Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
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| Relator: | OLINDO GERALDES | ||
| Descritores: | BENFEITORIAS NECESSÁRIAS AMPLIAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO | ||
| Nº do Documento: | RL | ||
| Data do Acordão: | 09/20/2007 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | CONFIRMADA A DECISÃO | ||
| Sumário: | I. A ampliação da matéria de facto, nos termos do n.º 4 do art.º 712.º do CPC, justifica-se relativamente aquela que foi alegada e é relevante para a justa decisão da causa. II. Pode ser qualificada como benfeitoria necessária a obra que, impedindo as infiltrações de águas pluviais e salvaguardando a estrutura, pode ter como fim evitar a deterioração do prédio. III. Tratando-se apenas de benfeitorias necessárias, as despesas com as obras no prédio são comparticipadas por todos os comproprietários, nos termos consagrados no n.º 1 do art.º 1411.º do CC. (O.G.) | ||
| Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: I. RELATÓRIO Maria e marido, António, instauraram, em 24 de Abril de 1998, no então 16.º Juízo Cível da Comarca de Lisboa, contra José e mulher, A, acção declarativa, sob a forma de processo sumário, pedindo que os Réus fossem condenados a pagar-lhe a quantia de 1 600 809$00, acrescida de juros vincendos. Para tanto, alegaram, em síntese, que, sendo todos comproprietários do prédio urbano, sito na Rua da Esperança do Cardal,(…), efectuaram os Autores obras de reparação da fachada e cobertura do referido prédio, depois de intimação da Câmara Municipal de Lisboa, não tendo os RR. pago a sua quota parte, não obstante tenham sido interpelados, para o efeito, em 4 de Janeiro de 1998. Contestaram os RR., por impugnação, designadamente o valor das obras e a sua natureza, concluindo pela sua absolvição do pedido. Deduzindo ainda reconvenção, pediram, para além do mais, a condenação dos AA. no pagamento da quantia de 700 000$00, pelos danos sofridos nas mobílias por causa das obras. Os AA. replicaram, no sentido da improcedência da reconvenção. Realizada a audiência de discussão e julgamento, com gravação, foi proferida, em 18 de Dezembro de 2006, a sentença, que condenou os RR. a pagarem aos AA. a quantia de € 7 790,57, acrescida de juros, à taxa legal, sobre a quantia de € 7 769,72, a contar de 4 de Janeiro de 1998, e sobre a quantia de € 20,85, a contar de 26 de Outubro de 1998, até integral pagamento, e absolveu os AA. do pedido reconvencional. Inconformados com a sentença, os RR. apelaram e, tendo alegado, formularam, no essencial, as seguintes conclusões: a) Deverá proceder-se a novo julgamento a fim de se dilucidar as obras realmente executadas. b) Os quesitos 6.º, 7.º, 8.º, 14.º, 15.º, 16.º, 17.º e 18.º a 35.º devem merecer respostas afirmativas. c) Aos recorrentes não podem ser imputados quaisquer custos por obras irregulares. d) Não se podem considerar as obras como benfeitorias necessárias, já que estão inquinadas pelo vício de invalidade, pois foram executadas irregularmente sem a respectiva licença camarária. e) Os reconvindos foram responsáveis pela deterioração da mobília dos recorrentes. f) A sentença recorrida violou os art.º s 1411.º do Código Civil e 653.º, n.º 2, do Código de Processo Civil. Pretendem, com o provimento do recurso, a sua absolvição do pedido e a condenação dos Autores a pagar-lhes a quantia de € 2 000,00. Os AA. não contra-alegaram. Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir. Neste recurso, está em discussão, para além da decisão sobre a matéria de facto, a contribuição do comproprietário nas despesas do prédio e ainda a responsabilidade civil. II. FUNDAMENTAÇÃO 2.1. Foram dados como provados os seguintes factos: 1. AA. e RR. são comproprietários do prédio urbano, sito na Rua da Esperança do Cardal, (…), Conservatória do Registo Predial de Lisboa. 2. Esse imóvel foi sofrendo graves deteriorações, sem nunca terem sido efectuadas obras de conservação. 3. Em 26 de Fevereiro de 1997, os AA. foram intimados pela Câmara Municipal de Lisboa (CML), como co-proprietários, para, no prazo de vinte dias, contados da publicação em boletim municipal, darem início às obras de reparação e consolidação da cobertura e fachada do prédio, com vista à eliminação das anomalias indicadas no auto de vistoria. 4. Nessa intimação é dito que “ficam os restantes co-proprietários igualmente vinculados a realizar as obras”. 5. Os AA., em 3 de Março de 1997, informaram os RR. da intimação da CML e pediram-lhes para os contactarem, no prazo de cinco dias, para procederem às obras, caso contrário eles próprios dariam início ás mesmas. 6. Em 13 de Março de 1997, os RR. responderam, dizendo que não autorizavam que se desse início a quaisquer obras sem que, previamente, sejam por eles pedidos orçamentos para as referidas obras. 7. Em 20 de Março de 1997, os AA. comunicaram aos RR. que lhes comunicassem, por escrito, o dia e a hora da semana de 24 a 27 de Março de 1997, para serem feitos os orçamentos, e informaram os RR. de que, no caso de negarem a colaboração e colocarem obstáculos à realização das referidas obras, iniciariam aquelas que pudessem ser feitas sem a colaboração dos RR. 8. Os RR. nada disseram a essa carta. 9. No dia 3 de Julho de 1997, os AA. enviaram aos RR. carta registada com aviso de recepção, que não foi levantada pelos RR. 10. Nessa carta, os RR. eram informados de que, dentro de quinze dias, iriam ter início as obras e da necessidade dos RR. retirarem do sótão objectos que lhes pertençam, desresponsabilizando-se de quaisquer danos. 11. O R. requereu, em 18 de Março de 1997, à CML, que lhe fosse concedida uma prorrogação do prazo, para a realização das obras, de forma a concorrer aos benefícios do RECRIPH. 12. Em 24 de Março de 1997, os AA. pediram à CML uma prorrogação do prazo de início das obras, em virtude da demora dos RR. na resposta solicitada, o que foi concedido, tendo sido taxados na quantia de 4 180$00, que os AA. pagaram. 13. Em 9 de Julho de 1997, os AA. enviaram aos RR. carta registada com aviso de recepção, que voltou a não ser levantada pelos RR. 14. Nessa carta reiteraram a informação da carta de 3 de Julho de 1997. 15. Os RR. não fizeram qualquer diligência no sentido de darem início às obras referidas. 16. Os AA. pediram orçamentos para a remodelação da cobertura e da fachada do prédio a C, e F. 17. Os AA. escolheram o orçamento que lhes pareceu mais vantajoso. 18. As obras constantes desse orçamento foram efectuadas. 19. Os AA. adjudicaram as obras a N. Lda. 20. Os RR. não pagaram aos AA. qualquer quantia. 21. As obras de remodelação da fachada e cobertura do prédio foram executadas por N. Lda., e integralmente pagas, no valor de 3 107 576$00, pelos AA. (resposta ao quesito 4.º). 22. Em 4 de Janeiro de 1998, os AA. enviaram aos RR. cópias das facturas e recibos relativos às obras no prédio e interpelaram-nos para, no prazo de oito dias, procederem ao pagamento da quantia de 1 553 788$00, referente à sua comparticipação, 1 900$00, referente a cartas e registos, 1 601$00, referente à cobertura para a chaminé, e 400$00, referente a fotocópias dos recibos e facturas juntos à carta enviada aos RR. 23. Os AA. efectuaram um prolongamento da cobertura a tardoz, para a zona do terraço, numa área de cerca de 10 m2, para prevenir as infiltrações no quarto a tardoz e que, para acompanhamento desse prolongamento, edificaram duas paredes em alvenaria, cada uma com cerca de 0,30 m x 2,00m x 1,10 m, melhorando sensivelmente as condições de salubridade e habitabilidade do imóvel, na medida em que impede infiltrações de águas pluviais e o enfraquecimento da estrutura (16.º, 36.º e 37.º). 24. Os RR. enviaram à CML o escrito a que se refere a cópia de fls. 130, em 18 de Agosto de 1997, e efectuaram junto da Polícia Municipal de Lisboa a denúncia de fls. 2 do processo camarário apenso com o n.º 378, em 18 de Agosto de 1997 (19.º). 25. Na sequência dessas denúncias, a CML enviou um fiscal ao local, tendo este elaborado o respectivo auto (20.º). 26. Em 25 de Junho de 1998, os RR. enviaram à CML o escrito a que se refere a cópia de fls. 134 a 136 (24.º). 27. Em Setembro de 1998, os AA. voltaram a fazer obras no edifício, sem autorização dos RR. (25.º e 26.º). 28. Em 11 de Setembro de 1998, os RR. enviaram à CML o escrito a que se refere a cópia de fls. 132 (27.º). 2.2. Descrita a matéria de facto dada como provada, importa conhecer do objecto do recurso, delimitado pelas respectivas conclusões, e cujas questões jurídicas emergentes foram já especificadas. Os apelantes impugnaram a decisão sobre a matéria de facto, a qual, nos termos do art.º 712.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (CPC), pode ser alterada pela Relação. É, nesse âmbito, que se procede à reapreciação da prova (art.º 712.º, n.º 2, do CPC), partindo da impugnação apresentada, nos termos do art.º 690.º-A do CPC, pelos recorrentes. Preliminarmente, convém considerar, no entanto, que a apelada, no depoimento de parte prestado, confessou parte da matéria integrante dos quesitos 7.º e 28.º da base instrutória, cuja resposta negativa se impugnou, sendo certo que a confissão foi reduzida a escrito (fls. 456). Em resultado dessa confissão, ficou também provado: - Os RR. contactaram, em Março de 1997, os AA., com o intuito de os alertar para a possibilidade de a Câmara vir a comparticipar de forma significativa nas obras a realizar. - Quando das obras no Verão de 1997, os AA. retiraram do sótão, sem o consentimento dos RR., uma cama, uma mesinha de cabeceira e um baú, que haviam pertencido à mãe da R. Face à confissão deixou de haver necessidade de responder, nessa parte específica, à matéria dos mencionados quesitos, atento o disposto no n.º 4 do art.º 646.º do CPC. Assim, as respostas negativas aos quesitos 7.º e 28.º da base instrutória têm de ser entendidas como referindo-se apenas à respectiva matéria que não foi objecto de confissão. Resta referir ainda, a propósito da alegada deficiência de inquirição, que a repetição do julgamento pode ser motivada numa deficiência da matéria de facto (712.º, n.º 4, do CPC), mas não em depoimento deficiente, em relação ao qual se pode exercer o princípio do contraditório. Seguindo os termos da impugnação dos recorrentes, as respostas aos quesitos 6.º, 7.º e 8.º da base instrutória não merecem ser alteradas. Para além da prova da confissão, que antes se referiu, mas que agora não interessa, não existe nos autos prova da respectiva matéria, mesmo a indicada pelos recorrentes. O documento de fls. 134 a 136, que corresponde a uma carta dos recorrentes dirigida à Câmara Municipal de Lisboa, não é idóneo, designadamente pelo seu conteúdo. O mesmo acontece com o documento de fls. 137 a 142, titulado como sendo um “relatório técnico”. O documento de fls. 175, que é cópia do de fls. 451, servindo de “audiência prévia” do recorrente a um procedimento administrativo da CML, não releva, também pelo seu conteúdo para uma resposta positiva. Relativamente ao quesito 14.º (os AA. realizaram obras sem licença camarária), também com resposta negativa, não há fundamento para se proceder à sua modificação. Com efeito, não foi produzida prova que permita uma resposta afirmativa ao quesito, sendo certo que o mesmo, pelo teor da sua formulação, admitia prova testemunhal. Desde logo, o depoimento da testemunha indicada pelos recorrentes, (…), não incluiu a matéria do quesito 14.º. De qualquer modo, aquilo que a testemunha declarou não possibilita, seguramente, uma resposta afirmativa, chegando a mesma afirmar que foram executadas “rigorosamente as obras da intimação”. O documento de fls. 43 a 49, que constitui a proposta de orçamento do empreiteiro, nada prova quanto à falta de licença. O mesmo se pode afirmar quanto ao documento de fls. 74 e 75, referente ao orçamento do empreiteiro “por trabalhos a mais”. Também a carta dos recorrentes para a CML e o relatório técnico, já antes referidos (fls. 134 a 142), não provam o facto controvertido. O documento de fls. 451, embora mencione “a existência de obras de alteração não licenciadas, consistindo em: alteamento da cobertura e prolongamento desta a tardoz, com construção das respectivas paredes em alvenaria” é insuficiente para uma resposta positiva, porquanto, referindo-se o mesmo à audiência prévia em procedimento administrativo, não reflecte a decisão final, nomeadamente sobre a falta de licença de parte das obras, que podia ser diferente. Obviamente, que a resposta positiva conjunta aos quesitos 16.º, 36.º e 37.º, conforme foi alegado, não serve para sustentar outra resposta, pois a modificação da matéria de facto, emergente da impugnação nos termos do art.º 690.º-A do CPC, tem de resultar de um certo meio de prova. A matéria do quesito 15.º (obras que alteraram substancialmente o imóvel) é inteiramente conclusiva, pelo que nem resposta (negativa) merecia ter tido (art.º 646.º, n.º 4, do CPC). Também os quesitos 16.º (resposta parcialmente positiva) e 17.º não justificam uma resposta totalmente afirmativa. Desde logo, a testemunha (…) não respondeu à matéria do quesito 16.º. Por outro lado, quanto ao quesito 17.º, a versão da testemunha é diferente da matéria constante do quesito, como, aliás, se referiu na fundamentação da decisão sobre a matéria de facto (fls. 464), enquanto os referidos documentos de fls. 134 a 142 e 451 não são idóneos para provar a matéria em causa. Relativamente aos quesitos 18.º a 27.º também não há fundamento para alterar as respostas dadas, num sentido totalmente positivo, para além de que o quesito 20.º obteve até tal resposta (fls. 463). O depoimento da testemunha (…), que respondeu apenas à matéria dos quesitos 21.º e 23.º, foi muito vago e inconclusivo, não permitindo uma resposta positiva. Por sua vez, os documentos de fls. 134 a 142 e 451, pelos motivos já referidos, também não determinam uma resposta diferente. Os documentos, sendo meios de prova, destinam-se à demonstração da realidade de factos alegados, designadamente dos da base instrutória. Tendo essa finalidade, não faz sentido a pretensão dos recorrentes, que, além de uma resposta inteiramente positiva aos quesitos, pretendem ainda que seja “transcrito como ponto de facto o teor dos documentos e não a sua simples evocação”. No tocante aos quesitos 28.º a 33.º, para além da matéria que foi objecto de confissão, anteriormente especificada, não há motivo para alterar as suas respostas, com excepção da resposta ao quesito 29.º. Com efeito, do depoimento da testemunha (…), vizinha do prédio, resulta que os móveis referidos foram colocados no logradouro do rés-do-chão. Assim, a resposta ao quesito 29.º da base instrutória deve passar a ser a seguinte: Os referidos móveis foram colocados no logradouro do rés-do-chão. Todavia, quanto ao mais, tanto aquele depoimento como o de J e A não se mostram concludentes, dado o seu teor vago e genérico, para se obter, com um grau elevado de probabilidade, a convicção da respectiva veracidade. Finalmente, no que se refere aos quesitos 34.º e 35.º, os meios de prova indicados pelos recorrentes não possibilitam a modificação da resposta negativa. Na verdade, o depoimento da testemunha J mostra-se muito vago, senão mesmo desconhecedor, da matéria em causa. E a prova documental indicada, designadamente as fotografias de fls. 448 a 450, sem a conjugação de outra prova, é insuficiente para suportar uma resposta afirmativa. Nesta conformidade, para além da resposta ao quesito 29.º, não se surpreende qualquer outra flagrante desconformidade com a prova produzida ou, até mesmo, uma simples desconformidade. 2.3. Em resultado da confissão e da alteração da decisão sobre a matéria de facto, está também provado: 29. Os RR. contactaram, em Março de 1997, os AA., com o intuito de os alertar para a possibilidade de a Câmara vir a comparticipar de forma significativa nas obras a realizar (confissão). 30. Quando das obras no Verão de 1997, os AA. retiraram do sótão, sem o consentimento dos RR., uma cama, uma mesinha de cabeceira e um baú, que haviam pertencido à mãe da R. (confissão). 31. Os referidos móveis foram colocados no logradouro do rés-do-chão (resposta ao quesito 29.º). 2.4. Os recorrentes alegaram, ainda também, que a resposta totalmente afirmativa ao quesito 4.º, por ser vaga e conclusiva, deve dar lugar a novo julgamento, com vista à especificação das obras realizadas. O art.º 712.º, n.º 4, do CPC, permite a repetição do julgamento, quando a matéria de facto padeça de deficiência, obscuridade ou contradição, bem como ainda quando se torne indispensável proceder à sua ampliação. Embora a resposta ao quesito 4.º, que não foi objecto de impugnação nos termos do art.º 690.º-A do CPC, se apresente algo genérica, correspondendo ao alegado na petição inicial, não se pode qualificá-la como sendo deficiente ou obscura, sendo certo que os recorrentes, no momento próprio, não reclamaram sequer da respectiva base instrutória, invocando esse fundamento (art.º 511.º, n.º 2, do CPC). A resposta, por outro lado, não é conclusiva, pois, se o fosse, a consequência seria considerá-la como não escrita (art.º 646.º, n.º 4, do CPC). A ampliação da matéria de facto também não se justifica, na medida em que não deriva de uma resposta à mesma, mas antes da matéria de facto alegada e relevante para a justa decisão da causa. Nestas condições, não se verificando qualquer dos fundamentos previstos no n.º 4 do art.º 712.º do CPC, carece de justificação a repetição parcial do julgamento. 2.5. Delimitada a matéria de facto, importa agora apreciar as questões substantivas colocadas pelo recurso, cuja procedência dependia, sobretudo, da alteração relevante da decisão sobre a matéria de facto, que, como se viu, não se verificou. Os comproprietários devem contribuir para as despesas necessárias à conservação ou fruição da coisa comum, de acordo com a proporção das suas quotas, nos termos da regra prescrita no n.º 1 do art.º 1411.º do Código Civil (CC). Como consta da respectiva epígrafe, a referida contribuição respeita às benfeitorias necessárias, isto é, às despesas feitas tendo por fim evitar a perda, destruição ou deterioração da coisa (art.º 216.º, n.º s 1 e 3, do CC). Os proprietários do imóvel identificado nos autos foram, com efeito, intimados pela respectiva câmara municipal a realizar obras, com vista à reparação e consolidação da cobertura e fachada do prédio. Os apelados realizaram as obras de remodelação da fachada e cobertura do prédio, que pagaram integralmente, como ficou demonstrado. Essas obras incluíram o prolongamento da cobertura a tardoz, para a zona do terraço, numa área de cerca de 10 m2, para prevenir as infiltrações no quarto a tardoz e que, para acompanhamento desse prolongamento, edificaram duas paredes em alvenaria, cada uma com cerca de 0,30 m x 2,00m x 1,10 m, melhorando sensivelmente as condições de salubridade e habitabilidade do imóvel, na medida em que impede infiltrações de águas pluviais e o enfraquecimento da estrutura. Para além de não ter ficado demonstrada a irregularidade das obras, designadamente da que se especificou, não se provou que as mesmas não se adequassem à imposição camarária, sendo certo ainda que nos autos não existe também prova da ordem definitiva de demolição de parte das obras executadas. A obra especificada, impedindo as infiltrações de águas pluviais e salvaguardando a respectiva estrutura, pode ter tido como fim evitar a deterioração do prédio e, por isso, poder qualificar-se como benfeitoria necessária. Dessa benfeitoria resultou, aliás, como ficou provado, a melhoria das condições de salubridade e habitabilidade. Neste contexto, tratando-se apenas de benfeitorias necessárias, as despesas com as obras no prédio são comparticipadas por todos os comproprietários, nos termos consagrados no n.º 1 do art.º 1411.º do CC. De resto, os recorrentes não lograram provar, como lhes competia, qualquer facto extintivo do dever jurídico de comparticipação nas benfeitorias necessárias. Por isso, não podem os recorrentes eximir-se ao pagamento da sua quota-parte nas despesas com as obras executadas no prédio, na sequência de intimação camarária, justificando-se a sua condenação no pedido, tal como se entendeu na decisão recorrida. Por sua vez, quanto à responsabilidade civil imputada aos recorridos, não fornecem os autos factos que a consubstanciem. Efectivamente, para além de não estar demonstrada o pressuposto da ilicitude, por violação de um direito subjectivo dos recorrentes, também não se provou a existência do pressuposto do dano, sendo certo que os pressupostos da responsabilidade civil, tal como está concebida no art.º 483.º, n.º 1, do CC, são de verificação cumulativa. Na verdade, ficou apenas provado que os recorridos retiraram do sótão, sem o consentimento dos recorrentes, uma cama, uma mesinha de cabeceira e um baú, que haviam pertencido à mãe da recorrente, colocando-os no logradouro do prédio. Esta factualidade, porém, é insuficiente para tipificar a ilicitude do facto da autoria dos recorridos e completamente omissa quanto ao dano, sendo certo que é a ocorrência deste que principalmente justifica a efectivação da responsabilidade civil. Assim, não sendo possível imputar-se a responsabilidade civil aos recorridos, improcede o pedido reconvencional, nomeadamente quanto ao pedido de indemnização correspondente a € 2 000,00. 2.6. Em conclusão: 1) A ampliação da matéria de facto, nos termos do n.º 4 do art.º 712.º do CPC, justifica-se relativamente aquela que foi alegada e é relevante para a justa decisão da causa. 2) Pode ser qualificada como benfeitoria necessária a obra que, impedindo as infiltrações de águas pluviais e salvaguardando a estrutura, pode ter como fim evitar a deterioração do prédio. 3) Tratando-se apenas de benfeitorias necessárias, as despesas com as obras no prédio são comparticipadas por todos os comproprietários, nos termos consagrados no n.º 1 do art.º 1411.º do CC. Nestes termos, improcede no essencial a apelação, sendo caso para se confirmar a decisão recorrida, proferida em harmonia com a lei aplicável. 2.7. Os recorrentes, ao ficarem vencidos por decaimento, são responsáveis pelo pagamento das custas, em conformidade com a regra da causalidade consagrada no art.º 446.º, n.º s 1 e 2, do CPC. Todavia, gozando os recorrentes do apoio judiciário, é inexigível o seu pagamento. III. DECISÃO Pelo exposto, decide-se: 1) Negar provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida. 2) Condenar os recorrentes no pagamento das custas, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficiam. Lisboa, 20 de Setembro de 2007 (Olindo dos Santos Geraldes) (Ana Luísa de Passos G.) (Fátima Galante) |