
00) A patente EP ... tem vinte e duas (22) reivindicações que apresentam a seguinte redação:
1. Uma combinação compreendendo (1S,4R)-cis-4-[2-amino-6-(ciclopropilamino)-9H-purin-9-il]-2-ciclopenteno-1-metanol ou um derivado daquele fisiologicamente funcional e (2R,cis)-4-amino-(2-hidroximetil-1,3-oxatiolan-5-il)-(1H)-pirimidin-2-ona ou um derivado daquele fisiologicamente funcional.
2. Uma combinação como reivindicado na reivindicação 1 em que o derivado fisiologicamente funcional de (1S,4R)-cis-4-[2-amino-6-(ciclopropilamino)-9H-purin-9-il]-2-ciclopenteno-1-metanol ou (2R,cis)-4-amino-(2-hidroximetil-1,3-oxatiolan-5-il)-(1H)-pirimidin-2-ona é um sal, éter, estér, sal de tal estér ou solvato daquele fisiologicamente aceitável.
3. Uma combinação de acordo com a reivindicação 1 compreendendo (1S,4R)-cis-4-[2-amino-6-(ciclopropilamino)-9H-purin-9-il]-2-ciclopenteno-1-metanol ou um derivado daquele fisiologicamente funcional daquele, zidovudina ou um derivado fisiologicamente funcional daquele, e (2R,cis)-4-amino-(2-hidroximetil-1,3-oxatiolan-5-il)-(1H)-pirimidin-2-ona ou um derivado daquele fisiologicamente funcional daquele.
4. Uma combinação de acordo com a reivindicação 3 em que o derivado fisiologicamente funcional de (1S,4R)-cis-4-[2-amino-6-(ciclopropilamino)-9H-purin-9-il]-2-ciclopenteno-1-metanol, zidovudina ou (2R,cis)-4-amino-(2-hidroximetil-1,3-oxatiolan-5-il)-(1H)-pirimidin-2-ona é um sal, éter, estér, sal de tal estér ou solvato daquele fisiologicamente aceitável.
5. Uma combinação de acordo com a reivindicação 3 ou 4 em que a proporção de (1S,4R)-cis-4-[2-amino-6-(ciclopropilamino)-9H-purin-9-il]-2-ciclopenteno-1-metanol, zidovudina ou (2R,cis)-4-amino-(2-hidroximetil-1,3-oxatiolan-5-il)-(1H)-pirimidin-2-ona está na razão de 1 até 20: 1 até 20:1 até 10 por peso.
6. Uma combinação de acordo com qualquer reivindicação desde 1 até 5 para uso em terapia médica.
7. Uma formulação farmacêutica compreendendo uma combinação de acordo com as reivindicações 1 até 5 em associação com um ou mais veículos farmaceuticamente aceitáveis para esse fim.
8. Uma formulação de acordo com a reivindicação 7 em forma de dosagem unitária.
9. Uso de (1S,4R)-cis-4-[2-amino-6-(ciclopropilamino)-9H-purin-9-il]-2-ciclopenteno-1-metanol e (2R,cis)-4-amino-(2-hidroximetil-1,3-oxatiolan-5-il)-(1H)-pirimidin-2-ona na manufactura de um medicamento para o tratamento e/ou profilaxia de uma infecção por HIV.
10. Uso de (1S,4R)-cis-4-[2-amino-6-(ciclopropilamino)-9H-purin-9-il]-2-ciclopenteno-1-metanol, zidovudina e 2R,cis)-4-amino-(2-hidroximetil-1,3-oxatiolan-5-il)-(1H)-pirimidin-2-ona na manufactura de um medicamento para o tratamento e/ou profilaxia de uma infecção por HIV.
11. Uso como reivindicado na reivindicação 9 ou 10 para o tratamento e profilaxia de uma infecção por HIV resistente a inibidores de nucleósidos ou não nucleósidos.
12. Uso como reivindicado na reivindicação 9 ou 10 no tratamento de SIDA.
13. Uso como reivindicado na reivindicação 9 ou 10 no tratamento de estados relacionados com SIDA ou encefalopatia da SIDA.
14. Um produto compreendendo (1S,4R)-cis-4-[2-amino-6-(ciclopropilamino)-9H-purin-9-il]-2-ciclopenteno-1-metanol, e 2R,cis)-4-amino-(2-hidroximetil-1,3-oxatiolan-5-il)-(1H)-pirimidin-2-ona como uma preparação combinada para uso simultâneo, separado ou sequencial no tratamento e/ou profilaxia de uma infecção por HIV.
15. Um produto compreendendo (1S,4R)-cis-4-[2-amino-6-(ciclopropilamino)-9H-purin-9-il]-2-ciclopenteno-1-metanol, zidovudina e (2R,cis)-4-amino-(2-hidroximetil-1,3-oxatiolan-5-il)-(1H)-pirimidin-2-ona como uma preparação combinada para uso simultâneo, separado ou sequencial no tratamento e/ou profilaxia de uma infecção por HIV.
16. Um produto como reivindicado na reivindicação 15 em que os componentes estão presentes, respectivamente, na razão de 1 até 20:1 até 20:1 até 10 por peso.
17. Um produto compreendendo (1S,4R)-cis-4-[2-amino-6-(ciclopropilamino)-9H-purin-9-il]-2-ciclopenteno-1-metanol como uma preparação para uso simultâneo, separado ou sequencial junto com (2R,cis)-4-amino-(2-hidroximetil-1,3-oxatiolan-5-il)-(1H)-pirimidin-2-ona no tratamento e/ou profilaxia de uma infecção por HIV.
18. Um produto compreendendo (2R,cis)-4-amino-(2-hidroximetil-1,3-oxatiolan-5-il)-(1H)-pirimidin-2-ona como uma preparação para uso simultâneo, separado ou sequencial junto com (1S,4R)-cis-4-[2-amino-6-(ciclopropilamino)-9H-purin-9-il]-2-ciclopenteno-1-metanol no tratamento e/ou profilaxia de uma infecção por HIV.
19. Um produto compreendendo (1S,4R)-cis-4-[2-amino-6-(ciclopropilamino)-9H-purin-9-il]-2-ciclopenteno-1-metanol como uma preparação para uso simultâneo, separado ou sequencial junto com zidovudina e (2R,cis)-4-amino-(2-hidroximetil-1,3-oxatiolan-5-il)-(1H)-pirimidin-2-ona no tratamento e/ou profilaxia de uma infecção por HIV.
20. Um produto compreendendo zidovudina como uma preparação para uso simultâneo, separado ou sequencial junto com (1S,4R)-cis-4-[2-amino-6-(ciclopropilamino)-9H-purin-9-il]-2-ciclopenteno-1-metanol e (2R,cis)-4-amino-(2-hidroximetil-1,3-oxatiolan-5-il)-(1H)-pirimidin-2-ona no tratamento e/ou profilaxia de uma infecção por HIV.
21. Um produto compreendendo (2R,cis)-4-amino-(2-hidroximetil-1,3-oxatiolan-5-il)-(1H)-pirimidin-2-ona como uma preparação para uso simultâneo, separado ou sequencial junto com zidovudina e (1S,4R)-cis-4-[2-amino-6-(ciclopropilamino)-9H-purin-9-il]-2-ciclopenteno-1-metanol no tratamento e/ou profilaxia de uma infecção por HIV.
22. Um produto compreendendo zidovudina e (2R,cis)-4-amino-(2-hidroximetil-1,3-oxatiolan-5-il)-(1H)-pirimidin-2-ona como uma preparação para uso simultâneo, separado ou sequencial junto com (1S,4R)-cis-4-[2-amino-6-(ciclopropilamino)-9H-purin-9-il]-2-ciclopenteno-1-metanol no tratamento e/ou profilaxia de uma infecção por HIV.
(documento n.º 8 junto pela Demandante com a petição inicial e documentos juntos em audiência).
PP) A Reivindicação 1 da patente EP ... é direcionada para a combinação dupla Abacavir/Lamivudina ("Uma combinação compreendendo (1S,4R)-cis-4-[2-amino-6-(ciclopmpetição iniciallamino)-9H-purin-9-il]-2-ciclopenteno-1-metanol ou um derivado daquele fisiologicamente funcional e (2R,cis)-4-amino-(2-hidroximetil-1,3-oxatiolan-5-il)- (1 H)-petição inicialrimidin-2-ona ou um derivado daquele fisiologicamente funcional").
QQ) Também referentes, especificamente, a esta dupla combinação, encontramos ainda as Reivindicações 2, 9, 14, 17 e 18 da patente EP ....
RR) As reivindicações 3, 4, 5, 6, 7, 8, 10, 11, 12, 13, 15, 16, 19, 20, 21 e 22 da EP ... abrangem a invenção de combinações terapêuticas anti-HIV de Abacavir, Zidovudina e Lamivudina, composições farmacêuticas contendo as referidas combinações e a sua utilização no tratamento de infeções por HIV incluindo infeções com mutantes de HIV com resistência a inibidores nucleosídicos e/ou não nucleosídicos (documento n.º 8 junto pela Demandante com a petição inicial e documentos juntos em audiência).
SS) A combinação tripla — Abacavir / Zidovudina / Lamivudina consta especificamente das reivindicações 3, 4, 5, 10, 15, 16, 19, 20, 21 e 22 (Documento n.º 8, junto pela Demandante com a petição inicial, págs. 48 e ss.).
TT) As Reivindicações 6 a 8 e 11 a 13 da patente EP ... versam sobre alegadas formulações farmacêuticas e usos terapêuticos aplicáveis quer às combinações duplas (reivindicações 1, 2, 9, 14, 17 e 18) quer às combinações triplas (reivindicações 3, 4, 5, 10, 15, 16, 19 a 22).
UU) As reivindicações constantes da patente EP ... respeitam à utilização clínica indicada (documento n.º 8 junto pela Demandante com a petição inicial).
VV) A tradução da EP ..., tal como concedida, foi apresentada perante o INPI (documento n.º 8 junto pela Demandante com a petição inicial e documentos juntos em audiência).
XX) O "T..." está indicado para tratamento e profilaxia de infeções pelo Vírus da lmunodeficiência Humana (HIV) que causa a SIDA (Síndrome da lmunodeficiência Adquirida) (reivindicações 9 a 13 da EP ...) (documento n.º 8 junto pela Demandante com a petição inicial).
ZZ) A utilidade clínica do "T..." decorre do efeito anti-HIV sinérgico positivo devido à associação das três substâncias ativas (inibidores da transcriptase reversa análogos nucleosidos, NRTI) para o tratamento de infeções por HIV, promovendo uma supressão viral mais completa e durante um período mais longo, com menor emergência de mutantes de HIV resistentes aos fármacos e melhor gestão de toxicidades relacionadas com os fármacos quando administrados em monoterapia (página 2 da descrição de EP ..., parágrafo 8 e respetivas reivindicações) (documento 8 junto pela Demandante com a petição inicial).
AAA) Até à data da invenção protegida por patente EP..., o tratamento das infeções por HIV baseava-se, em grande medida, em monoterapetição iniciala com inibidores nucleosídos de transcriptase inversa (NRTI); contudo verificava-se o aparecimento de mutantes de HIV com resistência a vários dos anti-retrovíricos utilizados (Documento n.º 8, junto pela Demandante com a petição inicial, pág. 26).
BBB) As três substâncias ativas do "T..." são NRTI, i.e., atuam todas elas de modo semelhante bloqueando a atividade da transcriptase inversa, uma enzima produzida pelo HIV que lhe permite infetar células e produzir mais vírus.
CCC) O "T..." reduz a quantidade de HIV no sangue e mantém-no em níveis baixos; não eliminando a infeção por HIV, mas atrasando porém as lesões do sistema imunitário e o desenvolvimento da SIDA e de infeções e doenças associadas à SIDA.
DDD) O que é inesperado nesta associação das três substâncias ativas com o mesmo mecanismo é que se obtém um efeito sinérgico anti-HIV, porque o que é usual é que fármacos que atuam no mesmo sítio de ação tenham efeito antagonista ou quando muito efeito aditivo (Documento n.º 8, junto pela Demandante com a petição inicial, pág. 27).
EEE) Na data de prioridade reivindicada pela patente EP..., ou seja, 30 de março de 1995, ninguém tinha feito uma terapêutica com as três substâncias ativas mencionadas na Patente, o que significa que não havia, na data de prioridade, experiência clínica que motivasse a utilização de uma terapêutica dupla ou tripla.
FFF) Na data de prioridade da patente EP..., o abacavir e a lamivudina não estavam sequer no mercado, só tendo obtido as respetivas autorizações de introdução no mercado respetivamente em 1999 e 1996 e pertenciam a diferentes entidades.
GGG) Na data de prioridade da referida patente não era possível prever o resultado de uma associação fixa (de duas ou três substâncias ativas numa única forma farmacêutica).
HHH) Não era possível prever sinergias e, em substâncias ativas com o mesmo mecanismo de ação, a probabilidade é de efeito antagónico ou de efeito aditivo.
III) Com base nos resultados experimentais in vitro um perito da especialidade seria levado a pensar que o abacavir e a lamivudina poderiam ser reciprocamente resistentes e seria conduzido a evitar o seu uso combinado (Documentos n.ºs 7 e 8, juntos pelas Demandadas com a contestação).
JJJ) Uma das diferenças da patente EP... relativamente ao estado da técnica anterior é a associação de anti-retrovíricos da mesma classe, o que é contrário ao então preconizado, ou seja, a associação de anti-retrovíricos de diferentes classes, por exemplo NRTI e NNRTI.
LLL) Verificando-se neste caso da patente EP... uma combinação tripla de NRTI.
MMM) Devido ao facto de a associação dos três NRTI, abacavir, lamivudina e zidovudina, apresentar uma atividade sinérgica, a associação fixa (num único comprimido) destes fármacos permitiu obter uma posologia mais adequada ao doente pela redução do número de comprimidos diários necessários para atingir o efeito terapêutico pretendido (de 6 comprimidos diários com os três fármacos formulados separadamente para 2 comprimidos diários em associação fixa).
NNN) Assim, para além do facto de se obter uma redução na posologia diária para manter o efeito terapêutico pretendido, conseguiu-se ainda obter implicações positivas na adesão à terapêutica, fator de extrema importância neste tipo de doentes, bem como a redução dos potenciais efeitos adversos.
OOO) O sal hemissulfato de Abacavir ou a forma livre depois de administrados no organismo humano produzem o mesmo efeito.
PPP) O "T..." foi lançado, em Portugal, em 2000/2001.
QQQ) O volume anual de vendas deste medicamento no mercado português foi, nos últimos 4 anos, de 6.582.000,00 euros.
RRR) Tendo uma quota de mercado no nosso país de 10%.
SSS) Sendo as estimativas de venda para os próximos anos de 1 milhão de euros/ano.
TTT) Caso o medicamento genérico das Demandadas fosse lançado prematuramente no mercado, estima-se que as vendas do medicamento T...® fossem reduzidas em cerca de 80%.
UUU) O medicamento contendo Abacavir/Lamivudina/Zidovudina destina-se exclusivamente ao mercado hospitalar, não carecendo das autorizações administrativas do INFARMED quanto à aprovação de preço de venda ao público (PVP) e de comparticipação.
VVV) A lista publicada da página eletrónica oficial do INFARMED, nos termos e para os efeitos do artigo 9.º, n.º 2 da Lei n.º 62/2011, anunciava ter a primeira Demandada requerido ao INFARMED a concessão da AIM a seguir identificada e nos termos em que consta da mesma lista:
(...)

(documento n.º 9, junto pela Demandante com a petição inicial).
XXX) De acordo com a certidão emitida pelo INFARMED em 22/10/2012, os dados constantes da referida publicação não estavam corretos, porquanto o medicamento genérico das Demandadas contém como substância ativa o abacavir (forma livre) e não o sulfato de abacavir também designado por hemissulfato de abacavir (documentos n.ºs 12 e 13, junto pelas Demandadas com a contestação).
ZZZ) A dosagem correta de cada uma das substâncias ativas do medicamento genérico das Demandadas é a seguinte: Zidovudina (300mg), Abacavir (300mg) e Lamivudina (150mg) (documentos n.ºs 12 e 13, junto pelas demandadas com a contestação).
AAAA) A AIM referida supra, após concedida, poderá vir a ser transferida para a Segunda Demandada, conforme proposto pela requerente da mesma (documento n.º 10, junto pela Demandante com a petição inicial).
BBBB) A Demandada “F” NEDERLAND B.V. é uma sociedade constituída de acordo com a lei Holandesa, cujo administrador único é a “F” Pharmaceuticals Europe B.V. ("“F” Europe BV") (documento n.º 2, junto pelas Demandadas com a contestação).
CCCC) A Demandada “F” PHARMA - PRODUTOS FARMACÊUTICOS, LDA., ("“F” PT") é uma sociedade por quotas, que tem por objeto "a importação e exportação, marketing, venda, distribuição, troca e produção, directa ou indirecta, de produtos e artigos farmacêuticos (incluindo ingredientes farmacêuticos activos) e a aquisição e exploração de patentes, marcas e outros direitos de propriedade intelectual e industrial; actividade de agência e representação de todo o tipo de sociedades do sector farmacêutico dentro e fora de Portugal", sendo detida, quase na totalidade, pela empresa “F” Europe BV (documento n.º 3, junto pelas Demandadas com a contestação e correspondente a certidão permanente da Demandada, com o n.º ...-...-...).
O Direito
Primeira questão (exercício excessivo dos seus poderes por parte do tribunal arbitral)
O presente recurso reporta-se a um litígio entre uma empresa (a A./apelada) que produz um medicamento (para uso humano) de referência – o T... - e duas empresas (as RR./apelantes), que pretendem produzir e vender em Portugal um medicamento que é alegadamente genérico face àquele, tendo para o efeito requerido ao Infarmed a necessária autorização de introdução no mercado (AIM).
Com efeito, a introdução no mercado nacional de medicamentos para uso humano está sujeita a autorização por parte do Infarmed, a qual depende do preenchimento de requisitos atinentes à qualidade, segurança e eficácia terapêuticas do medicamento, tendo como objetivo essencial a proteção da saúde pública (cfr. art.º 14.º do Regime Jurídico dos Medicamentos de Uso Humano - sinteticamente, Estatuto do Medicamento, EM), aprovado pelo Dec.-Lei n.º 176/2006, de 30.8, com alterações introduzidas pelo Dec.-Lei n.º 182/2009, de 07.8, Dec.-Lei n.º 64/2010, de 09.6, Dec.-Lei n.º 106-A/2010, de 01.10, Lei n.º 25/2011, de 16.6, Lei n.º 62/2011, de 12.12, Lei n.º 11/2012, de 08.3, Dec.-Lei n.º 20/2013, de 14.02 e Dec.-Lei n.º 128/2013, de 05.9).
Nos termos do art.º 3.º, n.º 1, alínea ii) do EM, medicamento de referência é um “medicamento que foi autorizado com base em documentação completa, incluindo resultados de ensaios farmacêuticos, pré-clínicos e clínicos.” Medicamento genérico é, na definição enunciada na alínea oo) do citado n.º 1 do art.º 3.º do EM, um “medicamento com a mesma composição qualitativa e quantitativa em substâncias ativas, a mesma forma farmacêutica e cuja bioequivalência com o medicamento de referência haja sido demonstrada por estudos de biodisponibilidade apropriados”.
Os medicamentos genéricos, produzidos e comercializados sem necessidade da realização, em boa parte, dos demorados e onerosos estudos e ensaios prévios que antecederam os medicamentos de referência (cfr. Remédio Marques, “Medicamentos versus Patentes”, Coimbra Editora, 2008, páginas 25 a 27; art.º 19.º n.º 1 do EM), podem ser colocados à disposição do consumidor a preços significativamente mais baixos do que os medicamentos de referência, o que torna a sua entrada no mercado questão de interesse público, maxime pelas poupanças que proporcionam aos serviços nacionais de saúde (matéria realçada no Relatório Final do Inquérito da Comissão Europeia ao Sector Farmacêutico, datado de 08.7.2009, de que se pode ler uma síntese, em língua portuguesa, em http://ec.europa.eu/competition/sectors/pharmaceuticals/inquiry/communication_pt.pdf; a totalidade do Relatório, em língua inglesa, é consultável em http://ec.europa.eu/competition/sectors/pharmaceuticals/inquiry/staff_working_paper_part1.pdf).
A efetiva entrada no mercado dos medicamentos genéricos pressupõe que as patentes respeitantes aos medicamentos de referência tenham expirado. Entretanto, atendendo a que o processo de concessão da AIM do genérico (e bem assim a fixação do seu preço e a atribuição de eventual comparticipação do Estado no preço) pode ser moroso, as empresas produtoras de genéricos procuram iniciar esse processo antes da caducidade da ou das ditas patentes, de forma a poderem concretizar a colocação do genérico no mercado imediatamente a seguir ao levantamento do exclusivo conferido pela patente à empresa produtora do medicamento de referência.
A apresentação do pedido de autorização de introdução no mercado de medicamentos genéricos respeitantes a medicamentos de referência com patentes ainda em vigor, por vezes ainda com anos de vigência pela frente, pode desencadear a reação dos laboratórios dos medicamentos de referência, que invocam, seja diretamente junto das autoridades administrativas responsáveis pela concessão da AIM do genérico (ou, subsequentemente, pela fixação do preço de venda ao público do medicamento e pela eventual atribuição de comparticipação do Estado no preço de tais medicamentos), seja junto dos tribunais, que tal pedido consubstancia violação ou ameaça de violação dos seus direitos de propriedade industrial. Esse fenómeno ganhou dimensão relevante em Portugal, merecendo até menção especial por parte da Comissão Europeia, no supra mencionado Relatório Final do Inquérito ao Setor Farmacêutico (parágrafo 888 – página 319 – e parágrafo 917 – página 331). Essa atitude por parte das empresas dos medicamentos de referência conseguia paralisar o processo de obtenção de AIM ou da subsequente fixação do preço ou da comparticipação, seja por decisão unilateral da autoridade administrativa, seja por força de decisão dos tribunais (em particular os tribunais administrativos), até que a questão fosse definitivamente dirimida ou, mesmo, até que cessasse o monopólio conferido pela patente (vide o referido Relatório da Comissão, locais citados, e ainda Maria José Costeira e Maria Teresa Garcia Freitas, “A tutela cautelar das patentes de medicamentos: aspectos práticos”, Julgar n.º 8, 2009, pág. 119 e seguintes; Remédio Marques, “Medicamentos versus patentes”, citado, páginas 11 a 13; Remédio Marques, “Licença de medicamento – as interconexões entre a propriedade industrial e a regulação administrativa no sector dos medicamentos”, in Themis, XI.20/21, 2011, pág. 19 e seguintes, maxime páginas 82 a 87).
A admissão de que a atribuição da AIM e a subsequente tramitação administrativa necessária à entrada no mercado de medicamentos genéricos podia ser alvo de interferências decorrentes de alegada necessidade de proteção de direitos de propriedade industrial (mais precisamente, direitos emergentes de patentes), a que a autoridade administrativa (em especial o Infarmed) teria de atender, parecia afrontar o regime previsto no Estatuto do Medicamento e na Directiva 2001/83/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 06.11.2001, que aprovou o código comunitário dos medicamentos para uso humano, e bem assim na Directiva 2004/27/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 31.3.2004, que alterou a Directiva 2001/83/CE com o objetivo de incrementar a comercialização de medicamentos genéricos, na medida em que nesses instrumentos jurídicos em parte alguma se fazia depender a concessão de autorização de introdução do medicamento no mercado da inexistência de direitos de patente vigentes que pudessem ser por ela afetados, omissão essa que deveria ser tida como intencional (vide, neste sentido, Maria José Costeira e Maria Teresa Garcia Freitas, estudo citado, páginas 133 a 136; também defendendo a dita destrinça entre a concessão de AIM e a eventual violação de patentes, vide o supra citado Relatório da Comissão Europeia acerca do Mercado Farmacêutico, páginas 130 e 131, onde se considera que o denominado “patent linkage”, ou seja, a pretensão de conexão entre a concessão de AIM ou de qualquer aprovação administrativa de um medicamento genérico e a caducidade da patente do medicamento de referência, é contrária à legislação comunitária, nomeadamente face ao disposto no art.º 126.º da já citada Directiva n.º 2001/83/EC, que estabelece que “a autorização de introdução no mercado apenas pode ser recusada, suspensa ou revogada pelas razões enumeradas na presente directiva” e ao disposto no Regulamento (CE) n.º 726/2004 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31.3.2004, alterado pelo Regulamento (CE) n.º 1901/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12.12.2006, que estabelece procedimentos comunitários de autorização e de fiscalização de medicamentos para uso humano e veterinário e que institui uma Agência Europeia de Medicamentos, em cujo n.º 2 do art.º 81.º se estipula que “uma autorização de introdução no mercado de um medicamento em conformidade com o presente regulamento só pode ser concedida, recusada, alterada, suspensa, retirada ou revogada em conformidade com os procedimentos e pelas razões previstas no presente regulamento”).
O denominado patent linkage (ligação, ou tentativa de ligação, entre a inexistência de lesão de direitos protegidos por patentes e a concessão de AIM a genéricos, a fixação dos seus preços e a determinação da comparticipação dos preços pelo Estado) levava, como se disse, a que as empresas de medicamentos de referência obtivessem, após a caducidade da patente de um determinado medicamento, o prolongamento, de facto, da situação de monopólio na exploração desse medicamento, fruto do atraso verificado no processo administrativo de aprovação do medicamento genérico.
Foi para obviar a esta situação que a Lei n.º 62/2011, de 12.12, introduziu alterações ao Estatuto do Medicamento e ao regime geral das comparticipações do Estado no preço dos medicamentos (aprovado pelo Dec.-Lei n.º 48-A/2010, de 13.5) e criou um regime de arbitragem necessária para a resolução dos litígios emergentes da invocação de direitos de propriedade industrial relacionados com medicamentos de referência e medicamentos genéricos.
Quanto às modificações introduzidas no Estatuto do Medicamento:
a) Alterou-se a redação do n.º 8 do art.º 19.º, passando aí a incluir-se a concessão de autorização de introdução no mercado entre as situações que, nos termos desse número, “não são contrárias aos direitos relativos a patentes ou a certificados complementares de protecção de medicamentos”;
b) No art.º 25.º, atinente aos motivos de indeferimento do requerimento de autorização de introdução no mercado, passou a afirmar-se expressamente que “o pedido de autorização de introdução no mercado não pode ser indeferido com fundamento na eventual existência de direitos de propriedade industrial” (n.º 2);
c) No art.º 179.º, respeitante à suspensão, revogação ou alteração de autorização ou registo concedido ao abrigo do diploma, passou a prever-se expressamente que “A autorização, ou registo, de introdução no mercado de um medicamento não pode ser alterada, suspensa ou revogada com fundamento na eventual existência de direitos de propriedade industrial” (n.º 2);
d) Aditou-se o art.º 23.º-A, em cujo n.º 1 se declara que “A concessão pelo INFARMED, I.P., de uma autorização, ou registo, de introdução no mercado de um medicamento de uso humano, bem como o procedimento administrativo que àquela conduz, têm exclusivamente por objeto a apreciação da qualidade, segurança e eficácia do medicamento” e em cujo n.º 2 se determina que “O procedimento administrativo referido no número anterior não tem por objeto a apreciação da existência de eventuais direitos de propriedade industrial”.
Às três primeiras alterações ao Estatuto do Medicamento supra referidas foi expressamente atribuída natureza interpretativa (n.º 1 do art.º 9.º da Lei n.º 62/2011).
Ao regime geral das comparticipações do Estado no preço dos medicamentos, aprovado pelo Dec.-Lei n.º 48-A/2010, de 13.5, foi aditado o art.º 2.º-A, onde expressamente se declara que o pedido que visa a obtenção de inclusão do medicamento na comparticipação não pode ser indeferido com fundamento na existência de eventuais direitos de propriedade industrial, que a decisão a proferir sobre a inclusão ou exclusão de medicamento na comparticipação não tem por objeto a apreciação da existência de eventuais direitos de propriedade industrial, não é contrária aos direitos relativos a patentes ou a certificados complementares de protecção de medicamentos e não pode ser alterada, suspensa ou revogada com fundamento na existência de eventuais direitos de propriedade industrial.
No art.º 8.º da Lei n.º 62/2011 preveem-se normas idênticas às do supra referido art.º 2.º-A quanto à decisão de autorização do preço de venda ao público de medicamentos e ao respetivo pedido.
A estes dois artigos ora referidos também foi atribuída natureza interpretativa (n.º 1 do art.º 9.º da Lei n.º 62/2011).
A Lei n.º 62/2011 emergiu da Proposta de Lei n.º 13/XII, de 01.9.2011, em cuja Exposição de Motivos se alude ao Relatório do Inquérito da Comissão Europeia ao Sector Farmacêutico supra mencionado e, apelando para as recomendações da Comissão Europeia e salientando o facto de a jurisprudência nacional ter vindo a entender que “os direitos de propriedade industrial podem ser afectados pela concessão das autorizações de introdução no mercado, do preço de venda ao público e da comparticipação do Estado no preço dos medicamentos”, anuncia-se o propósito de estabelecer “a compatibilização que se considera adequada desses direitos com outros de idêntica relevância, como é o caso do direito à saúde e ao acesso a medicamentos a custos comportáveis, bem como dos direitos dos consumidores.
No que concerne à resolução jurisdicional dos litígios e tendo em vista a mesma, introduziu-se no Estatuto do Medicamento o art.º 15.º-A, nos termos do qual o Infarmed deve publicitar na sua página eletrónica todos os pedidos de autorização, ou registo, de introdução no mercado de medicamentos genéricos, devendo a publicitação conter o nome do requerente da autorização de introdução no mercado, a data do pedido, a substância, dosagem e forma farmacêutica do medicamento e o medicamento de referência. A título de norma transitória, no art.º 9.º n.º 2 da Lei n.º 62/2011 determinou-se que o Infarmed deveria, no prazo de 30 dias após a entrada em vigor da lei, efetuar a publicitação referida no art.º 15.º-A, respeitante aos medicamentos para os quais ainda não tivesse sido proferida pelo menos uma das decisões de autorização de introdução no mercado, do preço de venda ao público ou de inclusão na comparticipação do Estado no preço dos medicamentos.
Com efeito, o art.º 2.º da Lei n.º 62/2011 determina que “os litígios emergentes da invocação de direitos de propriedade industrial, incluindo os procedimentos cautelares, relacionados com medicamentos de referência (…) e medicamentos genéricos, independentemente de estarem em causa patentes de processo, de produto ou de utilização, ou de certificados complementares de protecção, ficam sujeitos a arbitragem necessária, institucionalizada ou não institucionalizada.” E o interessado que pretenda invocar o seu direito de propriedade industrial nos termos deste artigo deve fazê-lo no prazo de 30 dias a contar da dita publicitação, junto do tribunal arbitral institucionalizado ou efetuando pedido de submissão do litígio a arbitragem não institucionalizada (art.º 3.º n.º 1 da Lei n.º 62/2011).
A Lei n.º 62/2011 densifica o aludido regime de arbitragem necessária pela seguinte forma:
As provas deverão ser oferecidas pelas partes com os respetivos articulados (n.º 3 do citado art.º 3.º); após a apresentação da contestação será designada data para a audiência de produção da prova que haja de ser produzida oralmente (n.º 4 do art.º 3.º); a audiência deverá ter lugar no prazo máximo de 60 dias posteriores à apresentação da oposição (n.º 5 do art.º 3.º); da decisão arbitral caberá recurso para o Tribunal da Relação competente (n.º 7 do art.º 3.º). Em tudo o que não for expressamente contrariado pelo disposto nos aludidos números do art.º 3.º da Lei n.º 62/2011, será aplicável o regulamento do centro de arbitragem, institucionalizado ou não institucionalizado, escolhido pelas partes e, subsidiariamente, o regime geral da arbitragem voluntária (n.º 8 do art.º 3.º). No n.º 2 do art.º 3.º ora em análise estipula-se que a não dedução de contestação à ação arbitral, no prazo de 30 dias após notificação para o efeito pelo tribunal arbitral, implica que o requerente de autorização, ou registo, de introdução no mercado genérico “não poderá iniciar a sua exploração industrial ou comercial na vigência dos direito de propriedade industrial invocados nos termos do n.º 1.
Este regime é justificado, na Exposição de Motivos da Proposta de Lei n.º 13/XII, através da constatação de que “tem vindo (…) a assistir-se a um vasto conjunto de litígios judiciais a respeito da concessão da autorização de introdução no mercado, da autorização do preço de venda ao público e da autorização da comparticipação do Estado no preço dos medicamentos relacionados com a subsistência de direitos de propriedade industrial a favor de outrem” e de que “no entanto, a questão de saber se existe, ou não, violação de direitos de propriedade industrial depende de sentença a proferir pelos tribunais”. Assim, a intenção do Governo foi “estabelecer um mecanismo alternativo de composição dos litígios que, num curto espaço de tempo, profira uma decisão de mérito quanto à existência, ou não, de violação dos direitos de propriedade industrial”, para isso instituindo o recurso à arbitragem necessária. A preocupação de celeridade é enfatizada na Exposição de Motivos, onde se pode ler que “ainda com o objectivo de promover a celeridade, estabelecem-se prazos para a instauração do processo e para a oposição, contados da publicitação pelo INFARMED, I. P., do pedido de autorização de introdução no mercado. (…). Adopta-se, ainda, uma tramitação consentânea com a preocupação de celeridade, com garantia pelo devido contraditório das partes, bem como o direito a uma instância de recurso, fixando-se o efeito meramente devolutivo do mesmo, de modo a manter os efeitos da decisão arbitral até à decisão que sobre o mesmo recair.”
Debrucemo-nos sobre o caso dos presentes autos.
O Infarmed publicitou na sua página eletrónica, nos termos e para os efeitos do art.º 9.º n.º 2 da Lei n.º 62/2011, que a ora primeira demandada havia requerido a concessão da AIM supra referida na alínea VVV) da matéria de facto, ou seja, para um medicamento genérico contendo, como substância ativa, zidovudina + abacavir sulfato + lamivudina, com a dosagem, respetivamente, 300 mg + 150 mg + 300 mg, na forma farmacêutica de comprimido revestido por película e tendo como medicamento de referência o medicamento de marca “T...”. Posteriormente esses dados foram retificados, conforme decorre das alíneas XXX) e ZZZ) da matéria de facto, no sentido de que o medicamento genérico em causa continha como substância ativa abacavir (forma livre) e não sulfato de abacavir, também designado por hemissulfato de abacavir, e a dosagem correta de cada uma das substâncias ativas do medicamento genérico das demandadas era de 300 mg de zidovudina, 300 mg de abacavir e 150 mg de lamivudina.
Seja como for, a demandante desencadeou a presente ação de arbitragem na sequência da dita publicitação de pedido de AIM, ao abrigo do já supra descrito regime previsto na Lei n.º 62/2011.
A ação veio a culminar com a condenação das demandadas a absterem-se de importar, fabricar, oferecer, armazenar, introduzir no comércio ou utilizar, em Portugal, medicamentos genéricos com combinação das três substâncias ativas Abacavir, Zidovudina e Lamivudina como princípio ativo, enquanto os direitos de propriedade industrial das Demandantes se encontrarem em vigor, ou seja, até 14 de Maio de 2018”.
Ou seja, o tribunal recorrido condenou as demandadas a absterem-se de praticar atos lesivos dos direitos de propriedade industrial da A. atinentes não só ao medicamento alvo do pedido de AIM que desencadeou o pedido de arbitragem, mas a quaisquer medicamentos genéricos com combinação das três substâncias ativas abacavir, zidovudina e lamivudina como princípio ativo.
As recorrentes insurgem-se contra o âmbito dessa condenação, por entenderem que ela se deveria ter atido ao concreto medicamento genérico cujo pedido de autorização fora publicitado e assim desencadeara a presente arbitragem. Defendem que essa restrição decorre do regime previsto no art.º 3.º da Lei n.º 62/2011 e que solução contrária viola o acesso ao direito e de defesa previsto no art.º 20.º da CRP e bem assim constitui uma restrição infundada do direito de livre iniciativa económica, constitucionalmente protegido nos artigos 61.º n.º 1 e 80.º alínea c) da CRP, além de violar o princípio do contraditório, consagrado no art.º 16.º alínea c) da LAV (de 1986), por conter uma condenação “em branco”, sem que as demandadas se tivessem pronunciado sobre os factos subjacentes à mesma. Mais asseveram que a decisão do tribunal a quo, com a aludida configuração, viola o disposto nos artigos 2.º n.º 3 (“o compromisso arbitral deve determinar com precisão o objecto do litígio; a cláusula compromissória deve especificar a relação jurídica a que os litígios respeitem”) e 11.º n.º 3 (“a notificação [da pretensão de instauração de litígio no tribunal arbitral] deve indicar a convenção de arbitragem e, se ele não resultar já determinado da convenção, precisar o objecto do litígio, sem prejuízo da sua ampliação pela parte contrária”) da LAV.
Vejamos.
O art.º 1.º da Lei n.º 62/2011 enuncia, como um dos aspetos que constituem o objeto desta, a criação de “um regime de composição dos litígios emergentes de direitos de propriedade industrial quando estejam em causa medicamentos de referência e medicamentos genéricos.” Tal caraterização é desenvolvida, no art.º 2.º da referida Lei, com a determinação de que “os litígios emergentes da invocação de direitos de propriedade industrial, incluindo os procedimentos cautelares, relacionados com medicamentos de referência (…) e medicamentos genéricos, independentemente de estarem em causa patentes de processo, de produto ou de utilização, ou de certificados complementares de protecção, ficam sujeitos a arbitragem necessária, institucionalizada ou não institucionalizada.”
A letra da lei não restringe a defesa dos direitos de propriedade industrial ao medicamento genérico concretamente alvo do pedido de autorização de introdução no mercado. Ou seja, embora o processo de arbitragem seja desencadeado, nos termos já supra explicitados, pela publicitação de um concreto pedido de AIM, atinente a um determinado medicamento genérico, a letra da lei não obsta a que a defesa dos direitos de propriedade industrial seja alargada, pelo respetivo titular, a todos os atos que razoavelmente possam ser configurados (na ação) como podendo vir a ocorrer e que ponham em perigo os referidos direitos, nomeadamente o fabrico, a importação, a oferta, a armazenagem, a introdução no comércio ou a utilização de qualquer medicamento genérico objeto da ou das patentes invocadas ou do respetivo certificado complementar de proteção (cfr. art.º 101.º n.ºs 1 e 2 e artigos 115.º e 116.º do Código da Propriedade Industrial - CPI).
Por outro lado, tal visão não restritiva do âmbito jurisdicional possível da concreta arbitragem instaurada potencia o intuito legislativo de economia de meios na resolução dos litígios nesta área económica, com evidentes vantagens para ambas as partes. Assim, evitam-se encargos jurisdicionais decorrentes da sucessiva apresentação de pedidos de AIM respeitantes a medicamentos genéricos contendo substâncias ativas idênticas, protegidas pelas mesmas patentes.
No caso dos autos, conforme decorre do Relatório supra, desde o início que o objeto da causa foi definido de forma ampla, tendo na ata de instalação do tribunal arbitral sido consignado que o litígio tinha como objeto “exercício dos direitos que as Demandantes possuem, decorrentes da Patente Portuguesa n.º ... e respectivo Certificado Complementar de Protecção n.º 55 e bem assim das Patentes Europeias n.º ... e n.º ..., relativamente a medicamentos genéricos, nomeadamente os indicados na lista publicada pelo Infarmed – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, I.P no seu sítio eletrónico, em 11 de Janeiro de 2012, com a substância activa “Abacavir+Lamivudina+Zidovudina”, conforme identificado na carta endereçada à Demandada em 8 de Fevereiro de 2012 (anexa a esta ata)” (itálico nosso). Na carta, redigida em inglês, em que a demandante dava conta às demandadas (ou melhor, à sua antecessora processual) da intenção de instauração da ação arbitral, expressamente se dizia que esta visava a defesa dos direitos emergentes das patentes e do certificado complementar de proteção aí identificados, respeitantes a medicamentos genéricos, incluindo, mas não apenas (“including, but not limited to”), os indicados na supra referida publicitação eletrónica feita pelo Infarmed. Tal definição do objeto do litígio teve sequência na formulação da petição inicial, em que se pediu que as demandadas fossem condenadas “a abster-se de, em território Português, ou tendo em vista a comercialização nesse território, importar, fabricar, armazenar, introduzir no comércio, vender ou oferecer o medicamento genérico referido no artigo 77.º supra ou, sob estas ou quaisquer outras designações ou marcas, qualquer outro medicamento contendo abacavir ou sulfato de abacavir, zidovudina e lamivudina como princípio ativo enquanto os direitos de propriedade industrial acima referidos se encontrarem em vigor, ou seja, até 14 de maio de 2018” (itálico nosso).
As demandadas, quer no escrito em que declararam aceitar intervir na ação arbitral, quer na contestação, não questionaram a licitude do âmbito dado à ação pela demandante, tendo, pelo contrário, demonstrado na contestação terem compreendido perfeitamente o alcance da ação e esgrimido argumentos tendentes a poderem concluir, a final daquela peça processual, pela sua absolvição do pedido, por “a titularidade de AIM sobre medicamentos genéricos contendo Abacavir/Lamivudina/Zidovudina não consubstanciar qualquer ato de infração ou de ameaça de infração” (conclusão ii) a) da contestação, itálico nosso).
Assim sendo, não se vê que o tribunal a quo tenha excedido o âmbito dos seus poderes, seja os definidos pela lei (neste sentido, cfr. o acórdão desta Relação, de 03.10.2013, processo 747/13.1YRLSB.L1-8 e, também desta Relação, 19.3.2013, processo 227/13.5YRLSB-7, in www.dgsi.pt e o último referido também em CJ XXXVIII, t. II, pág. 96 e seg.), seja os reconhecidos pelas partes, recusando-se, assim, que se mostre violado quer o disposto no art.º 3.º da Lei n.º 62/2011, quer o disposto nos artigos 2.º n.º 3 e 11.º n.º 3 da LAV de 1986 (sendo certo que nos eximimos, por tal ser desnecessário, de discutir a aplicabilidade destes dois últimos artigos ao caso vertente).
Como é sabido, uma patente de invenção é um título que confere um direito exclusivo de exploração de um invento (art.º 101.º n.º 1 do CPI), atribuindo-se ao respetivo titular o direito “de impedir a terceiros, sem o seu consentimento, o fabrico, a oferta, a armazenagem, a introdução no comércio ou a utilização de um produto objecto de patente, ou a importação ou posse do mesmo, para algum dos fins mencionados” (n.º 2 do art.º 101.º do CPI). Por sua vez o certificado complementar de proteção é um mecanismo de prorrogação do prazo de duração da patente, admitido para os medicamentos e para os produtos fitofarmacêuticos (artigos 115.º e 116.º do CPI e Regulamento n.º 469/2009, do Parlamento Europeu e do Conselho de 6 de maio de 2009, que codificou esta matéria, inicialmente regulada pelo Regulamento (CEE) n.º 1786/2, do Conselho, de 19 de julho de 1992).
O sistema legal previsto pela Lei n.º 62/2011 compele o titular de patentes relacionadas com medicamentos de referência, que possam ser afetadas pela entrada no mercado de medicamentos genéricos, a defender os seus direitos de propriedade industrial num prazo curto, contado a partir da publicitação do pedido de autorização de introdução no mercado do genérico, por meio de arbitragem (necessária), institucionalizada ou não institucionalizada. Trata-se da imposição de um ónus de resolução antecipada de litígios (como o qualifica o Tribunal Constitucional, no acórdão n.º 2/2013, de 09.01.2013, maxime no penúltimo parágrafo antes da decisão), que de alguma forma corresponde aos mecanismos “clearing the way” aventados no Relatório Final do Inquérito da Comissão Europeia ao Sector Farmacêutico, supra citado, páginas 459 a 461. O sistema legal instituído não pressupõe necessariamente que o demandado tenha praticado algum ato em concreto violador dos direitos de propriedade industrial do demandante ou que esteja suficientemente caraterizada uma situação de ameaça a esses direitos. Basta que exista um pedido de autorização de introdução no mercado de um medicamento genérico atinente a substância ativa, a processo de obtenção ou a utilização (artigos 51.º e 54.º do CPI) que estejam protegidos por patente ou certificado complementar de proteção, para legitimar a instauração da ação. Esta visará o reconhecimento jurisdicional de que a colocação no mercado, dentro de determinados limites temporais (art.º 99.º do CPI), de medicamentos genéricos com determinadas caraterísticas violará os direitos de propriedade industrial invocados pelo demandante e implicará, se for o caso, a intimação do demandado no cumprimento desses direitos. Foi esta a via configurada pelo legislador para que se cumpra o direito constitucionalmente garantido do acesso à tutela jurisdicional dos direitos e interesses legalmente protegidos (art.º 20.º da CRP), a qual pressupõe, salvo casos excecionais legalmente previstos, a disponibilização de ação adequada a fazer reconhecer o direito em juízo, a prevenir ou reparar a sua violação e a realizá-lo coercivamente (art.º 2.º n.º 2 do CPC).
In casu, a demandante invocou com precisão os direitos de que entendia ser titular e a atuação que entendia violá-los, tendo sido dada às demandadas plena possibilidade de apresentar a sua defesa. É certo que o tribunal arbitral se julgou incompetente para se pronunciar acerca da nulidade de uma das patentes, arguida pelas demandadas, mas tal decisão, contra a qual as demandadas não reagiram, tem como efeito, a nosso ver, conceder às demandadas a possibilidade de requererem, junto dos tribunais estaduais, a declaração da invalidade da aludida patente, retirando-se depois, em caso de sucesso dessa pretensão, as consequências decorrentes. De resto, a condenação das RR. na abstenção de praticarem, no futuro, atos violadores dos direitos da A. conforma-se com a natureza absoluta dos direitos em causa e adequa-se à finalidade meramente preventiva que a tutela jurisdicional também pode ter. A área de abstenção imposta às demandadas foi suficientemente delimitada/determinada: trata-se de não interferir, durante um limite temporal definido, com o exclusivo de exploração, alegadamente titulado pela demandante, de medicamentos contendo a combinação das três substâncias ativas abacavir, zidovudina e lamivudina como princípio ativo. Tal obrigação de abstenção resulta da ponderação, concretizada pelo legislador, dos interesses dos titulares dos direitos de exploração das invenções, cuja atividade criativa deve ser compensada para que assim se estimule o progresso técnico, embora com limitações, nomeadamente do ponto de vista da duração no tempo desse exclusivo, a fim de se poder alargar o campo dos beneficiados pela invenção.
Conclui-se, assim, que os termos em que a decisão foi formulada, no segmento ora em análise, não viola o direito ao contraditório das demandadas, nem colide com o acesso ao direito e de defesa previsto no art.º 20.º da CRP, nem constitui uma restrição infundada do direito de livre iniciativa económica das demandadas, constitucionalmente protegido nos artigos 61.º n.º 1 e 80.º alínea c) da CRP.
Segunda questão (anulabilidade da decisão recorrida)
Nesta vertente do recurso as apelantes defendem que a decisão recorrida, no segmento que temos vindo a analisar, é anulável por força do art.º 27.º, alíneas c), d) e e) da LAV (de 1986).
A este processo não se aplica a atual Lei de Arbitragem Voluntária (NLAV), aprovada pela Lei n.º 63/2011, de 14.12, mas sim a anterior Lei de Arbitragem Voluntária (LAV), contida na Lei n.º 31/86, de 29.8, uma vez que o processo tendente à realização da arbitragem se iniciou em 08.02.2012 (data da carta enviada pelas demandantes iniciais às demandadas primitivas, dando conta da vontade de realização da arbitragem) e as partes não manifestaram a vontade de que se aplicasse ao caso a NLAV (cf. art.º 4.º n.º 2 da Lei n.º 63/2011).
O art.º 27.º da LAV, dedicado às causas de anulação da decisão arbitral, indica, entre as razões da anulabilidade desta, “ter havido no processo violação dos princípios referidos no art.º 16.º, com influência decisiva na resolução do litígio” (alínea c) do n.º 1); “ter havido violação do artigo 23.º, n.ºs 1 alínea f), 2 e 3” (alínea d) do n.º 1) e “ter o tribunal conhecido de questões de que não podia tomar conhecimento, ou ter deixado de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar” (alínea e) do n.º 1).
Por sua vez o art.º 16.º da LAV enumera, de entre os princípios fundamentais que devem ser apreciados no processo, o princípio do contraditório (alínea c)).
O art.º 23.º, atinente aos elementos da decisão, exige no seu n.º 3 que a decisão seja fundamentada.
As recorrentes entendem que o tribunal arbitral, ao abranger na sua decisão medicamentos genéricos que não o publicitado pelo Infarmed, conheceu de questões de que não podia conhecer e inviabilizou o contraditório por parte das recorrentes. Por outro lado, não fundamentou tal amplitude na condenação.
A análise já supra efetuada quanto ao alegado exercício excessivo dos seus poderes por parte do tribunal arbitral permite-nos concluir, sem mais alongadas considerações, que a decisão recorrida não enferma dos aludidos vícios. O tribunal a quo, ao condenar as demandadas nos termos ora sindicados, ateve-se ao objeto do processo, tal como fora definido desde o início, do que as demandadas tiveram pleno conhecimento e sobre que exerceram o contraditório, sendo certo que o tribunal a quo fundamentou a condenação proferida, de facto e de direito, não se tendo pronunciado em particular sobre o obstáculo ora enunciado pelas demandantes (impossibilidade de a condenação abranger outros medicamentos genéricos para além do identificado no pedido de AIM publicitado) certamente porque essa questão não lhe foi suscitada pelas partes e terá considerado que a decisão proferida se integrava no âmbito dos seus poderes.
Improcede, assim, também esta parte do recurso.
Terceira questão (nulidade da sentença)
Nesta parcela do recurso as recorrentes defendem que a decisão recorrida enferma da nulidade prevista no art.º 668.º n.º 1 alínea c) do CPC (de 1961) quanto à proibição de comercialização até 14.5.2018, data em que caducará a Patente Europeia n.º ... (EP ...), na medida em que, no seu entender, resulta da matéria assente e da fundamentação da decisão que a eventual comercialização do medicamento genérico abacavir+lamivudina+zidovudina, objecto da AIM requerida ao Infarmed, não viola a aludida patente.
Vejamos.
Nos termos do disposto no art.º 668.º n.º 1 alínea c) do CPC de 1961 (em vigor à data da decisão recorrida e por conseguinte o aplicável na apreciação desta questão processual, por contraposição ao novo CPC, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26.6 – art.º 12.º n.º 1 e n.º 2, 1.ª parte, do Código Civil), a sentença é nula quando “os fundamentos estejam em oposição com a decisão.”
O vício aqui considerado pela lei consiste numa evidente contradição lógica: na fundamentação da sentença o juiz segue uma determinada linha de raciocínio, que aponta para determinada conclusão e, em vez de a tirar, decide noutro sentido, oposto ou divergente (cfr. Lebre de Freitas, Montalvão Machado e Rui Pinto, Código de Processo Civil anotado 2.ª edição, Coimbra Editora, pág. 704). Não cabem aqui o erro na interpretação do sentido dos factos apurados, na subsunção dos factos à norma jurídica ou o erro na interpretação desta. Nestes casos haverá erro de julgamento, fundador da impugnação quanto ao mérito da decisão.
Ora, analisada a decisão recorrida, não vislumbramos que ela enferme do patente vício de ordem lógica, entre os fundamentos e a decisão, consubstanciadora da aludida nulidade. O tribunal arbitral, na interpretação que fez dos factos provados, concluiu que o medicamento genérico das demandadas contém uma substância ativa que é, à luz do regime jurídico das patentes, equivalente à substância ativa protegida pela EP ..., patente esta que caducará em 14.5.2018, pelo que, em harmonia com tal raciocínio, condenou as demandadas no respeito por essa patente, até ao termo do respetivo prazo de caducidade.
O vício que as recorrentes apontam à decisão recorrida constitui, afinal, erro de julgamento: as apelantes defendem que a substância protegida na patente EP ... (sulfato de abacavir) é, contrariamente ao propugnado pelo tribunal recorrido, diferente da substância usada no seu medicamento genérico (abacavir em forma livre), o que inclusivamente justificou que sobre cada um desses produtos fosse concedida uma patente, pelo que o medicamento genérico contendo abacavir+lamivudina+zidovudina não viola a EP ..., devendo por conseguinte esta última ser desconsiderada na decisão recorrida.
Qualificado como erro de julgamento o vício que as recorrentes imputaram à decisão recorrida, cumpre então agora apreciar se tal erro de julgamento se verifica.
Está em causa saber se a produção e comercialização de um medicamento genérico contendo como substâncias ativas abacavir (na forma livre) + lamivudina + zidovudina viola a Patente Europeia ..., que é titulada pela demandante e caduca em 14.5.2018.
Às patentes europeias, reguladas pela Convenção Sobre a Concessão de Patentes Europeias – CPE – celebrada em Munique em 05.10.1973, que em Portugal foi aprovada para ratificação pelo Decreto n.º 52/91, de 30.8 e entrou em vigor no nosso país em 01.01.1992 – aviso n.º 198/91, de 21.12 -, tendo sido alvo de alterações e estando atualmente em vigor a versão revista em 2000 e que entrou em vigor em 13.12.2007, aprovada pela Resolução da Assembleia da República n.º 60-A/2007, de 12.12 e ratificada pelo Decreto n.º 126-A/2007, de 12.12, reconhecem-se os mesmos efeitos e aplica-se o mesmo regime que o de uma patente nacional, a não ser que a Convenção disponha de outra forma (artigos 2.º n.º 2 e 64.º nº 1 da CPE). De resto, o legislador nacional tem procurado conformar o direito de patentes nacional à imagem e semelhança do regime previsto na CPE, em domínios como o da definição do objeto da patente e o dos requisitos da patenteabilidade, acompanhando aliás o movimento nesse sentido ocorrido nos países da União Europeia (vide Luís Couto Gonçalves, Manual de Direito Industrial, 4.ª edição, 2013, Almedina, pág. 78, nota 168).
As patentes, sejam nacionais sejam europeias, serão concedidas - sem prejuízo de determinadas limitações -, para quaisquer invenções, em todos os domínios tecnológicos, desde que sejam novas, envolvam atividade inventiva e sejam suscetíveis de aplicação industrial (art.º 51.º n.º 1 do CPI, art.º 52.º n.º 1 da CPE).
A invenção é considerada nova quando não está compreendida no estado da técnica (n.º 1 do art.º 55.º do CPI, art.º 54.º n.º 1 da CPE).
O estado da técnica é constituído por tudo o que, dentro ou fora do País, foi tornado acessível ao público antes da data do pedido de patente, por descrição, utilização ou qualquer outro meio (n.º 1 do art.º 56.º do CPI, art.º 54.º n.º 2 da CPE), sendo igualmente considerado como compreendido no estado da técnica o conteúdo dos pedidos de patentes e de modelos de utilidade requeridos em data anterior à do pedido de patente, para produzir efeitos em Portugal e ainda não publicados (n.º 2 do art.º 56.º do CPI) e, quanto às patentes europeias, é igualmente considerado como incluído no estado da técnica o conteúdo dos pedidos de patente europeia, tais como foram apresentados, que tenham uma data de apresentação anterior à atrás mencionada no n.º 2 e que não foram publicados a não ser nessa data ou em data posterior (n.º 3 do art.º 54.º da CPE).
Considera-se que uma invenção implica atividade inventiva se, para um perito na especialidade, não resultar de uma maneira evidente do estado da técnica (n.º 2 do art.º 55.º do CPI; art.º 56.º da CPE).
Por sua vez, considera-se que uma invenção é suscetível de aplicação industrial se o seu objeto puder ser fabricado ou utilizado em qualquer género de indústria ou na agricultura (n.º 3 do art.º 55.º do CPI; art.º 57.º da CPE).
Nos termos do art.º 97.º n.º 1 do CPI, “o âmbito da protecção conferida pela patente é determinado pelo conteúdo das reivindicações, servindo a descrição e os desenhos para as interpretar.”
No n.º 4 do art.º 101.º do CPI afirma-se que “os direitos conferidos pela patente não podem exceder o âmbito definido pelas reivindicações.”
No art.º 69.º n.º 1 da CPE estipula-se que “o âmbito da protecção conferida pela patente europeia ou pelo pedido de patente europeia é determinado pelas reivindicações. Não obstante, a descrição e os desenhos servem para interpretar as reivindicações.”
No que concerne ao processo de patente pela via nacional, o nº 1 do art.º 62.º do CPI determina que ao requerimento do pedido de patente devem juntar-se os seguintes elementos:
a) Reivindicações do que é considerado novo e que caracteriza a invenção;
b) Descrição do objecto da invenção;
c) Desenhos necessários à perfeita compreensão da descrição;
d) Resumo da invenção.
Nos termos do n.º 3 do art.º 62.º, “as reivindicações definem o objecto da protecção requerida, devendo ser claras, concisas, correctamente redigidas, baseando-se na descrição e contendo, quando apropriado:
a) Um preâmbulo que mencione o objecto da invenção e as características técnicas necessárias à definição dos elementos reivindicados, mas que, combinados entre si, fazem parte do estado da técnica;
b) Uma parte caracterizante, precedida da expressão «caracterizado por» e expondo as características técnicas que, em ligação com as características indicadas na alínea anterior, definem a extensão da protecção solicitada.”
Nos termos do n.º 4 do art.º 62.º do CPI, “a descrição deve indicar, de maneira breve e clara, sem reservas nem omissões, tudo o que constitui o objecto da invenção, contendo uma explicação pormenorizada de, pelo menos, um modo de realização da invenção, de maneira que qualquer pessoa competente na matéria a possa executar.
Por sua vez o art.º 78.º da CPE estipula que o pedido de patente europeia deve conter:
a) Um requerimento para a concessão de patente europeia;
b) Uma descrição da invenção;
c) Uma ou mais reivindicações;
d) Os desenhos a que se referem a descrição ou as reivindicações;
e) Um resumo.
No art.º 83.º da CPE, sob a epígrafe “Descrição da invenção” estipula-se que “a invenção deve ser descrita no pedido de patente europeia de forma suficientemente clara e completa para que um perito na matéria a possa executar.”
E no art.º 84.º, sob a epígrafe “Reivindicações”, estabelece-se que “as reivindicações definem o objecto da protecção pedida. Devem ser claras e concisas e apoiar-se na descrição.”
A patente pode ter objeto produtos (art.º 51.º n.º 2 do CPI), processos (artigos 51.º n.º 3, 97.º n.º 2 do CPI) e, em especial na área da indústria químico-farmacêutica, novas utilizações de produtos eventualmente já conhecidos (artigo 54.º n.º 1 alínea a) do CPI, art.º 54.º n.º s 4 e 5 da CPE).
A patente confere, ao respetivo titular, durante 20 anos a contar do respetivo pedido (art.º 99.º do CPI, art.º 63.º n.º 1 da CPE), o exclusivo da exploração do invento patenteado, em qualquer parte do território português (art.º 101.º n.º 1 do CPI). Tal proteção tem como contrapartida a publicitação, pelo titular da patente, das caraterísticas da invenção, assim possibilitando que o avanço tecnológico por ela representado possa ser do conhecimento generalizado da comunidade e futuramente utilizado para o progresso da humanidade, seja após a caducidade da patente, seja ainda durante a sua vigência, quando o novo invento se situe fora dos seus limites de proteção ou, estando dentro do âmbito de proteção da patente, com o acordo do seu titular.
O exclusivo concedido pela patente protege, pois, o seu titular de imitações não autorizadas.
A questão da determinação em concreto do que constitui ou não imitação do invento patenteado é, obviamente, de solução difícil, dando azo a controvérsia não só quanto à decisão casuística mas, também, em termos de definição das suas regras gerais.
Sendo certo que é dado assente que a imitação, ou aproveitamento indevido do fruto da criatividade alheia, cristalizado na patente, vai além da mera reprodução literal da invenção patenteada.
A este respeito podem convocar-se, na fixação do âmbito de proteção da patente:
a) Uma posição tradicionalmente mais restritiva, adotada pelos tribunais do Reino Unido, em que, em tempos mais recuados, se considerava que apenas violava a patente o produto ou processo do demandado que reproduzisse todos os elementos essenciais do invento (sistema “pith and marrow”) - sendo que cada elemento caracterizante do invento era considerado essencial – de modo que se no produto ou processo demandado faltasse um desses elementos, não havia violação da patente, a não ser que esse elemento essencial fosse substituído por um elemento equivalente, ou seja, um elemento que produzisse o mesmo resultado (“the same result”) através da mesma forma (“same way”) ou do mesmo modus operandi (cfr. Remédio Marques, “Biotecnologia(s) e propriedade intelectual”, vol. I, Almedina, 2007, páginas 728 e 729);
b) uma posição mais ampla, propugnada na Alemanha, que reconhecia ao titular da patente proteção assente na ideia geral da invenção, formulação abstrata que assim levava à proteção da essência da concreta solução técnica perante produtos ou processos fabricados ou comercializados por terceiros que mobilizassem, conquanto sob outra forma, a essência da solução técnica protegida por direito de patente, e que como tal fossem dedutíveis por um perito da especialidade, sem para tal envolver, por parte do perito, atividade inventiva, sendo as reivindicações meras linhas diretrizes, para além das quais o titular da patente ainda lograva proteção (Remédio Marques, “Biotecnologia(s)… obra citada, páginas 730 a 733);
c) a tradição americana (dos EUA), em que os tribunais investigam se o objeto ou o método do réu correspondem substancialmente à mesma invenção (“substantially the same invention”), alargando a proteção a situações de apropriação não literal dos elementos caracterizantes do invento protegido, ou seja, de violação por equivalente, quando se demonstra que o produto ou o processo do réu “desempenha substancialmente a mesma função, substancialmente do mesmo modo, com vista a obter substancialmente o mesmo resultado” (teste triplo: function/way/result), desde que cada um dos elementos caracterizantes da invenção do autor esteja presente, ainda que por equivalência, no produto ou processo do réu (“all elements rule”), à luz do momento da alegada violação da patente (Remédio Marques, “Biotecnologia(s)… obra citada, páginas 740 a 746; Luís Couto Gonçalves, Manual…, citado, páginas 96 a 98).
Procurando proceder a uma harmonização de critérios, no art.º 69.º n.º 1 da CPE estipula-se, como já se transcreveu supra, que “o âmbito da protecção conferida pela patente europeia ou pelo pedido de patente europeia é determinado pelas reivindicações. Não obstante, a descrição e os desenhos servem para interpretar as reivindicações.”
O Protocolo Interpretativo ao art.º 69.º n.º 1 da CPE, aprovado em 05.10.1973, na sequência da conferência diplomática de Munique (e que faz parte integrante da Convenção, art.º 164.º, parágrafo 1.º, da Convenção), estipula que “o artigo 69.º não deve ser interpretado como significando que a extensão da protecção conferida por uma patente europeia é determinada no sentido estrito e literal do texto das reivindicações e que a descrição e os desenhos servem unicamente para dissipar as ambiguidades que poderiam ocorrer nas reivindicações. Nem deve ser considerado como significando que as reivindicações servem unicamente como orientação e que a protecção se estende também ao que, da consideração da descrição e desenhos por um especialista na matéria, o titular da patente entendeu proteger. Pelo contrário, o artigo 69.º deve ser interpretado como definindo uma posição, entre estes extremos, que assegura simultaneamente uma protecção justa ao titular da patente e um grau razoável de segurança jurídica para terceiros.
Por sua vez, a conferência diplomática de Munique realizada em novembro de 2000, inseriu um segundo parágrafo ao Protocolo Interpretativo, com a seguinte redação:
Para efeitos de determinação da extensão da protecção conferida por uma patente europeia, deve ter-se em conta todo o elemento equivalente a um elemento especificado nas reivindicações.”
Daqui resulta que o âmbito de proteção da patente define-se pelo teor das reivindicações, interpretadas à luz da descrição, sem sujeição ao estrito texto ou letra das reivindicações, abarcando aquilo que deva ser considerado equivalente a elemento ou elementos especificados nas reivindicações, procurando-se uma posição de equilíbrio, que assegure simultaneamente uma proteção justa ao titular da patente e um grau razoável de segurança jurídica para terceiros.
A aludida alteração ao Protocolo Interpretativo do art.º 69.º traduziu o reconhecimento, no direito positivo europeu de patentes, da necessidade de ponderar a delimitação do âmbito tecnológico de proteção de uma patente à luz da teoria da equivalência ou dos meios equivalentes, nomeadamente quando se pretende apurar a eventual violação do direito de patente (Remédio Marques, “Biotecnologia(s)… obra citada, página 768).
Na sequência da intervenção harmonizadora da CPE os tribunais do Reino Unido passaram a submeter as reivindicações e a descrição do invento a uma interpretação teleológica (“purposive construction”), à luz do propósito do requerente da patente, tal como é percecionado pelo perito na especialidade, construindo um “paradigma heurístico” (Remédio Marques, “Biotecnologia(s)…, citado, pág. 775), designado Catnic/Improver, devendo, para verificar se houve violação de patente, responder-se às seguintes questões:
a) Se o produto ou o processo usados pelo demandado produz um efeito material distinto relativamente ao modo como a invenção do autor funciona; se a resposta for negativa,
b) Se o facto de o funcionamento desse dispositivo não produzir um efeito material distintivo era evidente (obvious) para o perito na especialidade à data do pedido de patente; se sim,
c) Se o perito na especialidade teria deduzido, não obstante, do texto das reivindicações, que o titular da patente desejara que essa característica ou características constituíssem um elemento essencial da invenção, na medida em que uma determinada expressão ou palavra deveria ser entendida no seu sentido puramente literal; se a resposta for afirmativa, o dispositivo do réu estará fora do alcance da proteção do direito de patente (Remédio Marques, “Biotecnologia(s)…, citado, páginas 772 a 779; Couto Gonçalves, citado, páginas 98 a 100).
Ultimamente, os tribunais do Reino Unido têm dado particular importância à última questão supra referida, ou seja, à interpretação da vontade do titular da patente, que o perito fará a partir do texto das reivindicações, tendo em conta o seu contexto, em que avulta o objetivo pretendido pelo inventor, formulando-se considerações no sentido de que em princípio o requerente da patente utiliza a linguagem em termos muito precisos, tem algum conhecimento do direito de patentes e sabe que a sua reivindicação serve para definir o seu monopólio e que deve incidir sobre algo de novo (vide Pedro Sousa e Silva, Direito Industrial, Coimbra Editora, 2011, pág. 74 e a publicação do European Patent Office, “Case Law from the Contracting States to the EPC – 2004-2011”, Special edition 3, Official Journal 2011, páginas 175 a 182, 247 a 250, acedível na internet em http://archive.epo.org/epo/pubs/oj012/02_12/12_spe0.pdf). Ou seja, mantém-se a tradição britânica do apego ao teor literal das reivindicações, atenuada pela referência ao propósito do requerente da patente, tal como deveria ser apreendido pelo perito da especialidade médio.
Na Alemanha, a partir da decisão do caso Formstein (pelo BGH, em 29.4.1986), abandonou-se a visão de um âmbito de proteção da patente mais abrangente, materializado na ideia geral da invenção, passando as reivindicações a ser encaradas não como o ponto de partida, meras linhas diretrizes na determinação do âmbito de proteção, mas como a base fundamental à volta da qual esse âmbito seria fixado. Porém, a proteção da patente não se circunscreve ao mero teor literal das reivindicações, alargando-se aos meios equivalentes que o perito da especialidade, sem atividade inventiva, poderia deduzir das reivindicações e da descrição. Em 2002, no caso Schneidmesser I, o BGH aplicou uma formulação, em que cumpria saber se:
a) O dispositivo acusado resolve o mesmo problema técnico subjacente à invenção protegida através de meios modificados, mas que objetivamente produzem o mesmo efeito técnico; se sim,
b) Se o perito na especialidade poderia ter percebido esse facto na data da prioridade, através do uso dos seus conhecimentos especializados, sem usar atividade inventiva própria; se sim,
c) Se as considerações que o perito teve de usar, ao examinar o dispositivo acusado, o conduziram às regras técnicas da invenção anteriormente patenteada de uma tal maneira que o perito entendeu ou deveria ter entendido o dispositivo acusado como uma variante suficientemente próxima da invenção protegida, a ponto de poder ser considerada uma solução equivalente; se sim,
d) Se o dispositivo acusado carecia de novidade ou ostentava falta de nível inventivo, na data da prioridade da patente anteriormente protegida; se a resposta a esta pergunta for negativa, ocorre violação da patente (Remédio Marques, “Biotecnologia(s)…, citado, páginas 789 a 800; Couto Gonçalves, obra citada, páginas 95 e 96).
De notar que em 10.5.2011 o BGH proferiu um acórdão em que, revogando o em contrário decidido pelas duas instâncias inferiores, convergiu com as decisões proferidas pelos tribunais ingleses e holandeses sobre o mesmo conflito entre invenções (respeitante a um dispositivo de oclusão intravascular, que no caso do demandante compreendia um tecido metálico formado de fios metálicos entrelaçados, com grampos de fixação fixados em ambas as extremidades do dispositivo, enquanto que no dispositivo acusado a fixação fazia-se com apenas um grampo preso a uma das extremidades), sustentando uma interpretação cingida ao sentido literal e, segundo o BGH, indubitavelmente restritivo, da reivindicação, em detrimento dos termos mais genéricos da descrição, entendendo que o dispositivo acusado não violava a patente do demandante (decisão de 10.5.2011, sumariada in Case Law from the Contracting States to the EPC, supra citado, páginas 252 a 254; as decisões dos tribunais holandeses e britânicos estão aí sumariadas, respetivamente, a páginas 251 e 252 e a páginas 247 a 250). O BGH adotou aqui, por conseguinte, uma visão do âmbito de proteção das patentes mais restritiva do que a tradicionalmente seguida pelos tribunais alemães.
No acórdão arbitral recorrido invocou-se a aplicação ao caso da teoria dos equivalentes ou da equivalência, na formulação alemã, citando-se a opinião concordante de Couto Gonçalves e, ainda, a jurisprudência da Câmara de Recurso do Instituto Europeu de Patentes.
Luís Couto Gonçalves propende, de facto, para a visão alemã desta matéria, sintetizando a sua posição considerando que “há infracção do direito de patente por equivalência se a invenção patenteada e a invenção questionada se situarem no âmbito do mesmo problema técnico, apresentarem uma solução idêntica e os elementos modificados (ou variantes) estiverem ao alcance de um perito na especialidade, a partir da interpretação lógica (não estritamente literal) e objectivista (a procura da vontade declarada deve sobrepor-se à procura da vontade do titular da patente) do conteúdo das reivindicações da invenção protegida, de acordo com a orientação hermenêutica do art.º 1.º do Protocolo Interpretativo do art.º 69.º da CPE). Todavia, apesar da equivalência, o âmbito de protecção de uma invenção não deve abranger o equivalente se este for insusceptível de protecção ou for considerado evidente face ao estado da técnica” (Direito Industrial, citado, páginas 100 e 101, sublinhados nossos).
Remédio Marques adopta posição semelhante a esta, in “Medicamentos versus Patentes”, citado, páginas 458 a 460:
Vale isto por dizer que – constatada a inexistência de violação literal do conteúdo das reivindicações (…) haverá violação quando, cumulativamente:
(1) O dispositivo do réu produz o mesmo efeito técnico da invenção reivindicada pelo autor,
(2) O perito na especialidade pode discernir, sem o exercício de actividade inventiva, que, reportado à data da prioridade ou à data do pedido de protecção, a substituição visa desempenhar a mesma função, e
(3) O perito na especialidade percepciona facilmente esta variante (ou essa “relação de substituição”) como uma solução tecnicamente equivalente, uma variante técnica e suficientemente próxima da invenção anteriormente protegida, não obstante utilize meios diferentes, caso a equivalência não puder ser estabelecida senão através da interpretação das reivindicações” (sublinhados nossos).
Remédio Marques adiciona três requisitos negativos, de cuja verificação alternativa decorrerá sempre a inexistência de violação do direito de patente, do qual se realça o primeiro, por ser relevante para o caso sub judice: “o dispositivo acusado, utilizado pelo réu, não pode ser objecto de direito de patente na data da prioridade ou na data do pedido de protecção da patente do autor (excepção do estado livre da técnica); ou seja, não haverá violação da patente se o dispositivo ou processo utilizados pelo réu constituir uma variante evidente do estado da técnica” (Medicamentos versus Patentes, citado, pág.460).
Como se disse, no acórdão recorrido invocou-se também a jurisprudência da Câmara de Recurso do Instituto Europeu de Patentes, mais precisamente a contida na decisão T 697/92. Nessa decisão, redigida em alemão e proferida em 15.6.1994, a Câmara Técnica de Recurso do Instituto Europeu de Patentes, a propósito da apreciação da existência de atividade inventiva num dispositivo destinado a uma máquina-ferramenta, lidou com o conceito de meios equivalentes, considerando que dois meios são equivalentes quando desempenham a mesma função para atingirem o mesmo resultado, embora com modos de realização diferentes. Dois meios desempenham a mesma função quando procedem da mesma ideia fundamental, isto é, quando aplicam o mesmo princípio da mesma maneira. O resultado é a totalidade dos efeitos técnicos produzidos pelos meios. Para serem equivalentes, é necessário que os meios conduzam a um resultado da mesma natureza e da mesma qualidade. Consequentemente, um meio não é equivalente se o seu modo de realização conduz a um resultado da mesma natureza mas de qualidade ou eficácia diferente. Para tal, o resultado não tem de ser melhor, basta que seja diferente, pois não é o resultado em si que é patenteável mas sim o meio como é obtido (vide a publicação do European Patent Office, Case Law of the Boards of Appeal of the European Patent Office, Seventh Edition, September 2013, página 215, consultável em http://documents.epo.org/projects/babylon/eponet.nsf/0/4CCF968D57494023C1257C1C004F992C/$File/case_law_of_the_boards_of_appeal_2013_en.pdf; página 244 da versão francesa, consultável em http://documents.epo.org/projects/babylon/eponet.nsf/0/4CCF968D57494023C1257C1C004F992C/$File/case_law_of_the_boards_of_appeal_2013_fr.pdf).
A aplicação da denominada doutrina dos equivalentes na delimitação do âmbito de proteção da patente foi admitida por esta Relação, em acórdão datado de 17.9.2009, tendo aí sido adotada a formulação enunciada por Couto Gonçalves (processo 893/1995.L1-2, consultável in www.dgsi.pt).
No que concerne ao momento temporal a ter em consideração na apreciação da similitude ou equivalência dos dispositivos em conflito, que determinará o estado da técnica ou os conhecimentos a ter em conta pelo perito na especialidade para se pronunciar, entende-se que deverá ser o momento do pedido da patente ou da prioridade invocada, e não o momento da alegada violação da patente, por aquele ser o mais consentâneo com os interesses em presença, seja os da proteção dos legítimos interesses do titular da patente, seja os da preservação da segurança jurídica e das legítimas expetativas de terceiros (neste sentido, Remédio Marques, Medicamentos e patentes, citado, pág. 461 e Biotecnologia(s), citado, páginas 825 a 827; Couto Gonçalves, Manual de Direito Industrial, citado, pág. 101; Pedro Sousa e Silva, Direito Industrial, citado, pág. 76; Jose Antonio Gomez Segade, “Actividad inventiva y doctrina de los equivalentes”, in Direito Industrial, vol IV, 2005, páginas 53 a 55).
Na avaliação do âmbito de proteção de uma patente, em confronto com o produto, o processo ou a utilização apresentadas por terceiro, importa levar em consideração o problema técnico cuja resolução se visa com a invenção patenteada.
Quanto às patentes europeias, o Regulamento de Execução (que faz parte da Convenção Sobre a Concessão de Patentes Europeias – art.º 164.º n.º 1 da CPE) estipula que a descrição deve descrever a invenção, tal como é caracterizada nas reivindicações, de forma a permitir a compreensão do problema técnico, mesmo que não seja expressamente designado como tal, e a compreensão da solução do problema; mais deve indicar, se for o caso, as vantagens trazidas pelo invento, em relação ao estado da técnica (regra 42, n.º 1 alínea c).
Com efeito, “a apreensão do problema e a sua solução permite compreender a invenção reivindicada, não somente para o efeito de ser sindicada a novidade e o nível inventivo, mas também para determinar o âmbito tecnológico de protecção do direito já constituído, na medida em que os terceiros tenham utilizado elementos essenciais da invenção ou meios equivalentes enquanto solução do mesmo problema: na verdade, as formas de realização que não correspondam ao problema técnico resolvido pelo titular da patente não se acham normalmente compreendidas nesse âmbito de protecção. E isto mesmo ocorre nas invenções químicas” (Remédio Marques, Biotecnologia(s), citado, pág. 875).
Vejamos, então, o que se passa em relação à EP ..., titulada pela demandante.
A sua descrição, contida na certidão junta como doc. n.º 7 da petição inicial (fls 254 e seguintes), inicia-se pela forma seguinte, sob o título “Hemissulfato carbocíclico nucleosídico e a sua utilização no tratamento de infecções virais”:
O presente invento refere-se a um novo sal de (1S,4R)-cis-4-[2-amino-6-(ciclopropilamino)-9H-purin-9-il]-2-ciclopenteno-1-metanol ou a um seu solvato, formulações farmacêuticas contendo um tal composto, e a sua utilização em medicina, especificamente no tratamento da infecção pelo vírus da imunodeficiência humana (VIH) e pelo vírus da hepatite B (VHB).
O (1S,4R)-cis-4-[2-amino-6-(ciclopropilamino)-9H-purin-9-il]-2-ciclopenteno-1-metanol ("o composto") e a sua utilização antiviral, especialmente contra as infecções por VIH, está descrito na descrição da Patente Europeia Número 0 434 450 que também se refere a derivados farmaceuticamente aceitáveis especificamente a sais, ésteres e sais destes ésteres do composto, e em particular descreve sais cloridrato do composto. Para além disso, o Pedido de Patente PCT Nº PCT GB95/02 014 descreve o sal succinato do composto acima.
O composto (1S,4R)-cis-4-[2-amino-6-(ciclopropilamino)-9H-purin-9-il]-2- ciclopenteno-1-metanol está actualmente sob investigação clínica como um agente farmacêutico anti-VIH. Existe a necessidade de o composto ser preparado de uma forma apropriada para facilidade de isolamento em produção em larga escala, e para facilidade de formulação num produto aceitável para administração a humanos. Os requerentes verificaram que a produção da base livre do composto produz um sólido amorfo que se liga a solventes e é, portanto, inadequado para purificação em larga escala ou para formulação, sem técnicas de purificação adicionais.
Enquanto que o sal succinato descrito no Pedido de Patente PCT Nº PCT/GB95/02 014 tem vantagens na sua preparação, por exemplo, forma o sal facilmente a partir de razões estequiométricas do ácido e da base e cristaliza muito facilmente a partir de fora da solução, não é um produto ideal para formulação farmacêutica, especificamente para produção de comprimidos. Em particular, o sal succinato do composto aglomera para formar uma massa "encaroçada" que não se pode facilmente verter e é assim inadequada para utilização em máquinas de compressão comerciais, de tal modo que é necessária uma etapa extra de processamento de moagem, com elevada energia, para se obter um tamanho de partícula uniforme. Uma complicação adicional latente após a formação do sal succinato do composto é de que este pode existir em várias formas cristalinas, cada forma tendo propriedades físicas ligeiramente diferentes. A preparação do sal succinato do composto requer elevada atenção para evitar a preparação de formas indesejáveis, as quais se formadas requerem reprocessamento para se obter a forma desejada.
Os requerentes verificaram que as vantagens do sal hemissulfato do composto sobre os sais cloridrato revelados e sal succinato tornam o sal hemissulfato particularmente apropriado e vantajoso para a preparação em larga escala, e em particular para a utilização na preparação de formulações farmacêuticas. Especificamente, o sal hemissulfato forma um pó que escoa livremente, que não tem qualquer tendência para aglomerar e que é facilmente vertido e compactado, e deste modo é ideal para utilização em máquinas de compressão comerciais sem a necessidade de moagem. Pensa-se que o sal existe numa forma única mórfica e cristalina. O sal não se hidrata ou solvata, facilmente (e.g., no armazenamento). O sal filtra-se e seca facilmente, deste modo facilitando a preparação. Uma vantagem adicional é a elevada solubilidade em água do hemissulfato quando comparado com o succinato, o que torna o hemissulfato particularmente útil para a preparação de formulações líquidas.
Os requerentes também verificaram que quando o sal hemissulfato é preparado por um processo de "troca salina", que é o mesmo que dizer por conversão de um sal precursor de (1S,4R)-cis-4-[2-amino-6-(ciclopropilamino)-9H-purin-9-il]-2-ciclopenteno-1-metanol, particularmente o sal glutarato ou de succinato, é realizável um enriquecimento na pureza óptica sobre a do sal precursor. Assim, a necessidade de qualquer outra etapa preparativa ou de purificação adicional para aumentar a pureza óptica do produto sal hemissulfato pode ser reduzida ou eliminada.
De acordo com o primeiro aspecto do invento, é proporcionado o sal hemissulfato de (1S,4R)-cis-4-[2-amino-6-(ciclopropilamino)-9H-purin-9-il]-2-ciclopenteno-1-metanol ou um seu solvato, incluindo um seu hidrato, aqui referido como o composto de acordo com o invento.
Para evitar dúvidas, tal como aqui utilizado, o sal hemissulfato de (1S,(4R)-cis-4-[2-amino-6-(ciclopropilamino)-9H-purin-9-il]-2-ciclopenteno-1-metanol significa o sal formado entre o (1S,4R)-cis-4-[2-amino-6-(ciclopropilamino)-9H-purin-9-il]-2-ciclopenteno-1-metanol e o ácido sulfúrico numa razão estequiométrica de 2:1.
Ou seja, os requerentes da patente, depois de mencionarem, como fazendo parte do estado da técnica, o abacavir (cujo nome químico, constante na alínea G) dos factos provados, reproduzem), bem como a sua utilização antiviral, especialmente contra as infecções por VIH, referem o problema técnico a resolver, ou seja, a preparação do composto “de uma forma apropriada para facilidade de isolamento em produção em larga escala e para facilidade de formulação num produto aceitável para administração a humanos”, sendo certo que, segundo os requerentes verificaram, “a produção da base livre do composto produz um sólido amorfo que se liga a solvente e é, portanto, inadequado para purificação em larga escala ou para formulação, sem técnicas de purificação adicionais.” A solução apresentada pelos requerentes é, pois, o sal hemissulfato de abacavir, e processo da sua produção, nos termos depois pormenorizados na descrição e com a caracterização das reivindicações reproduzidas supra na alínea FF) da matéria de facto.
Ora, não está provado que o medicamento genérico das demandadas tenha na sua composição hemissulfato de abacavir. Pelo contrário, o pedido de autorização de introdução no mercado apresentado pela 1.ª demandada ao Infarmed refere-se a um medicamento contendo abacavir na forma livre, e não sulfato de abacavir ou, o que é o mesmo, hemissulfato de abacavir (alínea XXX) da matéria de facto). Sendo certo que, como aliás é reconhecido no acórdão arbitral (pág. 45 do acórdão, folha 939 dos autos), o sal hemissulfato de abacavir e a forma livre são distintos do ponto de vista químico.
É certo que se deu como provado que o sal hemissulfato de abacavir ou a forma livre depois de administrados no organismo humano produzem o mesmo efeito (alínea OOO) da matéria de facto). Mas não é o efeito terapêutico da substância protegida pela EP ... que a define e caracteriza face ao estado da técnica, conferindo-lhe nível inventivo, pois, como se reconhece na descrição e aliás resulta das outras patentes tituladas pela demandante, que têm datas de prioridade anteriores à da EP ... (a PT ... reivindica prioridade desde 22.12.1989, a EP ... reivindica prioridade desde 30.3.1995 e a EP ... desde 14.5.1998 – alíneas P), NN) e KK) da matéria de facto) o abacavir e a sua utilização terapêutica já eram conhecidos à data da apresentação do pedido da patente EP ..., estando inclusivamente protegidos pelas outras patentes e pelo certificado complementar de proteção titulados pela demandante. Assim, a substância ativa abacavir, na forma livre, à data do pedido de patente EP ... fazia parte do estado da técnica, não sendo, sem mais, patenteável. Ou seja, não só a substância ativa abacavir, na forma livre, não é tecnicamente equivalente ao hemissulfato de abacavir, tal como este é protegido pela EP ..., pois não resolve o problema técnico aí encarado, como, mesmo que as duas substâncias fossem qualificáveis como tecnicamente equivalentes, a proteção conferida pela EP ... não poderia abarcar o abacavir na forma livre, pois este fazia parte do estado da técnica à data do pedido da EP (requisito negativo supra referido, indicado por Remédio Marques e também por Couto Gonçalves). De facto, como vem sendo aliás defendido na jurisprudência de além fronteiras (vide Remédio Marques, Medicamentos versus patentes, citado, pág. 460, nota 524), o titular da patente não pode, por via da aplicação da doutrina dos equivalentes, obter proteção para algo que não teria conseguido patentear.
Ou seja, in casu, a demandante, que tem na EP ... proteção contra a exploração alheia da substância abacavir, até 28.3.2016 (alínea NN) da matéria de facto), após essa data só beneficiará de proteção em relação ao hemissulfato de abacavir, até 14.5.2018 (alínea KK) da matéria de facto).
É certo que, como se refere no acórdão arbitral, nos termos do n.º 3 do art.º 14.º do Estatuto do Medicamento, “sempre que um medicamento tiver obtido uma autorização de introdução no mercado, quaisquer dosagens, formas farmacêuticas, vias de administração e apresentações adicionais, bem como quaisquer alterações e extensões que venham a ser autorizadas, consideram-se incluídas na autorização de introdução no mercado inicialmente concedida”. E, nos termos do n.º 4, alínea a) do art.º 19.º do EM, entende-se que “os diferentes sais, ésteres, isómeros, misturas de isómeros, complexos ou derivados de uma substância ativa são considerados uma mesma substância ativa, a menos que difiram significativamente em propriedades relacionadas com a segurança ou a eficácia, caso em que o requerente tem de fornecer dados suplementares destinados a comprovar a segurança e a eficácia dos vários sais, ésteres ou derivados de uma substância ativa autorizada.
Porém, tal identificação é feita tendo em vista a similitude dos medicamentos em termos de efeitos terapêuticos, da sua segurança e eficácia, de molde a não se justificar a extensão do prazo da autorização, nomeadamente ao nível de proteção de dados (n.º 4 do art.º 14.º do EM) e poder qualificar-se o medicamento como genérico, para o efeito da dispensa de apresentação dos ensaios pré-clínicos e clínicos referida no n.º 1 do art.º 19.º do EM. Será com base neste artigo 14.º n.º 4 do EM que o medicamento das demandadas poderá ser considerado genérico face ao medicamento da demandante, pese embora o da demandante contenha abacavir em sal sulfato e o das demandadas abacavir na forma livre. Mas, reitera-se, tal tratamento jurídico ao nível do Estatuto do Medicamento não interfere com o regime das patentes, conforme supra explicitado. Como realça Remédio Marques (Medicamentos versus Patentes, citado, pág. 59, nota 61), “o sal ou um diferente isómero de uma substância química podem exprimir uma diferente substância, para efeitos de gozo do período de protecção de dados e dos direitos exclusivos de comercialização e constituir a mesma substância (ou uma substância tecnicamente equivalente), para efeitos do direito de patente, sendo que a inversa também pode ser verdadeira” (sublinhado nosso).
Na contra-alegação a apelada afirma que as demandadas não lograram provar que a composição do seu medicamento genérico contém abacavir base livre, como alegam, e não sulfato de abacavir.
Ora, é sobre a demandante que recai o ónus da prova de que o medicamento das demandadas viola as suas patentes, nomeadamente a EP ..., ou seja, conforme alegaram na petição inicial, que o medicamento das demandadas incorpora hemissulfato de abacavir (art.º 342.º n.º1 do Código Civil).
E isso não se provou, tendo inclusive o tribunal a quo elaborado a sua decisão com base no pressuposto de que o medicamento das demandadas contém abacavir em base livre, argumentando no sentido de que tal facto é irrelevante, por as duas substâncias serem tecnicamente equivalentes.
Admite-se, porém, que o facto de o EM equiparar tendencialmente as substâncias químicas e os seus sais e isómeros para o efeito do reconhecimento do estatuto de genérico a um medicamento e para o efeito da sua integração na mesma AIM facilita a utilização de hemissulfato de abacavir por parte das demandadas em medicamentos genéricos, seja o concretamente alvo do AIM que desencadeou a presente ação, seja outro ou outros, pelo que deverá ter-se isso em atenção, em conformidade, de resto, com a redação da petição inicial e do respetivo petitório. Ou seja, deverá condenar-se as demandadas a absterem-se de importar, fabricar, oferecer, armazenar, introduzir no comércio ou utilizar, em Portugal, medicamentos genéricos com combinação das substâncias ativas Abacavir (base livre) ou hemissulfato de Abacavir, Zidovudina e Lamivudina como princípio ativo, enquanto os direitos de propriedade industrial das Demandantes se encontrarem em vigor, ou seja, até 28 de março de 2016 quanto à substância ativa Abacavir (base livre) – conjugadamente com as substâncias ativas Zidovudina e Lamivudina - e até 14 de maio de 2018 quanto à substância ativa hemissulfato de Abacavir - conjugadamente com as substâncias ativas Zidovudina e Lamivudina.
Quarta questão (montante dos encargos da arbitragem)
A este respeito, além do que consta supra no Relatório, importa realçar o seguinte
Factualismo
1. Na ata de instalação do tribunal arbitral, no ponto 7, atinente a “Encargos da arbitragem”, consta o seguinte:
7.1. Os encargos da presente arbitragem são fixados em 75 000 (setenta e cinco mil euros), a que acresce IVA, neles se compreendendo os honorários dos árbitros e do secretário e os encargos administrativos, com exceção de despesas decorrentes de pretensões das partes, tal como perícias, traduções ou gravações de audiências;
7.2. Dez dias após o envio da petição, as Demandadas deverão pagar 25% do valor referido em 7.1. ao secretário, devendo a Demandada efectuar pagamento idêntico, no mesmo prazo, após o envio da contestação e, dez dias depois de marcada a primeira audiência de julgamento, Demandantes e Demandada, farão um reforço de mais 25% do valor indicado.”
2. Em 20.9.2012 as demandadas declararam que aceitavam intervir na presente ação arbitral e que aceitavam o tribunal arbitral já constituído bem como as regras processuais acordadas entre as partes e os senhores árbitros, de que tinham conhecimento.
3. Em 03.10.2012 o senhor secretário da arbitragem emitiu recibo do pagamento, pelas demandantes, da quantia de € 18 750,00, a título de encargos da ação arbitral.
4. Em 02.11.2012 a 1.ª demandada pagou a quantia de € 18 750,00, a título de encargos com a ação arbitral.
5. Em março de 2013 a demandante procedeu ao pagamento de reforço de provisão a título de encargos da arbitragem, no valor de € 22 784,00.
6. Na audiência de julgamento, realizada em 04.4.2013, foram juntos documentos pela demandante e inquiridas três testemunhas, indicadas pela demandante; as demandadas não se fizeram representar na audiência.
O Direito
O legislador impõe que os litígios emergentes da invocação de direitos de propriedade industrial relacionados com medicamentos de referência e medicamentos genéricos sejam sujeitos a arbitragem necessária. O recurso à arbitragem para a resolução de litígios nesta área é, assim, imposto pelo legislador, ou seja, não assenta, contrariamente à arbitragem voluntária, na vontade das partes, na autonomia privada. De todo o modo, naquilo que não é expressamente regulado no art.º 3.º da Lei n.º 62/2011, de 12.12, a lei manda aplicar o regulamento do centro de arbitragem escolhido pelas partes e, subsidiariamente, o regime geral da arbitragem voluntária. Aliás, também o Código de Processo Civil estipula, quanto ao tribunal arbitral necessário, que em tudo o que não vai especialmente regulado observar-se-á, na parte aplicável, o disposto na lei da arbitragem voluntária (art.º 1528.º do CPC de 1961, art.º 1085.º do CPC de 2013).
As partes não escolheram qualquer regulamento de centro de arbitragem, tendo procedido à constituição de um tribunal arbitral ad hoc, composto por um árbitro designado pelas demandantes iniciais, um árbitro designado pela demandada inicial e um árbitro escolhido pelos árbitros, que ficou a presidir ao tribunal arbitral.
Como já se disse supra, à presente arbitragem é aplicável a Lei n.º 31/86, de 29.8 (LAV).
O art.º 5.º da LAV, sob a epígrafe “encargos do processo”, estipula que “a remuneração dos árbitros e dos outros intervenientes no processo, bem como a sua repartição entre as partes deve ser fixada na convenção de arbitragem ou em documento posterior subscrito pelas partes, a menos que resultem dos regulamentos de arbitragem escolhidos nos termos do artigo 15.º
Na arbitragem necessária, que não assenta na vontade das partes, não existe convenção arbitral. Porém, se na lei que comina a arbitragem necessária nada for imposto em contrário, as partes poderão acordar quanto à remuneração dos árbitros e restantes encargos, seja quanto ao seu quantitativo como à forma de o determinar, seja quanto à repartição do encargo entre elas, sendo certo que poderão remeter tal regulação para um regulamento de arbitragem.
Os árbitros, que não podem ser obrigados a aceitar o encargo, ou seja, que intervêm na arbitragem numa base voluntária (art.º 9.º n.º 1 da LAV), se tiverem conhecimento do acordado pelas partes e ainda assim aceitarem o encargo, sem reparo quanto à sua remuneração, ficarão obrigados ao assim estipulado.
Ou seja, nem as partes podem impor aos árbitros o montante da sua remuneração, nem os árbitros podem impô-lo às partes (cfr. Manuel Pereira Barrocas, “Manual de Arbitragem”, Almedina, 2013, pág. 381; Luís Lima Pinheiro, “Arbitragem Transnacional, a determinação do estatuto da arbitragem”, Almedina, 2005, páginas 150 e 151, nota 421; Bernardo Reis, “O estatuto dos árbitros – alguns aspectos”, Themis, IX.16 (2009), pág. 14; João Luís Lopes dos Reis, “Questões de arbitragem ad hoc”, ROA, n.º 58, 1998, I vol., páginas 510 a 513). Que assim é resulta hoje claramente da atual Lei da Arbitragem Voluntária (Lei n.º 63/2011, de 14.12 – NLAV), em cujo art.º 17.º n.º 1 se estipula que “se as partes não tiverem regulado tal matéria na convenção de arbitragem, os honorários dos árbitros, o modo de reembolso das suas despesas e a forma de pagamento pelas partes de preparos por conta desses honorários e despesas devem ser objecto de acordo escrito entre as partes e os árbitros, concluídos antes da aceitação do último dos árbitros a ser designado.” Caso a matéria não tenha sido regulada na convenção de arbitragem (se tiver sido, os árbitros, conhecedores do teor da convenção, ao aceitarem a designação como árbitros aceitarão também o ali estabelecido) nem sobre ela tiver sido concluído qualquer acordo entre as partes e os árbitros, caberá aos árbitros fixar o montante dos seus honorários e despesas, mas as partes poderão sujeitar tal decisão à apreciação do tribunal estadual (n.º 3 do art.º 17.º da NLAV).
No caso dos autos, além de não haver convenção de arbitragem, não se mostra que tenha sido formalizado qualquer acordo entre as partes e os árbitros sobre os honorários e despesas destes, antes da aceitação do encargo pelos árbitros.
Na sua alegação as apelantes afirmam que “as partes apresentaram uma proposta comum no sentido de, já atentas as previsíveis vicissitudes e natureza do litígio em causa, os honorários a atribuir aos membros do Tribunal Arbitral se fixarem num montante entre € 40 000,00 e € 50 000,00, aos quais acresceria o montante de € 3 000,00, destinado a remunerar os serviços a prestar pelo Exmo. Senhor Secretário” (art.º 50.º das alegações).
Por outro lado, os senhores juízes-árbitros, na resposta que deram ao convite feito pelo relator para se pronunciarem sobre esta matéria, afirmaram que não houve acordo prévio quanto aos encargos da arbitragem, acrescentando que “a Demandante comunicou, na verdade, que não chegou a acordo com as Demandadas e propôs, além do mais, a fixação dos honorários dos três Árbitros em € 50 000,00. As Demandadas propuseram, por sua vez, que esse montante não ultrapassasse os € 40 000,00. A estes valores acresceriam encargos do secretariado.”
Como se vê, os senhores árbitros aceitaram realizar a arbitragem, mas fixaram em € 75 000,00 o montante dos encargos que deveriam ser suportados pelas partes, o que consignaram na ata de instalação do tribunal.
Ora, a demandante não se manifestou contra tal fixação, tendo, pelo contrário, apresentado a sua petição inicial na sequência da notificação que se seguiu e pago o preparo inicial tendo em consideração o a esse respeito estipulado na dita ata de instalação, pagamento esse que reforçou após a designação da data da audiência de julgamento.
Quanto às apelantes, que intervieram na ação em momento posterior à instalação do tribunal arbitral, declararam expressamente aceitar o tribunal arbitral já constituído, bem como as regras processuais acordadas entre as partes e os senhores árbitros, não tendo apresentado qualquer discordância quanto ao estipulado sobre os encargos: pelo contrário, na sequência da apresentação da contestação procederam ao pagamento do preparo determinado na ata de instalação do tribunal arbitral.
Poderá dizer-se, assim, que as partes deram sinais explícitos de aceitação dos valores e regras a este respeito consignados na ata de instalação do tribunal arbitral, pelo que não poderiam depois venire contra factum proprium (neste sentido, Bernardo Reis, “O estatuto dos árbitros – alguns aspectos”, citado, pág. 14). Aliás, as demandadas/apelantes demonstraram expressamente terem aceitado o valor inicialmente fixado para os encargos quando, em 14.3.2013, solicitaram que o valor dos encargos fosse reduzido (fls 819 a 822 dos autos). Aí não questionaram o valor inicialmente fixado, mas tão só solicitaram que o mesmo fosse revisto, atendendo a que, no seu entender, na sequência do decidido no acórdão-saneador, a complexidade da causa revelava-se inferior ao que fora pressuposto da fixação inicial.
E o tribunal arbitral, após a realização da audiência de julgamento, reduziu o valor dos encargos para € 60 000,00 (fls 858 e 859 dos autos).
Redução essa que constitui, afinal, o objeto desta parte do recurso, ou seja, as apelantes, que haviam concordado com o valor dos encargos inicialmente fixado (€ 75 000,00), reagem agora contra a redução dos encargos operada pelo tribunal arbitral, por entenderem que peca por defeito, ou seja, o valor devido a título de encargos deveria ter sido reduzido para montante não superior a € 30 000,00.
Caberá, pois, a esta Relação, apreciar até que ponto as vicissitudes processuais ocorridas após a prolação do acórdão-saneador justificam a redução do valor dos encargos que as partes deverão suportar e que estavam inicialmente fixadas, com o assentimento das partes, em € 75 000,00.
As apelantes invocam o Regulamento das Custas Processuais (RCP) e o Regulamento de Arbitragem do Centro de Arbitragem da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa, aprovado em 2008.
O n.º 7 do art.º 6.º do RCP estipula que “nas causas de valor superior a € 275 000,00, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento.” A filosofia subjacente a esta norma é evitar que, em virtude do mero valor processual da causa sejam colocados a cargo das partes montantes de taxa de justiça excessivamente elevados, atendendo à efetiva complexidade da causa.
No art.º 14.º-A, alíneas c) e d) do RCP, a lei determina a dispensa da segunda prestação da taxa de justiça, nas ações que terminem antes de oferecida a oposição ou em que, devido à sua falta, seja proferida sentença, ainda que precedida de alegações, ou em ações que terminem antes da designação da data da audiência final.
Por sua vez o Regulamento de Arbitragem do Centro de Arbitragem da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa, que na ata de instalação do tribunal arbitral é apontado como subsidiariamente aplicável, prevê, no n.º 5 do art.º 48.º, que “se a arbitragem terminar antes da decisão final, o tribunal arbitral poderá reduzir os seus honorários, tomando em consideração a fase em que o processo arbitral foi encerrado, o tempo despendido pelos árbitros ou qualquer outra circunstância que considere relevante.”
No caso dos autos, o processo seguiu toda a tramitação que era expectável, com articulados, saneador, guião de prova, audiência de julgamento, acórdão final. Por outro lado, o tribunal teve de apreciar na íntegra os pedidos formulados na petição inicial, a que acresceram as exceções aduzidas pela demandada. Teve de decidir vicissitudes atinentes à modificação subjetiva das partes, pedidos de prorrogação de prazos, recurso do saneador, pedido de redução do valor da ação. Tanto o acórdão-saneador, com um voto de vencido, bem como o acórdão arbitral final, atestam que a ação não revestiu simplicidade, e muito menos menor complexidade do que a que era expectável à data da instalação do tribunal arbitral. A nulidade de uma das patentes, arguida pelas demandadas na contestação, não era uma componente do litígio necessariamente previsível, cuja apreciação constituísse pressuposto do montante inicialmente fixado aos encargos. Por isso o facto de o tribunal não ter tido de se pronunciar sobre a verificação da nulidade de uma das patentes não releva para a compressão dos encargos inicialmente estimados. Seja como for, a apreciação da cognoscibilidade dessa exceção suscitou controvérsia entre os juízes-árbitros, como se patenteia nos autos, pelo que adensou a complexidade da tarefa dos julgadores.
Afigura-se-nos, pois, que a redução dos encargos a que, ainda assim, o tribunal arbitral procedeu, é adequada e satisfaz as exigências de proporcionalidade que presidem a esta matéria.
Nesta parte a apelação é, pois, improcedente.
Quinta questão (ilegalidade da decisão de condenação nos encargos e repartição dos encargos da arbitragem)
As apelantes arguem a nulidade da decisão de condenação nos encargos, prevista na alínea c) do n.º 1 do art.º 668.º do CPC (de 1961), por falta de fundamentação quanto à repartição dos encargos.
Nos termos da alínea c) do n.º 1 do art.º 668.º do CPC (de 1961, em vigor à data da prolação da decisão sindicanda), a sentença é nula quando “os fundamentos estejam em oposição com a decisão.”
Já atrás analisámos esta espécie de nulidade. Está aqui em causa uma incoerência ou contradição lógica entre um determinado raciocínio seguido na fundamentação da decisão e a decisão propriamente dita.
Não se descortina, in casu, qualquer contradição. No acórdão, após se descrever os termos do litígio e se enunciar as questões a decidir, apreciou-se as mesmas e concluiu-se pela procedência parcial da ação, ou seja, pela procedência em parte do que fora peticionado pela demandante e pela improcedência da parte restante, condenando-se e absolvendo-se as demandadas em conformidade. Seguidamente condenou-se ambas as partes nos encargos da arbitragem, em proporção que se fixou em ¾ pelas demandadas e ¼ pela demandante. Ao fazê-lo, o tribunal cumpriu o disposto no art.º 23.º n.º 4 da LAV, que estipula que da decisão constará a fixação e repartição pelas partes dos encargos resultantes do processo.
No que concerne à não indicação expressa dos motivos por que se fixou a repartição dos encargos na proporção enunciada na decisão, a lei não comina tal omissão com qualquer nulidade ou anulabilidade, nem na LAV, nem no CPC. A ausência de explicitação das razões da proporção fixada poderá, quando muito, enfraquecer a força persuasiva da decisão tributária proferida, que poderá não resistir à impugnação que a esse respeito seja deduzida.
Quanto à proporção em si, defendem as demandantes que esta viola a regra geral estabelecida no art.º 446.º n.º 1 do CPC, pois as recorrentes não deram causa à presente ação, nem foram parte vencida na proporção de ¾, pelo que nesta parte a decisão recorrida deve ser substituída por outra que conclua pela condenação em custas da demandante, ora recorrida, pelo menos na proporção de 2/3.
Vejamos.
Na arbitragem voluntária, a intervenção dos árbitros decorre do acordo das partes e dos árbitros, tendo uma origem contratual, independentemente da sua qualificação (contrato de mandato, contrato atípico ou sui generis, designado contrato de árbitro, modalidade de contrato de prestação de serviços a que são aplicáveis as regras do mandato, embora com as necessárias adaptações – Luís de Lima Pinheiro, “A arbitragem transnacional”, citado, páginas 129 a 131, Manuel Pereira Barrocas, “Manual de arbitragem”, citado, pág. 324 e seguintes, Bernardo Reis, “O estatuto dos árbitros – alguns aspectos”, citado, pág. 12, João Luís Lopes dos Reis, “Questões de arbitragem ad hoc”, citado, páginas 510 e 511, Mário Raposo, “O estatuto dos árbitros”, ROA, ano 67, setembro de 2007, pág. 529 e seguintes; contra a existência de relação contratual entre os árbitros e as partes na arbitragem voluntária, Pedro Romano Martinez, “Análise do vínculo jurídico do árbitro em arbitragem voluntária ad hoc”, in Estudos em memória do Professor Doutor António Marques dos Santos, volume I, Almedina, 2005, pág. 827 e seguintes; adotando uma posição mista, Mariana França Gouveia, “Curso de Resolução Alternativa de Litígios”, 2012, 2.ª edição, Almedina, páginas 176 e 177 e também, mais recentemente, Mário Raposo, “Os árbitros”, ROA, ano 72, n.ºs 2 e 3, abril/setembro 2012, páginas 498 a 500). Nesse acordo poderá figurar a proporção da responsabilidade das partes nos encargos ou a forma de a determinar. Nada sendo dito em contrário, há quem defenda que a obrigação de pagamento dos honorários será solidária, nomeadamente por aplicação do disposto no art.º 1169.º do Código Civil, ex vi art.º 1156.º (neste sentido, Manuel Pereira Barrocas, “Manual de arbitragem”, citado, páginas 345 e 346; Lopes dos Reis, citado, pág. 512). Tal questão é duvidosa, pois parece que a lei, ao determinar que na decisão arbitral conste a fixação e repartição pelas partes dos encargos resultantes do processo (n.º 4 do art.º 23.º da LAV, n.º 5 do art.º 42.º da NLAV, aqui com ressalva de convenção em contrário pelas partes), impõe a cada parte apenas uma fração dos encargos, mesmo nas relações externas, ou seja, na relação entre as partes e os árbitros, estruturando-se essa obrigação como obrigação conjunta ou parciária (cfr., v.g., Almeida Costa, Direito das Obrigações, 12.ª edição, Almedina, 2013, páginas 661, 662, 664 a 666).
Na arbitragem necessária, que assenta na lei e não na vontade das partes (podendo inclusivamente a parte demandada recusar indicar árbitro), só se houver acordo em contrário celebrado entre as partes e os árbitros é que, cremos, a obrigação pelos encargos com a arbitragem poderá ser qualificada de solidária, face à regra geral de conjunção ou parciaridade das obrigações civis (art.º 513.º do Código Civil), ressalvando-se, tão só, eventual solidariedade entre as partes que partilhem a mesma posição processual (co-demandantes, co-demandados).
No caso sub judice, uma vez que nada foi acordado a esse respeito, caberá, pois, decidir a fração dos encargos que recairá sobre a demandante, de um lado, e as demandadas, do outro.
No silêncio da lei, aceita-se que se atenda ao critério da percentagem do decaimento, por ser o mais justo (neste sentido, Manuel Pereira Barrocas, “Lei de arbitragem comentada”, Almedina, 2013, pág. 156), sem prejuízo de correções decorrentes de situações casuísticas, que justifiquem desvios à regra geral.
O tribunal arbitral absolveu as demandadas dos pedidos de condenação em sanção pecuniária compulsória e na proibição de transmissão da AIM a terceiros e, no mais, julgou a ação procedente. Em termos de divisão da responsabilidade com os encargos da arbitragem, fixou-a em ¾ pelas demandadas e ¼ pela demandante.
Afigura-se-nos que essa percentagem estava, face ao assim decidido, correta. De facto, os pedidos em que a demandante decaíra eram acessórios ou secundários. O pedido essencial era o primeiro, de cuja eventual improcedência resultaria, de resto, a improcedência dos outros dois. Ora, quanto ao primeiro pedido (que as demandadas fossem condenadas a abster-se, em território português, ou tendo em vista a comercialização nesse território, de importar, fabricar, armazenar, introduzir no comércio, vender ou oferecer o medicamento genérico referido no artigo 77.º da p.i. ou, sob estas ou quaisquer outras designações ou marcas, qualquer outro medicamento contendo abacavir ou sulfato de abacavir, zidovudina e lamivudina como princípio ativo enquanto os direitos de propriedade industrial acima referidos se encontrassem em vigor, ou seja, até 14 de maio de 2018), a demandante teve total ganho de causa. Aliás, face a essa vitória a demandante nem sequer impugnou a decisão arbitral no que concerne à parte em que decaiu. Acresce que, embora as demandadas tenham prescindido de intervir na audiência de julgamento e não tenham apresentado alegações antes da decisão final, apresentaram contestação, em que se opuseram à totalidade das pretensões da demandante, seja com base em argumentos processuais, seja de direito substantivo, questionando inclusivamente a validade de uma das patentes invocadas pela demandante, o que contraria o argumento de que a ação foi desnecessariamente instaurada pela demandante, por as demandadas não darem azo ao presente litígio.
Entende-se, pois, que nesta parte da decisão recorrida o tribunal arbitral não violou, contrariamente ao aventado pelas demandadas/apelantes, o disposto nos artigos 5.º e 16.º, alínea a), da LAV, nem os princípios gerais de igualdade, proporcionalidade e adequação, subjacentes ao princípio de acesso ao direito e de um Estado de direito democrático, consagrados nos artigos 2.º, 13.º, 17.º, 18.º, 19.º, 20.º e 22.º da Constituição da República Portuguesa.
Porém, a verdade é que, conforme supra exposto, esta Relação entende que o medicamento das demandadas, com a composição abacavir (base livre), zidovudina e lamivudina, apenas cede perante as patentes da demandante até 28.3.2016, e só quanto à composição hemissulfato de abacavir, zidovudina e lamivudina é que esses direitos se estendem a 14.5.2018. Tal implica o recuo da proteção reconhecida à demandante, o que faz acrescer o seu decaimento em termos que justificam que se fixe a proporção da obrigação das partes, quanto ao pagamento dos encargos da arbitragem, em 1/3 pela demandante e 2/3 pelas demandadas.
As apelantes invocam ainda que entendimento contrário ao seu significa que o art.º 3.º da Lei n.º 62/2011 estará a ser interpretado no sentido de permitir o estabelecimento obrigatório de encargos adicionais – os inerentes às ações arbitrais – para as entidades requerentes de AIMs de medicamentos genéricos, apenas pelo mero facto de as terem requerido. Tal poderá configurar, no entender das apelantes, uma violação direta da Directiva 2001/83/CE, de 06.11.2001, do Regulamento n.º 726/2004, de 31.3.2004 e dos artigos 4.º e 34.º do Tratado de Funcionamento da União Europeia, o que acarretaria a inconstitucionalidade desse artigo (o art.º 3.º da Lei n.º 62/2011), por violação do art.º 8.º da CRP, que consagra o primado do direito comunitário no seu n.º 4.
Vejamos.
Conforme resulta do aduzido acima a propósito da primeira questão do recurso, a Lei n.º 62/2011 procurou satisfazer os fins visados pela legislação comunitária tendo em vista a conjugação dos interesses dos laboratórios produtores de medicamentos de referência, que carecem de estímulo para prosseguirem as suas onerosas atividades de investigação e, por outro lado, os interesses dos consumidores e da comunidade em geral, no que concerne ao acesso a medicamentos mais baratos. Para isso consagrou-se expressamente a inexistência de patent linkage, ou seja, separou-se a aprovação administrativa de entrada no mercado do medicamento genérico de quaisquer eventuais controvérsias atinentes aos direitos de propriedade industrial da empresa produtora do medicamento de referência. Por outro lado, impôs-se o recurso à arbitragem necessária, nos termos já supra expostos, para a apreciação jurisdicional de eventuais direitos de propriedade industrial da empresa do medicamento de referência. Tais arbitragens, se e quando forem instauradas, terão, evidentemente, custos, mas o seu montante poderá, como já supra se referiu, ser fixado com o acordo das partes e é suscetível, no caso contrário, de fiscalização pelos tribunais estaduais. Por outro lado, não nos consta que a legislação dos outros países da União Europeia preveja mecanismos que isentem as empresas de genéricos de litigiosidade jurisdicional por parte das empresas de medicamentos de referência e/ou as proteja dos respetivos custos.
Não se perfila, pois, a nosso ver, que nesta perspetiva o art.º 3.º da Lei n.º 62/2011 viole a legislação comunitária e o art.º 8.º da CRP.
Em conclusão, a apelação é parcialmente procedente, na parte em que se restringe a proteção conferida pela EP ... à substância ativa hemissulfato de abacavir ou sulfato de abacavir e não ao abacavir base livre. No mais, a apelação improcede, mantendo-se a decisão recorrida nos seus precisos termos, a não ser quanto à proporção da responsabilidade por custas na primeira instância, que se altera tão só como consequência da supra dita modificação do juízo formulado quanto ao objeto da proteção da EP .... Afigura-se-nos que o decaimento das apelantes no recurso excede o da apelada em proporção correspondente a 2/3 pelas apelantes e 1/3 pela apelada (art.º 527.º n.º 1 e 2 do CPC de 2013, art.º 446.º n.ºs 1 e 2 do CPC de 1961).

DECISÃO
Pelo exposto, julga-se a apelação parcialmente procedente e consequentemente:
a) Revoga-se o n.º 2 do acórdão arbitral e em sua substituição condena-se as demandadas a absterem-se de importar, fabricar, oferecer, armazenar, introduzir no comércio ou utilizar, em Portugal, medicamentos genéricos com combinação das substâncias ativas Abacavir (base livre) ou hemissulfato de Abacavir, Zidovudina e Lamivudina como princípio ativo, enquanto os direitos de propriedade industrial das Demandantes se encontrarem em vigor, ou seja, até 28 de março de 2016 quanto à substância ativa Abacavir (base livre) – conjugadamente com as substâncias ativas Zidovudina e Lamivudina - e até 14 de maio de 2018 quanto à substância ativa hemissulfato de Abacavir - conjugadamente com as substâncias ativas Zidovudina e Lamivudina;
b) No mais mantém-se o acórdão recorrido, à exceção das custas da arbitragem, que serão suportadas pelas partes na proporção de 1/3 pela demandante e 2/3 pelas demandadas.
As custas da apelação são a cargo das apelantes e da apelada, na proporção de 2/3 pelas apelantes e 1/3 pela apelada.
Comunique-se a presente decisão ao Infarmed e ao INPI.

Lisboa, 06.02.2014

Jorge Manuel Leitão Leal
Ondina Carmo Alves
Eduardo José Oliveira Azevedo
Decisão Texto Integral: