Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
6952/05.7TCLRS.L1-1
Relator: MARIA DO ROSÁRIO BARBOSA
Descritores: RECONHECIMENTO DE DÍVIDA
CONTRATO DE MÚTUO
ÓNUS DA PROVA
ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 02/24/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: SUMÁRIO:
1.A promessa de cumprimento e o reconhecimento de dívida previstos no artigo 458, do C. Civil devem constar de documento escrito nos termos do nº2, do referido preceito.

2.Sendo a acção estruturada no pressuposto - foram os AA que afirmaram - de ter existido um mútuo, que não lograram demonstrar, segundo as regras do ónus da prova a acção teria de ser julgada improcedente, por indemonstração dessa tese, sendo indiferente que os RR. não tenham demonstrado a sua tese, porque a regra de decisão aplicável, o artigo 342º, nº 1 do CC, determina , face à incerteza, a decisão contrária àquele que invocou um determinado direito (aqui o direito a reaver, por via da nulidade do mútuo, o que entregou aos demandados) e não demonstrou os factos constitutivos desse direito invocado.

3. O tribunal recorrido não tinha que apreciar o enriquecimento sem causa, agora trazido as alegações de recurso, pois na acção intentada nunca os AA invocaram o enriquecimento sem causa sequer a título subsidiário.
(Sumário da Relatora)
Decisão Texto Parcial:Acordam os juízes do Tribunal da Relação de Lisboa

Os AA  intentaram acção declarativa de condenação, sob forma de processo comum ordinário, contra Os RR, pedindo a condenação destes no pagamento de € 375.000,00, acrescidos de juros legais, desde a citação até efectivo e integral pagamento.
 Alegaram, para tanto, que o A. e o R. acordaram em que aquele compraria um apartamento na Expo 98, previamente escolhido pelos RR., por se tratar de um bom negócio, e ter o A. disponibilidade financeira para o efeito, ao contrário do R., e subsequentemente o A. e o R. repartiriam entre ambos os lucros obtidos com a revenda do apartamento, após a restituição ao A. do capital por ele investido naquela compra.
Mas o A., que celebrou o contrato-promessa de compra do apartamento, e pagou o preço correspondente, bem como a sisa, não pôde estar presente na data da celebração da escritura, pelo que disse ao R. que outorgasse ele como comprador.
 O R., contudo, colocou a R. na posição de compradora, a qual veio a registar o apartamento em seu nome.
 O A., quando veio a saber deste facto, solicitou aos RR. que lhe devolvessem o dinheiro pago pela compra do apartamento, tendo os RR. assumido a dívida como sua, informando o A. que iam pedir um empréstimo bancário, com recurso à hipoteca da fracção, para lhe restituírem tal valor, o que não fizeram.
 A conduta ilícita e abusiva dos RR. permite aos AA., além do mais, exigir-lhes a restituição do preço do apartamento, aceitando-se, ainda assim, face à referida conduta dos RR., que se tratou de um mútuo, ele é nulo por falta de forma, fundando-se a obrigação de restituir naquela própria nulidade.
 Os RR. contestaram, por excepção e por impugnação de facto e de direito, alegando que não se tratou de um contrato de mútuo, mas antes que foi intenção do A. doar o apartamento aos RR., a título de presente de casamento destes, uma vez que foi o seu padrinho de casamento, atenta a forte amizade que tem ao R..
 Mais peticionaram a condenação dos AA. como litigantes de má fé.
Os AA. replicaram, pugnando pela improcedência da contestação, e pugnando pela condenação dos RR. como litigantes de má fé.
Foi proferida sentença que julgou a acção improcedente absolvendo os RR do pedido.

Os AA  interpõem recurso de apelação da sentença proferida nos autos.
São as seguintes as conclusões de recurso apresentadas: 
1. Os apelantes não e conformam com a  aliás  mui douta sentença proferida pelo Tribunal "a quo".
2. Os factos provados permitem concluir que a apelada adquiriu a fracção com o dinheiro titulado nos dois cheques ido nos autos, ao invés do acordado entre o apelante e o apelado.
3. E, bem assim que o apelante tudo fez no sentido de lhe ser restituído esse capital, tendo os apelados e o apelante acordado quanto ao reembolso desse valor.
4. Ademais, os apelados assumiram a responsabilidade na restituição do dinheiro. mediante empréstimo com hipoteca a constituir sobre a fracção.
5. E, nunca o apelante ofereceu aos apelados a fracção como prenda de casamento.
6. Nem seria razoável que o apelante pagasse uma sisa a 24.09.003 para oferecer a fracção à apelada passado catorze dias, pois a escritura de aquisição foi outorgada no dia 08.10.2003.
7. E menos seria curial uma prenda de casamento no valor soberbo de 375.000,00, a qual se fosse o caso, teria sido feita um ano antes da celebração do matrimónio que ocorreu em 23.10.2004, e que passado todo esse tempo poderia nem acontecer. Beneficiando então  desse valor, exclusivamente a apelada que o apelante havia conhecido uns seis meses antes.
8. O acordo celebrado entre apelante apelados, por via do qual se ajustou  o reembolso do capital ao apelante configura um mútuo o qual por não ter sido celebrado por escrito é nulo por falta de forma  face ao disposto nos arts. 1143 e 289 do CC.
9. Sendo nulo por falta de forma, deve ser restituído ao apelante o capital bem como os juros de mora devidos desde a interpelação judicial.
10. A obrigação de restituir resulta ainda  da assunção dessa responsabilidade por parte da apelada, que reconheceu a divida como assuntora  da obrigação nos termos do dispo to no art 595, do C C.
11. Caso assim se não entenda, sem conceder e não tendo ficado provado que o apelados tenham recebido a fracção com "prenda de casamento” não existe motivo legítimo  para que os apelados enriqueçam o seu património por via da quantias com as quais a fracção foi adquirida.
12.Não restam dúvidas face à matéria de facto provada que para além do enriquecimento dos apelado  à custa de outrem ou seja do apelante está esse enriquecimento desprovido de causa justificativa.
13. A obrigação de restituir fundada no enriquecirnento sem causa tem natureza subsidiária e  o recurso à acção é facultado ao empobrecido quanto a lei não lhe faculta outro meio para obter o ressarcimento dos seus prejuízos.
14. Os apelantes peticionam a condenação dos apelado no pagamento do capital titulado nos dois cheques no montante de 375.000.00 acrescido do. juros de mora desde a interpelação judicial, nada obstando à apreciação do mérito do referido instituto jurídico.
14 . Discorda-se da douta sentença com o devido respeito, quando conclui que a causa de pedir nestes aulas seja um acordo de  compra e posterior revenda do andar. configurando uma promessa  de doação, nos termos do artº 940 nº 1 do CC.
14 B. No primeiro momento do relacionamento entre as partes como se vê da matéria de facto provada. a compra da fracção seria realizada pelo apelante marido , tendo essa situação sido ultrapassada pelas  circunstâncias  que  em seguida o ocorreram, ficando os apelantes de restituir o capital utilizado na compra da fracção.
14C-Não se aceitando assim a decisão do tribunal "a quo  que  sem melhor fundamento salvo o devido respeito. extraiu pela conclusão de se tratar de  doação de coisa futura nos  termos previstos  no art 211º do CC.
14D. Igualmente se discorda com  o devido respeito que se trate de promessa unilateral de dívida, prevista  no art 458º do CC , perfilhada pela douta sentença sendo  a confissão da divida por parte do apelados relevante para aplicação ao caso - o que não sucedeu- do instituto de enriquecimento sem  causa.
14 E.O apelantes alegaram factos concretos e essenciais  à procedência do pedido ou seja a condenação dos  apelados a restituir o dinheiro utilizado na aquisição da fracção), não os integrando em qualquer instituto jurídico tal como diz a douta sentença.
14 F. A obrigação de restituir fundada no enriquecimento sem causa tem natureza subsidiária e o recurso  à respectiva  acção é facultado ao empobrecido quanto a lei lhe não faculte outro meio para obter o ressarcimento dos seus prejuízos nos termo do disposto no art°s 473°., 474°.479° e 482º,  do CC .
14 G.O tribunal a quo face aos factos provados concretos essenciais que se inserem na previsão da norma. Haveria de ter  concluído pela aplicação ao caso do instituto do enriquecimento sem causa. Não obstante esta na petição inicial  não tenha sido expressamente referida por meio de tal de designação. in Ac. nº  8171- TRL de 15.12.1994.
14 . A douta sentença "a quo" não se pronunciou sobre questão que devia apreciar, não obstante se encontrar apurada a necessária factual idade, não aplicou de  forma correcta aos facto provados as norma jurídicas correspondentes, tendo sido  violado o disposto nos  arts 473° e 474° do CC e ainda nas als. e d), do n° 1 do art" 668° do CPC.
15. Os apelados devem ser condenados restituir aos apelantes tudo aquilo com que injustamente se locupletaram. acrescido do pagamento de juros de mora desde a interpelação judicial, momento a partir do qual se pede a reparação devida, de acordo com o disposto nos artos 805º e 806º do CC.
16. Termos em que a. aliás douta sentença deve ser revogada. dando-se provimento ao recurso.
Foram proferidas contra alegações de recurso e requerida a ampliação do objecto do recurso nos termos do artigo 684-A , nº2 do CPC, com referência ao disposto no artigo 690-A , nº1 e 4 , do CPC.
São as seguintes as conclusões formuladas pelos Apelados
(…)

Objecto dos recursos.
O objecto do recurso baliza-se pelas conclusões dos recorrentes sem prejuízo da apreciação de outras questões de que cumpra oficiosamente conhecer.
Os factos dados como provados pelo tribunal recorrido são os seguintes:
1. Pouco tempo depois de o autor e o réu se conhecerem, este foi contratado como responsável pela área técnica da sociedade DD Lda, com sede em (...), de que o autor é sócio gerente (alínea A) dos Factos Assentes).
2. A partir dessa data, estabeleceram-se entre o autor e o réu óptimas relações profissionais e pessoais (alínea B) dos Factos Assentes).
3. Almoçavam juntos e partilhavam momentos de lazer fora do horário de trabalho, encontrando-se assiduamente (alínea C) dos Factos Assentes).
4. Passaram a ter plena e total confiança um no outro (alínea D) dos Factos Assentes).
5. O autor e o réu visitaram juntos a fracção autónoma designada pela letra A, correspondente ao rés-do-chão do prédio sito em (...), que se encontrava à venda (alínea E) dos Factos Assentes).
6. O réu não tinha meios para a sua aquisição, mas o autor dispunha de capital para essa compra (alínea F) dos Factos Assentes).
7. No dia 24 de Setembro de 2003 o autor pagou a sisa correspondente à compra da fracção (alínea G) dos Factos Assentes).
8. Por escritura de 8 de Outubro de 2003 a sociedade (...), declarou vender à ré, que declarou comprar, a fracção referida em E), pelo preço de 250 000,00 euros (alínea H) dos Factos Assentes).
9. A aquisição da fracção foi registada a favor da ré na Conservatória do Registo Predial (alínea I) dos Factos Assentes).
10. Os réus casaram um com o outro no dia 23 de Outubro de 2004 (alínea J) dos Factos Assentes).
11. Os réus têm vindo a usar em seu exclusivo proveito a fracção referida em E) (alínea K) dos Factos Assentes).
12. Foi acordado entre o réu e o autor que a compra da fracção referida em E) seria feita pelo autor (resposta ao artigo 3. da Base Instrutória
 13. Do contrato promessa consta uma cláusula de cedência de posição contratual da pessoa do comprador (resposta ao artigo 5. da Base Instrutória).
 14. A escritura de compra e venda seria realizada mediante prévia comunicação por parte da promitente vendedora (resposta ao artigo 6. da Base Instrutória).
 15. O autor subscreveu um cheque sacado sobre o (...) da agência de Terrugem, de 125 000,00 euros, datado de 3.09.03, com o nº 64000000707, emitido ao portador (resposta ao artigo 7. da Base Instrutória).
 16. O réu informou o autor que a escritura de compra e venda estava marcada para o dia 8 de Outubro de 2003 (resposta ao artigo 8. da Base Instrutória).
17. Como o autor não podia estar nessa data em Lisboa, os dois acordaram que a escritura seria celebrada pelo réu na qualidade de comprador (resposta ao artigo 9. Da Base Instrutória).
18. Para esse efeito, o autor subscreveu e entregou ao réu um cheque no valor de 250 000,00 euros, sacado sobre o (...), da agência de Terrugem, datado de 8.10.03, com o nº 9800000077, emitido à ordem de PM de Carvalho (resposta ao artigo 10. da Base Instrutória).
19. No dia 8.10.03 o réu colocou a ré na posição de compradora na escritura, ao invés do que fora acordado com o autor (resposta ao artigo 11. da Base Instrutória).
20. Apesar do que foi declarado na escritura, o preço da transacção foi de 375 000,00 euros, pago à sociedade vendedora mediante a entrega dos dois cheques emitidos pelo autor (resposta ao artigo 12. da Base Instrutória).
21. Os réus assumiram como sua a dívida, informando o autor de que iam pedir um empréstimo bancário, com recurso à hipoteca da fracção, para lhe restituírem tal valor(resposta ao artigo 15. da Base Instrutória;
22. Contudo os réus não pagaram ao autor o valor dos dois cheques (resposta ao artigo 16. da Base Instrutória)-
23. O autor e o réu conheceram-se em 1999 (resposta ao artigo 17. da Base Instrutória).
24. O réu confidenciou várias vezes ao autor a vontade de se casar e de constituir família com a ré, com quem o autor também já havia estabelecido uma relação de amizade (resposta ao artigo 18. da Base Instrutória).
25. Confidenciou também o réu ao autor a vontade de adquirir um imóvel destinado à habitação para utilizar como sua residência e da sua família a constituir (resposta ao artigo 19. da Base Instrutória).
26. O autor acompanhou os réus na visita à fracção referida em E) (resposta ao artigo 22. da Base Instrutória).
27. Quando os réus indicaram ao autor a fracção referida em E) como sendo a sua escolha, este iniciou conversações com a sociedade vendedora para a comprar, tendo subscrito um contrato promessa para o efeito (resposta ao artigo 23. da Base Instrutória).
28. A ré pagou ela própria a sisa em 7 de Outubro de 2003 (resposta ao artigo 25. da Base Instrutória).
29. Informadas as partes da data da escritura, o autor entregou ao réu um cheque de 250 000,00 euros para pagamento do preço da compra (resposta ao artigo 26.da Base Instrutória).

Apreciando e decidindo
Nas conclusões de recurso os Apelantes não impugnam matéria de facto mas  contestam a solução jurídica encontrada pelo tribunal recorrido considerando, por um lado,  que o acordo celebrado entre apelante apelados, por via do qual se ajustou  o reembolso do capital ao apelante configura um mútuo o qual por não ter sido celebrado por escrito é nulo por falta de forma  face ao disposto nos arts 1143 e 289 do CC. , devendo  ser restituído ao apelante o capital bem como os juros de mora devidos desde a interpelação judicial; por outro lado, sustentam  que a  obrigação de restituir resulta, ainda,   da assunção dessa responsabilidade por parte da apelada, que reconheceu a divida como assuntora  da obrigação nos termos do dispo to no art 595, do C C.
Defendem, ainda,  que caso assim se não entenda, e não tendo ficado provado que o apelados tenham recebido a fracção com "prenda de casamento” não existe motivo legítimo  para que os apelados enriqueçam o seu património por via da quantias com as quais a fracção foi adquirida  e  entendem que da factualidade provada o tribunal deveria ter aplicado ao caso o instituto do enriquecimento sem causa, apesar de na petição este não ter sido referido expressamente.
Invocam também que, por isso,  incorreu a sentença nas nulidades do artigo 668, nº1 al c) e d) do CPC.
Vejamos:
Não se verificam as nulidades da sentença previstas no artigo 668, nº1, al c e d do CPC.
A nulidade prevista na alínea c) pressupõe a oposição entre os fundamentos e a decisão, isto é, o raciocínio  do julgador aponta num sentido e no entanto decide em sentido oposto, o que não é o caso pois a decisão é consequência lógica da fundamentação.
Também não se verifica a nulidade da alínea d) –omissão de pronuncia –porquanto o tribunal apreciou as questões submetidas à sua apreciação.
Apreciemos agora se atenta a factualidade provada se  o tribunal recorrido deveria ter condenado os RR no pedido.
 As causas de pedir invocadas na acção são duas:
-um acordo entre o A. e o R. no sentido de que aquele compraria a casa escolhida pelos RR., e depois a revenderia, repartindo com o R. o lucro, após devolução do dinheiro investido pelo A.
- um contrato  de mútuo e com base nele, um direito de restituição, fundado na sua nulidade por falta de forma.
Como bem se refere na sentença os AA não lograram provar factos que integrassem a primeira causa de pedir e igualmente não demonstraram o contrato de mútuo.
Como é sabido, o mútuo é o contrato pelo qual uma das partes empresta à outra dinheiro ou outra coisa fungível, ficando a segunda obrigada a restituir outro tanto do mesmo género e qualidade.-art.1142 do C. Civil.
É certo que o Apelante passou  dois cheques,    entregou um deles ao Apelado e  tais cheques  destinaram-se  à compra do imóvel. Mas isso não bata para se ter por assente que o Apelante emprestou ao Apelado a quantia titulada pelos cheques ficando este com a obrigação de restituir esse montante.
Também não releva  o que consta dos factos 21 e 22 da matéria provada  -21. Os réus assumiram como sua a dívida, informando o autor de que iam pedir um empréstimo bancário, com recurso à hipoteca da fracção, para lhe restituírem tal valor. 22. Contudo os réus não pagaram ao autor o valor dos dois cheques).
Com efeito, esta matéria factual  carece de ser analisada e interpretada em termos técnico-jurídicos e, não havendo documento escrito donde conste o reconhecimento da dívida como a lei exige,   tal factualidade não tem relevância jurídica de molde a poder dizer-se que os RR reconhecem a dívida.
Como bem refere Almeida e Costa Direito das obrigações , 9ª Ed , pg 426 “Quanto à forma preceitua o art 458, nº2, que a promessa ou reconhecimento deve, porém constar de documento escrito…”(…) …”.a forma mínima para a promessa ou reconhecimento é o documento escrito.”. Tal decorre, aliás,  cristalinamente da letra da lei.
E refere o mesmo autor : “ Com esta imposição a lei procura evitar dúvidas ulteriores e advertir o devedor da importância do seu acto”(ob citada , pg 426).
  Não se tendo provado o mútuo entre A e R, que a existir seria inválido por falta de forma daí decorrendo a obrigação de restituição da quantia  entregue ao R também  não faz sentido falar-se na assunção de dívida por parte da Ré  pois a assunção de divida como o próprio nome indica,  é a operação pela qual um terceiro ( assuntor ) se obriga perante o credor a efectuar a prestação devida por outrem – art. 595 do C.C.
Consideramos que o enquadramento jurídico feito na sentença recorrida no sentido de não estar demonstrado o mútuo nem o reconhecimento de dívida está correcto.

Quanto ao enriquecimento sem causa.
Como já referimos a primeira causa de pedir é o acordo entre o A. e o R. no sentido de que aquele compraria a casa escolhida pelos RR., e depois a revenderia, repartindo com o R. o lucro,  após a restituição ao A. do capital por ele investido naquela compra.
A segunda causa de pedir que invocaram os AA é um empréstimo feito ao Réu naquele montante peticionado, configurando um contrato de mútuo  que seria nulo por falta de forma.
Na petição não invocam os AA o enriquecimento sem causa sequer de forma implícita.
Ora, os recursos visam o reexame, por parte do tribunal superior, de questões precedentemente resolvidas pelo tribunal a quo, e não a pronúncia sobre questões novas.
Trata-se de rever ou reponderar, pelo que o tribunal  de recurso não pode pronunciar-se sobre matéria não submetida à apreciação do tribunal recorrido.
Refere  Ribeiro Mendes que  os recursos ordinários são de revisão ou de reponderação da decisão recorrida, não de reexame; o objecto do recurso é constituído por um pedido que tem por objecto a decisão recorrida. A questão ou litígio sobre que recaiu a decisão impugnada não é, ao menos de forma imediata, objecto do recurso (Recursos em Processo Civil, Coimbra Editora, Abril de 2009, 50 e 81).
Daí que “os tribunais de recurso não podem apreciar ou criar soluções sobre ‘matéria nova’ (ainda Ribeiro Mendes, obra citada, 51).
Ou como dizem Lebre de Freitas e Ribeiro Mendes, “é, por isso, constante a jurisprudência no sentido de que aos tribunais de recurso não cabe conhecer de questões novas (o chamado ius novorum), mas apenas reapreciar a decisão do tribunal a quo, com vista a confirmá-la ou revogá-la.” (CPC, anotado, 3º, 2ª edição, Coimbra Editora, 2008, 8).
Estes doutrinadores acrescentam que “os tribunais de recurso podem, porém, conhecer de questões novas que sejam de conhecimento oficioso (…)”.
Às partes não é, portanto, lícito suscitar questões que não hajam sido objecto da decisão recorrida, não podendo o tribunal de recurso pronunciar-se sobre questões ali não decididas, excepto nas situações em que a lei expressamente determine o contrário, ou naquelas em que a matéria em causa seja de conhecimento oficioso.
Tudo em conformidade ainda com o princípio da preclusão e da lealdade processual.
Não sendo do conhecimento oficioso o enriquecimento sem causa.
Como resulta do princípio consagrado no art. 473º-1 C. Civil, na base do instituto do enriquecimento sem causa está uma deslocação patrimonial através da qual o património de uma pessoa beneficia de uma vantagem económica à custa de outra, independentemente da origem do acto de que procede essa vantagem. Juridicamente, uma tal vantagem, pode consistir, entre outras situações, na constituição de um direito subjectivo, na manutenção de um direito que, sem o enriquecimento se extinguiria, na modificação qualitativa ou quantitativa dum direito, na não constituição, extinção ou alteração dum débito (vd. MENEZES CORDEIRO, “Direito das Obrigações”, 2º, 53; ac. STJ, 8/7/97, CJ/STJ, V--II-145).   
Tendo a obrigação de restituir a sua origem no facto jurídico do enriquecimento, pressupõe, aquela, que este careça de causa justificativa.
O enriquecimento sem causa, previsto no art. 473º e ss. do C. Civil é fonte autónoma de obrigações, sendo que a causa da deslocação patrimonial só releva na ausência de relação obrigacional, negocial ou legal e, designadamente, tratando-se de prestação sem qualquer finalidade típica tutelada.
Por isso, a pretensão de enriquecimento é sempre subsidiária (ou residual), de tal modo  que só é possível se não existir meio alternativo para ressarcimento dos prejuízos (declaração de nulidade ou de anulação de negócio, por ex.).
Sendo, ele mesmo, fonte autónoma de obrigações, embora subsidiária, a falta de causa da atribuição ou vantagem patrimonial que integra o enriquecimento terá de ser alegada e demonstrada por quem invoca o direito à restituição dela decorrente, em conformidade com as exigências das regras gerais sobre os ónus de alegação e prova – art. 342º C. Civil.
A mera falta de prova da existência de causa da atribuição não é suficiente para fundamentar a restituição do indevidamente pago, sendo necessário provar que efectivamente a causa falta (cfr.  entre outros acs. STJ, de 24/4/85, BMJ 346º-254).
Por outro lado, e agora sob o ponto de vista do direito adjectivo, apesar dessa natureza subsidiária da obrigação de restituição fundada no enriquecimento, não podem ser afastadas as normas processuais sobre a iniciativa das partes e os poderes do tribunal, nos termos do art. 264º do CPC (princípio dispositivo), não podendo o tribunal,  afastar-se dos factos alegados e do pedido do autor (art. citado, nº 2 e 664º do mesmo diploma).
Como já referimos a factualidade integrante de tal causa de pedir nunca foi articulada, razão por que também não seria possível condenar os RR. com fundamento no instituto subsidiário.
Não alegam ou invocam , insiste-se, em parte alguma dos articulados, a falta de causa da atribuição ou vantagem patrimonial.
Assim, não pode acompanhar-se o Recorrente na sua pretensão de fazer derivar o direito à restituição da mera demonstração de uma deslocação patrimonial, desconsiderando os demais requisitos legalmente exigidos para a existência da obrigação de restituir, designadamente a prova da falta de causa da deslocação.
Não foram nem alegados nem provados, os requisitos da obrigação de restituição por enriquecimento sem causa.
O tribunal recorrido não tinha que apreciar o enriquecimento sem causa porquanto a acção intentada não foi estruturada nessa base. Os AA na acção intentada  nunca invocaram o enriquecimento sem causa sequer a título subsidiário
A  acção foi estruturada no pressuposto- foram os AA que afirmaram- ter existido um mútuo, que não lograram demonstrar pelo que segundo as regras do ónus da prova a acção teria de ser julgada como improcedente, por indemonstração dessa tese , sendo indiferente que os RR.  não tenham demonstrado a sua tese, porque a regra de decisão aplicável, o artigo 342º, nº 1 do CC, determina , face à incerteza, a decisão contrária àquele que invocou um determinado direito (aqui o direito a reaver, por via da nulidade do mútuo, o que entregou aos demandados) e não demonstrou os  factos constitutivos desse direito invocado.
Veja-se a este propósito uma questão similar analisada no Ac da Relação de Coimbra de 17.9.2003 consultável em ww.dgsi.pt onde se conclui:
“A falta de prova da “causa justificativa” alegada implica, relativamente ao enriquecimento sem causa, o accionar, por ausência dos pertinentes factos constitutivos, das “regras de decisão” previstas no artigo 342º do CC.
“Assim, o enriquecimento sem causa não traduz uma regra “residual” de decisão (não traduz sequer uma regra de decisão), que seja desencadeada, no que à obrigação de restituir respeita, pela indemonstração da causa de uma deslocação patrimonial, cuja invocação se dirigia a outro efeito (como seja a restituição de uma quantia mutuada).”
“ Nestes casos, invocação de ter existido um mútuo sem que se tenha logrado prová-lo, a acção improcede, sendo descabido determinar a restituição do que foi prestado aos alegados mutuários com base no suposto enriquecimento sem causa destes.”
Assim sendo a acção teria necessariamente de ser julgada improcedente.
Fica prejudicado o conhecimento da ampliação do âmbito do recurso dos recorridos .
Conclusões:
1.A promessa de cumprimento e o reconhecimento de dívida previstos no artigo 458, do C Civil devem constar de documento escrito nos termos do nº2, do referido preceito.
2.Sendo a  acção  estruturada no pressuposto-  foram os AA que afirmaram- de ter existido um mútuo, que não lograram demonstrar,   segundo as regras do ónus da prova a acção teria de ser julgada  improcedente, por indemonstração dessa tese , sendo indiferente que os RR.  não tenham demonstrado a sua tese, porque a regra de decisão aplicável, o artigo 342º, nº 1 do CC, determina , face à incerteza, a decisão contrária àquele que invocou um determinado direito (aqui o direito a reaver, por via da nulidade do mútuo, o que entregou aos demandados) e não demonstrou os  factos constitutivos desse direito invocado.
3. O tribunal recorrido não tinha que apreciar o enriquecimento sem causa,  agora trazido as alegações de recurso,   pois na acção  intentada  nunca os AA invocaram o enriquecimento sem causa sequer a título subsidiário.
DECISÃO
Pelo exposto julgam improcedente a apelação confirmando a sentença.
Custas pelos Apelantes.
Lisboa, 24.02.2015
Maria do Rosário Barbosa
Rosário Gonçalves
Graça Araújo
Decisão Texto Integral: