Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
746/17.4T8LSB.L1-4
Relator: ALBERTINA PEREIRA
Descritores: AUTO DE NOTÍCIA
ELEMENTO SUBJECTIVO
CONTRAORDENAÇÃO
PROCESSO PENAL
APRECIAÇÃO DA PROVA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 12/06/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: CONFIRMADA A SENTENÇA
Sumário: I– No auto de notícia devem ser relatados os factos materiais sensorialmente perceptíveis que constituem a contraordenação, especificando-se o dia, a hora, o local, e as circunstâncias em que foram cometidos, a identificação do arguido, dos ofendidos e do autuante, bem como indicação das disposições legais que prevêem e punem a infracção, a coima e, sendo caso, a sanção acessória.

II– O agente autuante não pode o imputar ao arguido os factos a título de culpa, na modalidade de dolo ou na modalidade de negligência, sob pena de contrariar o art.º 32.°, n.º 2, da CRP.

III– Não resulta do art. 32.°, n.° 10 da CRP, que o processo de contraordenação, enquanto processo sancionatório, assegure um conjunto de garantias equivalentes às previstas no processo criminal. Pelo que, como tem vindo a ser entendido, não pode equiparar-se o processo penal e as suas exigências de forma e de fundo, ao processo contraordenacional e à maneira como o mesmo deve ser conduzido e julgado, quando as infrações que são perseguidas num e noutro são, qualitativa e quantitativamente, diferentes, não justificando o regime substantivo e adjetivo das contraordenações e a natureza, finalidade e sancionamento destas últimas um tratamento similar ou sequer próximo do que é dispensado e reclamado pelos direitos do arguido e pela sua defesa contra os crimes que lhe são imputados e que podem degenerar na perda da liberdade daquele.

IV– Os vícios enumerados no art.º 410.º, n.º 2 do CPP representam anomalias decisórias ao nível da elaboração da sentença, circunscritas à matéria de facto, devendo ser apreensíveis pelo seu próprio texto, sem recurso a quaisquer outros elementos a ela estranhos, designadamente depoimentos exarados no processo ou documentos juntos ao mesmo, impeditivos de bem se decidir, tanto ao nível da matéria de facto como de direito.

(Sumário elaborado pela Relatora)

Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na secção social do Tribunal da Relação de Lisboa.


1.–Relatório:


1.1.– AAA, Lda veio recorrer para esta Relação da decisão que tendo confirmado a decisão da Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) a condenou numa coima no valor de 100 UC’s, com fundamento na violação das seguintes normas: art.º 5.º, nº 3 da Portaria nº 987/93, de 6 de Outubro, aplicável por força do art.º 6.º do DL 347/93 de 1 de Outubro, na redacção conferida pelo art.º 8º da Lei 113/99, de 3 de Agosto, na medida em que tinha um extintor de combate a incêndio colocado no pavimento e obstruído por diversos materiais.

Concluiu o seu recurso do seguinte modo:
1.– A decisão aqui posta em crise, na nossa humilde opinião, falha redondamente quer na apreciação da matéria de facto, quer na apreciação da matéria de direito.
2.– Do processo contraordenacional movido contra a aqui recorrente, não resulta quaisquer factos provados que integrem o tipo de ilícito de que vem acusada (também este obscuro) e que justifiquem a aplicação de uma qualquer coima, e muito menos no valor que lhe vem a ser exigido.
3.– O objeto da ação que deu origem à sentença recorrida, prende-se diretamente com a aplicação à aqui recorrente, no pagamento de 100 UC´S, pela violação do disposto no art. 5º, n. º 3 da Portaria n.º 987/93, de 6 de outubro, aplicável por força do art. 6º do DL n.º 347/93 de 1 de outubro.
4.– Tal decisão foi objeto de impugnação judicial por parte da recorrente, onde alegou, considerando a sede a própria, a nulidade do auto, por não descrever os factos constitutivos da infração e as circunstancias em que esta foi cometida, não indicar sequer a norma concreta que se viu violada, isto é a especificação técnica não cumprida, e ainda por ser omisso, quanto ao elemento subjetivo do tipo, violando-se o direito de defesa da arguida pelo menos em dois momentos.
5.– Por mero dever de patrocínio, impugnou-se ainda todo o vertido na decisão administrativa, deu-se a conhecer a situação económico-deficitária da arguida- tudo como melhor se alcança da impugnação judicial junta aos autos.
6.– Procedeu-se à audiência de julgamento no dia 17 de março de 2017, e na data de 20 de março de 2017, foi a arguida notificada de sentença que julgou improcedente a referida impugnação e manteve na integra a decisão administrativa e a coima aplicada.
7.– Ora, a Recorrente não se pode conformar com a sentença proferida pela Meritíssima Juíza do Tribunal a quo, conforme já avançou, pelo que dela interpõe o presente recurso.
8.– Quanto ao âmbito do presente recurso, a segunda instância tem os seus poderes de cognição limitados à matéria de direito, estando excluída, por regra, a sua intervenção em sede de matéria de facto, ficando no entanto ressalvada a eventual verificação de qualquer dos vícios enumerados no art. 410º/2 e 3 do CPP.
9.– Mais, estando em causa uma sentença proferida em processo de contraordenação, são-lhe ainda aplicáveis os requisitos constantes do art.º 374º, nº 2, do CPP, por força do disposto no art.º 41.º, do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro (RGCO) e artigos 50.º, n.º 4 e 60.º da Lei n.º 107/2009, de 14 de Setembro.
10.– Ora, da descrição fática do auto, nada se retira para além de que da visita inspetiva resultaram detetadas irregularidades do ponto de vista da segurança no trabalho que foram objeto de notificação para a tomada de medidas e que as ditas situações anómalas não se viram corrigidas (mesmo que não se mencione em momento algum quais as medidas a tomar e havendo alegadamente uma preocupação séria com a segurança dos trabalhadores!)
11.– Consta do auto que dentro das irregularidades, contava-se a existência de um extintor “colocado no pavimento da arrecadação/armazém e com acesso obstruído por diversos materiais”. Ora, dizer isto é formular uma conclusão abstrata, onde cabe um sem número de condutas concretas e impedir o exercício de um efetivo direito de defesa da arguida, ficando esta sem saber o que fez e de que forma violou as nomas de Higiene e Segurança no Trabalho.
12.– Mais, a indicação da norma segundo a qual foi autuada, contendo uma previsão legal geral, nada elucida dos factos ilícitos cometidos.
13.– Aliás, como se depreende da norma, existe legislação específica reguladora dos meios de combate a incêndio, que deveria ter sido em todo o caso invocada para tipificar um qualquer ilícito, pois o arguido só será colocado na possibilidade de exercer cabalmente o direito de audição e defesa quando a autoridade administrativa lhe comunicar com clareza suficiente todas as circunstancias de tempo, modo e lugar da prática dos factos, as normas que tipificam a infração cometida e as sanções em que incorre.
14.– De facto, os conceitos “perfeito estado de funcionamento” e “locais acessíveis”, necessitam de preenchimento objetivo e a norma trata de o fazer, remetendo para legislação específica, que não foi sequer em momento algum levada à discussão da matéria em causa.
15.– Acresce que na comunicação prévia da imputação destinada a assegurar a defesa da arguida, a entidade administrativa não forneceu à arguida os elementos subjetivos do tipo de infração de que vinha acusada e é inegável que é relevante para a defesa conhecer os pressupostos da punição e sua intensidade.
16.– O tribunal a quo julgou que “(…) a decisão administrativa é de facto parca na descrição dos factos, mas estes são efetivamente poucos, claros e simples (…) não há qualquer nulidade, nem qualquer conclusão generalista, nem tão pouco qualquer limitação do direito de defesa da arguida (…) Não é por ter uma empresa a quem paga para lhe assegurar que o cumprimento das normas é efetuado que tal obsta à prática da contraordenação (…) Ao receber três visitas do ACT e nada fazer, para regularizar a situação, está ela mesmo, e não a empresa de segurança, a ter uma negligência tão elevada, um descuido tão grave que não poderia ter outro desfecho que não a presente acção. E assim sendo, o elemento subjectivo da prática do tipo de ilícito contra-ordenacional é uma evidência em si mesma, e o mesmo se deu por assente”
17.– Ora, é inevitável o reparo à decisão proferida! Em processo de contraordenação o conteúdo da decisão condenatória da autoridade administrativa deve ser elaborado em conformidade com as regras do art.º 25º, nº 1, da aludida Lei nº 107/2009, dela devendo constar, para além do mais, a descrição dos factos imputados, com indicação das provas obtidas, e bem assim a indicação das normas segundo as quais se pune e a fundamentação da decisão.
18.– E com o devido respeito diga-se que in casu a descrição dos factos é inexistente, tal como a indicação da prova obtida e a indicação das normas segundo as quais se pune, uma vez que existe legislação específica relativa aos meios de combate a incêndio e esta não foi sequer invocada para tipificar a infração para dar a conhecer ao arguido o que de facto teve de ilícito a sua conduta.
19.– Quanto à omissão do elemento subjetivo, dita o Acórdão do STJ de 28.11.2002 (publicado in Acs Dout. do STA, 498, 1020) que “o auto de notícia, que anuncia a imputação ao arguido de um tipo de infracção, seguido de uma descrição meramente objectiva dos factos que pretensamente constituiriam a contra - ordenação, sendo absolutamente omisso quanto aos elementos subjectivos do infracção padece do vício de nulidade sanável nos termos do artigo 283º, nº 3, do CPP e art.º 41º, nº 1 do RGCO. O arguido fica prejudicado no seu direito de defesa se desconhecer esses factos, pois ficou impossibilitado de exercer, de forma plena e eficaz, aquele direito, relativamente a questões de importância fulcral, designadamente a culpa e o seu grau”
Acresce que o auto de notícia apenas pode fazer fé exactamente dos factos que dele constam. Não se pode dele extrair mais factos. Se do mesmo não constarem a descrição do elemento subjectivo, também daquele não se pode retirar.
20.– Assim, o direito de defesa da arguida viu-se violado pelo menos em dois momentos, pelo que deveria o Digníssimo tribunal a quo ter-se decidido pela nulidade do auto e da decisão administrativa em que este se fundou.
21.– Mais, da simples leitura da sentença, verifica-se que a Meritíssima Juíza do Tribunal a quo não descreve, em momento algum, a análise critica efectuada perante a prova produzida, não sendo possível à Recorrente perceber com base em que elementos o tribunal a quo criou a sua convicção.
22.– Na verdade, da sentença constam apenas os factos dados como provados, a legislação aplicável ao caso controvertido e a conclusão (decisão) retirada pelo Tribunal.
23.– Sendo assim impercetível, qual o raciocínio efectuado pelo Tribunal a quo para considerar determinado facto como provado ou não provado.
24.– A apontada omissão de fundamentação quanto aos factos supra aludidos determina a nulidade da sentença, nos termos dos artº 379º nº 1 al. a) e 374º nº 2 do C.P.Penal.
25.– Acresce que o tribunal a quo extraiu conclusões que plasmou na matéria de facto provada que não têm assento razoável, nem lógico, na prova efetivamente produzida.
26.– Quanto ao facto dado como provado no ponto 1, cumpre referir que o extintor se encontrava de facto, colocado no pavimento da arrecadação/armazém, MAS EM SUPORTE PRÓPRIO- Tal como foi afirmado aliás, na versão oferecida pela arguida, na sua impugnação judicial, art.º 23º, ao contrário do que entendeu a Exma. Juíza a quo, ter a arguida oferecido na sua versão dos factos.
27.– Mais, não existe sequer um registo fotográfico que ponha a versão da arguida em causa.
28.– Quanto aos diversos materiais que alegadamente obstruíam o meio de combate a incêndio, parece-nos ter resultado claro que a haver material no local, visto tratar-se de um armazém onde naturalmente tem que circular mercadoria e essa hipótese tem que se colocar, seria de forma momentânea e tratar-se-ia de material que, atendendo ao comercializado na loja alvo da visita inspetiva, de parcas dimensões e peso, facilmente removível.
29.– Mais, não foi afirmado em momento algum ser impossível aceder ao meio de combate a incêndio.
30.– Quanto ao facto dado como provado no ponto 2, é verdade que foi concedido um prazo para regularização de irregularidades que se haviam detetado. No entanto e apesar das irregularidades se terem visto regularizadas, a localização do extintor manteve-se, pois estava colocado em suporte próprio e não obstruído, colocando os trabalhadores em perigo, não havendo por isso, nada de irregular com este. E tal, foi garantido por quem tem realmente conhecimentos técnicos específicos acerca da matéria. E com todo o respeito, se a arguida não confiar nos técnicos, que têm conhecimentos certificados, irá confiar em quem?
31.– Quanto ao facto dado como provado no ponto 3, desconhece-se em que é que se funda a Exma. Juíza para dar tal facto como assente, uma vez que estas alegadas visitas não se encontram comprovadas documentalmente.
32.– Quanto ao facto dado como provado no ponto 5: “Ao atuar de forma mencionada a arguida agiu de forma livre, voluntária, e sem o cuidado devido”. Ora, nenhuma norma autoriza o tribunal recorrido a presumir factos, ilicitude e culpa com base no auto de notícia e nenhuma norma o autoriza a “inverter” o ónus probatório, pelo que também não se poderia ter dado tal facto como provado.
33.– Também daqui resulta que os factos dados como provados nos pontos 1, 3 e 5 não poderiam ter sido dados como provados.
34.– Constata-se ainda erro notório na apreciação da prova, pois na parca fundamentação factual do tribunal recorrido assumiu papel de relevo probatório o auto de notícia em si considerado, a que acresceu a sua confirmação pelo autuante.
35.– Nenhuma norma autoriza o tribunal recorrido a presumir factos, ilicitude e culpa com base no auto de notícia e nenhuma norma o autoriza a “inverter” o ónus probatório.
36.– Nenhuma norma revogou o princípio da livre apreciação da prova e a necessidade de as entidades acusadoras fazerem prova dos factos relevantes para o preenchimento de ilícitos criminais e contraordenacionais. Ou seja, mantém-se em vigor o artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa.
37.– O valor probatório do auto de notícia é, simplesmente, livremente apreciado nos termos do artigo 127º do Código de Processo Penal.
38.– O tribunal recorrido interpretou um auto de notícia como fazendo “fé em juízo” até prova em contrário e presumiu a veracidade dos factos até que a arguida apresentasse contraprova da não prática desses factos, ou seja, operou uma presunção iuris tantum, isso reflete-se na apreciação probatória como “erro notório na apreciação da prova”, o vício de facto previsto no art. 410º, n. 2, al. c) do CPP, aplicável ao caso dos autos por remissão do art. 41º, n. 1 do Dec-Lei n. 433/82, de 27-10.
39.– A sentença do Tribunal "a quo" tal como está fundamentada, traduz-se numa convicção arbitrária do julgador, e não numa convicção baseada na prova produzida em sede de Audiência de Julgamento.
40.– Daqui resulta a violação do princípio in dúbio pro reu que encerra uma imposição dirigida ao juiz no sentido de este se pronunciar de forma favorável ao arguido quando não tiver certeza sobre os factos decisivos para a solução da causa pelo que a sua violação exige que o juiz tenha ficado na dúvida sobre factos relevantes e, nesse estado de dúvida, tenha decidido contra o arguido.
41.– Quanto à escolha e medida concreta da sanção importa referir que estabelece o artigo 18.º do R.G.C.O.C., que os fatores a atender na determinação concreta da coima a aplicar.
42.– In casu, e salvo melhor opinião, não nos parece que tenha sido atendida a condição económica da empresa, embora tenha ficado a sua fragilidade comprovada.
43.– Mais, o volume de negócios da empresa não traduz de forma fidedigna a capacidade económica da empresa, caso se atente no passivo corrente e responsabilidades financeiras a fazer face a curto prazo por parte da mesma, o que se deu a conhecer através dos documentos juntos aos autos.
44.– Considerando as circunstâncias aludidas na decisão recorrida e que merecem ponderação no doseamento da coima, nos termos do artigo 18º, nº 1 do RGCO, deve a coima a aplicar à arguida/recorrente ser fixada em pelo menos metade.
45.– Acresce que o legislador ao formular a norma através da qual se atinge a coima mínima a aplicar olvidou princípios constitucionais essenciais, arguindo-se desde já a inconstitucionalidade do artigo 6º do DL 347/93, na sua nova redação, por violação do princípio da proporcionalidade consagrado no artigo 18.º da Constituição da República Portuguesa.
46.– Concluímos, assim, pela inconstitucionalidade do normativo citado, pela ofensa do princípio da proporcionalidade. Para este juízo de desproporcionalidade concorre aliás a evolução normativa operada- o limite mínimo da coima a aplicar pelo cometimento da mesma infração evoluiu de € 250,00 para € 9.180,00. A desproporcionalidade é evidente.
47.– Ainda que assim não se entenda, o art. 18.º do RGCO prevê que, em caso de atenuação especial de punição por contraordenação, “os limites máximo e mínimo são reduzidos para metade”.
48.– A atenuação especial da pena está prevista no art. 72.º, n.º 1 do Código Penal “quando existirem circunstâncias anteriores ou posteriores ao crime, ou contemporâneas dele, que diminuam por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente o a necessidade de pena.”
49.– No caso em apreço, a Arguida não retirou por qualquer benefício económico da sua conduta, nunca teve qualquer intenção de colocar em risco a segurança dos trabalhadores, e mesmo não concebendo que o extintor estivesse mal posicionado, caso realmente o estivesse, estava convicta do contrário, por informação técnica especializada.
50.– Mais, a arguida sempre pautou a sua vida empresarial pelo cumprimento da Lei, mantendo uma conduta exemplar, sem qualquer infração aos regulamentos em vigor quer antes quer depois dos factos até à presente data.
51.– Para além disso, a Arguida tem uma situação precária financeira, conforme já adiantado, pelo que teve que fechar várias lojas nos últimos tempos e encontra-se na iminência de fechar pelo menos mais três.
52.– Resulta do exposto que a Arguida se encontra em condições de beneficiar de atenuação especial da coima, uma vez reunidas as condições legalmente exigidas pelo art. 72.° do Código Penal.
53.– Assim, o limite mínimo da coima deverá ser reduzido para metade, passando a ser de 45 UC. Limite mínimo este, que deverá ser o aplicado à arguida, caso lhe venha a ser aplicada uma qualquer coima.
54.– De todo o exposto e atendendo que existira erro de julgamento no que respeita à nulidade e questões de direito invocadas na impugnação judicial interposta, violação dos requisitos da sentença, má apreciação da prova produzida, erro notório na apreciação da prova e ainda, uma errada escolha da medida concreta da sanção, a sentença aqui em crise não deverá merecer acolhimento na ordem jurídica.
NESTES TERMOS, E nos melhores de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deverá a douta sentença ser revogada e substituída por outra que se coadune com a pretensão exposta.
FAZENDO-SE, ASSIM, A HABITUAL E NECESSÁRIA JUSTIÇA!

1.2.– O Exmo. Magistrado do MP respondeu ao recurso, no sentido de a sentença recorrida não padecer de qualquer erro na apreciação da prova, nem da nulidade que a recorrente invoca, não havendo incoerência e/ou contradição na fundamentação sobre a prova.

Cumpre apreciar e decidir.

2.– Objecto do recurso
Como é sabido, de acordo com disposto nos artigos 33.° n.º 1 e 50.° do Regime Processual das Contra-Ordenações Laborais e de Segurança Social, aprovado pela Lei 107/2009 de 14 de Setembro (RPCLSS) e, subsidiariamente,  nos artigos 403.° n.º 1 e 412.° n.° 1 do Código de Processo Penal (CPP), aplicável “ex vi” do artigo 74.° n.° 1 do DL 433/82 de 27 de Outubro, que aprovou o regime geral das contra-ordenações (RGCO), o âmbito do recurso define-se pelas conclusões que o recorrente extraia da respectiva motivação, sem prejuízo, contudo, das questões de conhecimento oficioso, designadamente, dos vícios indicados no n.º  2 do artigo 410.° do CPP.

Assim as questões que a arguida, recorrente, coloca à apreciação deste tribunal são as seguintes:
Nulidade do auto notícia por não descrever os factos constitutivos da infracção e as circunstâncias em que esta foi cometida, nem o elemento subjectivo da infracção;
Nulidade da decisão administrativa por não descrever os factos constitutivos da infracção e as circunstâncias em que esta foi cometida;
Nulidade da sentença recorrida por omissão da fundamentação;
Erro notório na apreciação da prova;
Atenuação especial da pena;
e
Inconstitucionalidade do art.º 6.º do DL 347/93, de 1 de Outubro.

3.– Fundamentação de facto.
1.– No dia 22 de Setembro de 2015, pelas 14:40h na sequência de uma visita inspectiva do ACT ao estabelecimento comercial da empresa AAA, Lda, sita no centro comercial (…), em Lisboa, foi constatada a existência de um extintor colocado no pavimento de uma arrecadação/armazém e com acesso obstruído por diversos materiais;
2.– Foi concedido um prazo para regularização da situação por parte da arguida;
3.– Foram ainda feitas mais duas visitas pelo ACT no dia 13/11/2015 e em 2/12/2016 e constatado que a situação se mantinha apesar das notificações para a regularização;
4.– O volume de negócios da arguida em 2014 foi de €23.185.006;
5.– Ao actuar da forma mencionada a arguida agiu de forma livre, voluntária, e sem o cuidado devido;
6.– A arguida atravessa uma situação económica difícil tendo encerrado diversas lojas;
7.– A arguida tem uma empresa de higiene e segurança que lhe presta serviços e que garantiu que o extintor estaria apto a funcionar correctamente.

4.– Fundamentação de Direito.
4.1.– Da nulidade do auto de notícia por não descrever os factos constitutivos da infracção e as circunstâncias em que esta foi cometida, e dele não resultar o elemento subjectivo da infracção
Adianta-se, desde já, que não assiste razão à arguida quanto a este aspecto.
Na verdade, como resulta do art.º 13.º n.º 2 do RPCLSS, «[s]em prejuízo do disposto em legislação especial, há lugar a auto de notícia quando, no exercício das suas funções o inspector do trabalho ou da segurança social, verificar ou comprovar, pessoal e directamente, ainda que por forma não imediata, qualquer infracção a normas sujeitas à fiscalização da respectiva autoridade administrativa sancionada com coima» e do n.º 1 do art.º 15º do mesmo diploma legal, «[o] auto de notícia, a participação e o auto de infracção referidos nos artigos anteriores mencionam especificadamente os factos que constituem a contra-ordenação, o dia, a hora, o local e as circunstâncias em que foram cometidos e o que puder ser averiguado acerca da identificação e residência do arguido, o nome a categoria do autuante ou participante e, ainda, relativamente à participação, a identificação e a residência das testemunhas». A materialidade deste tipo de documento significa, pois, que nele devem “ser relatados os factos materiais sensorialmente perceptíveis que constituem a contra-ordenação, especificando-se o dia, a hora, o local, e as circunstâncias em que foram cometidos, bem como a identificação do arguido, dos ofendidos e do autuante”. Devendo do mesmo ainda constar  “… a referência às disposições legais que prevêem e punem a infracção, bem como a coima e sendo caso a sanção acessória (art.º 15.º n.º 1 e ar.º 17.º a 19.º)”. Cfr. Manuel M. Roxo e Luís C. Claudino “ O Processo de Contra-Ordenação Laboral e de Segurança Social”, Almedina, 2009, pág. 49. No que se refere ao elemento subjectivo da infracção, não se desconhece a doutrina do Acórdão de Uniformização de Jurisprudência 1/2003 (DR I Série-A, n.º 21, de 25.01.2003),  por via da qual se torna necessário o relato de factos que indiciem não somente a existência do tipo legal objetivo (os pressupostos da concreta contraordenação) como também o tipo legal subjetivo, sob pena de nulidade. Importa, contudo, proceder à interpretação dessa doutrina e não somente à sua leitura singela. Assim, e em primeiro lugar, como tem sido entendimento dominante, não pode, o agente autuante imputar os factos a título de culpa, seja na modalidade de dolo seja na modalidade de negligência, ao arguido, o que contrariaria, entre o mais, o princípio da “presunção de inocência” do arguido, decorrente do artigo 32.°, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa (CRP). O que o agente autuante deve verter no auto de notícia é o que observa, o que verifica e atesta, isto é, factos, comportamentos, situações. Sendo que da análise do artigo 243.° do Código de Processo Penal (CPP), aplicável no âmbito contra-ordenacional por força do art.º 41.° do DL 433/82, de 27 de Outubro (RGCO), por via do qual, devidamente adaptados, são aplicáveis no processo contraordenacional os preceitos reguladores do processo criminal, não se retira que a entidade que lavra o auto de notícia ali deva mencionar o elemento subjetivo. Na verdade, “o elemento subjetivo não é observável, a sua captação resulta de uma operação de caráter lógico-racional, que deriva dos factos percecionados, captados pelos sentidos, não competindo ao agente autuante consignar no auto de notícia o elemento subjetivo. O elemento psicológico emerge, antes, da interpretação e valoração que se faça do comportamento do sujeito, sendo a intenção «algo» (uma «ideia», um «pensamento», para a ação, integrando, portanto, um elemento volitivo) de natureza imaterial, que se acantona na «mente» do sujeito e, se ele a não revela, verbalizando-a, a ela só podemos aceder pela análise da sua conduta exteriormente manifestada” (Acórdão do TRC de 15-07-2009, Recurso de Contraordenação n. ° 600/08. OTFCBR).

O auto de notícia deve, por conseguinte, considerar-se perfeito com a relação dos factos da infração e os elementos constantes dos normativos citados, entre os quais se não incluem os relativos à culpa. Como também referem Manuel M Roxo e Luís C. Oliveira, “Ob. Cit.”, pág. 50 a “para além do relato dos factos que constituem os pressupostos do elemento objectivo da infracção, devem ser também reportados os factos que evidenciem o elemento subjectivo”, mas a “sede própria para apreciar da culpabilidade ( ... ) é após a conclusão da fase instrutória do processo e não no auto de notícia. É aliás, o que resulta dos princípios gerais do processo penal: a culpa não pode ser presumida, nem previamente determinada pelo agente autuante. A questão da culpabilidade é apreciada, com propriedade, na sequência do apuramento de factos sobre os elementos constitutivos do tipo de contraordenação e sobre a participação do arguido nesses factos (artigo 368.°, n.º 2, do CPP); ( ... ) não incumbe ao agente autuante qualificar a culpa do arguido ou fazer juízos sobre a respetiva intensidade, nem graduar a coima ( ... ). Admitir o contrário, significaria permitir ao inspetor autuante o exercício de funções instrutórias, violando a proibição prevista quanto à inibição desse exercício funcional no processo (artigo 16.° da Lei n.º 107/2009)”.

Ora, no presente caso, como resulta do auto de notícia n.º CO1716500454 (fls. 3-4), aí consta a identificação da arguida, do seu legal representante, do inspector autuante, bem como as circunstâncias de tempo, modo e lugar em que aquela praticou a infracção, as normas violadas e a coima aplicada. Ali se consignou, com efeito, ter o inspector autuante acompanhado da inspectora do trabalho, Dr.ª (…),  (1.º), no dia 22 de Setembro de 2015, pelas 14 h,40, detectado “irregularidades do ponto de vista da segurança no trabalho que foram objecto para tomada de medidas (…) (2.º); “De entre essas irregularidades conta-se a existência  de um extintor de combate a incêndio naquele estabelecimento, o qual se encontrava colocado em local inapropriado, no pavimento da arrecadação/armazém  e com o acesso obstruído por diversos materiais, porquanto encontrava-se colocado em local inadequado  e inacessível, de modo a prevenir a segurança e a saúde dos trabalhadores em caso de incêndio (3.º); não o tendo feito como era sua obrigação legal, a infractora configurou a violação do n.º 3 do art.º 5.º, da Portaria nº 987/93, de 6 de Outubro aplicável por força do art.º 4.º do DL nº 347/93 de 1 de Outubro” (6.º); “o que constitui infracção muito grave, nos termos do disposto na alínea b), do n.º 1 do art.º 6.º, do DL nº 347/93 de 1 de Outubro, com a redacção introduzida pela Lei 113/99, de 3 de Agosto (8.º). 

Posto isto, não se vê, pois, como pode a arguida insistir na tese de que não se encontram descritos no dito auto de notícia os factos constitutivos da infracção e as normas violadas. Improcede, assim, por tudo quanto fica dito, a presente questão. 

4.2.– Da nulidade da decisão administrativa por não descrever os factos constitutivos da infracção e as circunstâncias em que esta foi cometida.
Também quanto a esta questão carece a arguida de razão.
Nos termos do n.º 1, do art.º 25.º do RPCLSS, para o que aqui releva, a “decisão que aplica a coima e ou as sanções acessórias contém”: 
(…)
b)- A descrição dos factos imputados, com indicação das prova obtidas;
c)- A indicação das normas segundo as quais se pune e a fundamentação da decisão;
(…)

Importa não olvidar que esta decisão obedece a uma estrutura mais simples que a decisão judicial (art.º 374.º do CPP, aplicável “ex vi” do art.º 41.º do RGCO), que no caso se mostra observada.
 Na verdade, da leitura da decisão administrativa fls. 16 a 21, resulta que a mesma contém a descrição dos factos, em termos objectivos e subjectivos, que são imputados à arguida, como acima referido, com a indicação das provas obtidas, a indicação das normas segundo as quais se pune a infracção e a fundamentação da decisão (art.º 5.º, nº 3 da Portaria nº 987/93, de 6 de Outubro, aplicável por força do art.º 6º do DL nº 347/93 de 1 de Outubro, na redação conferida pelo art.º 8º da Lei 113/99, de 3 de Agosto), mostrando-se observado o art.º 25.º, n.º 1, alíneas b) e c), do RPCLSS. A decisão administrativa permite, deste modo, cabalmente à arguida exercer o seu direito de defesa, não padecendo de nulidade.

4.3.– Da nulidade da sentença recorrida por omissão da fundamentação.

Invoca a arguida, a este respeito, que a sentença recorrida não elenca os factos ilícitos cometidos, nem fornece os elementos subjectivos da infracção.

Também quanto a este ponto carece a arguida de razão.

Na realidade, não obstante sujeita a fundamentação, como imposto, designadamente, pelo art.º 205.º da CRP, a decisão judicial proferida no foro contra-ordenacional não está onerada com o mesmo grau de rigor e exigência de explanação, impostos à sentença penal. Não resulta do art. 32.°, n.° 10 da CRP, que o respectivo processo de contraordenação, enquanto processo sancionatório, assegure um conjunto de garantias equivalentes às previstas no processo criminal.

O direito mera ordenação social assenta em razões diversas das que presidem ao direito penal, tutelando este  bens jurídicos essenciais à comunidade e intervindo como última ratio na defesa desses valores fundamentais. Aquele direito, traduz-se, antes, num ordenamento sancionatório alternativo, cuja desobediência não reveste a ressonância moral característica do direito penal. Não pode, por conseguinte, quiparar-se o processo penal e as suas exigências de forma e de fundo, ao processo contraordenacional e à maneira como o mesmo deve ser conduzido e julgado, quando as infrações que são perseguidas num e noutro são, qualitativa e quantitativamente, diferentes, não justificando o regime substantivo e adjetivo das contraordenações e a natureza, finalidade e sancionamento destas últimas um tratamento similar ou sequer próximo do que é dispensado e reclamado pelos direitos do arguido e pela sua defesa contra os crimes que lhe são imputados e que podem degenerar na perda da liberdade daquele (Cfr., entre outros, o acórdão do TRL de 25.01.2017, processo 3882/15.8TBRR.L1, www.dgsi.pt).

Prescreve o art.º 374.º n.º 2 do CPP, “ex vi” do art.º 60.º do (RPCLSS):
 “Requisito da sentença (…)
2- Ao relatório segue-se a fundamentação, que consta da enumeração dos factos provados e não provados, bem como de uma exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal.
(…).

Ora, pese embora em termos sucintos, a sentença recorrida não deixou de observar o citado dispositivo legal. Com efeito, nela consta a enunciação da factualidade provada (n.ºs 1 a 6), e a respectiva fundamentação de facto (fls. 77); as provas que serviram de base à convicção do julgador, tendo-se procedido à fundamentação de direito, com indicação expressa das normas violadas e referencia ao elemento subjectivo (fls. 78 a 82).

A decisão recorrida não carece, assim, de fundamentação (art.º 615.º, n.º 1 alínea b) do CPC), pois o facto de se discordar da apreciação da matéria de facto, tal não corresponde à omissão na mesma de qualquer factualidade relevante para a decisão da causa, nem à omissão da respetiva motivação de direito.
Não ocorre, por tudo isso, nulidade da sentença por ausência de fundamentação.

4.4.– Erro notório na apreciação da prova
No âmbito do recurso contra-ordenacional, o tribunal da Relação posiciona-se como o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) se posiciona no processo penal, ou seja, funciona como tribunal de revista e apenas conhece da matéria de direito - art.º 434.º do CPP e art.º 75.º, n.º 1, do RGCO.
Antes da reforma do Código de Processo Penal operada pela Lei nº 59/98, de 25 de Agosto, estava estabelecido um sistema designado de “revista ampliada”: mesmo nos casos em que o conhecimento se restringia a matéria de direito, o STJ podia intrometer-se em matéria de facto, quer por iniciativa própria, quer por invocação do recorrente de algum ou alguns dos vícios previstos no art.º 410.º, nº 2, do CPP. Com a aludida reforma, deixou de ser possível recorrer para o STJ com fundamento na existência de qualquer dos referidos vícios. Constituindo orientação sedimentada do nosso mais alto tribunal que a única possibilidade de conhecer dos vícios do art.º 410.º, nº 2 ocorrerá quando, para evitar que a decisão de direito se apoie em matéria de facto claramente insuficiente, ou fundada em erro de apreciação ou assente em premissas contraditórias, o STJ, oficiosamente, ou seja, por sua iniciativa, decida fazê-lo. Ou seja, se concluir que, por força da existência de qualquer daqueles vícios, não pode chegar a uma correcta solução de direito, o STJ, excepcionalmente, deles conhecerá oficiosamente. É essa função que, no processo contra-ordenacional, deve assumir o tribunal da Relação (Acórdão do TRL de 08-02-2012, processo 272/11.5TBRR.L1).

Dispõe, para o que releva, o dito art.º 410.º do CPP:
(…)
“2.- Mesmo nos casos em que a lei restrinja a cognição do tribunal de recurso a matéria de direito, o recurso pode ter como fundamentos, desde que o vício resulte do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum:
(…)
c)- Erro notório na apreciação da prova”.
Sobre este ponto, também não se ignora que a jurisprudência dos tribunais superiores é a de que os vícios enumerados no art.º 410.º, n.º 2 do CPP representam anomalias decisórias ao nível da elaboração da sentença, circunscritas à matéria de facto, devendo ser apreensíveis pelo seu próprio texto, sem recurso a quaisquer outros elementos a ela estranhos, designadamente depoimentos exarados no processo ou documentos juntos ao mesmo, impeditivos de bem se decidir, tanto ao nível da matéria de facto como de direito.
Ora, não patenteia o próprio texto da decisão recorrida a existência de qualquer erro na apreciação da prova. Consoante já se afirmou, a sentença recorrida, embora sintética, justificou com razoabilidade e verosimilhança as razões porque considerou provada a referida factualidade, tendo feito expressa menção aos depoimentos dos inspectores da ACT que visitaram o estabelecimento da arguida e constataram a prática da infracção, “os quais deixaram claro e inequívoco que o extintor se encontrava no pavimento de uma armazém/arrecadação, sem suporte, e com materiais diversos, desde caixas a material das funcionárias à volta dificultando ou impedindo o acesso ao mesmo”. Tendo-se também feito menção ao depoimento de funcionária do Departamento de recursos humanos da arguida, (…) que nada pode atestar por não ter presenciado os factos em questão. Posto isto, apenas nos resta concluir pela improcedência da presente questão.

4.4.– Da atenuação especial da punição
A atenuação especial da punição por contraordenação está consagrada no art.º 18.º n.º3 do RGCO, podendo ter lugar nas situações previstas nos artigos 9.º n.º 2 (erro censurável); 13.º, n.º 2 (tentativa punível) e 16.º n.º 3 (cúmplice), do RGCO “ex vi” do art.º 60.º do RPCLSS. O que, no presente caso, manifestamente, se não verifica.

É certo que o art.º 72.º do Código Penal (CP), aplicável por força do art.º 32.º do RGCO, prevê a atenuação especial da pena quando existam circunstâncias anteriores ou posteriores à infracção ou contemporâneas dela, que diminuam por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena. Para que possa conceder-se o referido benefício da atenuação especial da pena é necessário que se provem factos que consubstanciem uma diminuição da ilicitude do facto, da culpa do arguido ou da desnecessidade da punição. Ora, sucede que, também nesta situação, se não enquadra a conduta da arguida, à qual até foi dada a oportunidade de regularizar a situação e não o fez. A arguida atravessa uma situação económica difícil, como se provou, mas essa situação foi já ponderada, tendo o montante da coima sido fixado perto do seu mínimo. Improcede, por tudo isso, de igual modo, esta questão.

4.5.– Da inconstitucionalidade do art.º 6.º do DL 347/93, de 1 de Outubro.

Insurge-se a arguida relativamente ao montante da coima que, por força do previsto no art.º 6.º do DL 347/93, de 1 de Outubro na redacção decorrente do art.º 8.º, DL 113/99, de 3 de Agosto, subiu para valores que, diz, violam o princípio da proporcionalidade, decorrente do art.º 18.º da CRP.

Não se nos afigura que a arguida tenha razão no que se refere a este aspecto também.

Com efeito, não obstante se tenha verificado um acréscimo nos valores das coimas pela prática de contraordenações laborais, não se demostra tenha sido essa modelação mais acentuada no domínio da infracção em causa, a pontos de se infringir o princípio da proporcionalidade, em qualquer das suas vertentes aplicativas. Improcede, deste modo, igualmente, a presente questão.

5.– Decisão.
Em face do exposto, julga-se improcedente o presente recurso interposto pela arguida AAA, Lda., confirmando-se a sentença recorrida.
Custas a cargo da arguida.
Registe e notifique.



Lisboa, 2017.12.06



Albertina Pereira
Leopoldo Soares