Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
5659/04.7TBSXL.L1-2
Relator: ONDINA CARMO ALVES
Descritores: ALIMENTOS DEVIDOS A MENORES
FIXAÇÃO DA PENSÃO
OBRIGAÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 09/17/2009
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO
Sumário: 1. Não tem sido unívoco o entendimento jurisprudencial quanto à questão de saber se o legal dever parental de contribuir com alimentos para o sustento dos filhos menores deve sempre ser fixado pelo Tribunal, mesmo nas situações em que nada se haja apurado acerca da vida social e profissional do progenitor vinculado à prestação de alimentos.
2. Para uma corrente jurisprudencial, a fixação da pensão de alimentos não é obrigatória nas decisões que regulam o poder paternal, sempre que o obrigado não tiver quaisquer meios para cumprir esse dever de prestar alimentos. E, nestas circunstâncias, o Tribunal deverá abster-se de fixar qualquer pensão de alimentos, por forma a dar cumprimento ao critério da proporcionalidade plasmado no artigo 2004º, nº 1 do Código Civil.
3. Para outra corrente jurisprudencial, o Tribunal deve sempre proceder à fixação de alimentos a favor do menor, ainda que desconheça a concreta situação da vida do obrigado a alimentos, visto que o interesse do menor sobreleva a questão da indeterminação ou do não conhecimento dos meios de subsistência do obrigado a alimentos, cabendo a este o ónus de prova da impossibilidade total ou parcial de prestação de alimentos.
4. O argumento da necessidade de se obter uma condenação judicial para accionar o Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menor não pode ser invocado para se defender a obrigatoriedade de fixação de alimentos, já que tendo em consideração os requisitos cumulativos consagrados no artigo 1º da Lei nº 75/98, de 19/11, sempre se terá de entender que este regime não pretendeu afastar o critério da proporcionalidade consagrado no artigo 2004º, nº 1 do Código Civil, pelo que apenas estão abrangidos por tal regime os casos em que é possível proceder à necessária e prévia correlação entre as necessidades do alimentando e as possibilidades do obrigado.
5. O desconhecimento da situação do requerido - progenitor vinculado à prestação de alimentos - impede o recurso à inversão do ónus de prova, pois esta apenas ocorre quando a parte contrária culposamente tiver tornado impossível a prova ao onerado (artigo 344º, nº 2 do C.C.).
(Sumário da Relatora)
Decisão Texto Integral: ACORDAM OS JUÍZES DA 2ª SECÇÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA

RELATÓRIO
B..., veio instaurar contra C..., com última residência conhecida na..., acção de regulação do exercício do poder paternal referente à menor D..., nascida a 26.03.1991, ... filha da requerente e do requerido.
O requerido foi citado editalmente, após várias diligências com vista ao apuramento do seu paradeiro.
A requerente prestou declarações na conferência de pais entretanto designada e foi efectuado pelo Instituto de Reinserção Social o relatório social que consta de fls. 49 a 53.
O Ministério Público emitiu parecer no sentido de que a menor deveria ficar à guarda da mãe que exerceria o poder paternal, podendo o progenitor visitar a menor em casa da mãe, sem prejuízo das horas de repouso e rotina caseiras e devendo este pagar uma prestação de alimentos mensal em valor não inferior a cem euros.
Por se considerar que requerente e requerido tinham nacionalidade cabo-verdiana, foi ordenada a junção aos autos da respectiva legislação de Cabo Verde referente às relações entre pais e filhos e à obrigação de prestar alimentos.
O Tribunal a quo proferiu decisão nos seguintes termos:
a) Confiar a menor à guarda e cuidados da mãe que exercerá o poder paternal;
b) O requerido poderá visitar a menor na casa da requerente, sem prejuízo do normal descanso e das actividades escolares da menor;
c) Não fixar, por ora, pensão alimentícia, dado que são desconhecidas as condições económicas do requerido.

Inconformado com o assim decidido, o Magistrado do Ministério Público interpôs recurso de apelação, relativamente à sentença prolatada.
São as seguintes as CONCLUSÕES do recorrente:
i) A sentença ora recorrida, abstém-se de fixar a pensão de alimentos a cargo do requerido/pai a favor da menor D..., "dado que são desconhecidas as condiçoes económicas do requerido".
ii) A fixação de alimentos é uma das três questões essenciais a decidir na sentença que regula o exercício do poder paternal, não devendo o progenitor ficar desresponsabilizado do dever de contribuir para a alimentação da menor.
iii) Ora, decorre que na regulação do poder paternal deverá sempre fixar-se a pensão alimentícia e a forma de a prestar, independentemente da precária, ou desconhecida situação económica do progenitor a quem o menor não fique confiado.
iv) Por outro lado, do artigo 69.° da Constituição da República Portuguesa resulta que as crianças têm direito à protecção da sociedade e do Estado, com vista ao seu desenvolvimento integral.
v) Competindo aos pais, no interesse dos filhos, velar pela sua segurança e saúde destes, prover ao seu sustento e dirigir a sua educação.
vi) A regulação do poder paternal contempla o destino do filho e os alimentos a este devidos e a forma de os prestar.
vii) Por alimentos entende-se tudo o que é indispensável ao sustento, habitação, vestuário, instrução e educação do alimentado no caso de este ser menor.
viii) Os alimentos serão proporcionados aos meios daquele que houver de prestá-los e às necessidades daquele que houver de recebê-los.
ix) A primeira condição para que se possa accionar o mecanismo de acesso ao Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores é a fixação judicial do "quantum" de alimentos devidos a cada menor.
x) que temos uma criança a quem cabe primeiramente aos pais e às pessoas que têm a criança a seu cargo a responsabilidade de assegurar, dentro das suas possibilidades e disponibilidades económicas, as condições de vida necessárias ao desenvolvimento da criança e em última instância, cabe à sociedade e ao Estado garantir as prestações existenciais que lhe proporcionem as condições essenciais ao seu desenvolvimento e a uma vida digna.
xi) Sendo que a medida dos alimentos obtém-se de acordo com o binómio necessidades/possibilidades.
xii) As possibilidades dos pais para alimentarem os seus filhos, por modestas que sejam, partirão sempre de um patamar acima de zero, competindo-lhes a natural obrigação de tudo fazerem para garantir aos filhos o máximo que estiver ao seu alcance, ainda que o máximo se venha a traduzir, na partilha da sua modesta condição sócio-económica.
xiii) Verificando-se que a capacidade alimentar dos pais se mostra insuficiente ou relapsa, cabe ao Estado substituir-se-lhes, garantindo aos menores as prestações existenciais que lhe proporcionem as condições essenciais ao seu desenvolvimento e a uma vida digna.
xiv) Com esta finalidade, a Lei n.° 75/98, de 19 de Novembro criou o Fundo de Garantia dos Alimentos Devidos a Menores. estabelecendo como condição primeira de acesso a fixação judicial do "quantum” de alimentos devido a cada menor.
xv) Assim, é que uma decisão como a que ora se recorre, não obrigando o requerido/pai a pagar pensão de alimentos à filha, alimenta-lhe a irresponsabilidade e priva a menor da protecção que o Estado lhe pode e deve proporcionar.
xvi) A esta interpretação, de fixar alimentos, obriga a defesa do superior interesse da criança, já que nos termos do artigo 3.° da Convenção dos Direitos da Criança todas as decisões relativas a crianças terão primacialmente em conta o superior interesse da criança.
xvii) Acresce que o artigo 180.°, n.° 1 da O.T.M., estabelece que na sentença o exercício do poder paternal será regulado de harmonia com os interesses do menor.
xviii) Ora se o Tribunal "a quo" tivesse fixado a pensão de alimentos à menor, consideramos não existir nenhum obstáculo legal a que tal prestação seja, desde logo, assegurada pelo Fundo de Garantia dos Alimentos Devidos aos Menores, uma vez que um dos pressupostos legais para que o Fundo assuma a obrigação de pagar alimentos à menor assenta no reconhecimento da impossibilidade ou da inviabilidade da cobrança coerciva dos alimentos devidos a esse menor pelo seu progenitor a eles obrigado.
xix) Não esqueçamos que estamos no âmbito de um processo de jurisdição voluntária, por via do qual o tribunal não está vinculado a critérios de legalidade estrita, devendo adoptar mesmo a solução que julgue mais conveniente e oportuna para cada caso (cfr. artigo 1410.° do Código de Processo Civil, ex vi artigo 150.° da OTM).
xx) Acrescendo que a intervenção do Fundo de Garantia dos Alimentos Devidos aos Menores "in casu" se encontra coarctada, uma vez que está depende de o devedor ser judicialmente obrigado a prestar alimentos (cfr. artigo 1.° da Lei n.° 75/98. de 19 de Novembro).
xxi) Pois, tal condenação judicial, revela-se indispensável para que o Fundo de Garantia dos Alimentos Devidos aos Menores possa intervir em substituição do progenitor, garantindo os alimentos ao menor, e sempre que não seja possível obter os mesmos do seu progenitor a eles obrigado.
xxii) Conforme se retira do Preâmbulo do D.L. n.° 16499. de 13 de Maio, que regulamentou a garantia de alimentos devidos a menores, prevista na Lei n.° 75/98, de 19 de Novembro, do direito das crianças à protecção, como função da sociedade e do Estado, tendo em vista o seu desenvolvimento integral, estabelecido no artigo 69.° da Constituição da República Portuguesa, impondo ao Estado o dever de assegurar a garantia da dignidade da criança, resulta o direito a alimentos, pressuposto necessário dos demais e decorrência, ele mesmo, do direito à vida.
xxiii) A assim se entender, a protecção social devida a menores ficaria dependente de se conhecer o paradeiro do devedor e a sua situação económica, o que nos parece ser manifestamente contrário à filosofia que esteve na base do regime instituído pela Lei 75/98, de 19 de Novembro, acrescendo a gritante violação do princípio da igualdade (cfr. artigo 13.° da Constituição da República Portuguesa).
xxiv) A douta decisão recorrida não defende os superiores interesses da menor, interesse este que deve nortear as decisões proferidas no âmbito dos presentes autos — artigo 3.°, n.° 1. da Convenção da Nações Unidas sobre os Direitos das Crianças, de 20 de Novembro de 1989, ratificada pelo Decreto do Presidente da República n.° 4990, de 12 de Setembro. artigos 180.°, n.° 1 e 147.°-A, ambos da O.T.M. e artigo 4.°. alínea a) da L. P. C. J. P.
xxv) No caso "sub judice", dúvidas não se suscitam de que a defesa do superior interesse da menor impõe que seja fixada pensão de alimentos a cargo do pai.
xxvi) A decisão recorrida violou o disposto nos artigos 1846.°. n.°s 1 a 3. 1847.°. 1939.° e 1940.°, n.° 2 do Código Civil Cabo-Verdiano. artigos 180.° e 1 47.°-A. da O.T.M.. artigo 4.°, alínea a) da L. P. C. J. P.. artigos 13.°, 36.°, 69.° da Constituição da República Portuguesa e artigo 3.°. n.° 1 da Convenção da Nações Unidas sobre os Direitos das Crianças.
xxvii) A decisão recorrida deve ser revogada na parte em que se abstém de fixar a pensão de alimentos a cargo do requerido/pai, substituindo-a por outra, que fixe a pensão alimentar devida pelo requerido/pai à menor D..., em montante não inferior a € 100,00 (cem euros) mensais, actualizável anualmente de acordo com o índice da taxa de inflação, publicada pelo I.N.E.
xxviii) Reconhecida que é a impossibilidade manifesta do progenitor cumprir a prestação alimentícia, impor-se logo na decisão recorrida a obrigação do Fundo de Garantia dos Alimentos Devidos aos Menores prestar alimentos à menor D...

Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
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I. ÂMBITO DO RECURSO DE APELAÇÃO

Importa ter em consideração que, de acordo com o disposto nos artigos 684º, nº 3 e 690º, nº 1 do Código de Processo Civil, é pelas conclusões da alegação do recorrente que se define o objecto e se delimita o âmbito do recurso, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.
Assim, e face ao teor das conclusões formuladas, a única questão controvertida a resolver consiste em apurar:
DA OBRIGATORIEDADE DE FIXAÇÃO, NAS DECISÕES QUE REGULAM O EXERCÍCIO DO PODER PATERNAL, DE UMA PENSÃO DE ALIMENTOS, NÃO OBSTANTE O DESCONHECIMENTO DA SITUAÇÃO ECONÓMICA DO PROGENITOR LEGALMENTE OBRIGADO A PRESTAR TAL PENSÃO.
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III . FUNDAMENTAÇÃO
A - OS FACTOS
Foram dados como provados na sentença recorrida, com base no documento de fls. 2, no relatório de fls. 49 a 53 e nas declarações de fls. 45 e 55 os seguintes factos:
1. D... nasceu a 26.03.1991, na freguesia de ...., concelho do .... e é filha de B... e de C....;
2. Os progenitores da menor estão separados;
3. A menor reside com a requerente;
4. Não é conhecido o paradeiro do requerido;
5. A progenitora tem zelado pelo bem-estar da menor;
6. Existe uma boa relação afectiva entre a requerente e a menor;
7. A requerente exerce a profissão de empregada de limpeza num lar;
8. A casa onde vivem a requerente e a menor é composta por três assoalhadas;
9. A requerente paga, mensalmente, cerca de 15 euros a título de renda de casa.
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B - O DIREITO
Consignou-se na sentença recorrida que os alimentos a atribuir à menor deveriam ser fixados em prestações mensais, de acordo com as possibilidades do requerido e as necessidades da menor, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 1940º, n°2 e 1939° do Código Civil cabo-verdiano – lei aplicável no caso em apreço. E, por serem totalmente desconhecidas as condições económicas do requerido, entendeu-se não ser de fixar, por ora, qualquer pensão alimentícia.
Insurge-se o recorrente contra tal decisão, propugnando pela necessária fixação de alimentos à menor, assente basicamente em dois fundamentos:
i) Inaplicabilidade ao caso sub judice do critério de proporcionalidade a que alude o artigo 2004º do Código Civil, já que a decisão foi proferida ao abrigo da legislação Cabo-Verdiana;
ii) Defesa do superior interesse da menor, o que sempre levaria a que, nas situações de dificuldade de prova dos meios do alimentante, se deveria presumir que o mesmo auferia o salário mínimo nacional, tanto mais que só com uma condenação judicial seria possível a intervenção do Fundo de Garantia dos Alimentos Devidos aos Menores, em substituição do progenitor.
No que concerne ao primeiro dos fundamentos, sempre se dirá que o mesmo não merece qualquer acolhimento, já que como expressamente se invoca na sentença recorrida, prevê-se no artigo 1939º do Código Civil da República de Cabo Verde que: 1 – Os alimentos serão proporcionais aos meios daquele que houver de prestá-los e à necessidade daquele que houver de recebê-los. 2 - Na fixação dos alimentos atender-se-á outrossim, à possibilidade de o alimentando prover à sua própria subsistência, à do seu consorte e dos seus filhos ou das outras pessoas que com ele vivam em economia comum.
Tal significa que o critério da proporcionalidade que o Tribunal a quo teve em consideração decorre, não do artigo 2004º da lei civil portuguesa, mas da própria legislação de Cabo Verde, aplicável ao caso em análise, por força do disposto no artigo 57º, nº 1 do Código Civil.
Vejamos agora se procede a matéria argumentativa invocada em segundo lugar pelo apelante.
Não tem sido, com efeito, unívoco o entendimento jurisprudencial quanto à questão de saber se o legal dever parental de contribuir com alimentos para o sustento dos filhos menores deve sempre ser fixado pelo Tribunal, mesmo nas situações em que nada se haja apurado acerca da vida social e profissional do progenitor vinculado à prestação de alimentos.
Para uma corrente jurisprudencial, a fixação da pensão de alimentos não é obrigatória nas decisões que regulam o poder paternal, sempre que o obrigado não tiver quaisquer meios para cumprir esse dever de prestar alimentos. E, nestas circunstâncias, o Tribunal deverá abster-se de fixar qualquer pensão de alimentos, por forma a dar cumprimento ao critério da proporcionalidade plasmado no artigo 2004º, nº 1 do Código Civil – v. neste sentido e a título meramente exemplificativo, Ac. R.Lx. de18.01.2007, acessível na Internet, no sítio www.dgsi.pt (Pº 10081/2007-2).
Para outra corrente jurisprudencial, o Tribunal deve sempre proceder à fixação de alimentos a favor do menor, ainda que desconheça a concreta situação da vida do obrigado a alimentos, visto que o interesse do menor sobreleva a questão da indeterminação ou do não conhecimento dos meios de subsistência do obrigado a alimentos, cabendo a este o ónus de prova da impossibilidade total ou parcial de prestação de alimentos – v. neste sentido, e entre muitos, Ac. R.Lx. de 26.06.2007, acessível no mesmo sitio da Internet (Pº 5797/2007-7).
A decisão recorrida seguiu a primeira das supra identificadas correntes jurisprudenciais, com a qual concordamos inteiramente.
É que, a questão em apreciação reveste de acuidade porquanto, para fazer accionar a intervenção do Fundo de Garantia dos Alimentos Devidos a Menor, necessário se torna, como justamente refere o apelante, a verificação de uma condenação judicial.
A Lei nº 75/98, de 19.11 e o Decº-Lei nº 164/99, de 12.05 atribuem ao Estado, através do aludido Fundo gerido pelo Instituto de
Gestão Financeira, a obrigação de garantia do pagamento dos alimentos devidos ao menor sempre que os mesmos não possam ser cobrados nos termos previstos no artigo 189º da OTM.
Mas, este argumento de natureza pragmática não pode ser invocado para se defender a obrigatoriedade de fixação de alimentos, já que tendo em consideração os requisitos cumulativos consagrados no artigo 1º da Lei nº 75/98, de 19/11, sempre se terá de entender que este regime não pretendeu afastar o critério da proporcionalidade consagrado no artigo 2004º, nº 1 do Código Civil, pelo que apenas estão abrangidos por tal regime os casos em que é possível proceder à necessária e prévia correlação entre as necessidades do alimentando e as possibilidades do obrigado.
E, no caso vertente, nem sequer é possível concluir, com a necessária segurança – como se entendeu no supra citado Ac. R. Lx. de 26.06.2007 - que o requerido está em condições de exercer uma profissão que, no mínimo, lhe garanta o salário mínimo nacional, já que se ignora totalmente o paradeiro do requerido, bem como a sua situação económica e financeira, desconhecendo-se, em suma, se está vivo, tanto mais que, como consta do relatório social constante de fls. 49 a 53, a requerente declarou que a ruptura da situação de união de facto existente entre a requerente e o requerido terá ocorrido há cerca de treze anos, por alegados problemas com alcoolismo, por parte do requerido, tendo este optado por sair de casa, passando a pernoitar na rua como sem-abrigo.
Ora, caso o Tribunal optasse pela fixação de uma prestação de alimentos em quantia aleatória – in casu de € 100,00 mensais, como propugna o recorrente - sem qualquer suporte factual, sempre constituiria, como de resto se salientou no citado Ac. R. Lx. de 18.01.2007,
uma decisão violadora do disposto nos artigos 664º e 1410º do CPC, pois não obstante neste tipo de decisões o Tribunal não esteja sujeito a critérios de legalidade, mas antes de conveniência e oportunidade, isso não quer dizer que lhe seja permitido decidir sem factos e que ignore em absoluto as normas em vigor.
Acresce que o absoluto desconhecimento da situação do requerido igualmente impede o recurso à inversão do ónus de prova, já que esta apenas ocorre quando a parte contrária culposamente tiver tornado impossível a prova ao onerado – v. artigo 344º, nº 2 do C.C.
Improcede, por isso, o recurso de apelação.
Sem custas – v. artigo 446º, nº 1 do CPC e artigo 2º, nº 1 als. a) e g) do CCJ.
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IV. DECISÃO
Pelo exposto, acordam os Juízes desta 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar improcedente o recurso, confirmando-se a decisão recorrida.
Sem custas.
Lisboa, 17 de Setembro de 2009
Ondina Carmo Alves – Relatora
Ana Paula Boularot
Lúcia Sousa