Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
6421/17.2JFLSB.L1-5
Relator: RUI COELHO
Descritores: REENVIO PREJUDICIAL
VIOLAÇÃO DO SEGREDO DE JUSTIÇA
VIOLAÇÃO DO SEGREDO DE FUNCIONÁRIO
NOVA VERSÃO DE TIPO CRIMINAL
TRATAMENTO MAIS FAVORÁVEL
PROVA INDIRECTA
PRINCÍPIO IN DUBIO PRO REO
REALIZAÇÃO DE PERÍCIA
PRINCÍPIO DA NECESSIDADE DA PROVA
DESPACHO DE AUTORIZAÇÃO DE INTERCEPÇÃO TELEFÓNICA
NULIDADES PROCESSUAIS
INTERCEPÇÕES TELEFÓNICAS
METADADOS
CORRUPÇÃO
PECULATO
OFERTA
CONTRAPARTIDA
CRIME CONTINUADO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 04/09/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NÃO PROVIDO
Sumário: I–O Juiz nacional deve rejeitar o pedido de reenvio prejudicial se o caso não implica a aplicação de direito comunitário, mas apenas de direito nacional.

II–Quando o Tribunal decide não pronunciar um dos Arguidos acusado como co-autor, tal não terá que se estender necessariamente aos demais.

III–Estender ao crime de violação de segredo de justiça a mesma natureza que o crime de violação de segredo por funcionário é desprovido de fundamento legal e viola o princípio da tipicidade penal.

IV–Quando a nova versão do tipo criminal revogou a versão anterior, na íntegra, o Tribunal não pode aplicar apenas uma parte da norma antiga ou uma parte da norma nova. Terá que conhecer de forma global e sistemática o âmbito de cada incriminação, em toda a sua amplitude, escolhendo aquela que, concretamente, for mais favorável ao Arguido.

V–Nada obsta ao recurso da figura da prova indirecta para obter uma resposta quanto à matéria de facto levada à apreciação do Tribunal, posto que existem regras para a sua utilização e não produz decisões arbitrárias ou incoerentes. Tem um substracto objectivo e é fruto de um processo sindicável.

VI–Quanto à valoração da prova, o que o Arguido pretende é que seja outra, mais de feição ao seu interesse e de acordo com aquilo que defende. Porém, não se vislumbra a razão pela qual a sua visão se deva impor à do Tribunal, cujo teor foi determinado pelos critérios seguidos na sua fundamentação.

VII–Não basta que o Recorrente defenda que teve dúvidas quanto aos factos, atenta a prova produzida pois, se o Tribunal as não teve, não violou o princípio do in dubio pro reo. O Tribunal, com a amplitude permitida pela livre apreciação da prova, superou as dúvidas que poderia ter e produziu uma decisão fundamentada na qual expressa como chegou aos factos provados.

VIII–O Tribunal não pode ficar refém de uma sua decisão determinou a realização de uma perícia. Nomeadamente se se revelou que a mesma não era exequível, tanto mais que a matéria em apreço estava coberta pela prova produzida em audiência, e não se afigurava possível ir mais longe no que à demonstração dos factos. Para tanto, basta-lhe, justificadamente, explicar as razões pelas quais veio a decidir em sentido contrário. Pode, inclusivamente, o Tribunal chegar à conclusão de que, perante a prova produzida, se torna desnecessária a realização de uma diligência probatória anteriormente determinada, sem que tal importe qualquer nulidade.

Tal emerge do princípio de controlo, pelo Tribunal, da necessidade da prova, que se traduz no princípio da livre apreciação da mesma, tal como está consagrado, genericamente, no art.º 340.º do Código de Processo Penal; cuja abrangência de poderes do Tribunal se revela quer na apreciação dos requerimentos de prova quer, igualmente, e a cada momento, na prova a produzir em audiência.

IX–O despacho de autorização da escuta deve, fundamentalmente, tornar perceptíveis as razões que levam o juiz a autorizar a escuta, sem necessidade de expor as razões pelas quais os outros meios de obtenção de prova não servem no caso concreto.

X–Ao sistema de nulidades de actos processuais, o Código justapõe um regime próprio de proibições de prova. Serão de excluir do círculo das proibições de prova as inobservâncias sem mais, das formalidades prescritas para o processamento das escutas a que se refere o art.º 188.°, do C.P.Penal.

XI–Escutas telefónicas como meio de obtenção de prova e aproveitamento e transmissão dos metadados são meios diferentes de obtenção de prova, com pressupostos de utilização diferentes, teleologicamente orientados para finalidades diversas - obtenção de dados de conteúdo no primeiro caso e obtenção de dados de identificação, tráfego ou localização no segundo. Obtenção de conteúdo em tempo real no primeiro caso, aproveitamento de dados armazenados no segundo, Não são, pois, confundíveis e têm assento legal distinto.

XII–Nos crimes de corrupção e peculato, exige-se a oferta, ou a promessa de oferta, de um conjunto de benefícios que podem, ou não, ter expressão pecuniária.

Mais do que o valor de artigos de ... e de ..., o acesso ao ...e aos …, a proximidade ao ... de ..., são claramente relevantes para um adepto. Esta proximidade, ainda que não seja traduzível em valor monetário, e pareça desprezível, tem um conteúdo que ao qual o cidadão comum concede um valor e garante uma satisfação pessoal que configura uma clara vantagem, nomeadamente pela indisponibilidade para o comum dos cidadãos.

XIII–A oferta e aceitação de diversas “contrapartidas” em diferentes momentos configura um constante renovar da resolução criminosa, correspondendo à prática de diversos crimes autónomos.

Porque não foi demonstrada qualquer circunstância externa que diminua sensivelmente a culpa do Arguido, não se mostra sustentável o recurso à figura do crime continuado.

(Sumário da responsabilidade do relator)

Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes Desembargadores da 5.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa:

RELATÓRIO

No Juízo Central Criminal – J16, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa foi proferido acórdão, com o seguinte dispositivo:
«A-Condenar o arguido AA . pela prática, em concurso real, de:
-1 (um) crime de corrupção passiva, p. e p. pelo artigo 373.°, n.° 1, e 386.°, n.° 1, alíneas a) e b), do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos de prisão, não lhe aplicando a pena acessória prevista no artigo 66.°, n.° 1, alíneas a), b) e c), do Código Penal;
-6 (seis) crimes de violação do segredo de justiça, p. e p. pelo artigo 371.°, n.° 1, do Código Penal (Inquéritos n.°s 143/17, 6785/15, 8/16, 872/16, 5340/17 e 7161/17), na pena de 1 (um) ano de prisão por cada um desses crimes;
-9 (nove) crimes de acesso indevido, p. e p. pelo artigo 47.°, n.° 1, da Lei n.° 58/2009, de 26 de outubro, na pena de 6 (seis) meses de prisão por cada um desses crimes.
-9 (nove) crimes de violação do dever de sigilo, p. e p. pelo artigo 51.°, n.°s 1 e 2, alíneas a) e d), da Lei n.° 58/2009, de 26 de outubro, na pena de 9 (nove) meses de prisão por cada um desses crimes.
-28 (vinte e oito) crimes de acesso ilegítimo, p. e p. pelo artigo 6.°, n.° 4, alínea a), da Lei do Cibercrime, na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão por cada um desses crimes.
-1 (um) crime de peculato, p. e p. pelo artigo 375.°, n.° 2, do Código Penal, na pena de 1 (um) ano de prisão, absolvendo-o da qualificativa do n.° 1 do mesmo artigo, e não lhe aplicando a pena acessória do artigo 66.° do Código Penal;
- em cúmulo jurídico, condenar o arguido AA . na pena única de 5 (cinco) anos de prisão, cuja execução se suspende, por idêntico período de tempo.
B-Absolver o arguido AA ., da prática de 21 (vinte e um) crimes de violação de segredo por funcionário, p. e p. pelos artigos 383.°, n.° 1, e 386.°, n.° 1, alíneas a) e b), do Código Penal.
C-Absolver o arguido BB da prática de 1 (um) crime de corrupção passiva. em coautoria com AA .. p. e p. pelo artigo 373.°. n.° 1. 386.°. n.° 1. alíneas a) e b). 26.°. do Código Penal. e na pena acessória prevista no artigo 66.°. n.° 1. alíneas a). b) e c). do Código Penal. não sendo. em consequência. condenado na pena acessória pedida (artigo 66.° do Código Penal).
D-Condenar o arguido CC pela prática de 1 (um) crime de corrupção ativa. p. e p. pelo artigo 374.°. n.° 1. do Código Penal. na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão. suspensa na sua execução por idêntico período de tempo. mediante a condição de o arguido proceder ao pagamento semestral da quantia de € 5.000.00 (cinco mil euros) à Associação Nacional de ..., fazendo prova desses pagamentos nos autos.
E-Absolver o arguido CC da prática de:
-6 (seis) crimes de violação do segredo de justiça, em coautoria com AA ., p. e p. pelos artigos 371.°, n.° 1, e 26.°, do Código Penal (inquéritos n.°s 143/17, 6785/15, 8/16, 872/16, 5340/17 e 7161/17);
-21 (vinte e um) crimes de violação de segredo por funcionário, em coautoria com AA ., p. e p. pelos artigos 383.°. n.° 1. 386.°. n.° 1. alíneas a) e b), 26.° e 28.°, do Código Penal (inquéritos e processos sem segredo de justiça):
-9 (nove) crimes de acesso indevido, em coautoria com AA ., p. e p. pelos artigos 44.°, n.°s 1 e 2, alíneas b) e c), da Lei n.° 67/98, de 26 de outubro, e 26.° do Código Penal:
-2 (dois) crimes de acesso indevido, p. e p. pelo art.° 44.°, n.°s 1 e 2, alíneas b) e c), da Lei n.° 67/98, de 26 de outubro (DD e EE):
- 9 (nove) crimes de violação do dever de sigilo, em coautoria com AA ., p. e p. pelos artigos 47.°, n.°s 1 e 2, alíneas a) e b), da Lei n.° 67/98, de 26de outubro, e 26.° do Código Penal:
-2 (dois) crimes de violação do dever de sigilo, p. e p. pelo artigo 47.°, n.°s 1 e 2, alíneas a) e b), da Lei n.° 67/98, de 26 de outubro (DD e EE).
F-Condenar os arguidos AA e CC no pagamento de 6 UCs de taxa de justiça, e nas demais custas do processo (artigos 513.° e 514.° do Código de Processo Penal, e 8.°, n.°s 4 e 5, do Regulamento das Custas Processuais).
Não são devidas custas pelo arguido BB.
G-Declarar perdidos a favor do Estado a documentação apreendida, bem como discos rígidos que tenham sido objeto de análise informática, o material informático e o casaco apreendido na residência do arguido AAe os telemóveis apreendidos aos arguidos e que foram utilizados para manter conversações relacionadas com a prática dos crimes.
H-Determinar a restituição a quem foram apreendidos dos demais bens apreendidos nos autos e que não constituam meios de prova.
I-Julgar o pedido de indemnização civil apresentado por FF contra os demandados AA . e CC parcialmente procedente, condenando o demandado AAno pagamento ao demandante da quantia de € 3.000,00 (três mil euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data da notificação do demandado para contestar o pedido de indemnização civil até integral pagamento, absolvendo o demandado CC da totalidade do pedido e o demandado AAdo remanescente do pedido.
J-Julgar o pedido de indemnização civil apresentado nos autos pelo GG contra o demandado AA totalmente procedente, condenando o demandado no pagamento ao demandante do montante de € 5.000.00 (cinco mil euros).
K-Julgar o pedido de indemnização civil apresentado pelo demandante HH contra os demandados AA e CC parcialmente procedente, condenando-se o demandado AA no pagamento ao demandante da quantia de € 2.000.00 (dois mil euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data da notificação do demandado para contestar o pedido de indemnização civil até integral pagamento, absolvendo o demandado CC do pedido.
L-Julgar o pedido de indemnização civil apresentado pelo demandante II contra os demandados AA . e CC parcialmente procedente, condenando-se o demandado AA no pagamento ao demandante da quantia de € 2.000,00 (dois mil euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data da notificação do demandado para contestar o pedido de indemnização civil até integral pagamento, absolvendo o demandado CC do pedido.
M-Julgar o pedido de indemnização civil apresentado pelo demandante JJ contra o demandado AA parcialmente procedente, condenando-se o demandado no pagamento ao demandante da quantia de € 2.000.00 (dois mil euros). acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data da notificação do demandado para contestar o pedido de indemnização civil até integral pagamento, absolvendo o demandado do restante pedido.
N-O demandado AA e os demandantes civis deverão suportar, se parcial ou totalmente vencidos nas demandas civis, as custas respetivas, na proporção do vencimento (artigo 536.° do Código de Processo Civil).
Não são devidas custas cíveis pelo demandado CC.»
- do recurso do Arguido AA -
Inconformado, recorreu o Arguido AA . formulando as seguintes conclusões:
«1.Tendo por base a factualidade dada como provada e não provada, devem, na procedência deste recurso, os factos dados como provados em 16,17,18,19,20,21,22,25,27,28,29 - excecionado os acessos aos proc.° 15477/16.4T8LSB, proc.° n.° 5340/17.7T9LSB e proc.º n.° 997/18.4T9LSB -, 31, 34, 35, 36, 38, 40, 43, 46, 47, 48, 51, 52, 53, 57, 58, 63, 64, 65, 68, 69, 70, 75, 76, 78, 79, 82, 83, 95, 96, 97, 98,100,101,104,105,106,107,108,148 - excetuando a consulta ao inquérito com o número 5340/17.7T9LSB -183,184,185,202, 203, 204, 205, 206, 207, 208, 209, 210, 211, 212, 213, 214, 215, 216, 217, 218, 220, 221, 222, 223, 224, 225, 226, 227, 228, 234, 235, 236, 237, 240, 241, 242, 243, 244, 246, 259, 260, 261, 262, 263, 273, 274, 275, 276, 277, 278, 282 e 283, serem dados como não provados.
2.A conclusão de que o arguido AA era autor de acessos não autorizados a processos judiciais, em troca de benefícios junto do ..., sendo corrompido pelo arguido CC para esse efeito, é feita sem qualquer base probatória concreta, utilizando-se, sem base legal, a perigosa prova indireta, em violação do princípio da livre apreciação da prova. O Tribunal a quo, para cimentar a sua conclusão deu como provado factos que, per si, anulam e contraditam a referida conclusão - que é o suporte da condenação pelo crime de corrupção passiva.
3.O Tribunal a quo, imputa acessos ilegítimos a processos judiciais ao arguido recorrente, na ótica do Tribunal a quo, com vista a este, em troca de tratamento privilegiado junto do ..., por parte do arguido CC. No entanto, o Tribunal a quo deu como não provados os factos E, L, M, N, P, Q, R, T e V, que são pontos fulcrais na teoria supra exposta, porquanto, o vertido nestes factos, se reportam às referidas contrapartidas que o arguido AA - segundo o Tribunal a quo - recebia por aceder, ilegitimamente, aos processos judiciais em questão nos autos e que o tribunal considerou que não sucedeu, e por isso, deu, tais factos, como não provados.
4.O Tribunal a quo opta por, em sede de motivação, não relevar em devida conta, a relação de forte amizade existente entre o arguido AA e o arguido CC.
5.O Tribunal a quo reconhece, nos factos provados, a relação de amizade existente entre o recorrente e o arguido CC, no entanto, em vez de valorar - devidamente - opta por a utilizar como um veículo para a prática dos crimes pelos quais os mesmos foram condenados, «criando» uma nova forma de corrupção, baseada não na promessa de contrapartidas, mas no aproveitamento duma relação de amizade, sem a existência de qualquer acordo prévio.
6.-O recorrente e o arguido CC conhecem-se desde 2015 e principiaram uma relação de amizade por essa altura; resulta objetiva e factualmente que os supostos acessos indevidos aos processos judiciais se iniciaram no ano de 2017. Caso a relação de amizade entre o recorrente e o arguido CC se pautasse, única e exclusivamente, numa relação de interesses e contrapartidas, por que razão demorou 2 anos o arguido CC a “corromper” o recorrente? A resposta é simples: não existe razão, pois o recorrente não foi corrompido, nem o co-arguido o quis corromper!
7.-A relação de amizade foi considerada pelo tribunal como “natural" - facto provado 297, ou seja, sincera e honesta, ao ponto do arguido CC confiar a segurança do seu próprio filho ao recorrente, para, com ele, percorrer quilómetros desde sua casa em ..., até ...e de, no momento mais difícil da vida do arguido CC - atropelamento com risco de vida do filho mais novo - o aqui arguido ter percorrido mais de 600 Km para o ir visitar no hospital onde se encontrava internado.
8.Nenhum dos acessos foram realizados mediante contrapartida e/ou vantagem - nem tal alguma vez lhe foi prometida pelo co-arguido -, o recorrente fê-lo sempre como favor de amigo, pela sua simpatia clubística e por uma necessidade natural de se sentir agradável, simpático e cordial junto do seu amigo CC.
9.Perante as declarações do co-arguido CC, o Tribunal a quo «salta» para a errada conclusão de que o recorrente terá sido o responsável pelos acessos aos processos judiciais que lhe são imputados, quando, na verdade, qualquer pessoa poderia ter efetuado os referidos acessos, partindo destes, para concluir por todos, até mesmo pelos realizados no período de férias e ausência do local de trabalho do recorrente, concluindo que tais acessos “terão sido executados mediante o uso de programas do género TeamViewer ou anydesk", num juízo conclusivo violador do princípio do in dúbio pro reo.
10.Em momento algum foi produzia prova em audiência de julgamento, ou junta aos autos no sentido de ser o arguido AA quem, de facto, acedeu aos processos n.° 9693/10.OJFLSB, proc.º n.° 3656/12.ªTTLSB-A, proc.º n.° 2189/13.0TVLSB,proc.º n.°6255/15.9TDLSB, proc.º n.° 143/17.1 JGLSB, proc.º n.° 6784/15.4TDLSB, proc.º n.° 6785/15.2TDLSB, proc.º n.° 8/16.4ZCLSB, proc.º n.° 770/16.4JDLSB, proc.º n.°872/16.7JFLSB, proc.º n.° 2074/16.3T9LSB, proc.º n.° 181/17.4JGLSB, proc.º n.° 183/17.0JGLSB, proc.º n.° 198/17.9JGLSB, proc.º n.° 2879/17.ªT9BRR, proc.º n.° 5242/17.7T9LSB, proc.º n.° 5310/17.5T9LSB, proc.º n.° 5354/17.7T9LSB, proc.º n.° 7161/17.ªT9LSB, proc.º n.° 7566/17.4T9LSB, proc.º n.° 7957/17.0T9LSB, proc.º n.° 8860/17.0T9LSB e proc.º n.° 98/18.5T9LSB, através das credenciais da magistrada KK e proc.º n.° 44/15.ªT9FAF, através das credenciais da funcionária judicial LLou qualquer outro.
11.As testemunhas MM ., NN e OO depuseram no sentido de que, tanto a sala do Tribunal de ..., como a sala do Tribunal de ..., se encontrava sempre aberta, que qualquer pessoa, especialmente outros funcionários judiciais, poderiam ter entrado na mesma, não sendo de olvidar a existência de outros funcionários da mesma simpatia clubística, um até arguido nos autos e outros, ouvidos em julgamento, designadamente a testemunha LL, sendo que a possibilidade de acesso por terceiros que não o recorrente, é real e nessa medida deverá ser admitida e interpretada pelo tribunal em favor do arguido, tanto mais que o Sr. Perito, desde o início, referiu ser impossível apurar quem, concretamente, acedeu aos referidos processos e, após o acesso, o que conseguiram consultar
12.Para ficar, efetivamente demonstrado, como foram feitos os acessos, seria necessária uma análise - pericial - aos logins - registo de dados do Citius - que o GG informou terem já sido destruídos, pelo que não podem ser imputados ao arguido AA os acessos que foram realizados enquanto o mesmo se encontrava, comprovadamente, de férias e ausente do trabalho, nomeadamente, acessos nos dias 24 de julho a 4 de agosto e de 14 de agosto a 31 de agosto de 2017.
13.Perante os esclarecimentos prestados pelo Sr. Perito, o recorrente requereu que o Tribunal a quo “se digne solicitar à entidade responsável pela disponibilização dos sistemas ”CITIUS” e “SITAF” bem como dos serviços de Rede Privada Virtual (VPN) aos registos de segurança/auditoria relativos aos dias em causa nos autos/perícia. Mais requerendo que, após a recepção de tais elementos, deverão os mesmos ser remetidos ao Sr. Perito afim de o mesmo completar a sua perícia"., sendo que tal foi impossibilitado pelo GG, que destruiu toda essa informação.
14.Não faz sentido, sem os elementos destruídos e não apresentados ao tribunal, com o relatório pericial e esclarecimentos ao mesmo, o tribunal dar como provado que foi o arguido que, no seu período de férias, desde o ..., acedeu aos processos, concluindo que “deve ter sido à distância com programas como o TimeViewer e anydesK', sendo que esta conclusão não faz, do ponto de vista do processo penal, qualquer sentido, pois para a condenação exige-se uma certeza absoluta e não o critério do deve ter sido.
15.A eventual destruição das provas, tem de se relegar para momento posterior às fases da investigação e da instrução, nomeadamente quanto à destruição de elementos que fazem parte do inquérito, designadamente os acessos VPN e logs armazenados nas bases de dados do GG, que só seria, processualmente própria, após o trânsito em julgado da decisão que puser termo ao processo, não podendo ser ordenada a sua destruição em fase anterior do processo, que esteja ainda em curso, ou pior, mesmo sem ser ordenada, ser destruída ou omitida por um dos assistentes no processo.
16.Percorrendo o Douto Acórdão, conclui-se que o mesmo é omisso quanto a factos integradores dos elementos subjetivo e objetivo do crime de corrupção, pois os pontos constantes da pronúncia mais não eram que juízos conclusivos e o douto Acórdão foi no mesmo sentido.
17.É indubitável que dos autos resultaram provas de alguns crimes de natureza informática, bem como é objetiva a existência dos processos judiciais a que se alude e que o arguido foi várias vezes ver ... de ..., alguns deles com convite, mas a verdade é que, a prova produzida em julgamento, não demonstra uma efetiva correlação entre uma coisa e outra e mais, não resultam factos que suportem a necessária «solicitação» criminosa.
18.Há que realçar a qualidade das pseudo contrapartidas, na medida em que a prova não permitiu sequer apurar o que é que foi visível por via dos acessos indevidos, isto é, não resulta do D. acórdão ora posto em crise que contrapartidas podia oferecer, sendo por isso, processualmente exagerado, estabelecer um nexo causal entre a oferta ou a promessa da vantagem.
19.Tribunal a quo deu como provado a existência de uma relação de amizade entre o recorrente e o arguido CC, que principiou no ano de 2015, sendo que a mesma surgiu de forma natural classificando o co-arguido CC, como uma pessoa de caráter naturalmente atencioso e o recorrente como uma pessoa entusiasta.
20.Nem o recorrente, nem o arguido CC esconderam, dissimularam ou procuraram omitir que tinham uma relação de amizade, sendo que ambos eram vistos e ouvidos a ter conversas típicas de dois bons amigos, tanto no ... do ..., bem como fora do mesmo, por exemplo, na zona do parqueamento, perante altas figuras do ... e do ... no geral, adeptos, jornalistas, políticos, etc, sendo do conhecimento de todos que é, por regra, o piso mais focado pelas câmaras das televisões e frequentado por jornalistas: O recorrente e o arguido CC não esconderam a sua amizade, porquanto não tinham nada a esconder.
21.O arguido CC pedia e cedia, em média,..., por ..., sendo que dispensava apenas uma ínfima parte (não sempre) ao arguido AA, tal e qual como fazia com outros amigos, designadamente o seu compadre PP. Aliás para se ter uma ideia da insignificância dos ...para os ... atente-se a fls. 267, 268 e 269 do Apenso Listagem de ...para o ... entre o ... e o ... no qual foram distribuídos 1574 ...para o ... do ...... o tal que o tribunal considerou tão especial em termos de oferta/contrapartida para o aqui arguido AA ., sendo de concluir (em face do número) que, afinal, tal não configura qualquer tratamento privilegiado.
22.O Tribunal a quo comete um erro, verificando-se contradição entre factos provados e não provados, na medida em que dá como provado a oferta de artigos de ... - no plural, o que indica a existência de várias prendas -, quando, na verdade, só foi feita prova da entrega de um casaco, casaco esse oferecido pelo arguido CC, nada mais é do que uma lembrança de Natal, bastando ter em atenção na data em que o mesmo foi oferecido - ... ... contra o …, a 20 de dezembro de 2017, pago com cartão do próprio arguido CC.
23.Resumindo, as ofertas do arguido CC ao, aqui, recorrente são aceites do ponto de vista social pelo público, sendo habituais, normais e corriqueiras com os usos e costumes da sociedade portuguesa e do mundo do ... e muito mais normais serão entre dois amigos sinceros e reais - facto provado 297.
24.Os ..., ...e artigos de ... oferecidos pelo arguido CC ao arguido AA, aqui recorrente, não passam de prendas ou ofertas decorrentes da relação de amizade que une ambos os arguidos, tanto mais que tais prendas não se traduziam em custos do lado de quem as oferecia, designadamente no que aos ... respeita, pois, como se referiu, estão em causa ... de menor presença de público nas bancadas.
25.A verdade é que a conduta do arguido AA - e, por extensão, do arguido CC - é socialmente adequada, não podendo, por isso ser enquadráveis numa enumeração taxativa a priori, apenas detetáveis, caso a caso, atendendo às características de cada sector de atividade, sendo que a aceitação de ofertas de ..., ...e artigos de ..., por cortesia e amizade, é característico a todos os sectores, de todas as atividades, sejam elas na função pública ou no sector privado.
26.Pelo princípio da adequação social, a conduta do arguido AA não pode consubstanciar um crime de corrupção passiva até porque, conforme já explanado, não existiram contrapartidas e/ou vantagens por qualquer das suas condutas, mas sim prendas de um grande e querido amigo para outro.
27.Em face de tudo o exposto e da prova produzida deverá ser dado como não provado que o arguido AA, aqui Recorrente, foi corrompido pelo arguido CC e deve ser dado como não provado que o arguido AA acedeu aos processos n.° 9693/10.OJFLSB, proc.º n.° 3656/12.ªTTLSB-A, proc.º n.° 2189/13.0TVLSB,proc.º n.°6255/15.9TDLSB, proc.º n.° 143/17.1 JGLSB, proc.º n.° 6784/15.4TDLSB, proc.º n.° 6785/15.2TDLSB, proc.º n.° 8/16.4ZCLSB, proc.º n.° 770/16.4JDLSB, proc.º n.° 872/16.7JFLSB, proc.º n.° 2074/16.3T9LSB, proc.º n.° 181/17.4JGLSB, proc.º n.° 183/17.0JGLSB, proc.º n.° 198/17.9JGLSB, proc.º n.° 2879/17.ªT9BRR, proc.º n.° 5242/17.7T9LSB, proc.º n.° 5310/17.5T9LSB, proc.º n.° 5354/17.7T9LSB, proc.º n.° 7161/17.ªT9LSB, proc.º n.° 7566/17.4T9LSB, proc.º n.° 7957/17.0T9LSB, proc.º n.° 8860/17.0T9LSB e proc.º n.° 98/18.5T9LSB, através das credenciais da magistrada KK e proc.º n.° 44/15.ªT9FAF, através das credenciais da funcionária judicial Maria Cristina Castro e que o tenha feito a pedido do co-arguido CC mediante a entrega ou expectativa de receber qualquer contrapartida, designadamente, ...para ....
28.O tribunal violou o art.° 127° do CPP na forma como, erradamente apreciou a prova e assim sucedeu na desvalorização e desconsideração do depoimento do arguido CC e nos factos relatados pelas testemunhas QQ, RR, SSe TT, sendo que todos depuseram no sentido de que era prática comum a entrega gratuita de ..., ...e artigos de ..., por parte de altos funcionários do ... a amigos, clientes e parceiros profissionais, referindo a existência de cerca de 2000 ... para a maioria dos ... (com exceção dos ... com previsão de lotação esgotada), ...dirigidos a várias entidades, designadamente ... ..., ..., etc.
29.Desvalorizou, infundadamente, ainda, os depoimentos das testemunhas MM . e NN, quando os mesmos referiram que a sala do Tribunal de ..., onde o arguido AA trabalhava, estava sempre aberta e o depoimento da testemunha OO, o qual depôs no sentido de que o gabinete do arguido AA, no Tribunal de ..., estava quase sempre aberto; Desvalorizou ainda o depoimento do perito informático da Polícia Judiciária UU e da testemunha VV, ..., quanto à impossibilidade de dizer, concretamente, quem foi o autor dos acessos aos processos que se alude na conclusão 27.
30.O princípio in dúbio pro reo é princípio geral do processo penal decorrente do princípio da presunção da inocência do arguido.
31.No Acórdão de que ora se recorre, o que se faz é, - porque não tem certeza quanto à prática dos factos por parte do arguido AA - eliminam-se todas as provas que constituiriam a «contraprova» - designadamente o depoimentos do arguido CC em conjugação com as testemunhas QQ, RR, SS eTT, sendo que todos depuseram no sentido de que era prática comum a entrega gratuita de ..., ...e artigos de ..., por parte de altos funcionários do ... a amigos, clientes e parceiros profissionais, bem como a diversas pessoas e entidades, bem como a desvalorização do Tribunal a quo do depoimento do perito informático da Polícia Judiciária UU, da testemunha VV, ..., da testemunha MM, NN e OO - o que do ponto de vista do CPP não é admissível, por violação do princípio in dubio pro reo.
32.Na presença de dúvidas, o Tribunal, apreciou-a em desfavor do arguido, isto é, resultando da decisão recorrida a existência de dúvidas quanto a estas questões, em vez de, na aplicação do princípio do in dúbio pro reu, apreciar os factos em favor do arguido, não o faz, verificando- se dúvidas quer nos factos consubstanciadores dos crimes de corrupção passiva, quer nos acessos a que se alude na conclusão n.° 29.
33.Violou o D. Acórdão aqui posto em crise, o princípio in dubio pro reo, resultando evidente do texto da decisão recorrida, por si só e ainda conjugada com as regras da experiência comum, que a dúvida só não foi reconhecida, em virtude de erro na apreciação da prova, nos termos do art.° 410.°, n.° 2, alínea c) do CPP.
34.Conforme resulta dos autos, designadamente do relatório pericial e esclarecimentos do perito UU, relativos aos acessos indevidos imputados ao arguido aqui recorrente, não foi possível apurar quem estava por detrás dos computadores. Tal relatório da PJ logrou, seguindo os IPs, chegar aos dados de localização das máquinas/torres de computador fixos instalados nos tribunais de ... e ... e aos utilizadores do IP e, a partir destes, novamente percorrendo os IPs e dados alojados, chegar aos processos, indevidamente acedidos.
35.Não foi, porém, produzida qualquer prova direta dos acessos imputados ao recorrente, e, as dúvidas acerca da autoria dos acessos ficaram mais adensadas, pelo facto de se verificarem acessos a processos em dias em que o arguido AA não se encontrava em nenhum dos tribunais e mesmo nos dias em que o mesmo se encontrava de férias, na zona do ..., ou seja, a mais de 600 km de .../....
36.O Coletivo confrontado com esta realidade e como forma de esclarecer esta questão de natureza técnico-científica, ordenou a realização duma perícia e por Douto despacho de 1.2.2022, ref.ª citius 412664074, notificou o recorrente para apresentar os correspondentes quesitos, o que este fez, solicitando resposta às seguintes questões:” “AA ., arguido melhor identificado nos autos supra referenciados, notificado do Douto despacho vem pronunciar-se quanto ao objecto da perícia: Devem os peritos responder, além do mais que venha ser determinado, por V. Exc.a, o seguinte: 1. Os acessos informáticos efectuados nos entre os dias 24/7/2017 a 04/08/2017 e entre os dias 14/8/2017 a 31/8/2017, nos termos descritos na pronúncia, foram realizados a partir da máquina/computador instalado no Tribunal de ... ou a partir de outro computador? 2. 2. Sendo efectuado por outro computador como ficou tal acesso registado informaticamente e qual o correspondente disco/máquina? 3. No dia 27/10/2017 foi efectuado algum acesso informático nos termos que constam da pronúncia? Esse acesso foi realizado a partir da máquina/computador instalado no Tribunal de ... ou a partir de outro computador? 4. Sendo efectuado por outro computador como ficou tal acesso registado informaticamente e qual o correspondente disco/máquina?"
37.Notificado o assistente GG, veio inicialmente prestar falsas informações, alegando que o arguido tinha atribuído computadores portáteis, o que verificou ser falso e veio a resultar da prova posteriormente produzida, como, de resto, resulta do D. Acórdão; vindo mais tarde alegar que não podia prestar informações porque as bases de dados/alojamento do CITIUS tinham sido qualificadas como “segredo de Estado", para mais tarde vir alegar que “já não possuem os dados - logs/registos de acesso - por os mesmos terem sido apagados".
38.Tentando remediar a «trapalhada» do assistente GG, o Tribunal ordenou a inquirição de testemunhas e esclarecimentos complementares ao perito, vindo, quanto à perícia, a emitir despacho contraditório com o primitivo, na parte em que a havia determinado, revogando o ® mesmo.
39.A perícia em causa havia sido determinada por Despacho judicial, com vista a apurar se os acessos efetuados no período de férias do arguido, designadamente, para se apurar se tinham sido efetuados presencialmente, isto é, por manuseamento da máquina/computador, ou, se os acessos teriam sido concretizados à distância ou por meio dum outro computador e/ou equipamentos, tendo por base os dados que os IPs apresentam.
40.As questões a analisar em tal perícia judicialmente ordenada, são especificas e de natureza técnica e só com a realização de perícia poderiam ser, cabalmente esclarecidas, acabando o Tribunal por concluir como provado que os acessos nesse período “terão” (!?!) sido levados a cabo “à distância pelo arguido”, surgindo a conclusão, não com base em certezas, mas, apesar da dúvida, com base na restante prova, num aproveitamento para o processo penal do ditado popular: “quem faz uma, faz um cento”, o que, não tem cabimento no nosso ordenamento jurídico e é violador do princípio do in dúbio pro reo.
41.Tribunal “a quo" não poderá substituir uma perícia já determinada por Douto despacho transitado em julgado, por esclarecimentos aos peritos a uma perícia efectuada nos autos que não respondeu às questões e dúvidas colocadas pelo arguido a fls... em 12.01.2022.
42.A não realização da perícia nos autos, depois de ter sido determinada por Despacho já transitado em julgado, implica a nulidade por violação do caso julgado, pois transitada em julgado uma decisão, forma a mesma caso julgado formal sobre as questões ou relações de caráter processual ou adjetivo com efeito intraprocessual, não podendo o juiz na mesma ação alterar essa sua decisão.
43.A não realização da perícia técnica para esclarecimentos de questões de natureza técnico- científica, constitui uma omissão de diligências fundamentais para a descoberta da verdade material, diligência essa que o Tribunal deveria ter ordenado, nos termos do disposto nos artigos 323° e 340° ambos do CPP, e ao não o fazer, implica que a Decisão seja nula por e omissão de diligências essências à descoberta da verdade e boa decisão da causa.
44.A realização desta diligência é um dever do tribunal, dever esse que o Colectivo não cumpriu e ao não o ordenar - pior, ao revogar o próprio despacho que a havia ordenado - e optar o tribunal, «a olho», por uma das soluções - “deve ter sido o arguido à distância” -, curiosamente a menos favorável ao arguido, incorre o tribunal a quo em nulidade, impondo-se que seja ordenada a realização de uma nova perícia para determinar se os acessos foram executados presencialmente ou à distância e, em caso afirmativo a partir de que IPs, pois apenas essa permitirá uma resposta, penalmente, segura.
45.Da parte final da conclusão do relatório elaborado pela PJ resultou: “Quanto aos registos de segurança/auditoria aos sistemas “CITIUS” e “SITAF”, bem como dos serviços de Rede Privada Virtual (VPN), deverão ser solicitados à entidade responsável pela disponibilização dos mesmos, sendo que a entidade em causa é o GG, que, ao abrigo de contratos que tem com operadora de serviços de internet, armazena tais dados, denominados de logs.
46.Porém, os tais supostos registos/logs, despareceram da base de dados por o GG, assistente nos autos, os ter destruído e dessa forma escaparam ao crivo da análise dos sujeitos processuais e ao exercício do direito do contraditório.
47.Sem fundamento, e em violação pelos princípios do contraditório e do in dúbio pro reo, veio o tribunal a quo - mesmo sem os elementos destruídos e não apresentados ao tribunal, apesar do relatório pericial e esclarecimentos ao mesmo - a dar como provado que foi o arguido que, no seu período de férias, desde o ... acedeu aos processos, concluindo que “deve ter sido à distância com programas como o timewier ou anydesk”. Ora, este elemento de prova a ser valorado, como foi teria, necessariamente que constar dos autos e, como vimos, não consta.
48.A decisão condenatória ao suportar-se em elementos que o assistente GG destruiu, viola, ® de forma grosseira o princípio do contraditório. Além disso é inconstitucional a destruição de qualquer elemento probatório, que o órgão de polícia criminal e o Ministério Público conheceram sem que o arguido tenha de tal conhecimento e sem que se pudesse pronunciar sobre o seu interesse para a defesa e relevância para o processo.
49.A eliminação, de forma irreversível, de elementos de prova - registo de ligações/acessos VPN e logs de acesso neste caso - tem como consequência a nulidade de tal meio de prova, sob pena de tal constituir uma intolerável e inadmissível desigualdade de armas entre a acusação e a defesa, desigualdade que é constitucionalmente inaceitável por colocar em causa o processo justo e equitativo, consagrado constitucionalmente no artigo 20.°, n.° 4, CRP, como é próprio num Estado de Direito, do qual são corolários as mais amplas garantias de defesa, o contraditório e a lealdade e equidade processuais, plasmados no artigo 32°, n.° 1 e 5, CRP, desigualdade que é também ilegal, porquanto viola o artigo 6o, n.° 1 e 3, al. b), CEDH, normativo vigente na ordem jurídica portuguesa- art.°, n.° 2, CRP.
50.O arguido não devia, nem podia ser sujeito a julgamento pelos crimes pelos quais o co- arguido BB acabou por ser despronunciado pelo Supremo Tribunal de Justiça, tudo nos termos do recurso interposto em 26.05.2021, referência citius 29379042, que aqui e agora se dá por integralmente reproduzido, recurso esse admitido pelo Tribunal a quo, com subida a final, declarando o arguido que mantém interesse e requer a apreciação de tal recurso.
51.Se o Ministério Público construiu uma narrativa factual na acusação, na qual refere, expressamente, que o crime apenas se consumava com a acção conjunta do arguido recorrente com o BB e se este iá não está - por opção do Ministério Público nos termos supra alegados (e não por acção do STJ que se limitou a corrigir um erro do Tribunal da Relação de Lisboa) - não poderá o arguido AA ., aqui recorrente, ser ele, também, julgado, na medida em que a inação do MP quanto ao BB, terá, necessária e forçosamente de ter consequências, quanto ao aqui recorrente.
52.Ao não recorrer da decisão de não pronuncia relativamente ao co-autor e co-arguido BB, sabia o MP que a decisão de não pronuncia em co-autoria com o aqui arguido AA, implicaria o trânsito em julgado no que aos crimes não recorridos respeita, decisão essa que, fruto da acusação e dos moldes em que se encontra lavrada, deverá ser extensível aos demais arguidos, designadamente ao aqui recorrente.
53.Deverá a decisão de não pronúncia do co-arguido BB, declarada pelo Supremo Tribunal de Justiça, ser extensível ao aqui recorrente nos termos do disposto no art.° 402°, n.° 2 do CPP, aliás, entendimento diferente, violaria o princípio da igualdade, constitucionalmente consagrado, devendo ser declarada inconstitucional a interpretação normativa conjugada dos artigos 26° do CP e 402° do CPP, quando entenda não ser extensível aos demais arguidos a decisão de não pronúncia dum deles, dos efeitos do recurso de co-arguido consigo acusado em coautoria por violação dos artigos 13°, 20°, 32° e 219°, n.° 1 da Constituição da República.
54.O arguido não poderá ser condenado pelos factos que estão subjacentes à condenação pelos crimes de violação do segredo de justiça e crimes de acesso indevido, pois, relativamente a todos estes crimes, carecia o MP de legitimidade para promover a acção penal, por falta de queixa.
55.Percorridos os autos, resulta que nenhuma participação/queixa da entidade que superintende o serviço - GG - foi apresentada, tendo o Ministério Público, na sequência da denúncia anónima, partido, sem mais, para a investigação que fez como bem entendeu, terminando com a acusação - e agora com a condenação - para o qual não dispondo de legitimidade, situação que gera nesta parte a nulidade da acusação/pronúncia e por consequência a nulidade da condenação, impondo-se a absolvição do arguido pela prática destes crimes. 
56.As escutas telefónicas autorizadas (e efectuadas) nos autos são nulas e, nessa medida, não poderão valer, nem ser utilizadas como meio de prova, resultando do Douto Acórdão, que o Tribunal a quo, fez uso das mesmas para condenar os arguidos, verificando-se a ilegalidade do processo, por utilização de métodos proibidos de prova.
57.Na data em que foram ordenadas as escutas, dos autos resultavam apenas indícios da existência de acessos ilegítimos ao sistema informático instalado no DIAP de Lisboa e não qualquer co-relação com qualquer outro crime, designadamente de corrupção.
58.Considerando que, quanto ao crime de corrupção, que esteve na base da autorização de interceções telefónicas, os autos não apresentavam, até ao momento em que as escutas foram autorizadas, qualquer outro elemento de prova, facto ou indício que fosse, entende o recorrente que a interpretação do art.° 187° do CPP está ferida de inconstitucionalidade, nomeadamente da interpretação normativa do artigo 187° do Código de Processo Penal, no sentido que conclua ser admissível, mesmo sem elementos indiciários do crime de corrupção nos autos, e somente com base na informação constante de denúncia anónima, ao tribunal determinar a realização de intercepções telefónicas por tal constituir uma ofensa das garantias de defesa do arguido, violação dos princípios da legalidade em material criminal (art.° 29°, n.° 1 e 32° n.° 1 da CRP, violação do princípio do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva (art.° 20.°, n.°1, da C.R.P.), e dos artigos 18°, n.° 2, 34° n.° 1 e 4 todos da Constituição da República Portuguesa.
59.Dos presentes autos consta a ordem e a efetivação de destruição das escutas, mensagens e correio eletrónico que, selecionadas pelo órgão de polícia criminal e ouvidas pela MM.a Juiz de Instrução Criminal, por estes foram consideradas inúteis.
60.Tal destruição, ao não permitir que o arguido possa, ou que os arguidos possam ouvir as escutas e visualizar a correspondência eletrónica na íntegra e, na sequência dessa audição, possa(m) solicitar que algumas delas fiquem a constar dos autos, por, no seu entender, conterem elementos essenciais para a descoberta da verdade, e eventualmente, serem esclarecedoras de situações em que outras escutas poderiam levantar-se dúvidas, está, manifestamente, a violar os princípios da integridade dos autos e do contraditório, o que se traduz numa intolerável e inadmissível desigualdade de armas entre a acusação e a defesa, desigualdade que é constitucionalmente inaceitável por colocar em causa o processo justo e e equitativo, consagrado constitucionalmente no artigo 20.°, n.° 4, CRP, como é próprio num Estado de Direito, do qual são corolários as mais amplas garantias de defesa, o contraditório e a lealdade e equidade processuais, plasmados no artigo 32°, n.° 1 e 5, CRP, desigualdade que é também ilegal, porquanto viola o artigo 6o, n.° 1 e 3, ai. b), CEDH, normativo vigente na ordem jurídica portuguesa- art.ª°, n.° 2, CRP.
61.No que ao crime de peculato respeita, verifica-se uma contradição entre os factos provados - 225,226 e 227- e não provados - BA - o que gera, nesta parte, a nulidade do Douto Acórdão.
62.Tribunal dá como provado uma coisa - apropriação - e depois dá como não provado o inverso - ou seja, que o arguido tenha actuado com o propósito de fazer seus os equipamentos obsoletos que se encontravam em sua casa, devendo o recorrente ser absolvido do crime de peculato pelo qual foi condenado.
63.Sem prescindir: resulta da motivação do Acórdão, nesta parte, bem como na correspondente fundamentação, no que ao peculato respeita, as únicas provas produzidas nos autos foram os autos de busca, tendo deposto em tribunal, o inspector que a realizou e confirmado o auto. Não há, sobre este tema, outro depoimento testemunhal (além das testemunhas WW, chefe do arguido e de NN, secretário judicial), declarações de arguidos, vigilâncias, escutas, mensagens, absolutamente mais nada.
64.Não resultou da prova produzida em julgamento, que o aqui recorrente tenha querido se apropriar, em proveito próprio ou de outra pessoa, dos bens identificados nos autos, ou seja, não apresenta «animus domini», isto é, a intenção de fazer seus os bens apreendidos, antes sim fazer, somente, um uso dos mesmos.
65.Aquilo que, objectivamente resultou provado foi que o arguido tinha em sua casa, em uso, bens que são propriedade do Estado e nada mais, sendo que esse uso foi verificado pela PJ nas buscas realizadas à casa do arguido e resulta também das declarações da testemunha WW.
66.-O crime de peculato de uso previsto no art.° 376° n° 1 do Cód. Penal consuma-se com a utilização, pelo funcionário, de veículo ou outra coisa móvel de valor apreciável, para fins alheios àqueles a que se destinam, independentemente do fim visado pelo agente se ter ou não concretizado, sendo que é isso, que, no limite, resultou da prova, pelo que, sem prescindir do que supra se alegou quanto à contradição entre factos provados e não provados, se impõe a absolvição do arguido pelo crime de peculato e a sua condenação pelo crime de peculato de uso, p e p, pelo art.° 376° do CP.
67.Resulta dos autos que o arguido está, além do mais, condenado pela prática dos seguintes crimes: 6 (seis) crimes de violação do segredo de justiça, p. e p. pelo artigo 371.°, n.° 1, do Código Penal (Inquéritos n.°s 143/17, 6785/15, 8/16, 872/16, 5340/17 e 7161/17; 9 (nove) crimes de acesso indevido, p. e p. pelo artigo 47.°, n.° 1, da Lei n.° 58/2009, de 26 de outubro; 9 (nove) crimes de violação do dever de sigilo, p. e p. pelo artigo 51°, n.°s 1 e 2, alíneas a) e d), da Lei n.° 58/2009, de 26 de outubro e 28 (vinte e oito) crimes de acesso ilegítimo, p. e p. pelo artigo 6.°, n.° 4, alínea a), da Lei do Cibercrime.
68.Porém, ao contrário do que consta do Douto Acórdão, somos do entendimento, em face dos elementos existentes constantes dos autos, que, in casu, se verifica, em cada um deles, uma clara situação de crime continuado, devendo, em face disso, ser a imputação criminosa alterada, devendo, a final, o recorrente ser condenado por apenas um, de cada uma das previsões legais.
69.Prevê o artigo 30.°, n.° 1, do Código Penal: “O número de crimes determina-se pelo número de tipos de crime efectivamente cometidos, ou pelo número de vezes que o mesmo tipo de crime for preenchido pela conduta do agente”. Quer isto significar, que em princípio, o número de crimes determina-se pelo número de tipos de crime efectivamente cometidos (concurso heterogéneo), ou pelo número de vezes que o mesmo tipo de crime for preenchido pela conduta do agente (concurso homogéneo) - artigo 30.°, n.° 1, do C. Penal.
70.No caso concreto, quanto aos crimes de violação de segredo por funcionário crimes de violação de segredo de justiça (6), 9 crimes de acesso indevido, 9 crimes de violação do dever de sigilo e 28 crimes de acesso ilegítimo, verifica-se: A identidade do bem jurídico, pois em todos se pretende proteger o sigilo e segurança informática da informação aí «depositada»; A pluralidade de infrações - a conduta do arguido constitui infrações a várias normas ou várias vezes da mesma norma; A homogeneidade de comportamento do arguido, isto é, uma única resolução criminosa, ao decidir entrar no sistema informático e verificar os dados aí existentes, que se manteve estabilizada no tempo e no espaço, tendo os acessos informáticos sido executados sempre no contexto do exercício da actividade profissional do arguido, isto é, sem necessidade de criação de nova forma de acesso que se manteve; Dentro dum quadro exterior que permitia e facilitava os crimes: o arguido trabalhava diariamente com computadores e com o programa informático citius, sendo a partir desse mesmo quadro exterior que levou a cabo a infração das normais penais.
71.Pelo que, a manter-se a decisão condenatória, sem prescindir do que alegamos nos demais pontos desta motivação, não há pois, dúvidas que o comportamento e atividade criminosa do arguido, constituem uma unidade de desígnio e pluralidade de resolução criminosa, pelo que, se verifica, relativamente aos crimes pelos quais foi condenado, não um concurso real, mas sim, uma situação de crime continuado, pelo que, na procedência deste recurso, deverá o arguido ser condenado pela prática de um crime de violação de segredo de justiça, um crime de acesso indevido, um crime de violação do dever de sigilo e de um crime de acesso ilegítimo.
72.A questão dos metadados é abordada no Douto Acórdão posto em crise, do ponto de vista da sua aplicabilidade ao regime das escutas telefónicas. Não há dúvida que o Acórdão do Tribunal Constitucional que declarou a inconstitucionalidade, nos termos que melhor constam do Acórdão 268/2022, não visou, de facto, as normas que regulamentam o conteúdo das interceções em tempo real, mas também não é isso que está em causa no caso dos autos, tendo o Tribunal a quo «rodeado» a questão.
73.Dos autos, verificam-se a existência de metadados abrangidos pela declaração de inconstitucionalidade, dados que nada têm que ver com interceções telefónicas em tempo real e sobre esses o tribunal não se pronuncia. Foram esses mesmo dados que estiveram na origem do presente processo e na identificação de intervenientes, designadamente do aqui arguido e mesmo do cidadão XX que, precisamente, por causa dos dados informáticos conservados, chegou até a estar sob escuta telefónica (por determinação do JIC) e depois, nem sequer acusado foi. Quer isto dizer que, no caso, dos presentes autos, DADOS informáticos conduziram ao prosseguimento do inquérito e com base nestes DADOS, a escutas, vigilâncias, apreensões de computadores e buscas.
74.Se há processo que está assente em DADOS INFORMÁTICOS CONSERVADOS é este e o tribunal não pode fugir a esta questão, tanto mais que este processo começou com uma suposta «denúncia anónima» acerca de uns, possíveis, acessos a processos em fase de inquéritos e com base nisso, avançou-se para, com base em DADOS DE TRÁFEGO CONSERVADOS, tentar apurar-se os autores de tais acessos.
75.Para tal, fez a investigação o percurso inverso: a partir da análise dos DADOS existentes/conservados que permitiam indiciar os acessos efectuados meses antes, com base nos DADOS DE TRÁFEGO INFORMÁTICO, percorreu-se o sistema de dados, até se chegar aos IPs de acesso, isto é, foram os DADOS de acesso que permitiram chegar às máquinas instaladas no tribunal de ... e no tribunal de ..., sendo que foram esses DADOS conservados no sistema citius/habilus que permitiram a realização das perícias informáticas.
76.Os IPs são DADOS informáticos só possíveis pelo acesso à internet e para se aceder a esta, só mediante o uso de serviços de empresas de prestação de serviços informáticos, sendo os Metadados informações recolhidas e guardadas com um IP. 
77.O Tribunal Constitucional veio, em 19/4/2022, por Acórdão n.° 268/2022, considerar inconstitucional essa guarda. A decisão do Tribunal Constitucional respondeu e pronunciou- se atendendo ao regime de conservação de dados de tráfego dados de base para identificação de um utilizador a quem estava atribuído um endereço de protocolo IP.
78.Em face da Decisão do Tribunal Constitucional, deve colocar em crise a validade da prova com recurso a esses dados, pois a conservação dos dados, acesso e seu uso para a condenação nestes autos é abrangida por este acórdão e daí INCONSTITUCIONAL.
79.O Tribunal Constitucional entendeu que, ao não se prever que o armazenamento desses dados ocorre na UE, estará em causa, sem dúvida, o direito do visado controlar e auditar o tratamento dos dados a seus respeitos e a efetividade da garantia constitucional por uma entidade reconhecida e independente e considerou, igualmente, que guardar os dados de trafego e localização de pessoas restringe de modo desproporcionado os direitos à reserva da intimidade e da vida privada, designadamente por poder atingir sujeitos relativamente sobre os quais não existe qualquer suspeita de pratica de crimes.
80.É isso que, no caso concreto, sucedeu, pois foram os dados de tráfego, que permitiram a localização das máquinas/computadores, de pessoas, dos seus números mecanográficos, o seu número de telefone, moradas e categoria profissional.
81.É nula toda a prova obtida com recurso aos METADADOS recolhidos e guardados pelas operadoras e sistemas informáticos de conservação de dados utilizados por, através dos seus IPs, terem fornecido aos autos as trocas de comunicações e informações, designadamente, os acessos desde os computadores fixos existentes nos tribunais de ... e ... até à base de dados alojados e conservados no citius/habilus , e, desse modo, aos processos em curso no DCIAP e noutros tribunais identificados na pronúncia, bem assim como os dados informáticos que permitiram imputar ao arguido recorrente acessos concretizados à distância - com base em programas (ex. timewier ou anydesk) no período de férias no ... e ausências do local de trabalho, pois estes acessos, apenas são possíveis por via de DADOS DE TRÁFEGO, porquanto sem isso, seria impossível aceder, via VPN, desde o ..., às máquinas/computadores fixos dos tribunais de ... e ..., ficando esses acessos registados na rede virtual conservados nos serviços da operadora.
82.O citius/habilus funciona por intermédio da chamada “linha dedicada” ou “acesso dedicado” e também, na falha desta, mediante rede móvel, sendo a linha dedicada uma linha de telecomunicações, normalmente digital, destinada a assegurar uma ligação permanente entre dois pontos. Segundo a wikipedia, disponível in https://pt.wikipedia.orQ/wiki/Acesso dedicado define o acesso dedicado como “um termo técnico relacionado à central de atendimento telefónico ou ao tipo de conexão entre um computador ou um terminal com a Internet. É a conexão entre um telefone ou sistema telefónico (como um Distribuidor Automático de Chamadas) ou PABX e uma empresa operadora de longa distância ou de serviços de telecomunicação.
83.É um sistema de dados que funciona através da denominada internet fixa dedicada e caso esta falhe, por intermédio de rede móvel, sendo, ambos os serviços contratos à operadora de comunicações PT/Altice, que, para o efeito, guarda todos os dados transmitidos, o que é, de resto, facilmente perceptível, pela simples consulta de processos arquivados há anos, sendo possível a consulta dos mesmos por via do acesso aos dados armazenados.
84.Foram estes metadados que estabeleceram, entre si, na data dos factos as horas, em que se acedeu a cada um dos processos constantes dos factos provados e desde onde, ou seja, os dados que permitiram a localização e a partir daí a identificação do utilizador dessas máquinas, identificação essa, igualmente apenas possível com base nos DADOS CONSERVADOS nas bases de dados, sendo de recordar, tal como referimos supra que todos os acessos, quer presenciais, quer à distância, bem assim como a identificação dos utilizadores, apenas foi possível com o acesso aos IPs e estes apenas funcionam com serviços de internet.
85.Esta situação é flagrante em todos os factos provados relativos a acessos e identificação dos sujeitos, pois foi a partir deste conhecimento baseado em metadados, que se seguiram escutas, vigilâncias, buscas e demais diligências no inquérito, tal como resulta claro da motivação no Acórdão condenatório, o qual espelha a inexistência qualquer outra prova que e não sejam os dados informáticos reunidos e guardados pelas operadoras e serviços de alojamento de dados (IPs) apenas «funcionáveis» com serviços de internet, estando o recurso a metadados por parte do MP documentado, além do mais, a fls. 13,14,15,16 e 17, 34, 39, 41, 68, 80, 83, 87, 96,152,155,156,157,162 a 164,182 a 184,187,188, 230, 293 e fls. 119 a 130 do Relatório GG com informação IP's.
86.Não há dúvidas do suporte probatório em metadados, desde o início do processo, até à fase do julgamento, acabando o tribunal por dar grande parte da materialidade dada como provada com base neste método proibido de obtenção de prova.
87.Mesmo nas situações em que os dados não tenham sido por si só prova direta exclusiva do facto provado, a verdade é que tal teve influência na demais materialidade dada como assente que suportou a condenação do arguido, a verdade é que não se poderá deixar de concluir, que o recurso aos metadados guardados de forma inconstitucional contaminou a demais prova, ou melhor os meios de prova.
88.Face ao exposto, em aplicação ao caso concreto, com conjugação do art.° 122.° e 126.° do Código de Processo Penal e do n.° 8, do art.° 32.°, da Constituição da República Portuguesa, toda a prova extraída através de metadados é, proibida, o que vem sendo, confirmado quer pela declaração de inconstitucionalidade no âmbito do processo 268/2022, quer pela jurisprudência, neste sentido vide os Acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 7 de setembro de 2022 processo n.° 877/22.9JAPRT-A.E1 e e do Tribunal da Relação de Évora de 28.02.2023/Proc. 661/17.1TELSB.E1.
89.Resulta, sem qualquer dúvida a utilização de dados armazenados por operadoras de telecomunicações - dados de tráfego e dados de localização - para fundamentar a factualidade que consta, como provada, nos pontos 3, 4, 5,10,14, 22, 25, 27, 28, 29, 30, 31, 34, 35, 36, 37, 38, 40, 43, 46, 47, 48, 51, 52, 53, 56, 58, 63, 68, 69, 72, 75, 78, 82, 86, 87, 89, 90, 96, 97, 100, 105, 107, 112, 113, 115, 116, 117, 118, 141, 149, 150, 168, 169, 170, 171, 172, 173, 174, 175, 176, 177, 184, 220, 222, 234, 235, 236, 246, 262, 274, 275 e 282 do Douto Acórdão.
90.Não sendo permitida a utilização de prova obtida através de metadados, forçoso será de concluir que os factos dados como provados nos pontos supra identificados do Douto Acórdão condenatório se encontram, irremediavelmente, afetados pelo Acórdão do Tribunal Constitucional, sendo, desse modo, nula a utilização de tal prova, provenientes de meio proibido de obtenção de prova, o que deverá ser declarado com as legais consequências.
91.Entende o arguido que - sem prescindir do que se expôs nos pontos I a X deste recurso - deverá ser posta em causa a medida da pena, ainda que V. Exc.as, Meritíssimos Juízes Desembargadores, mantenham o entendimento que se verificam os crimes pelos quais o recorrente foi condenado.
92.Exercendo uma cuidada análise da materialidade vertida no douto Acórdão proferido em primeira instância, permitir-se-ia concluir pela existência de sérias razões para crer que duma pena mais baixa resultariam vantagens para a reinserção social do arguido condenado, além sido, in casu e no que à maioria dos crimes respeita deveria o Tribunal a quo ter optado pela pena de multa em detrimento da pena de prisão.
93.Não tomou o Tribunal em conta, todos os elementos constantes do relatório social, designadamente a integração profissional do arguido, que iniciou a sua atividade profissional apenas com 19 anos de idade, bem como não teve em devida conta, o grau de ilicitude; a situação pessoal; o seu comportamento anterior e posterior à prática do crime - exemplar e querido por todos os seus colegas, chefias e magistrados - neste sentido vide fls.... e depoimentos das testemunhas YY, ZZ, AAA, BBB e CCC; não obstante os factos em apreço, manteve a confiança de todos, continuando a trabalhar; a idade do arguido - ... anos - levando a grande parte da sua vida limpa de comportamentos ilícitos, com integração profissional, familiar e social, mesmo no período em que se encontrou em prisão preventiva, teve apoio da quase totalidade dos seus colegas do tribunal, que, inclusivamente assinaram um «abaixo assinado» atestando do caráter e boa conduta do recorrente. Igualmente não sopesou o seu caráter pessoal e a sua integração familiar, com família estável e três filhos todos estudantes.
94.Sem prescindir de tudo o que alegamos nos pontos I a X deste recurso, deverão as penas aplicadas ao arguido AA - ainda que se mantenha a decisão condenatória, o que apenas por mera hipótese académica se admite - ser alteradas, passando os crimes de violação do segredo de justiça, de acesso indevido, de violação do dever de sigilo, de acesso indevido e de peculato, a ser punidos com pena de multa, em quantum que V. Exc.aas entendam; e quanto ao crime de corrupção ser a pena reduzida para o seu limite mínimo legal, procedendo-se, em consequência, a novo cumulo jurídico em conformidade, ficando, em qualquer circunstância a pena suspensa na sua execução.»
O Arguido requereu ainda a apreciação do recurso interlocutório, por si apresentado em 26.05.2021, bem como audiência nos termos do art.º 411.º/5, do Código de Processo Penal.
Requereu igualmente reenvio prejudicial ao Tribunal de Justiça da União Europeia, para pronúncia sobre as seguintes questões prejudiciais:
«1. Em que medida os Tratados, concretamente o princípio da cooperação leal previsto no artigo 4.°, n.° 3 do Tratado da União (TUE), exigem que os tribunais nacionais investiguem e apreciem a compatibilidade das medidas nacionais de transposição da Diretiva 2006/24/CE com as garantias conferidas pela Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, incluindo o seu artigo 7.°, cujo conteúdo é inspirado no artigo 8.° o da Convenção Europeia dos Direitos Humanos (CEDH)?
2. A invalidade da Directiva 2006/24/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15.03.2006, declarada pelo TJUE no Acórdão Digital Rights Irei and, de 08.04.2006, nomeadamente no que respeita às exigências constantes dos seus artigos 3.° a 6.° implica a invalidade dos artigos 4.°, 6.° e 9.° da lei nacional que a transpôs (cfr. Lei n°. 32/2008, de 17.07) por exceder os limites impostos pelo respeito do princípio da proporcionalidade à luz dos artigos 7.° 8.° e 52.°, n°1 da Carta?
3. Deve o disposto no artigo 5.°, n° 1 alínea a) 2) iii) e alínea c) 2) i) da Diretiva 2006/24/CE, à luz do Direito da União Europeia, tal como interpretado nos Acórdãos Digital Rights Ireland, de 08.04.2014, Tele 2, de 21.12.2016 e La Quadrature du Net, de 06.10.2020, ser interpretado no sentido de que o endereço do protocolo IP atribuído a certa máquina no momento em que aquela se conexiona à rede e durante a sua ligação, envolvendo informação da sua utilização num determinado momento, revelando não apenas o utilizador, como também o posto/local de trabalho de quem o IP está atribuído e o acesso a informação, por via do mesmo, em determinado dia e hora, constitui dado de tráfego (metadado) gerado e tratado no contexto da oferta de serviços de comunicações electrónicas publicamente disponíveis ou de redes públicas de comunicações?
4. Deve o disposto nos artigos 2.°, n° 2 alínea a), 3.° e 5.° da Diretiva 2006/24/CE, à luz do Direito da União Europeia e da referida jurisprudência do TJUE, ser interpretado no sentido de as informações conservadas na aplicação informática denominada CITIUS (www.citius.mj.pt), nomeadamente a identificação de quem acedeu e consultou processos judiciais, a identificação destes, bem como o dia, hora e local em que tal acesso e consulta foi feita, designadamente através do IP usado para o efeito, constituírem dados de tráfego (metadados) gerados e tratados no contexto da oferta de serviços de comunicações electrónicas publicamente disponíveis ou de redes públicas de comunicações?
5. No caso de resposta afirmativa a qualquer uma das duas questões anteriormente formuladas, a conservação dos dados que constam da plataforma CITIUS, feita no âmbito dos artigos 4.°, 6.° e 9.° da lei de transposição (Lei n°. 32/2008, de 17.07), por força do determinado nos artigos 3.° a 6.° da Directiva 2006/24/CE é compatível com o respeito pelo (i) princípio da proporcionalidade, da necessidade e da adequação da restrição que a Directiva 2006/24/CE opera dos direitos ao respeito pela vida privada e familiar, (ii) princípio da protecção de dados pessoais previstos nos artigos 7.° e 8.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e, ainda, (iii) princípios gerais do direito comunitário previstos nos n.° 1 e 2 do artigo 6.° do Tratado da União Europeia?».
- do recurso do Arguido CC -
Também inconformado, recorreu igualmente o Arguido CC formulando as seguintes conclusões:
«1.ª
O recorrente, pese embora não se conforme com a condenação e dela discorde em absoluto, não pode deixar de reconhecer e de realçar a seriedade e a clareza da decisão, cuja fundamentação permite alcançar, sem margem para dúvidas, o raciocínio que lhe subjaz e, por isso, permite a sua sindicância em termos desejáveis num Estado de Direito Democrático.
2.ª
E, por isso, é fácil perceber do teor da decisão sob censura que a condenação do arguido pela prática do crime de corrupção se situa mais no campo do que aos olhos do Coletivo se afigura ser justo - impedir que a conduta do aqui recorrente fique impune -, do que no domínio da legalidade, ou seja, da aplicação estrita do Direito.
3.ª
O Coletivo, coerentemente, diga-se, está convencido de que a “ideia” da realização dos acessos ao “Citius”, concretizados pelo arguido AA ., foi do aqui recorrente e tal facto, é, por si só, reprovável e, por isso, merecedor de uma sanção penal. Se o arguido AAacedeu ilegitimamente (como o Tribunal dá profusamente por provado) a processos em curso nos tribunais e o fez a pedido ou, mesmo, por sugestão do ora recorrente, não deve ser apenas aquele arguido a ser punido, mas ambos.
4.ª
O que facilmente se retira da fundamentação da decisão é que o Coletivo, verdadeiramente, o que considera é que o aqui recorrente participou nos acessos executados pelo coarguido AA, agindo como instigador. Todavia, corretamente, o Coletivo não pôde deixar de reconhecer que a acusação/pronúncia não tinha “colocado” as coisas nesses termos, não tendo carreado para os autos os factos indispensáveis à determinação da coautoria. É o que expressamente se afirma a páginas 482 e segs. (do PDF, porque as páginas da decisão não se encontram numeradas).
5.ª
Assim, na impossibilidade de condenar o aqui recorrente como coautor dos crimes de acesso ilegítimo e indevido executados pelo coarguido AA, mas não admitindo que, dessa forma, o mesmo ficasse impune, o Coletivo, de forma incongruente e contraditória com o que deu como provado, e com a doutrina e jurisprudência que convoca, acaba por enquadrar (subsumir), atamancadamente, a conduta do aqui recorrente no crime de corrupção.
6.ª
Para tanto, “desdobra” a conduta do aqui recorrente, ficcionando motivação distinta, em dois momentos distintos, para um comportamento absolutamente idêntico (a oferta de ..., antes e depois do pedido dos acessos) e valorizando distintamente o mesmo facto de acordo com a reiteração e destinatário do mesmo (a oferta de ... esporádica e a oferta de ... reiterada à mesma pessoal), na ânsia de firmar uma peita, ou seja, a existência de uma contrapartida dada pelo aqui recorrente ao coarguido AA pelos acessos por este realizados. Decidindo, assim, contra o Direito.
7.ª
Foi, também, a vontade de não deixar impune a conduta do aqui recorrente, que levou o Coletivo a considerar válida a utilização, como meio de obtenção de prova, das interceções telefónicas realizadas ao arguido AA e, depois, ao aqui recorrente, uma vez que sem as mesmas não teria sido possível estabelecer qualquer ligação entre os arguidos.
8.ª
Com efeito, é manifesto que nos momentos em que foi promovida, e decidida, a realização das interceções telefónicas, não existiam quaisquer indícios da prática de um crime de catálogo, nomeadamente do de corrupção. Só erigindo em indício o que consta de uma denúncia anónima é que o Tribunal conseguiu vislumbrar, àquela data, a existência de indícios de uma qualquer contrapartida para os acessos feitos ao “Sistema Citius”, indiciariamente pelo coarguido AAou por um indivíduo de nome MM .. Ora, a contrapartida (a peita) é um elemento típico imprescindível para que se possa ter por indiciada a prática do crime de corrupção. A decisão é, pois, também, ilegal nesse segmento.
...
Resulta com evidente clareza que o que os autos forneciam à data da promoção, e da respetiva decisão de autorização, das escutas ao arguido AAe ao,então, suspeito XX, era, objetivamente, o seguinte: (i)
- Indícios fortes de acesso através do “Sistema Citius” a um determinado número de processos, resultantes de diligências que permitiram chegar à conclusão de que tais processos teriam sido acedidos com a utilização de credenciais de pessoas que não tinham feito tais acessos;
- Indícios de que tais acessos poderiam ter sido realizados por um de dois funcionários judiciais, ou por ambos, AA e XX, resultantes de diligências que permitiram determinar que os referidos acessos teriam sido realizados através de máquinas atribuídas a estes;
- Indícios de que informações desses processos teriam sido fornecidos ao ...ou ao aqui recorrente (CC), resultante do facto de nas buscas realizadas ao Gabinete deste nas instalações do ...ter sido apreendido um documento relativo ao processo com o NUIPC 5340/17.7T9LSB.
10.ª
Os autos não continham, pois, rigorosamente qualquer elemento que pudesse constituir elemento indiciário de qualquer crime, concretamente de catálogo. Com efeito, os elementos indiciários acima identificados não chegam, nem de perto, nem de longe, para fundar a suspeita da prática de qualquer crime de corrupção! Só através da imaginação, ou seja, da pura especulação, é que se pode configurar a hipótese de os factos até então apurados poderem ter subjacente um crime de corrupção.
11.ª
Os factos (indícios) até então apurados não permitiam, sequer, indiciar a que título o referido documento se encontrava na posse do arguido CC, muito menos que os acessos indiciariamente realizados por AA e/ou XX tivessem sido pedidos por si, muito menos ainda que o tivessem sido com a promessa ou entrega de contrapartidas.
12.ª
O sustento da promoção e da decisão de colocar sob escuta, relativamente à existência de indícios da prática do crime de corrupção, ou seja, de se encontrarem indiciados os elementos típicos de tal tipo de crime - atuação de funcionário contra os deveres do cargo mediante contrapartida solicitada ou aceite - é encontrado, apenas e só, na denúncia anónima.
13.ª
À data da promoção e da decisão de realização das escutas a AAe a XX, o que os indícios revelavam era, tão só, a prática do crime de acesso ilegítimo, p. e p. pelo art.° 6.° da Lei n.° 109/2009, com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias, excluído do catálogo de crimes a que alude o art.° 187 do CPP, pelo que, não estariam verificados os requisitos de admissibilidade para a realização das escutas.
14.ª
A exigência, agora reforçada, de fundamentação da realização de escutas, deixa claro que o recurso a este método, altamente intrusivo, de obtenção de prova, não pode, simplesmente, assentar nas suspeitas denunciadas.
15.ª
A denúncia apenas dá notícia do crime e desencadeia o procedimento criminal, não tem, ela própria, qualquer condão probatório, e por isso não constitui, obviamente, indício nos factos, alegadamente criminosos, que possa descrever.
16.ª
Necessário será, para que possa sequer cogitar-se a possibilidade de se proceder a interceções telefónicas, que a prática criminosa, de que a denúncia lança suspeita, encontre já força e consistência bastantes, necessariamente reveladas por diligências de investigação, ou seja, por outros meios de obtenção de prova.
17.ª
In casu, não só as diligências investigatórias levadas a cabo (até ao despacho que autorizou as escutas), não revelaram a indispensabilídade do recurso às escutas nem impossibilidade ou grave dificuldade de obtenção de prova por outro meio, como se constata que não revelaram a suspeita da prática de qualquer crime de catálogo.
18.ª
Assim, por não se mostrarem preenchidos os requisitos materiais da admissibilidade do recurso a um tal método de obtenção de prova, consagrados no artigo 187, n.° 1, do Código de Processo Penal e, bem assim, por não se mostrar verificada a necessidade e a proporcionalidade da restrição dos direitos fundamentais que o mesmo sacrifica, em manifesta violação do disposto no artigo 18, n.° 2, da CRP, a decisão que autorizou a realização de interceções telefónicas encontra-se (clamorosamente!) ferida de nulidade, nos termos do disposto no artigo 190 do Código de Processo Penal.
1...
Existindo prova, nos autos, que seja proibida nos termos consignados no artigo 126 do Código de Processo Penal, não estamos sequer perante uma nulidade que imponha, ou que a ela possa conduzir, uma invalidade do ato nos termos do artigo 122, n.° 1 do Código de Processo Penal. Do que estamos é perante uma proibição de utilização de prova se estivermos em face de um dos casos previstos no n.° 1 (métodos absolutamente proibidos) e, no que respeita aos casos previstos no n.° 3 (métodos relativamente proibidos), quando não se verifique o preenchimento dos pressupostos legais (ou o consentimento do titular dos direitos fundamentais comprimidos, ou suprimidos, pelo método de obtenção de prova).
20.ª
O Acórdão de Uniformização de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça (n.° 1 de 2018, disponível em www.dgsi.pt). acolhendo a apreciação feita no Acórdão do Tribunal Constitucional n.° 476/2015, de 30 de setembro (disponível em www.tribunalconstitucional.pt),aponta para a exclusão do regime de proibição de prova, apenas, o incumprimento de certas formalidades previstas no artigo 188 do CPP.
21.ª
Nos restantes casos, quais sejam, designadamente, o de inobservância dos requisitos previstos no artigo 187, n.° 1 do CPP, estaremos sempre perante proibições de prova, por violação do disposto nos artigos 32, n.° 8, 34, n.°s 1 e 4 e 18, n.° 2, da CRP, e 126, n.° 3 e 118, n.° 3, do CPP.
22.ª
In casu, ponto é que, ao contrário do que se advoga na decisão recorrida, não se verificou o preenchimento dos pressupostos de admissibilidade do recurso a interceções telefónicas como meio de obtenção de prova.
23.ª
Pelo que, estamos perante, não só, atos processuais feridos de nulidade, conforme supra se expôs (e já anteriormente se havia arguido), como perante prova proibida que, como tal, não pode ser utilizada, impondo-se, assim, expurgar-se os autos de toda a prova obtida através das interceções telefónicas.
24.ª
A questão que, necessariamente, se coloca, subsequentemente, é a de se saber se, sendo as provas obtidas por via das interceções telefónicas, prova proibida, que validade terão, e se a terão, todas as demais provas colhidas nos presentes autos. A resposta é, no entanto, simples: toda a demais prova carreada para os autos, porque obtida - apenas e só - na sequência e por força das interceções telefónicas, de que resultou prova que se constata ser proibida é, também, proibida, não podendo ser utilizada.
25.ª
Uma tal evidência resulta, de resto, da tramitação dos autos (com respaldo na decisão recorrida): foi através das escutas realizadas a AAque foi possível relacionar os arguidos e determinar a existência, na perspetiva da acusação /pronúncia acolhida na decisão sob censura, de contrapartidas entregues pelo aqui recorrente ao arguido AApelos acessos por este realizados.
26.ª
Toda a prova que serve de suporte à acusação/pronúncia trata-se, pois, de prova proibida, não podendo, nos termos do disposto no artigo 126, n.° 3, do Código de Processo Penal e, bem assim, nos termos do disposto no artigo 32, n.° 8, da Constituição da República portuguesa, ser utilizada - igual resultado se alcança se sufragado o entendimento de que o que está em causa é uma invalidade de todos os atos subsequentes a um ato nulo, nos termos do disposto no artigo 123 do Código de Processo Penal, que, à cautela, (novamente) se invoca, para que, sendo declarada a nulidade do despacho que determinou a realização das escutas, seja declarada, também, a invalidade de todos os atos e, bem assim, diligências de prova, subsequentes.
27.ª
Declarada a proibição da prova indicada na acusação e as nulidades e invalidades invocadas, deverão das mesmas tirar-se as necessárias consequências legais, nomeadamente revogando-se a decisão recorrida.
28.ª
Aliás, o segmento normativo a extrair da interpretação do artigo 187.° do Código de Processo Penal (que foi feita no despacho de fls. 186), no sentido de que para afirmar a existência de indícios da prática de um crime de catálogo, nomeadamente do crime de corrupção, é suficiente a descrição factual constante de denúncia anónima, é inconstitucional por constituir uma ofensa das garantias de defesa do arguido, a violação dos princípios da legalidade em material criminal (art. 29, n.° 1 e 32, n.° 1 da CRP), e dos artigos 18, n.° 2 e 34, n.°s 1 e 4, todos da Constituição da República Portuguesa.
2...
Como acima se referiu, a condenação pela prática do crime de corrupção apresenta-se como a única solução que o Tribunal encontrou para não deixar impune a conduta que reprova ao arguido aqui recorrente (sendo o arguido AA uma vítima necessária para o efeito), já que, tendo o arguido AA agido a pedido do aqui recorrente, o Tribunal não se conforma com o facto de aquele ser punido pelos crimes associados aos atos que executou a pedido do aqui recorrente, e este, dada a circunstância de a acusação não ter alegado e, portanto, provado, a sua participação nesses crimes, ou seja, não ter alegado e provado os factos de onde se pudesse retirar a instigação, não ser condenado.
30.ª
Todavia, ao trilhar tal caminho, a decisão entrou, inevitável e necessariamente, em contradições, e viu-se forçada a encontrar justificações, pouco adequadas, para alcançar as suas conclusões e, até, a “ajeitar” os factos para que os mesmos “coubessem” no tipo de crime pretendido.
31.ª
Do ponto de vista factual, a decisão propõe-nos, desde logo, que a alegada peita - a oferta de ... - é normal, sendo, portanto, socialmente adequada, só não sendo aceitável por ser reiterada. Ou seja, todas as ofertas realizadas pelo aqui recorrente ao arguido AA só não são aceites pela decisão recorrida como sendo socialmente adequadas porque foram realizadas por mais do que uma vez, ou, até, sempre que este arguido lhe pediu!
32.ª
Impõe-se, assim, e desde logo, referir que a entrega de ... já teria que ser considerada socialmente adequada, uma vez que foi manifestamente esporádica e reduzida - a oferta de um casaco para o filho do arguido AA (facto provado n.° 136).
33.ª
A ideia que está subjacente a este raciocínio e é, aliás, por diversas vezes afirmada, é a de que foi dispensado pelo ora recorrente um tratamento diferente ao arguido AA em relação ao que dava aos seus outros amigos, entrando o Tribunal, até, numa diferenciação entre o nível de amizade, distinguindo os amigos que frequentam a casa uns dos outros, os que são pares, os que são ligados pelas “mesmas ideologias políticas, religiosas ou outras afinidades”, e os que o não fazem ou não são (merecendo aqueles maior distinção), para retirar a conclusão de que, sendo o arguido AA um amigo desta segunda categoria (os que não são “visita de casa”), não poderia ter sido bafejado de forma idêntica àquela de que só os amigos da primeira categoria deveriam (podiam) beneficiar.
34.ª
Acontece que, por um lado, tendo ficado provado que o aqui recorrente solicitava e entregava uma média de 30 ... por ..., destinando, quando possível, 4 deles ao arguido AA, o Tribunal não sabe, porque não foi discutido nem objeto de qualquer prova, se os restantes eram entregues com o mesmo tipo de reiteração ou com outra qualquer.
35.ª
Pura e simplesmente não foi feita qualquer prova relativamente a quem o aqui recorrente entregava os, pelo menos, demais 24 ... de que dispunha em média, de forma a que o tribunal pudesse afirmar que não existiam outras pessoas que recebiam igual número de ...e com igual periodicidade ou, até, com semelhante “fidelização " Aliás, dos autos resulta apenas provado a entrega de ... ao arguido AA para 13 ... (factos provados 141 e 142):
36..ª
Por outro lado, resulta do depoimento da testemunha José Cardoso, que foi jardineiro do aqui recorrente, que este beneficiou da mesma atenção, ou até superior, por parte aqui recorrente, beneficiando do mesmo tipo de ...(que aliás colecionou), com idêntica reiteração, com idênticas comodidades! Atente-se no seu depoimento: - 20220124101318_19717595_2871053.wma.
37.ª
Não é, pois, factualmente correto, em primeiro lugar, afirmar que o tratamento dispensado pelo aqui recorrente ao arguido AA foi diferente do que praticou com outras pessoas! E, depois, não se vislumbra qual a razão, do ponto de vista jurídico, ou outro, para afirmar que uma prática reconhecidamente normal, deixa de o ser pelo facto de ser reiterada.
38.ª
Salvo melhor entendimento, a aferição sobre a adequação social de uma oferta faz-se em função da natureza da mesma, avaliando, objetivamente, se ela é aceite pela comunidade, ou não. Repare-se que mesmo os códigos de conduta que pretendem disciplinar tais casos, o fazem por referência a critérios objetivos, normalmente o valor da oferta, e nunca à sua periodicidade ou regularidade.
3...
No caso concreto, estamos perante ofertas sem custo para o ofertante, inserindo-se a oferta no âmbito das suas funções e estatuto profissional, revestindo a mesma, até, interesse para a entidade que representa.
40.ª
Aliás, resulta dos factos provados e dos documentos juntos aos autos que se não fossem para o arguido AA os ... que o aqui recorrente lhe entregou teriam sido entregues, seguramente, a outra, ou a outras, pessoas. Basta conferir as listas do Apenso (Equipa 9) Busca ...., folhas 130 e segs., de onde consta a identificação das dezenas de entidades (entre elas, SEF Aeroporto, PJ, PSP, 12.° Bairro Fiscal e outras entidades públicas) sistematicamente e reiteradamente destinatárias de vários ...para assistirem aos ... nacionais e internacionais do ... no ..., concretamente ao longo da época 2016/2017, e ainda, os factos dados como provados na decisão recorrida sob os pontos 305 e 306.
41.ª
Como é do conhecimento público, é vulgar e reiterado o convite de entidades públicas para assistirem a ... de ...: o ..., o ..., o..., os..., o ..., etc..., mas tal não passa a ser socialmente inadequado se uma destas pessoas pratica um crime a pedido de alguém ligado ao ... que as convidou! Como é óbvio, nessa circunstância, outra terá que ser a avaliação a fazer do comportamento dos intervenientes.
42.ª
A explicação para a decisão do Tribunal não pode ser outra que não seja a de que o Tribunal, não conseguindo colocar o aqui recorrente como coautor, como instigador, dos “crimes de acesso” do arguido AA, apenas consegue puni-lo se estabelecer um nexo causal entre os atos deste e a oferta que o aqui recorrente lhe fez, caracterizando-a como uma verdadeira contrapartida.
43.ª
Todavia, esta tese não tem apoio, nem nos factos nem na lei. Estando em causa, nos crimes de corrupção, a colocação em causa da autonomia intencional do Estado, ou seja, a liberdade de decisão do Estado segundo critérios de legalidade e objetividade, a contrapartida tem que ter uma relevância que leve o “funcionário” a mercadejar o seu cargo, colocando os interesses privados à frente dos interesses públicos. Mas o legislador não pode deixar de considerar que a vida em sociedade comporta uma série de inter-relações, partindo do pressuposto que os servidores do Estado (ou de um interesse público), os “funcionários”, sabem afastar os “perigos” daí decorrentes, só relevando os comportamentos sociais “anormais”, ou seja, que não resultam já do mero “funcionamento” da vida em sociedade, do normal relacionamento social.
44.ª
Não constitui, pois, contrapartida de um ato ilícito, penalmente relevante, o convite para almoçar ou jantar, por mais que tal se revele socialmente relevante para o convidado; como não constitui corrupção (ou mesmo tráfico de influência, ao contrário do que alguma jurisprudência inacreditável aceita) o pedido do pai ao filho, ou vice-versa, do irmão, do amigo, etc... tudo isso são circunstâncias normais da vida que se impõem a qualquer funcionário, que fazem parte do relacionamento social normal, e a que se pressupõe que ele saiba responder adequada e licitamente.
45.ª
A vantagem, patrimonial ou não patrimonial, solicitada ou aceite por funcionário, ou a este dada ou prometida, não se enquadre naquela que é reconhecida como sendo conforme aos usos e costumes, concretamente que não integre a denominada esfera da “adequação social”. “Na verdade, um facto que seja acomodável pela colectividade não pode, ao mesmo tempo, produzir dano relevante a essa mesma colectividade, e, por essa razão, não pode, adequadamente, enquadrar-se num ilícito típico, ainda que, formalmente, assim o pareça: só é considerada relevante para o direito penal a conduta socialmente danosa, que atinge o meio em que as pessoas vivem, ferindo em elevado grau o sentimento de justiça e o senso de adequação social de um povo (…)”
46.ª
As condutas compreendidas na assinalada adequação social, ao serem admitidas ou, por vezes, impostas pelo sentimento geral de justiça subjacente à “consciência axiológica comunitária", uma vez que não configuram ferimento ou ofensa do bem jurídico protegido pela norma incriminadora — a autonomia intencional do Estado ou a autonomia da atuação do agente que desempenha funções públicas — encontram-se excluídas da previsão do crime de corrupção.
47.ª
Aliás, se o Tribunal tivesse verdadeiramente atentado nas citações que ele próprio faz na decisão sob censura, sem o condicionamento a que já se aludiu, teria chegado a conclusão diversa, por mais que isso lhe custasse. Veja-se o que na decisão aqui sob censura se citou do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 1 de junho de 2021, processo n.° 9590/11.1TDLSB.L2-5 (in www.dgsi.pt).
48.ª
A atividade desportiva desenvolve-se num contexto específico, com emoções, paixões, angústias, alegrias, tristezas, desesperos e outros estados de alma. No desporto evidencia-se, por aquelas razões, a aceitação social de oferta de determinados bens ou produtos — umas vezes por iniciativa dos promotores, outras (muitas) vezes a pedido dos destinatários das mesmas — como forma de permitir a estes assistirem ao espetáculo desportivo que envolva o seu ... ou apenas por razões de natureza protocolar ou de interesse social de ali marcarem presença.
4...
É facto público e notório nas diferentes modalidades desportivas, pelo mundo fora, a oferta de ...(com ou sem acesso a parque de estacionamento e a lounge para degustar) para assistir aos ... da respetiva... (..., ..., ..., ..., entre outros) às mais variadas pessoas, desde as denominadas individualidades, a representantes de instituições oriundas da vida social, económica, cultural, científica, desportiva e política, de instituições ..., ... e de ..., a ..., a...e ..., a ... e ..., a intermediários, parceiros ou, simplesmente, a amigos ou a amigos de amigos.
50.ª
É também prática corrente e socialmente aceite em ...a oferta de produtos de ..., como por exemplo, camisolas, cachecóis, bolas, entre outros.
51.ª
A oferta de ... ou de ...para assistir a ..., de pulseiras para acesso a zonas de restauração, de cartão para acesso ao parque de estacionamento, de artigos de ... (camisolas, cachecóis, entre outros), é uma prática habitual no meio desportivo, nomeadamente no ..., sendo transversal a todos os ...s, dos maiores aos mais pequenos, dos nacionais aos estrangeiros.
52.ª
Trata-se de produtos com valor diminuto, sem nenhuma vantagem patrimonial relevante para o seu destinatário, cuja oferta é socialmente aceite e conforme aos usos e costumes.
53.ª
O ..., tal como, aliás, se aceita na decisão recorrida, não é exceção, sendo- lhe diariamente solicitada, com maior incidência na véspera dos ..., proveniente dos mais variados quadrantes, a oferta de ... e/ou de produtos de ... (camisolas, cachecóis, bolas, porta-chaves, entre outros). A oferta daqueles bens ou produtos por parte do ..., tal como sucede com todos os restantes ...s de ... em Portugal e em todas as partes do globo, é, insiste-se, um hábito socialmente instituído e conforme aos usos e costumes da atividade em causa.
54.ª
A oferta de ... ou de ... para os ... e de artigos de ..., no meio desportivo, designadamente no ..., faz parte de uma prática instituída, encontrando-se a mesma regulamentada pelas instituições federativas nacionais e internacionais responsáveis pela modalidade.
55.ª
A “adequação social” daquelas ofertas encontra-se reconhecida na regulamentação internacional e nacional do ..., concretamente no Código de Ética da ... (Edição 2018) — artigo 20.° () —, nas ... Disciplinary Regulations (Edição 2012) — artigos 11.° e 23.° () — nas Directives governing ... match officers (Edição 2012) — artigos 4.° e 14.° ( ) —, nas General Terms and Conditions for Referees officiating at ... Matches (Edição 2014) — artigo 6.° ( ) —, no Regulamento Disciplinar da... — artigos 59.°, 122.° e 146.° () — e no Regulamento Disciplinar das Competições Organizadas pela … — artigos 62.° e 62.°-A.
56.ª
Os regulamentos nacionais estabelecem que a oferta de objetos simbólicos, até ao valor de 1,5 unidades de conta (UC), não integra o conceito de vantagem, enquanto no caso dos referidos regulamentos internacionais, o Código de Ética da ... não estabelece nenhum valor, sendo que nos regulamentos da ... é feita referência aos costumes culturais locais e estabelecido o valor de € 300,00.
57.ª
Quanto aos artigos de ..., concretamente as camisolas (autografadas ou não), a sua oferta é também habitualmente realizada antes, no final ou em momento posterior aos ..., seja pelos próprios jogadores, seja por dirigentes, tendo como destinatários os convidados ou os simpatizantes que a tenham pedido, tratando-se de uma forma de perpetuar e realçar a ligação aficionada dos mesmos ao ....
58.ª
As referidas ofertas de ...e outros produtos constituem, portanto, uma conduta socialmente adequada, que não é criminalizada, configurando a situação expressamente prevista na lei como excludente da ilicitude da entrega de tais ofertas a um funcionário público nos casos nela previstos (cf. artigo 10.°-A, n.° 3, da Lei n.° 50/2007, de 31.08, na redação que lhe foi dada pela Lei n.° 13/2017, de 02.05 — “Lei n.° 50/2007”).
5...
As ofertas feitas pelo aqui recorrente ao arguido AAsão socialmente aceites pelo público em geral e não extravasam a sua conformidade com os usos e costumes das práticas levadas a cabo no .... As ofertas em causa integram uma conduta conforme aos usos e costumes, estando por via da sua adequação social excluída a ilicitude da sua prática. O ... oferece, insista-se, uma média de 3 mil ... por ...!
60.ª
Acresce que, jamais as ofertas feitas pelo aqui recorrente poderiam ser tidas como contrapartida, a peita, dos atos de acesso ilícito (através do Sistema Citius) praticados pelo arguido AA, ainda que a pedido do ora recorrente.
61.ª
Importa, com distanciamento e sem pré-juízos, verificar se os factos dados como provados permitem concluir que o comportamento do ora recorrente (ao ofertar ... ao arguido AA) 11 não se mostra justificável de outro modo, assumindo, inequivocamente, o (...) significado de criar um clima de “permeabilidade" ou “simpatia”para posteriores diligências
62.ª
Dos factos dados como provados resulta, inequivocamente, que: (i) a oferta de ... pelo ora recorrente ao arguido AAcomeçou a ser realizada a partir do início da época 2015/2016, a qual começou em julho/agosto de 2015 e terminou em junho de 2016 e (ii) a oferta de ... ao arguido AAteve origem num episódio ocasional, de que veio a resultar uma relação de amizade (natural, como provado) entre os arguidos e respetivas famílias.
63.ª
Os autos apenas permitem afirmar que o ora recorrente pediu alguma coisa relativa às funções exercidas pelo arguido AAa partir de março de 2017, ou seja, quase dois anos após o início da oferta dos ...!
64.ª
De acordo com as regras da prova em processo penal e tendo em consideração o princípio (aplicável sobretudo ao regime da prova) in dubio por reo, apenas pode concluir-se que entre março de 2015 e março de 2017 o ora recorrente não pediu ao arguido AA o que quer que fosse que respeitasse ao exercício das suas funções como funcionário. Com efeito, relativamente a esse período, não existe qualquer prova, direta ou, sequer, indireta, de tal pedido (pelo que, pelo menos, o Tribunal não pode considerar outra situação, que nem sequer é alegada na acusação /pronúncia).
65.ª
A conduta do aqui recorrente para com o arguido AA, de acordo com a matéria de facto provada, foi exatamente a mesma, antes e depois de março de 2017, ou seja, o facto de em março de 2017 o aqui recorrente ter solicitado ao arguido AA que praticasse atos contrários aos seus deveres funcionais não implicou qualquer tipo de alteração no seu comportamento ou na relação entre os dois arguidos, nomeadamente, o aqui recorrente não passou a oferecer mais (nem menos) ao arguido AA.
66.ª
Neste circunspecto, não é possível afirmar que em julho/agosto de 2015 (quando o aqui recorrente começou a oferecer ..., para o arguido AAe pessoas por si convidadas assistirem aos ... do ... no ... do ...), o aqui recorrente tinha já em mente vir a pedir ao arguido AA que praticasse atos contrários aos seus deveres funcionais (estando a criar um clima de permeabilidade deste) e que o arguido AA tinha já aceite vir a praticar tais atos em função das ofertas que lhe eram feitas pelo aqui recorrente.
67.ª
Mesmo que o Tribunal não acredite que tais ofertas se situavam no estrito campo da amizade ou do interesse legítimo de ambos os arguidos (o do aqui recorrente, de levar pessoas ao ...e o do arguido AA, de ver os ... e poder obsequiar família e amigos), não tem qualquer facto provado que lhe permita afirmar que nessa altura (julho/agosto de 2015) o arguido AA mercadejou com o cargo, pondo, logo ali, os interesses privados do ora recorrente à frente dos interesses públicos que lhe cabia defender, colocando-se, logo ali, à disposição do aqui recorrente para o que este lhe viesse a pedir.
68.ª
Na verdade, não existe qualquer prova, direta ou indireta, que permita firmar a conclusão de que a conduta dos arguidos (oferta e aceitação) teve na sua origem o mercadejar do cargo do arguido AA. Pelo contrário, foram, como vimos, dados como provados factos que permitem afastar, com segurança, tal conclusão.
6...
E sendo inequívoco que nem o comportamento do arguido AA, nem o do aqui recorrente sofreu qualquer alteração, mantendo-se absolutamente inalterado, com o pedido deste àquele para aceder a determinados processos judiciais, impõe-se concluir que a prática destes atos, pese embora a sua manifesta ilicitude, não teve como contrapartida as ofertas do aqui recorrente, nem foi motivada por estas.
70.ª
Nesta conformidade, tem que cair a condenação pela prática do crime de corrupção, por que foram condenados o aqui recorrente e o arguido AA.
71.ª
É inegável que os pedidos feitos pelo aqui recorrente ao coarguido AA, independentemente de terem sido os que o Tribunal julgou provados ou apenas os que o aqui recorrente admitiu, são feios, são eticamente reprováveis e nunca deveriam ter acontecido. Sobre isso não existem dúvidas, e disso já se penitenciou o aqui recorrente! Mas podem ter sido realizados num quadro que jurídico-penalmente não é relevante, ou não se ter provado tal relevância.
72.ª
Com efeito, independentemente dos crimes associados aos acessos ilícitos aos processos judiciais, não se provou (para não dizer que se provou o contrário), que o aqui recorrente tivesse “comprado” os atos praticados pelo coarguido AA ou que este os tivesse “vendido” ao aqui recorrente.
73.ª
A inexistência de prova desse facto impõe a absolvição dos arguidos pela prática do crime de corrupção. Aliás, a igual solução se chegará reconhecendo que, pelo menos, tendo em conta os factos dados como provados, se encontra gerada uma dúvida razoável e, portanto, inultrapassável, sobre a existência de uma mercancia do cargo de funcionário (in dubio pro reo).
74.ª
Acresce que, como bem se afirma na decisão recorrida, relativamente aos crimes diretamente associados aos acessos ilícitos aos processos judiciais, ao aqui recorrente só poderia ser assacada responsabilidade criminal caso fosse provada a sua participação como coautor, a título de instigador. Todavia, a acusação não descreve quaisquer factos de onde pudesse resultar tal imputação.
75.ª
Em conclusão: o comportamento do ora recorrente que logrou ser provado não é bonito e é, mesmo, eticamente censurável, mas não constitui a prática de um crime.
Por outro lado,
76.ª
O que a decisão recorrida nos propõe é que as ofertas do aqui recorrente ao coarguido AA começaram por ter em vista criar um clima de maleabilidade e de simpatia, com vista à obtenção de atos contrários aos deveres do cargo público que este detinha e, depois, constituíram a contrapartida da prática desses atos (acessos a processos judiciais).
77.ª
Porém, para além de esta tese cair por terra no que respeita à motivação inicial, não tendo o Tribunal qualquer elemento que permita sustentar que as ofertas não se inseriram apenas no contexto desse relacionamento, que tinha por base o benfiquismo de ambos, não se vislumbrando qualquer facto indiciador, sequer, de que o arguido AA tenha então mercadejado o cargo, também não é sustentável que tenham constituído uma contrapartida depois, uma vez que nenhuma mudança de comportamento de ambos ocorreu, a verdade é que juridicamente tal tese é insustentável.
78.ª
Com efeito, se as ofertas do aqui recorrente ao arguido AA fossem justificadas no âmbito da criação de um clima de permeabilidade e de simpatia, tendo ambos os arguidos já em vista a prática dos atos (embora não identificados nem ainda equacionados), contrários aos deveres do cargo, pelo arguido AA, que lhe viessem a ser solicitados pelo aqui recorrente, ou seja, o aqui recorrente teria oferecido com vista a obter a disponibilidade do AApara praticar os atos que lhe viesse a pedir, e este aceitou as ofertas com a consciência de que as mesmas só ocorriam tendo em conta esse hipotético desfecho e, nesse caso, não estando identificado o ato “comprado”, teríamos a prática do crime previsto e punido pelo artigo 372 do Código Penal - Recebimento indevido de vantagem - e não poderíamos ter, então, a prática dos crimes de corrupção dos artigos 373 e 374.
7...
Porquanto, o crime do artigo 372, à semelhança dos crimes dos artigos 373 e 374, consuma-se no momento da solicitação ou aceitação da vantagem (n.° 1) ou da promessa ou entrega (n.° 2), sendo o ato entretanto praticado pelo funcionário a pedido do particular (ato que não foi equacionado aquando da solicitação, aceitação, promessa ou entrega da vantagem) o resultado do clima de permeabilidade criado com a vantagem, mas não o ato “comprado”, porquanto, ali, o que foi negociado, transacionado, foi a disponibilidade do funcionário para agir contra os deveres do cargo, e não este ou aquele ato.
80.ª
O que resulta da decisão recorrida é que o mesmo comportamento não tem qualquer efeito criminógeno até determinado momento, e passa a tê-lo a partir de então. Ou seja, o tratamento privilegiado concedido pelo ora recorrente ao arguido AAnão é relevante do ponto de vista criminal até à formulação do pedido de acesso e passa a sê-lo desde então. Todavia, esta formulação é inaceitável, mesmo do ponto de vista naturalístico, quanto mais do ponto de vista jurídico.
81.ª
Das duas uma, ou o tratamento privilegiado concedido ao arguido AAé ilícito, e então terá que o ser desde sempre e, portanto, desde que ele se iniciou, ou não o é, e não é em qualquer caso.
82.ª
Se o tratamento privilegiado concedido ao arguido AA é ilícito, tal ilicitude terá que ser procurada no momento em que o mesmo se iniciou e, portanto, é a esse momento que importa circunscrever os factos que conduzem à conclusão da ilicitude do comportamento dos arguidos.
83.ª
Ora, e tal facto parece ser pacífico na decisão recorrida, no momento em que o aqui recorrente passou a dispensar um tratamento dito privilegiado a AA, não existe nota, muito menos prova, de o aqui recorrente pretender qualquer ato concreto do arguido AA- tal ato só vem a ser solicitado cerca dois anos depois -, pelo que, é forçoso concluir que, nesse momento, a “vantagem” concedida pelo aqui recorrente e aceite pelo arguido AA apenas poderia ter como fundamento a criação de um clima de permeabilidade com vista à pratica de um ato futuro e hipotético, que viesse a ser desejado pelo aqui recorrente, e contrário aos deveres do cargo do arguido AA.
84.ª
Assim, ou o aqui recorrente não praticou qualquer crime, porque as ofertas que fez ao arguido AA não são jurídico-penalmente relevantes, ou o crime que cometeu não pode deixar de ser “apenas” o previsto e punido no artigo 372, n.° 2 do Código Penal e não o do artigo 374.
85.ª
A primeira solução é a que melhor se coaduna com os factos dados como provados e com o Direito que lhes deve ser aplicado, devendo o aqui recorrente ser absolvido do crime por que foi condenado. Sem embargo, se assim não for entendido, o que apenas por dever de patrocínio se equaciona, deve a decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que condene o ora recorrente pelo crime previsto e punido pelo artigo 372 do Código Penal - recebimento indevido de vantagem.
86.ª
Como consequência, encontram-se incorretamente julgados, nos termos explicitados na motivação, os factos dados como provados sob os números 17, 20, 21 e 139, 22, 25 e 218, 120, 125, 136, 179, 205 e 206, 213 e 214, 215 e 240 e 228.
87.ª
Se assim não for entendido, a pena que for aplicada, seja no caso da condenação pelo crime previsto e punido pelo artigo 372, n.° 2 do código Penal, seja no caso de se manter a decisão da primeira instância, deve situar-se abaixo de metade da moldura penal abstrata do tipo de crime.
88.ª
Com efeito, pese embora as reconhecidas exigências de prevenção geral que este tipo de crimes reclama, a verdade é que a simples condenação e toda a repercussão que o processo teve na vida profissional do ora recorrente, originando a perda do seu posto de trabalho no ..., com grande estrondo público, é suficiente para acautelar tais exigências. Sobretudo o que releva para este efeito é a ideia que será gerada na comunidade de que o ora recorrente, não obstante o “poder” de que dispunha, foi condenado.
8...
Ao invés, as exigências de prevenção especial são relativamente diminutas, atento o que ficou provado relativamente ao carácter do recorrente (cfr. factos provados n.°s 413 a 442), à sua integração social e à consciência que revelou de que tinha agido de forma errada ao solicitar ao arguido AAque acedesse a processos judiciais no Sistema Citius. Toda a postura do aqui recorrente no decurso do processo demonstrou humildade, respeito e consideração pelo funcionamento da justiça, reconhecendo sempre que, pese embora fosse sua convicção que não cometera um crime nem por isso a sua conduta era justificável do ponto de vista ético, assegurando que não a repetiria.
90.ª
Assim, a pena a aplicar ao aqui recorrente, em caso de condenação, deve ficar abaixo da metade da moldura penal correspondente ao crime por que for condenado.
E, naturalmente, a execução da pena deve ser suspensa.»
- da resposta do Ministério Público -
Notificado para tanto, respondeu o Ministério Público concluindo nos seguintes termos:
- quanto ao recurso do Arguido AA -
«1. O arguido AA . foi condenado, como autor material pela prática de de um pela prática, em concurso real, de um crime de corrupção passiva, p. e p. pelo artigo 373.º, n.º 1, e 386.º, n.º 1, al.s a) e b), do C.Penal, na pena de dois anos de prisão, não lhe aplicando a pena acessória prevista no artigo 66.º, n.º 1, alíneas a), b) e c), do Código Penal; seis crimes de violação do segredo de justiça, p. e p. pelo artigo 371.º, n.º 1, do Código Penal (Inquéritos n.ºs 143/17, 6785/15, 8/16, 872/16, 5340/17 e 7161/17), na pena de um ano de prisão por cada um desses crimes; nove crimes de acesso indevido, p. e p. pelo artigo 47.º, n.º 1, da Lei n.º 58/2009, de 26 de outubro, na pena de seis meses de prisão por cada um desses crimes; nove crimes de violação do dever de sigilo, p. e p. pelo artigo 51.º, n.ºs 1 e 2, alíneas a) e d), da Lei n.º 58/2009, de 26 de outubro, na pena de 9 nove meses de prisão por cada um desses crimes; oito crimes de acesso ilegítimo, p. e p. pelo artigo 6.º, n.º 4, alínea a), da Lei do Cibercrime, na pena de um ano e seis meses de prisão por cada um desses crimes; um crime de peculato, p. e p. pelo artigo 375.º, n.º 2, do Código Penal, na pena de um ano de prisão;
2. A enumeração taxativa e exaustiva, bem como a análise critica da prova, que damos, incluindo a prova documental, pericial e testemunhal explanada na decisão recorrida, contraria a tese do arguido AA, segundo a qual Tribunal utiliza a prova indireta para concluir que este era autor de acessos não autorizados a processos judiciais, em violação da livre apreciação da prova, não se socorrendo de qualquer base probatória concreta.
3. As conversas telefónicas transcritas e analisadas na decisão condenatória são reveladoras da expetativa que o arguido AA tem de receber contrapartidas da parte do arguido CC ofertas, sendo que nos autos apenas são referidos ...para ... de ... ou peças de vestuário, pelo que não podemos extrapolar que tenham existido ofertas de outra natureza. Certo é que as referidas ofertas não surgem de forma esporádica e inopinada. Na relação criada entre os dois arguidos, não existem ofertas que sejam verdadeiramente inesperadas;
4. A esta data estava criada claramente no arguido AA a expetativa de receber oferendas, o que, de acordo com as regras da experiência comum, se compreende no contexto de disponibilidade em que o mesmo se colocou face ao arguido CC e, por outro lado, na permeabilidade que este último foi conseguindo obter do arguido AA com as oferendas que ao longo dos anos lhe foi fazendo;
5. Havendo um funcionário que aceita contrapartidas para praticar determinados actos que são contrários às suas funções, existe corrupção, visto que se verifica o já referido sinalagma, a contraprestação por uma conduta concreta do funcionário. Aliás, no que tange com o arguido CC as ofertas eram feitas inicialmente para que o arguido AA fosse depois permeável aos seus pedidos, como se constatou que foi, o que foi sucedendo também depois de aquele ter aceite fazer os acessos que lhe foram solicitados, aí já a título de verdadeira contrapartida pelos actos por aquele praticados;
6. Atenta a prova elencada no Acórdão e a fundamentação dos factos, entendemos que não existiu qualquer violação do princípio do contraditório pelo Tribunal, uma vez que este, tal como o arguido, nunca teve acesso aos registos de auditoria de acesso por Virtual Private Network.
7. O Tribunal, na fundamentação da matéria de facto provada, não invoca qualquer dúvida insanável, motivada pela falta de exame pericial, consequência de os registos de auditoria de acesso por Vitual Private Network uma vez que, atento o tempo decorrido já não existirem no GG - ao invés, a motivação da matéria de facto denuncia uma tomada de posição clara e inequívoca relativamente aos factos constantes da pronúncia, com indicação clara e coerente das razões que fundaram a convicção do tribunal, inexistindo lugar à aplicação do princípio “in dubio pro reo”;
8. A imputação dos factos pelo Ministério Público na acusação, não impede o juiz de instrução/e ou julgamento de produzida a prova, indiciar/condenar apenas um dos arguidos, uma vez que a responsabilidade é estritamente pessoal.
Não obstante, terem sido imputados factos aos arguidos AA e JC, em co-autoria, a responsabilidade de cada um afere-se individualmente, nos exatos termos em que a morte, por hipótese, extingue a responsabilidade penal de um dele. A decisão de não pronúncia do co – arguido Júlio Couto não é extensível ao arguido AA, nos termos excepcionados no art.º 402.º, n.º2, do C.P.Penal;
9. O crime de violação de segredo de justiça, por funcionário, p. e p. pelo art.º 383.º do C.Penal e o crime de acesso indevido, p. e p. pelo art.º 44.º, n.º1, da Lei 67/98, de 26.10, são ilícitos, semi-públicos cujo procedimento criminal depende de queixa, sendo que os ilícitos pelos quais o arguido foi condenado têm natureza pública, não carecendo o Ministério Público de legitimidade para desencadear a ação penal;
10. As interseções determinadas nos presentes autos e o registos de voz e imagem autorizados, tendo respeitado os requisitos substanciais constantes do artº 187º, do C.P.Penal, não padecem de vicio que as fira de nulidade, não põem em causa as garantias de defesa (artigo 32.º, n.º 1, da CRP), não constituem a prova proibida a que se refere o artº 126º, nº 3, do C.P.Penal;
11. No caso concreto, da conjugação do teor da denuncia a que se refere a informação de fls. 2, com o conteúdo das demais diligências e documentos que foram obtidos até ao despacho de fls. 186, o Tribunal entende que atenta a fase inicial da investigação em que se estava e em que as intercetações foram promovidas e determinadas, era possível fazer juízo de alguma indiciação quanto ao crime de catálogo, o crime de corrupção passiva, invocado na Promoção do Ministério Público e no Despacho da J.I.C.
12. Entendemos que não enferma de qualquer nulidade o despacho do juiz de instrução que determina a destruição dos suportes técnicos e relatórios manifestamente estranhos ao processo, que digam respeito a conversas em que não intervenham pessoas referidas no nº 4 do artigo 187º, do mesmo código, sem que antes o arguido deles tenha conhecimento e possa pronunciar-se sobre a sua relevância (cfr. Ac. TC293/08, Pº nº 304/08, de 29/05/2008);
13. Não existe qualquer contradição entre os factos provados – 225 a 227 - e os factos não provados – BA - a enumeração dos factos, apreciação e subsunção dos mesmos ao direito é benéfica ao arguido, desqualificando-se o crime de peculato imputado no despacho de pronúncia, atento o valor diminuto dos bens;
14. Face à matéria de facto provada, é possível destrinçar distintas resoluções criminosas de cada vez que o arguido AA se decide a aceder a um diferente processo, sem que exista qualquer circunstância externa que diminua sensivelmente a conduta do agente e que possa levar à conclusão de estarmos face a um crime continuado;
15. O Acórdão nº 268/2021 do Tribunal Constitucional, de 19 de abril de 2022, declarou a inconstitucionalidade com força obrigatória geral das normas dos artigos 4º e 6º da Lei n.º 32/2008, de 17 de julho. Até agora, tais disposições obrigavam os operadores de comunicações a guardar, de forma sistemática, dados referentes a comunicações, para que os mesmos (embora sob muitas condições e limitações) pudessem vir a ser utilizados na investigação da prática de crimes;
16. Não obstante a Jurisprudência obrigatória, o Tribunal Constitucional reconheceu, especificamente quanto aos endereços de IP utilizados para estabelecer uma determinada comunicação, a sua essencialidade na investigação criminal moderna e a conformidade da sua retenção com a Constituição;
17. O artigo 6º da Lei nº 41/2004 permite aos operadores de comunicações conservar alguns dados de tráfego, sendo tal conservação uma opção que os operadores de comunicações exercem ou não (portanto, a conservação de dados não constitui uma obrigação). Porém, apenas é “permitido o tratamento de dados de tráfego necessários à faturação dos assinantes e ao pagamento de interligações”, sendo tal tratamento apenas “lícito até final do período durante o qual a fatura pode ser legalmente contestada ou o pagamento reclamado”;
18. Nem todos os dados a que se refere o art.º 4.º da Lei n.º 32/2008, de 17.7, estão protegidos pelo disposto no art.º 34.º, n.ºs 1 e 4, da C.R.Portuguesa. De acordo com a jurisprudência reiterada pelo TC, aquele parâmetro abrange os dados de tráfego quando pressuponham uma comunicação entre pessoas, mas não os dados que independentemente de qualquer comunicação ou á mera identificação de um utilizador a quem estava atribuído um determinado número de telefone ou endereço de IP estático (dados de base – cf. Ac. TC n.º 420/2017), nem os dados de tráfego gerados pela comunicação entre um sujeito e uma máquina – v.g. a consulta de sites na internet.
19. Os dados conservados nas bases de dados do GG, o n.º de IP dos seus trabalhadores, utilizadores do sistema, somente, assumiriam a natureza de dados de tráfego quando pressuponham a comunicação entre pessoas, mas já não são os dados que, independentemente de qualquer comunicação, quando se destinem á mera identificação de um utilizador a quem estava atribuído um endereço de IP estático, bem como a localização da máquina (computador), dados de base como entendemos tratar-se da situação dos autos;
20. A base de dados do GG contem o registo de todos os IPs dos seus trabalhadores, bem como a interceção desses IPs no sistema informático e a localização do equipamento, por razões de segurança e contratuais, nos mesmos termos em que uma empresa contém os registos dos seus clientes vinculados contratualmente e trabalhadores;
21. No caso dos autos, a investigação dirigiu-se apenas à obtenção e análise dos (meta)dados indispensáveis à identificação dos potenciais autores dos acessos ás bases de dados do GG, ou seja, à identificação de pessoas em relação às quais havia já uma suspeita – que podemos dizer fundada, uma vez que existia já uma denúncia, de ter praticado atos ilícitos criminais graves, o que significa que não houve, consequentemente, um acesso genérico e indiscriminado a (meta)dados respeitantes a acessos efetuada por diversos cidadãos em relação aos quais nenhuma suspeição existia de participação na prática de crimes;
22. Do juízo de inconstitucionalidade formulado pelo Tribunal Constitucional no seu acórdão n.º 268/2022 não decorre qualquer nulidade ou proibição de aquisição ou valoração de prova relativamente a (meta)dados de base retidos por força da obrigação imposta pelo n.º 1 do artigo 4.º da Lei n.º 32/2008, de 17 de julho, e a que as autoridades responsáveis pela investigação criminal tiveram legitimamente acesso;
23. O arguido AA agiu com dolo direto, levando a cabo um número significativo de crimes, sendo que sem a sua participação, aquele outro arguido não teria logrado alcançar os seus desideratos;
24. O modus operandi seguido pelo arguido AA não configura uma atividade rudimentar, antes se mostrando revelador de alguma determinação criminosa, pois que o arguido agiu reiteradamente, como o comprova o elevado número de situações demonstradas nos autos, na consideração da gravidade da conduta e do grau de culpa do arguido no que respeita em especial aos crimes mais graves;
25. As exigências de prevenção de ordem geral são muito elevadas. Ou seja, cabe no âmbito das funções de que se reveste o Tribunal reforçar por via da presente decisão a confiança nas normas violadas, e dar ao cidadão cumpridor um sinal de que os seus sacrifícios e o cumprimento da Lei não são em vão e que essa é a opção que compensa. De outra forma estar-se-á a incentivar a continuação de atividades criminosas já em curso ou mesmo a decisão de percorrer tal via, atenta a falta de resposta eficaz das autoridades ao seu combate;
26. O resultado final decorrente da prática dos crimes, visa finalidades que importa desmotivar e, porventura mais do que isso, sensibilizar para a necessidade de alteração de comportamentos e práticas, tendo em vista alcançar uma mudança de mentalidade que não se antevê seja fácil de atingir;
27. Em termos de prevenção especial, é certo que o arguido AA parece ser pessoa com adequado enquadramento socioeconómico; tal, porém, não o inibiu de praticar os factos dos autos, o que demonstra que a motivação para a prática dos crimes nada tem a ver com a falta de enquadramento social, familiar ou profissional;
28. Acresce que o arguido AAem audiência de julgamento optou pelo direito ao silêncio, o que não o poderá prejudicar, mas também não o beneficia, posto que não existe uma situação de arrependimento comprovada que possa ser considerada a seu favor;
29. A dosimetria da pena do arguido AA foi corretamente encontrada pelo Tribunal;
30. Os dados relativos à mera identificação de um utilizador a quem estava atribuído um determinado endereço de protocolo IP não estão abrangidos pelo âmbito de proteção do sigilo das comunicações consagrado naquele preceito constitucional, pois não pressupõe um ato de comunicação específico. Não se acompanha, portanto, a posição defendida pelo arguido, quanto à violação do n.º 4 do artigo 34.º da Constituição;
31. A declaração de invalidade de uma diretiva não tem uma consequência automática sobre a validade de um ato legislativo português que a transponha. O ato legislativo nacional, embora tendo como objetivo o cumprimento do dever de transposição de uma diretiva, decorrente do Direito da UE (artigo 4.º, n.º 3, do Tratado da EU, artigo 288.º, 3.º parágrafo, do Tratado sobre o Funcionamento da EU e artigo 112.º, n.º 8, da Constituição), tem uma fonte autónoma de validade e legitimidade;
32. A declaração de invalidade de uma diretiva não tem uma consequência automática sobre a validade de um ato legislativo português que a transponha. O ato legislativo nacional, embora tendo como objetivo o cumprimento do dever de transposição de uma diretiva, decorrente do Direito da UE (artigo 4.º, n.º 3, do Tratado da EU, artigo 288.º, 3.º parágrafo, do Tratado sobre o Funcionamento da EU e artigo 112.º, n.º 8, da Constituição), tem uma fonte autónoma de validade e legitimidade, não se verificando os requisitos do reenvio para o TJEU;
33. Concluindo, dir-se-á, pois, que se nos afigura que o recurso do arguido não merece provimento, devendo manter-se integralmente o douto despacho recorrido.»
- quanto ao recurso do Arguido CC -
I.«Inconformado com o Douto Acórdão que o condenou pela prática de 1 (um) crime de corrupção ativa, p. e p. pelo artigo 374.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão, suspensa na sua execução por idêntico período de tempo, mediante a condição de proceder ao pagamento semestral da quantia de € 5.000,00 (cinco mil euros) à Associação Nacional de ... de Rua, fazendo prova desses pagamentos nos autos, vem o arguido interpor recurso formulando para tal as correspondentes conclusões.
II.O âmbito do recurso define-se pelas conclusões da respectiva motivação, sem prejuízo da apreciação das questões de conhecimento oficioso.
III.Perante as conclusões do recurso as questões a decidir são, no nosso entender, essencialmente e fundamentalmente 3. A primeira questão levantada prende-se com a nulidade das interceções telefónicas, a segunda prende-se com a apreciação dos factos provados – impugnação da matéria de facto e enquadramento jurídico penal dos factos - e a terceira com a medida da pena.
Ponto 1:
IV.Resumidamente e grosso modo, o recorrente começa por alegar que na data em que o Ministério Público promoveu as interceções telefónicas que foram autorizadas e determinadas pelo Juiz de Instrução, não existiam nos autos indícios da prática de crime abrangido pelo catálogo de crimes a que alude o artigo 187º do CPP, pelo que não se mostravam reunidos os pressupostos de admissibilidade das mesmas, porquanto da denúncia anónima não resultava que os acessos ao Citius tivessem sido efetuados a troco de contrapartida, elemento imprescindível para que se pudesse ter por indiciada a prática do crime de corrupção, motivo pelo qual entende que tal decisão é nula.
V.Sobre esta questão já se pronunciou a Mma Juiz de Instrução e bem assim o Colectivo de Juízes no Acórdão em crise, contudo e ainda que de forma abreviada não deixaremos de aqui tecer algumas considerações, afirmando-se desde já que o nosso entendimento vai ao encontro do já decidido, sendo por isso contrário ao que defende o recorrente.
VI.O artigo 34.º da Constituição da República consagra a inviolabilidade do domicílio e da correspondência, estabelecendo no seu n.º 1 que o domicílio e o sigilo da correspondência e dos outros meios de comunicação privada são invioláveis e acrescentando no seu n.º 4 que é proibida toda a ingerência das autoridades públicas na correspondência, nas telecomunicações e nos demais meios de comunicação, salvo os casos previstos na lei em matéria de processo criminal.
VII.Por sua vez, o artigo 18.º n.º 2 da Constituição da República determina que a lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos, sendo que, de harmonia com o n.º 3, as leis restritivas de direitos, liberdades e garantias têm de revestir carácter geral e abstrato e não podem ter efeito retroativo nem diminuir a extensão e o alcance do conteúdo essencial dos preceitos constitucionais.
VIII.Por isso o repúdio absoluto pela obtenção de provas mediante tortura, coacção, e ofensa da integridade física ou moral da pessoa, cuja inviolabilidade é primariamente garantida nos artigos 24 e 25 da Constituição, e a limitação aos casos expressamente previstos na lei, em conformidade com a Constituição (artigos 26º e 34º), da obtenção de provas mediante intromissão na vida privada, no domicílio, na correspondência ou nas telecomunicações.
IX.«O que há de novo no n.º 8 [do artigo 32º da Constituição] não é a proibição do uso de meios proibidos na obtenção de elementos de prova mas essencialmente a utilização das provas obtidas por tais meios. Essas provas é que são nulas, nulidade que deve ser considerada em sentido forte, ou seja, como proibição absoluta de sua utilização no processo; seria intolerável que para realizar a justiça no caso fossem utilizados elementos de prova obtidos por meios vedados pela Constituição e incriminados pela lei.
X.Assim, do ponto de vista da proibição de valoração – ou seja, do ponto de vista da “sanção” legalmente imposta para a violação da proibição de produção de prova – o legislador de 1987 estabeleceu uma relação de total identidade entre os n.ºs 1 e 3 do artigo 126º. Relação de total identidade ou mesmidade que lhe era e é imposta pelo n.º8 do artigo 32º da CRP, que impunha a mesma cominação (“são nulas”) a todos os grupos que o legislador de 1987 distribuiu pelos n.ºs 1 e 3 do artigo 126º.
XI.E é o próprio teor literal do n.º3 que o sugere, ao acompanhar a cominação da nulidade do advérbio “igualmente”. O que, em boa hermenêutica, só pode significar o propósito do legislador (de 1987) de impor, tanto para o grupo do n.º1 como para o do n.º 3, uma igual solução de nulidade, ou uma nulidade a valer nos mesmos termos – “igualmente” - e com as mesmas implicações normativas e prático-jurídicas.
XII.Tudo sem escamotear a diferença mediada entre o n.º1 e o n.º3 do artigo 126; diferença que não se situa ao nível da consequência jurídica (nulidade/proibição de valoração), mas ao nível da hipótese legal.
XIII.Assim, o n. º1 do artigo 126º proíbe e sanciona os atentados mais graves e intoleráveis da dignidade e integridade pessoais. E proíbe-os sempre, independentemente do consentimento da pessoa concretamente atingida, sendo aqui, um tal consentimento, tido como pura e simplesmente irrelevante, pois as proibições em causa (v.g. da tortura) não se revestem apenas de uma valência pessoal-individual. Elas valem também como “instituições” irrenunciáveis do processo penal do Estado de Direito e são, por isso, indisponíveis.
XIV.No grupo de proibições do n. º3 do artigo 126º do Código de Processo Penal só a coerção e o arbítrio, isto é, só a ausência de consentimento, determinam a sanção da proibição de valoração; no grupo de proibições dos n.ºs 1 e 2 a lei prescreve a proibição de valoração, em nome de uma presunção geral, abstracta e não ilidível, de arbítrio e coerção, por estarem em causa aqui valores pertinentes ao núcleo irredutível do Estado de Direito e, mesmo, da civilização.
XV.Em ambos os casos estamos perante proibições de prova.
XVI.Na legislação processual penal, o artigo 187.º estabelece as condições de admissibilidade da interceção e da gravação de conversações ou comunicações telefónicas, elencando os crimes em relação aos quais é possível efetuar escutas telefónicas.
XVII.O que o art. 187° n° 1 do CPP parte final exige é que haja “razões para crer” que a interceção e a gravação das interceções telefónicas se revelarão “indispensável para a descoberta da verdade” ou que “a prova seria, de outra forma impossível ou muito difícil de obter”, o que remete para um critério de eficácia.
XVIII.Em face da nossa lei, tudo apontará para que estejamos perante prova proibida quando obtida através de uma escuta não consentida pelo visado, ou então não autorizada pelo juiz de instrução, ou ainda quando autorizada pelo mesmo, nas situações em que o não podia fazer face à lei (por exemplo, face ao tipo legal de crime em questão, ou as pessoas escutadas).
XIX.Pelo que dito fica, serão de excluir do círculo das proibições de prova as inobservâncias sem mais, das formalidades prescritas para o processamento das escutas, no art. 188.º do CPP, subsistindo como também enquadráveis no âmbito das proibições de prova, os resultados de actos nulos de produção de prova por força do 190.º, por desrespeito do art. 187.º, ambos do CPP (…)”.
XX.In casu, forneceram-se ao juiz de instrução dados suficientes para se poder concluir que o recurso às escutas era, não só o mais idóneo, mas também o mais eficaz para a investigação dos factos reportados aos autos (que eram não tão singelos como o recorrente quer dar a entender).
XXI.Por despacho judicial constante dos autos, a fls. 186, datado de 29/11/2017, a Mma Juiz de Instrução considerando os fundamentos expressos no mesmo e por considerar verificada a existência de indícios da prática, entre o mais, de um crime de corrupção passiva (mais uma vez aqui se faz alusão à pratica do crime que o recorrente entende não se encontrar à data indiciado), determinou ao abrigo do dispostos no artº 187º, nº 1, al. a) do C.P.P.l e artº 6º, da lei nº 5/2002, de 11/01, autorizar as interceções telefónicas e gravação das comunicações em relação suspeitos e números constantes na promoção do Ministério Público (fls. 182), autorizando, também, a recolha de som e imagem dos suspeitos AA e XX, bem como de terceiros que com eles se relacionem no âmbito do crime em investigação, até 5/01/2018.
XXII.Fundamenta tal decisão, indicando que as informações ilegitimamente transmitidas ao advogado CC, terão sido fornecidas pelos funcionários judiciais XX e DDD (o que, pelos documentos dos autos, facilmente se percebe que se reporta à certidão do processo nº 5340/17.7T9LSB, de fls. 43 a 63, na qual consta o auto de busca e apreensão datado de 19/10/2017 - busca efectuada ao gabinete de CC, nas instalações do ... e documentos apreendidos, entre os quais se encontram fotocópias de documentos referidos pela PJ na informação de fls. 2, e bem assim aos documentos constantes nos A e B, referentes aos acessos a processos, elementos remetidos pelo GG, os quais, conforme termo de fls. 185, foram remetidos para o TIC.
XXIII.Da análise efetuada, conclui a Mma Juiz de Instrução que os factos não terão sido praticados isoladamente, indiciando-se que estes poderão estar envolvidos numa atuação mais vasta e a troco de benefícios económicos, acrescentando que o crime de corrupção é em regra praticado num ambiente de secretismo e sob a aparência de legalidade, razão pela qual se revela essencial realizar as diligências de investigação que o Ministério Público propõe, não sendo possível obter a prova da prática dos factos e dos seus autores sem a realização das mesmas.
XXIV.O mesmo é dizer que sem as interceções telefónicas aos telemóveis utilizados não seria possível prosseguir a investigação quanto a este arguido, em relação ao qual se desconhecia a identificação e toda a dinâmica da atividade criminosa, em que este estava envolvido.
XXV.Assim, quando procedeu à análise do pedido de autorização de realização de escutas telefónicas, o juiz primeiramente apurou a da existência de indícios da prática de algum dos crimes para cuja investigação é possível utilizá-las, elencados no n.º 1 do artigo 187.º do CPP e depois face à positividade da conclusão a que chegou, decidiu que este meio de prova era indispensável pois que sem ele, a prova é muito difícil ou impossível de obter, verificando e certificando-se, por último, que o alvo se enquadra dentre o elenco das pessoas escutáveis.
XXVI.Se as respostas a todas estas perguntas forem positivas, então o juiz autorizará a realização de escutas.
XXVII.Perante tais evidências não vemos como pode o recorrente continuar a sustentar a não ligação do arguido CC à prática dos factos, nem tão pouco alegar a irrelevância do histórico do processo 5340/17.7T9LSB que foi encontrado no seu gabinete quando à saciedade resulta que haviam sido efectuados acessos não permitidos e dissimulados ao histórico do mesmo processo, já que admite a existência de todos os indícios supra referidos, batendo-se pela não existência de indícios quanto à ligação do recorrente com os demais e bem assim que tais elementos haviam sido pedidos e lhe haviam sido fornecidos com contrapartidas, contudo não justifica de forma cabal– porque não lhe interessa e não consegue – porque motivo tais elementos foram encontrados no seu gabinete, querendo até dar a entender que poderiam ali ter sido colocados propositadamente, o que contraria todas as regras da experiência, não sendo minimamente de aceitar como verdadeiro.
XXVIII.Não há qualquer especulação, os elementos juntos aos autos são claros e evidentes, indiciando-se a prática dos crimes elencados pelo Ministério Público aquando da promoção das escutas telefónicas.
XXIX.Posto isto, facilmente se conclui que não foi violado o disposto no art.º. 187º nº 1 do CPP, como incrivelmente se vem alegando, nem tão pouco, os princípios da proporcionalidade e subsidiariedade, não estamos, por isso perante prova proibida nos termos do artigo 126º, n.º 3 do CPP, nem a decisão se mostra ferida de nulidade, nos termos do disposto no artigo 190º do Código de Processo Penal.
XXX.Com efeito, tal só ocorreria se estivéssemos perante uma prova obtida através de uma escuta não consentida pelo visado, uma escuta não autorizada pelo juiz de instrução ou ainda quando autorizada pelo mesmo, nas situações em que o não podia fazer face à lei, por não estarmos perante um crime de catálogo, as pessoas a escutar não serem arguidos, suspeitos ou pessoa que sirva de intermediário, determinada por tempo para além do enunciado na lei; ou não observando a lei quanto ao processo em que pode ser feito o uso das escutas; tudo requisitos constantes do artº 187º, do C.P.P, que foram, no nosso entender, bem analisados, explanados e fundamentados no despacho proferido pela Mma Juiz de Instrução.
XXXI.Ora, como acima já dissemos, se a não verificação dos pressupostos previstos no artº 187º, do C.P.P, é sancionada, por força do artigo 190º, do C.P.P, como nulidade, a falta de fundamentação da decisão judicial é sancionada como irregularidade, a qual pode ser invocada pelos interessados nos termos do artigo 123º, do C.P.P.
XXXII.A considerar-se, que não se considera, o despacho de fls. 186 com falta de suficiência de fundamentação, o vicio de que padeceria seria de mera irregularidade e não de nulidade como se invoca que sempre já se mostrava sanada pelo decurso do tempo pois que já há muito teria que ser invocada.
XXXIII.No mais, considerando o entendimento supra referido, não se verificando qualquer nulidade na obtenção da prova, naturalmente não se existe nos autos qualquer prova proibida que tivesse sido utilizada, nomeadamente para fundamentar a condenação do recorrente, ficando por isso prejudicadas todas as demais questões levantadas, inclusivamente a contaminação da prova obtida na sua sequência.
XXXIV.Nesta medida, e por todos os motivos supra expostos, concluímos que deve improceder, nesta parte, o recurso, mantendo-se o Acórdão recorrido na integralidade.
2- Impugnação da matéria de facto e enquadramento jurídico penal dos factos (inexistência de contrapartidas e não verificação de compra de permeabilidade):
XXXV.Entende, o recorrente, não ser possível afirmar que em julho/agosto de 2015 (quando o recorrente começou a oferecer ... ao arguido AA e pessoas por si convidadas assistirem aos ... do ... no ... do ...), que o recorrente tinha já em mente vir a pedir ao arguido AAque praticasse atos contrários aos seus deveres funcionais (estando a criar um clima de permeabilidade deste) e que o arguido AA tinha já aceite vir a praticar tais atos em função das ofertas que lhe eram feitas pelo aqui recorrente.
XXXVI.Mesmo que o Tribunal não acredite que tais ofertas se situavam no estrito campo da amizade ou do interesse legítimo de ambos os arguidos (o do recorrente, de levar pessoas ao ...e o do arguido AA, de ver os ... e poder obsequiar família e amigos), não tem qualquer facto provado que lhe permita afirmar que nessa altura (julho/agosto de 2015) o arguido AA mercadejou com o cargo, pondo, logo ali, os interesses privados do ora recorrente à frente dos interesses públicos que lhe cabia defender, colocando-se, logo ali, à disposição do aqui recorrente para o que este lhe viesse a pedir.
XXXVII.Não existe qualquer prova, direta ou indireta, que permita firmar a conclusão de que a conduta dos arguidos (oferta e aceitação) teve na sua origem o mercadejar do cargo do arguido AA. Pelo contrário, foram, como vimos, dados como provados factos que permitem afastar, com segurança, tal conclusão.
XXXVIII.E sendo inequívoco que nem o comportamento do arguido AA, nem o do recorrente sofreu qualquer alteração, mantendo-se absolutamente inalterado, com o pedido deste àquele para aceder a determinados processos judiciais, impõe-se concluir que a prática destes atos, pese embora a sua manifesta ilicitude, não teve como contrapartida as ofertas do aqui recorrente, nem foi motivada por estas.
XXXIX.Nesta conformidade, entende que tem que cair a condenação pela prática do crime de corrupção, por que foram condenados o recorrente e o arguido AA.
XL.Sem embargo, se assim não for entendido, o que apenas por dever de patrocínio se equaciona, deve a decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que condene o ora recorrente pelo crime previsto e punido pelo artigo 372 do Código Penal ‒ recebimento indevido de vantagem.
XLI.Como consequência, entende que se encontram incorretamente julgados os factos dados como provados sob os números 17, 20, 21 e 139, 22, 25 e 218, 120, 125, 136, 179, 205 e 206, 213 e 214, 215 e 240 e 228.
XLII.Como é sabido, a decisão sobre a matéria de facto é susceptível de ser sindicada por duas vias: por um lado, no contexto mais restrito dos vícios previstos no artigo 410.º, n.º 2 do CPP e, por outro, no âmbito da impugnação ampla regulada no artigo 412.º, n.os 3, 4 e 6 do mesmo diploma, como, julgamos, é o caso.
XLIII.Todavia, o que se vislumbra nas conclusões da motivação de recurso do arguido, em matéria de facto, com todo o respeito, é uma confusa e indemonstrada alegação de erro de julgamento do tribunal coletivo quanto a essa matéria.
XLIV.Só do próprio texto das motivações se pode inferir que o que o arguido pretende é sustentar que tivessem sido dadas como não provadas as contrapartidas/a peita no que respeita ao crime de corrupção, propugnando, desde logo, pela sua absolvição.
XLV.Na verdade, o arguido limita-se a contestar a convicção adquirida pelo tribunal recorrido sobre os factos dados como provados, não aceitando, apenas porque a decisão lhe é desfavorável, que o Tribunal tenha valorado todas as provas em conjunto, as pré constituídas e as constituídas em audiência de discussão e julgamento e as conjugasse por recurso às regras da experiência comum e à livre convicção do julgador com respeito pelo disposto no artigo 127.º do CPP, como se extrai do teor do douto acórdão.
XLVI.A produção da prova decorre perante o tribunal de primeira instância e no respeito de dois princípios fundamentais e interconectados: o da oralidade e o da imediação. E com isso visa-se assegurar o princípio basilar do julgamento da matéria de facto em processo penal: o da livre apreciação da prova por parte do julgador.
XLVII.Neste o julgador apresenta e fundamenta os pressupostos valorativos de obediência a critérios da experiência comum e da normalidade, o que, na verdade, foi efectuado.
XLVIII.O princípio da imediação pressupõe um contacto directo e pessoal entre o julgador e as pessoas que perante ele depõem, sendo esses depoimentos que irá valorar e servirão para fundamentar a decisão da matéria de facto.
XLIX.E é precisamente essa relação de proximidade entre o tribunal do julgamento em primeira instância e as provas que lhe confere os meios próprios e adequados para valorar a credibilidade dos depoentes e que de todo em todo o tribunal do recurso não dispõe.
L.O duplo grau de jurisdição na apreciação da decisão da matéria de facto não tem, portanto, a virtualidade de abalar o princípio da livre apreciação da prova que está conferido ao julgador de primeira instância, só podendo o tribunal de recurso modificar aquela decisão quando não encontrar qualquer suporte nos meios de prova produzidos no processo.
LI.A menos que, como se disse, a convicção formada pelo julgador contrarie as regras da experiência comum, da lógica e dos conhecimentos científicos.
LII.Tanto mais assim é que a alteração do decidido em primeira instância só poderá ocorrer, de acordo com a alínea c), do n.º 3, do a art.º 412.º do Código de Processo Penal, se a reavaliação das provas produzidas impuserem diferente decisão, mas não já se tal for uma das soluções possíveis da sua reanálise segundo as regras da experiência comum.
LIII.No caso concreto, verifica-se claramente que o Tribunal recorrido valorou as provas constituídas de acordo com o que lhe pareceu ser a credibilidade emanada pelas declarações do arguido, das testemunhas que quanto aos factos depuseram, conjugando-os com a prova junta aos autos e assim formou a sua convicção, não se evidenciando que com isso tenha violada qualquer regra da experiência comum.
LIV.Assim sendo, pretendendo o recorrente estribar a impugnação da decisão da matéria de facto provada apenas na convicção diversa que formou sobre a credibilidade dos meios de prova, sem que sustentadamente mostrasse que a mesma violou qualquer regra da experiência comum, naturalmente que isso impede que o tribunal de recurso da mesma conheça, já que a valoração prevalecente é a do Tribunal recorrido, pois que não se vislumbra, nem o recorrente invoca, que ao fazê-lo tenha sido violada qualquer regra da experiência comum.
LV.Mas ainda que se pudesse conhecer da impugnação da decisão da matéria de facto, o que se admite por necessidade de raciocínio, desde já se diga que não poderia ser alterada uma vez que nenhuma prova foi apresentada que impusesse decisão diversa da proferida no Acórdão recorrido, mas tão somente valoradas de forma diferente o que é insuficiente para lograr o efeito pretendido, já que a lei só permite a alteração da decisão da matéria de facto caso as provas imponham essa alteração.
LVI.O recorrente invoca razões de ordem probatória que no seu entendimento impõem decisão diversa da tomada pelo tribunal a quo, o que nos remete para a impugnação ampla da matéria de facto, regulada no artigo 412.º, n.os 3, 4 e 6 do CPP, já que a sindicância efectuada não se limita ao texto da decisão, estendendo-se à análise da prova produzida em audiência.
LVII.Com efeito, o que se verifica é que o recorrente na posição que assume alheia-se de toda a prova pré constituída e da conjugação dessa com a efectuada em julgamento, contudo o conteúdo de toda a prova espelha a forma de actuação do arguido e dos demais co-arguidos, a relação existente entre todos e os factos tal qual foram dados como provados, tendo o Tribunal a quo elencou as razões da valoração que efectuou, identificando a prova por declarações, testemunhal, pericial e documental que relevou na formação da sua convicção e indicando os aspectos da mesma que conjugadamente o levaram a concluir no sentido de considerar demonstrada a factualidade dada como provada, para além de ter assinalado de forma lógica e racional os fundamentos que no seu entendimento justificam a credibilidade que reconheceu e peso probatório que conferiu à toda a prova junta aos autos.
LVIII.Posto isto, mão podemos estar mais em desacordo com a posição assumida pelo recorrente!
LIX.Porque na verdade, o que se verifica da conjugação da prova existente é o oposto daquilo que o recorrente pretende fazer crer!
LX.Na verdade, o que se verifica, como aliás resulta à saciedade do texto do Acórdão que se transcreveu é que apesar de se verificar que os acessos indevidos só se iniciaram em 2017, não deixa de ser também verdade (e ficou plenamente demonstrado) que o recorrente, sabendo de quem se tratava e das funções que exercia, pretendeu com a convivência, interligação e relação de amizade que estabeleceu e que veio a sedimentar com o arguido AA, a quem por diversas vezes facultou o acesso ao ...do ... e outros campos que permitiam assistir a ... de ..., quer seja por intermédio de .../.../redpass ou outro qualquer meio que permitisse a entrada e assistência aos ..., foi precisamente estabelecer uma relação de confiança que lhe permitisse posteriormente pedir/solicitar àquele favores que sabia que estavam ao seu alcance, sabendo também que AA não lhe iria negar tais pedidos face às oferendas que lhe eram atribuídas.
LXI.Na verdade, no nosso entender, pode-se até mesmo concluir que o arguido AA face ao recebimento de tantas oferendas/favores prestados (assistências a ... e ...) não seria capaz de negar qualquer pedido que lhe viesse a ser efectuado pelo recorrente, porque sempre se sentiria agradecido por tudo o que o recorrente lhe tinha proporcionado, fazendo com que aquele sentisse que lhe devia um favor ou melhor, vários favores, sabendo, o recorrente de antemão que tal não estaria ao alcance do arguido AA caso tivesse que pagar os ... e as oferendas, assim como o este também tinha disso noção, tanto mais que até estava na expectativa que aquele arranjasse um emprego ao seu sobrinho.
LXII.E por isso, pode-se até concluir, indo mais além, que o arguido AA estava na disponibilidade do recorrente, estava nas suas mãos, ou seja, estaria na disponibilidade de lhe retribuir os favores que lhe foram feitos e as oferendas que lhe foram dadas, nem que tivesse que praticar crimes, como forma de retribuição, o que se verificou.
LXIII.Sem tirar nem pôr foi isto que aconteceu! O recorrente com a conduta que manteve, ao oferecer convites/.../redpass/... ao arguido AA conseguiu fazer, porque era isso mesmo que queria, com que aquele ficasse na disponibilidade de lhe retribuir qualquer favor que lhe fosse solicitado e que facilmente o aceitaria fazer por força das contrapartidas que lhe deu e que o outro recebeu, ainda que apenas tenha começado a retribuir dois anos mais tarde.
LXIV.Há uma expressão portuguesa que cremos se adequa muito ao caso concreto - uma mão lava a outra e ambas lavam o rosto, mas neste caso com o cometimento de crimes à mistura.
LXV.Perspetivando a análise da lei tendo presente o caso dos autos - lembrando-se, pois, que ao arguido é imputada a pratica do crime de corrupção ativa - impõe-se afirmar que, na corrupção, o núcleo do ilícito reside no “mercadejar” com a função ou nesse perigo, o que acaba por modelar o tipo legal, quer na corrupção passiva, quer na corrupção ativa.
LXVI.O crime de corrupção ativa consuma-se e verifica-se:
- no momento em que o corruptor “dá” (pressuposto desta expressão é que funcionário a aceitou) o suborno ao funcionário e, portanto, o crime consuma com a entrega do suborno (Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário cit., pág. 887; M. Miguez Garcia e J.M. Castela Rio, Código cit., pág. 1040 vão um pouco mais longe sustentando que, no caso da dádiva fracionada o crime se consuma com a entrega da última parte dela); ou
- o momento em que a sua promessa (de suborno) chega ao conhecimento do funcionário (Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário cit., pág. 888) — se, por alguma razão, a promessa foi feita, mas não chegou ao conhecimento do funcionário, importará verificar se os pressupostas da tentativa, expressamente punível nos termos do artigo 374.º, n.º 3 - seja porque aceitou o “repto” que lhe foi lançado pelo funcionário (a “iniciativa do suborno coube a este último), seja porque ele próprio teve a iniciativa de corromper o funcionário com um suborno, sendo, neste último caso, indiferente à consumação do crime de corrupção ativa, a reação do funcionário (podendo esta traduzir-se, de modo irrelevante para a perfeição do ilícito, no repúdio do suborno, na sua aceitação ou na indiferença em relação ao mesmo traduzida no puro silêncio).
LXVII.Em face destes dados, impõe-se concluir que:
- na promessa de suborno, a consumação do crime de corrupção ativa não depende do efetivo recebimento da vantagem ou do suborno, não sendo sequer necessário que o corruptor tenha a intenção de efetivamente cumprir a promessa e entregar o suborno ou a peita ao funcionário; e
- a consumação do crime, tal como na corrupção passiva, não está dependente da prática, pelo funcionário, de qualquer ato ou omissão contrária aos seus deveres funcionais, sendo irrelevante até, para este efeito, que nunca sequer tenha tido a intenção de o praticar ou omitir;
- a corrupção ativa não é um crime de comparticipação necessária, tal como vimos que não era a corrupção passiva; e
- a corrupção ativa, tal como a passiva, é um crime de execução instantânea.
LXVIII.Se no artigo 372.º se pune a criação de um “clima de permeabilidade” ou de simpatia tendo em vista futuros atos, mas desligado de objetivos imediatos, tal significará que na corrupção “quando se solicita, aceita ou promete, a peita deve atualizar já o sentido de uma «troca» ou «transação» com o exercício do cargo” (Almeida Costa, Comentário cit., pág. 671), sem que, todavia, se exija a verificação de uma relação direta entre o suborno e a conduta do funcionário, até porque esta não precisa de “se encontrar pré-determinada de forma precisa ou, até, ficar subordinada, quanto ao quanto ao seu «se» e ao seu «como», à discricionariedade do agente, em razão do circunstancialismo que se observe no momento de a levar a cabo” (Almeida Costa, Comentário cit., pág. 671).-tudo em conformidade com o Ac. TRP, proferido em 14.04.2021, disponível em www.dgsi.pt.
LXIX.Além do mais, quanto ao crime elencado no artigo 372º do CP, sempre se dirá que, ainda que se entendesse como o recorrente, que o mesmo se encontra numa relação de concurso aparente com o crime em causa nos autos, o de corrupção, pelo que sempre este consumiria aquele. – cfr. Ac. STJ, de 03.12.2020.
LXX.Feitas estes considerandos, entendemos que os factos não deixam margem para dúvida: existiram vantagens patrimoniais para o arguido AA, pois, como se refere no Acórdão, ainda que o recorrente CC não tivesse que pagar para obter ...ou facultar outros benefícios ao arguido AA, do ponto de vista do arguido AA aquilo que recebia tinha um valor correspondente aos ... que não teve que adquirir para assistir aos ... que assistiu, ao valor correspondente aos ...que passou a receber e a poder ele próprio oferecer a terceiros, mantendo-se também na expetativa de receber sempre algo do arguido CC, como artigos de ... ou um emprego para o seu sobrinho, sendo certo que o recorrente admite até em relação ao blusão que ofereceu ao filho do arguido AA comprou-o na loja da ... e não teve desconto!
LXXI.Pelo exposto, entendemos que deverá improceder a pretensão do recorrente, também nesta parte, se mantendo a decisão recorrida nos seus precisos termos.
3- Medida da pena:
LXXII.Alega o recorrente à cautela, caso não venha a merecer provimento o seu recurso e se mantenha a decisão da primeira instância, entende que a pena aplicada se deve situar abaixo da metade da moldura penal abstrata do tipo de crime.
LXXIII.Pese embora reconheça as exigências de prevenção geral que este tipo de crimes reclama, a verdade é que a simples condenação e toda a repercussão que o processo teve na vida profissional do ora recorrente, originando a perda do seu posto de trabalho no ..., com grande estrondo público, é suficiente para acautelar tais exigências. Sobretudo o que releva para este efeito é a ideia que será gerada na comunidade de que o ora recorrente, não obstante o “poder” de que dispunha, foi condenado.
LXXIV.Ao invés, as exigências de prevenção especial são relativamente diminutas, atento o que ficou provado relativamente ao carácter do recorrente (cfr. Factos provados n.ºs 413 a 442), à sua integração social e à consciência que revelou de que tinha agido de forma errada ao solicitar ao arguido AA que acedesse a processos judiciais no Sistema Citius.
LXXV.Toda a postura do recorrente no decurso do processo demonstrou humildade, respeito e consideração pelo funcionamento da justiça, reconhecendo sempre que, pese embora fosse sua convicção que não cometera um crime nem por isso a sua conduta era justificável do ponto de vista ético, assegurando que não a repetiria.
LXXVI.Mais uma vez entendemos que não assiste razão ao recorrente, tenso o Tribunal indicado expressamente as circunstâncias que depõe a favor e contra o arguido para justificar a aplicação da pena em causa, que ficou estabelecida, 2 anos e 6 meses de prisão, situada por isso no meio da moldura penal aplicável.
LXXVII.Consideramos que a pena é adequada e justa, subscrevendo o entendimento do Tribunal que, a nosso ver, não merece reparo.
LXXVIII.O ponto de partida das finalidades das penas por referência à tutela necessária dos bens jurídicos reclamada pelo caso concreto e com significado prospectivo, encontra-se nas exigências da prevenção geral positiva ou de integração, em que a finalidade primária da pena é o restabelecimento da paz jurídica comunitária posta em causa pelo comportamento criminal.
LXXIX.Em termos jurídico-constitucionais, é a ideia de prevenção geral positiva ou de integração que dá corpo ao princípio da necessidade de pena.
LXXX.A moldura de prevenção, comporta ainda abaixo do ponto óptimo –ideal-, outros em que a pressuposta tutela dos bens jurídicos “é ainda efectiva e consistente e onde portanto a pena pode ainda situar-se sem que perca a sua função primordial de tutela de bens jurídicos. Até se alcançar um limiar mínimo – chamado de defesa do ordenamento jurídico – abaixo do qual já não é comunitariamente suportável a fixação da pena sem se pôr irremediavelmente em causa a sua função tutelar de bens jurídicos.” (idem, ibidem, p. 117)
LXXXI.O ponto de chegada encontra-se nas exigências de prevenção especial, nomeadamente da prevenção especial positiva ou de socialização, ou, porventura a prevenção negativa relevando de advertência individual ou de segurança ou inocuização, sendo que a função negativa da prevenção especial, se assume por excelência no âmbito das medidas de segurança.
LXXXII.Na fixação da medida concreta da pena, como ensina Figueiredo Dias, devem ser tidos em conta os critérios gerais da medida da pena contidos no artº 71º – exigências gerais de culpa e prevenção – e o critério especial dado pelo nº 1 do artº 77º: «Na medida da pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente».
LXXXIII.Um dos critérios fundamentais em sede da culpa, numa perspectiva global dos factos, é o da determinação da intensidade da ofensa e dimensão do bem jurídico ofendido, sendo certo que assume significado profundamente diferente a violação repetida de bens jurídicos ligados à dimensão pessoal, em relação a bens patrimoniais.
LXXXIV.Por outro lado, importa determinar os motivos e objectivos do agente no denominador comum dos actos ilícitos praticados e, eventualmente, dos estados de dependência, bem como a tendência para a actividade criminosa expressa pelo número de infracções, pela sua permanência no tempo, pela dependência de vida em relação àquela actividade.
LXXXV.As qualidades da personalidade do agente manifestada no facto devem ser comparadas com as supostas pela ordem jurídica e a partir daí se emitam juízos, mais fortes ou mais acentuados, de valor ou desvalor.
LXXXVI.Na avaliação da personalidade expressa nos factos é todo um processo de socialização e de inserção, ou de repúdio pelas normas de identificação social e de vivência em comunidade, que deve ser ponderado.
LXXXVII.Assim, face ao supra aludido, por confronto com a factualidade dada como provada, facilmente concluímos que nada falhou na apreciação efectuada pelo Tribunal a quo, revelando-se que o arguido agiu com dolo directo, sendo evidente e significativa a sua vontade criminosa [als. a) e b), do n.º 2, do artigo 71.º, do Código Penal], surgindo o recorrente como elemento preponderante que desencadeou toda a sequência de crimes que se veio a consumar, manifestando a culpa do arguido uma gravidade já acima da média posto que este arguido era quem, em última instância beneficiava mais com toda esta situação, tendo em vista as finalidades últimas pretendidas com a sua conduta.
LXXXVIII.As exigências de prevenção especial não obstante serem elevadas, mostram-se relativamente amenizadas, na medida em que o arguido se mostra enquadrado socio economicamente e familiarmente, o que mesmo assim não o impediu de manter a conduta em causa nos autos.
LXXXIX.No que às razões de prevenção geral concerne, são muito elevadas, pelo que urge responder às expectativas sociais de reafirmação da validade material das normas violadas pelo recorrente, dada a proliferação deste tipo de crime.
XC.O fenómeno da corrupção mostra-se facilmente apreensível para a generalidade das pessoas: na sua forma mais simples, ocorre naquelas situações em que, por força de um suborno recebido, o funcionário não cumpre os deveres inerentes ao exercício das funções públicas de que está investido. É vista, portanto, como um comportamento desvalioso através do qual um funcionário público ou titular de um cargo político ou alto quadro público atua de modo diverso aos padrões normativos do sistema jurídico tendo em vista o favorecimento de interesses particulares, mediante a obtenção de uma vantagem e aqui falamos na atividade do funcionário corrompido e em corrupção passiva; mas também pode ser vista como uma conduta que consiste em alguém seduzir um funcionário público para obter um benefício que, de outra maneira, não conseguiria, assim se caraterizando a atividade do agente corruptor e a corrupção ativa.
XCI.Com esta nota, torna-se claro que o combate (também pela via penal) à corrupção encontra a sua pedra de toque na defesa do “interesse geral” ou “público” de que só funcionários públicos (ou equiparados) a cumprir os deveres inerentes ao exercício das suas funções pautados por critérios de legalidade, imparcialidade e objetividade constitui garantia segura da tutela de direitos individuais, mas também a efetiva defesa de interesses coletivos indispensáveis à realização da pessoa enquanto “ser social”. Aliás, este quadro assume cada vez mais relevo no contexto de escassez (da ideia de que os recursos não chegam para satisfazer todas as necessidades) que também marcam as sociedades ou países desenvolvidos, principalmente quando se associa a corrupção à apropriação ilegítima de bens ou recursos públicos.
XCII.Assim, há muito que se abandonaram teses que olhavam a corrupção não só com complacência - uma espécie de “mal necessário” - mas até como algo de positivo para a economia, quer de países em vias de desenvolvimento, quer de países desenvolvidos, servindo de “lubrificante” das relações entre o setor privado e os poderes públicos ou como tais encarados. Bem pelo contrário, num tempo - como é o nosso - onde a falta de recursos para a satisfação das necessidades surge como pano de fundo da discussão, construção e reconstrução do Estado e dos direitos das pessoas, deixou de se olhar para ele apenas como um ente ao serviço de todos, mas como uma realidade de que todos fazemos parte (o “Estado somos nós!”), impondo-se-lhe e aos seus agentes uma atuação de acordo com os princípios da boa administração, isto é, de modo imparcial, igual e justo.
XCIII.A corrupção apresenta-se como um fenómeno transnacional, transversal, complexo e pluridimensional: não conhece fronteiras (o que é facilitado pelos fenómenos de globalização), corrói os pilares do Estado de Direito (nomeada e especialmente, quando associada à corrupção dos representantes escolhidos pela via democrática, fragilizando a própria Democracia), prejudica o crescimento económico e o desenvolvimento sustentável, distorce a livre e sã concorrência, para além de, frequentemente, andar de mãos dadas com outras manifestações criminais as mais das vezes altamente organizada.
XCIV.Ora a conjugação de todos estes factores, do elevado grau de ilicitude e a intensidade do dolo – directo- do crime praticado permite concluir que a pena aplicada é a única adequada às necessidades de prevenção geral e especial do caso em apreço.
XCV.Em suma, da análise da fundamentação do acórdão impugnado facilmente se constata que todas as circunstâncias favoráveis ou não favoráveis foram devidamente analisadas e correctamente valoradas na pena aplicada, pelo que nenhuma censura merece o acórdão recorrido, devendo o mesmo improceder.
Assim, se conclui no sentido de ser negado provimento ao recurso e, consequentemente, ser mantido Acórdão recorrido.»
- da resposta da Assistente -
«A. Ponto prévio: da necessária improcedência dos pedidos de reapreciação de prova
I. A reapreciação da prova produzida em audiência de julgamento pelo Tribunal de recurso deve ser considerada, naturalmente, limitada e restrita, em consequência dos princípios da oralidade e da imediação da prova (artigo 355.º do CPP) e do princípio da livre apreciação da prova pelo julgador (artigo 127.º do CPP), ficando reservada para as situações em que o Tribunal a quo incorre num erro de julgamento.
II. No presente caso não está em causa um erro de julgamento que imponha uma decisão sobre os factos diferente da que se encontra vertida no aresto recorrido, mas antes uma ponderação diferente, por parte dos Recorrentes, da prova produzida em audiência e da consequente decisão sobre os factos que nela se suportou.
III. Não resultando da decisão da primeira instância qualquer violação das regras de experiência comum, da produção de prova ou da formação da convicção do Tribunal que impusesse uma valoração da prova em oposição àquela que o Tribunal a quo fez, não se mostra possível uma decisão sobre a matéria de facto distinta daquela que justamente se encontra vertida no douto acórdão recorrido.
B. Resposta ao Recurso Interposto Pelo Arguido AA
IV.O Recorrente não logra demonstrar na sua alegação qualquer evidência de erro de julgamento do Tribunal a quo na apreciação da matéria de facto, o que, só por si, pelo aludido carácter excecional e meramente pontual que deve revestir a alteração da decisão sobre a matéria de facto por parte do Tribunal ad quem, determina naturalmente a improcedência do recurso interposto no presente segmento da respetiva alegação.
V.Quanto à alegada desvalorização, pelo Tribunal a quo, da relação de amizade que alegadamente existiu entre os arguidos, cabe notar que o Tribunal a quo encontrou na prova produzida razões fortes e bastantes para formar a convicção de que a natureza da relação mantida entre os coarguidos, no que releva o âmbito dos presentes autos, não era apenas de proximidade/amizade, e, mesmo que fosse, tal não seria incompatível com a prática dos factos criminosos.
VI.Não sendo passível de ser tida, portanto, como credível, a conclusão de que a relação entre os coarguidos era genuína na sua totalidade, ou, pelo menos, que pudesse a mesma obstar a uma inerente intenção de corrupção para a prática dos factos dados como provados.
VII.Resulta da concatenação de toda a prova nos autos (entre a qual, o Relatório do GG, o testemunho de CC e informação pericial da PJ) com as regras da experiência comum, alicerçadas nos elementos de prova direta existentes, que foi o Recorrente que procedeu às consultas aos processos em causa nos presentes autos, mesmo quando se encontrava de férias ou ausente.
VIII.Quanto à alegada adequação social das contrapartidas, deve improceder o argumento do Recorrente pois sendo a oferta de ... e ... uma prática tolerada e até promovida no mundo do desporto, não deixa a sua frequência de atestar à anormalidade ou desadequação social das ofertas, o que resulta das próprias Diretivas da ....
IX.In casu, não se poderá desconsiderar o número de ofertas realizadas, uma vez que a sua frequência extrapola o aceitável e adequado.
X.Ademais, as situações em que as ofertas – que normalmente seriam passíveis de consubstanciar o crime de corrupção – não constituem ilícito devem ser circunscritas a casos especiais, pelo que a conduta dos arguidos não é isenta de relevância penal apenas por se tratar de uma alegada “prática habitual no meio desportivo”.
XI.Assim, as ofertas realizadas por CC a AAnão foram meras cortesias ou lembranças de amigo, mas verdadeiras contrapartidas por serviços prestados.
XII.Quanto à alegada violação, pelo Tribunal a quo, do disposto no artigo 127.º CPP, por desconsideração e desvalorização de diversos depoimentos, esta é totalmente improcedente, uma vez que (i) o Tribunal a quo reconheceu, em linha com a prova testemunhal produzida, que era prática comum a entrega de ... e artigos de ... pelos funcionários do . a amigos e (ii) o
Tribunal a quo, após confrontar os depoimentos do perito informático da PJ
UU e da testemunha VV, ..., com a restante prova produzida respeitante aos acessos realizados aos processos no Citius concluiu, com segurança, que havia sido o arguido AA a realizar os acessos comprovados nos autos, mesmo aqueles realizados na pendência das suas férias.
XIII.Não se verificando qualquer desrespeito pelas regras legais aplicáveis à apreciação da prova, não releva que as alegações do Recorrente revelem uma diferente análise valorativa da prova produzida.
XIV.Quanto à alegada violação do princípio do in dúbio pro reo, não assiste razão ao Recorrente, atendendo que este princípio impõe ao julgador o dever de se pronunciar de forma favorável ao arguido sempre que não tenha certeza sobre os factos conducentes à matéria a decidir, o que não é posto em causa nos presentes autos, na medida em que, analisada toda a prova, não restaram dúvidas ao Tribunal a quo que o Recorrente foi corrompido e acedeu ilegitimamente a processos judiciais a pedido do arguido CC, em troca de vantagens e contrapartidas.
XV.A decisão de condenação do Tribunal de 1.ª instância não viola o princípio in dubio pro reo face à patente inexistência de dúvidas quanto aos factos relevantes.
XVI.Quanto à alegada violação do caso julgado, não tendo o Recorrente recorrido do despacho de 02.03.2022, que determinou a comparência do autor do Relatório do GG em audiência de julgamento para prestação de esclarecimentos, ou do despacho de 28.04.2022, que decidiu pela inexistência das alegadas nulidades invocadas pelo Recorrente, ficou o tribunal de recurso impedido de os sindicar, tendo ambos os despachos transitado em julgado.
XVII.Termos em que é o recurso inadmissível nesta parte, nos termos disposto no artigo 414.º, nº 2, do CPP.
XVIII.Sem prejuízo, o despacho de 02.03.2022 – que, segundo o Recorrente, revogou o despacho de 01.02.2022 – jamais poderia padecer do vício da nulidade por violação do caso julgado formal, uma vez que o despacho de 01.02.2022 não havia ainda transitado em julgado.
XIX.Atendendo que a violação“[d]o caso julgado formal só se constitui quando é contrariado em despacho posterior um anteriormente proferido que tenha apreciado concretamente as questões cujo conhecimento ora se repete” (cfr. Acórdão da Relação de Coimbra de 02.02.2022, proferido no Processo n.º 32/18.2GAMGL-A.C1), conclui-se que não houve constituição nem violação de qualquer caso julgado formal porquanto resulta da contraposição dos despachos de 01.02.2022 e de 09.03.2022 que não existe coincidência quanto ao seu objeto, desde logo por o último decorrer de factos só então conhecidos, nomeadamente, da inexistência dos registos dos logs e consequente impossibilidade de realização de perícia.
XX.Ademais, não podia o Tribunal a quo proceder à realização de perícia porquanto esta era impossível e se mostrou supervenientemente impertinente, por terem resultado entretanto esclarecidas as questões que o Tribunal (e não o Recorrente) pretendeu inicialmente esclarecer.
XXI.Por último, o Tribunal a quo diligenciou no sentido de ver esclarecidas as diversas questões colocadas pelo arguido, pelo que o Tribunal a quo não incorreu em qualquer omissão de diligência essencial de produção de prova, nem violou qualquer caso julgado formal.
XXII.Quanto à alegada violação do princípio do contraditório, o argumento do Recorrente não procede pois, processualmente, o princípio do contraditório deve ser interpretado no sentido de que tem o arguido o direito de intervir no processo e de se pronunciar e contraditar todos os elementos de prova ou argumentos jurídicos trazidos ao processo, o que se mostrou plenamente cumprido nos presentes autos, na medida em que o registo dos logs relativos aos acessos não foi junto aos autos e, consequentemente, não foi valorizado para efeitos de tomada de decisão pelo Tribunal a quo.
XXIII.Ora, uma vez que a decisão do Tribunal, no tocante à origem dos acessos na pendência das férias e ausências do arguido, não se fundamentou nos logs dos acessos remotos, mas antes na prova adicional produzida nos presentes autos, o Recorrente não se viu impedido de contraditar o registo dos logs enquanto elemento de prova, porque este não constava sequer dos autos.
XXIV.Quanto à alegada violação do artigo 402.º, n.º 2, do CPP, o argumento do Recorrente não procede, tal como havia já sido decidido a 12 de abril de 2021, mediante despacho que indeferiu, por falta de fundamento, a extensão do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, relativamente ao arguido BB ao Recorrente.
XXV.Sem prejuízo, a não pronúncia do arguido BB, pelo Supremo Tribunal de Justiça, não aproveita ao Recorrente, pois as questões formais conhecidas, que conduziram a essa não pronúncia, - mormente a violação do caso julgado pelo Tribunal da Relação de Lisboa quanto ao despacho de não pronúncia do arguido BB quanto aos 6 crimes de violação do segredo de justiça, 21 crimes de violação de segredo por funcionário, 9 crimes de acesso indevido e 9 crimes de violação do dever de sigilo de que havia sido acusado – não se verificaram no caso do Recorrente.
XXVI.Quanto à alegada falta de legitimidade do Ministério Público para a ação penal quanto aos crimes de violação do segredo de justiça e de acesso indevido, o argumento do Recorrente é improcedente pois, tal como foi decidido em sede de decisão instrutória – que formou caso julgado formal –, apenas o crime de violação de segredo por funcionário está dependente de queixa para o exercício da ação penal, tendo o procedimento criminal instaurado contra os arguidos em relação a este crime sido arquivado por se considerar que a queixa do GG havia sido extemporânea.
XXVII.Ademais, concluiu o Tribunal da Relação de Lisboa em Acórdão proferido nos presentes autos – e que formou caso julgado – que a queixa apresentada foi tempestiva uma vez que, anteriormente a 08.03.2018, data em que o GG foi notificado para, querendo, efetuar participação criminal, o GG não conhecia de elementos relativos ao processo que possibilitassem a elaboração de participação.
XXVIII.Quanto à alegada nulidade das interceções telefónicas por falta de indícios da prática de crime de catálogo, deve o argumento do Recorrente ser considerado improcedente, pois à data da autorização das escutas, existiam indícios suficientes da prática de um crime de catálogo e verificação dos restantes requisitos do artigo 187.º e 189.º do CPP.
XXIX.Concretamente, constavam dos autos, entre outros, a denúncia anónima já avaliada e credibilizada pelo Sr. Coordenador de Investigação Criminal da 2.ª SCICCEF da PJ, os Apensos A e B, e a certidão do processo n.º 5340/17.7T9LSB, da qual consta o auto da busca e das apreensões aí efetuadas a CC, os quais indiciavam já a prática de um crime de catálogo.
XXX.E, caso se considerasse que não resultavam indícios fortes da prática do crime de corrupção passiva, decidiu o Tribunal da Relação do Porto em acórdão de 24.05.2023, Processo n.º 700/23.7JAPRT-A.P1, que “[p]ara a realização de tais diligências [interceções telefónicas], não se exige que os indícios de prática dos crimes em apreço sejam fortes, devendo ser apurado apenas se elas são necessárias, adequadas e proporcionais” em face da restrição de direitos fundamentais.
XXXI.In casu, não se levantam dúvidas quanto à observância do princípio da proporcionalidade, atendendo às consequências associadas à prática do crime de corrupção e à dificuldade de investigação destes tipos de crime decorrente do conluio entre agentes, ocultação de vestígios e pactos de silêncio.
XXXII.Consequentemente, não se está perante qualquer prova proibida, por não serem as interceções telefónicas ilegais.
XXXIII.Acresce que qualquer deficiente fundamentação do despacho de autorização das interceções ordenadas nos presentes autos – a existir, no que evidentemente não se concede – redundaria meramente num vício de irregularidade, há muito sanado.
XXXIV.Quanto à alegada nulidade por destruição das conversações e mensagens de correio eletrónico gravadas, não deve o argumento do Recorrente proceder pois a destruição das escutas e correio eletrónico apreendido resultou da aplicação do preceituado no artigo 188.º, n.º 6, do CPP.
XXXV.Resulta ainda do Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 147/2021, datado de 19.03.2021, proferido no Processo n.º 338/2020, que não é inconstitucional a interpretação da alínea a), do n.º 6 do artigo 188.º do CPP no sentido que as interceções das comunicações e conversações não transcritas em auto podem ser destruídas de imediato e sem que o arguido a elas possa recorrer.
XXXVI.Mais decidiu o Tribunal Constitucional, em Plenário, através do Acórdão n.º 70/2008, de 31.01.2008 “não julgar inconstitucional a norma do artigo 188.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, na redacção anterior à Lei n.º 48/2007, de 29 de Agosto, quando interpretada no sentido de que o juiz de instrução pode destruir o material coligido através de escutas telefónicas, quando considerado não relevante, sem que antes o arguido dele tenha conhecimento e possa pronunciar-se sobre o eventual interesse para a sua defesa”.
XXXVII.Ademais, mesmo que assim não fosse, em causa não estaria uma nulidade insanável, passível de culminar na declaração de nulidade de todas as “escutas, mensagens e correios eletrónicos” que não foram eliminados, pois como decorre do disposto no artigo 119.º do CPP, para que uma nulidade seja insanável, carece impreterivelmente de tipificação legal nesse sentido, o que não ocorre.
XXXVIII.Quanto à alegada contradição entre factos provados e não provados quanto ao crime de peculato e alegado erro na qualificação jurídica dos factos integradores do mesmo, não assiste razão ao Recorrente por resultar claro do Acórdão recorrido que, quanto ao crime em apreço, apenas não se fez prova do valor concreto do equipamento apreendido, não tendo assim restado dúvidas de que o arguido agiu com intenção de fazer seus os equipamentos informáticos apreendidos.
XXXIX.Quanto à alegada unidade criminosa, não poderá proceder a alegação do Recorrente, uma vez que o Recorrente incorreu, de facto, através da sua atuação, numa pluralidade de crimes, sob a forma de concurso real, conforme previsto no disposto no artigo 30.º, n.º 1, do CP, tendo preenchido, por mais de uma vez, os respetivos tipos objetivo e subjetivo.
XL.Ocorre que não se verifica a permanência de qualquer circunstancialismo externo suscetível de determinar a reiteração do ato ilícito que inicialmente o Recorrente optou por praticar, antes se constatando que, em relação a cada conduta ilícita por si adotada, foram as circunstâncias que o possibilitaram intencionalmente criadas pelo próprio.
XLI.Ou seja, resulta claro não estarem verificados, nos termos e para efeitos do preceituado no artigo 30.º, n.º 2, do CP, os requisitos – cumulativos - subjacentes à verificação do crime continuado, assim se pautando igualmente a pretensão do Recorrente, quanto a esta matéria, por uma absoluta falta de fundamento.
XLII.Quanto à alegada nulidade da prova obtida com base em metadados por aplicação da Lei n.º 32/2008, de 17 de julho (“Lei n.º 32/2008") e em virtude da interpretação do Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 268/2022, proferido no âmbito do processo n.º 828/2019, que veio declarar a inconstitucionalidade das normas constantes dos respetivos artigos 4.º (conjugadamente com o artigo 6.º) e 9.º, não cabe razão ao Recorrente.
XLIII.Primeiramente, o acesso aos dados conservados pela plataforma Citius não se baseou na Lei n.º 32/2008 mas, ao invés, na Lei n.º 109/2009 (“Lei do Cibercrime”), em particular nos termos do disposto no seu artigo 18.º, n.os 1, alínea a), 2 e 3, termos em que as normas da Lei n.º 32/2008 não só não foram convocadas como não revestem qualquer importância nos presentes autos.
XLIV.Não obstante, o argumento do Recorrente nunca poderia proceder pois a Lei n.º 32/2008 é inaplicável ao caso concreto, em razão do seu âmbito subjetivo - fornecedores de serviços de comunicações eletrónicas publicamente disponíveis ou de uma rede pública de comunicações – do qual se exclui a plataforma citius.
XLV.Pelo que a prova obtida aquando da investigação, baseada no acesso aos metadados conservados no Citius, não pode ser considerada nula tendo por base o Acórdão n.º 268/2022 do Tribunal Constitucional, datado de 19.04.2022, uma vez que extravasa o âmbito material deste.
XLVI.Mesmo que assim não se considerasse, o que apenas por mera cautela de patrocínio se equaciona sem conceder, os (meta)dados que facilitaram a recolha da demais prova nos autos enquadram-se nas definições de dados de base (nome de utilizador e IP estático) e dados de tráfego gerados pela comunicação entre um sujeito e uma máquina (data e hora das consultas e ações praticadas), os quais não são tutelados pela Lei n.º 32/2008 e, consequentemente, pelo Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 268/2022.
XLVII.E, sem prejuízo, ainda que assim não se entendesse, resulta do Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 24.03.2023, proferido no processo n.º 747/20.5JGLSB.P1, que “[d]o juízo de inconstitucionalidade formulado pelo Tribunal Constitucional no seu acórdão n.º 268/2022 não decorre qualquer nulidade ou proibição de aquisição ou valoração de prova relativamente a (meta)dados de base retidos por força da obrigação imposta pelo n.º 1 do artigo 4.º da Lei n.º 32/2008, de 17 de julho”.
XLVIII.O Tribunal da Relação do Porto veio ainda afastar a impossibilidade de valorar o resultado das diligências investigatórias desenvolvidas pelas autoridades policiais com base nos conhecimentos obtidos através do acesso aos (meta)dados, por «efeito-à-distância», improcedendo, também quanto a esta parte, a alegação do Recorrente.
XLIX.Quanto ao pedido de reenvio prejudicial, deve este ser considerado inadmissível, por não revestir qualquer relevância para o julgamento da presente causa.
C. Resposta ao Recurso Interposto Pelo Arguido CC
L.Quanto à alegada proibição da utilização das escutas telefónicas, deve o argumento do Recorrente improceder na medida em que, e como foi já referido, as interceções telefónicas em causa nos presentes autos foram autorizadas em cumprimento dos pressupostos legais previstos nos artigos 187.º e 188.º do CPP, inexistindo, consequentemente, prova proibida nos termos do artigo 126.º, n.º 3, do CPP, sendo sempre certo, sem prejuízo, que qualquer eventual deficiente fundamentação do despacho de autorização das interceções ordenadas nos presentes autos, a existir, redundaria meramente num vício de irregularidade, já há muito sanado.
LI.Quanto à alegada adequação social das contrapartidas, deve o recurso interposto pelo Recorrente ser julgado improcedente, na medida em que as ofertas realizadas por CC a DDD, pelo seu caráter reiterado e instituído, não se traduziram em meras cortesias ou lembranças de amigo, mas sim de verdadeiras contrapartidas por serviços (ilicitamente) prestados.
LII.Quanto à alegada inexistência de contrapartidas nos termos e para os efeitos do artigo 374.º do CP e da não verificação de compra da permeabilidade, improcede o argumento do Recorrente porquanto resultou da prova produzida nos autos que a manutenção da conduta em apreço – tratamento privilegiado dirigido a DDD – se deveu ao facto de, com a mesma, estar o Recorrente a oferecer as já mencionadas contrapartidas criando, desta forma, uma situação em que pudesse vir – como, na realidade, veio – a mercadejar o cargo do arguido AA ., incorrendo no tipo criminal ora em causa.
LIII.Sucede que não está em causa qualquer crime de recebimento indevido de vantagem, justamente porque o que se demonstrou foram factos idóneos ao preenchimento do tipo de ilícito de corrupção, pelo que sempre se constataria estar aquele consumido por este, atenta a relação de concurso aparente existente.»
Admitidos os recursos, foi determinada a sua subida imediata, nos autos, e com efeito suspensivo.
- do recurso interlocutório
Está pendente recurso interlocutório apresentado pelo Arguido AA, da decisão que indeferiu que o decidido pelo Supremo Tribunal de Justiça relativamente ao co-arguido BB lhe seja extensível. Admitido tal recurso com efeito devolutivo e a subir a final, nele, o Arguido concluiu:
«1.O Douto despacho que indeferiu que o decidido pelo Supremo Tribunal de Justiça relativamente ao coarguido BB lhe seja extensível, viola o disposto no art.º 402º, n.º 2, al. a) e o caso julgado, o que deverá ser declarado com as legais consequências, padecendo o Douto despacho de nulidade, por pretender sujeitar a julgamento o recorrente quando, quanto a si se verifica, - igualmente - o trânsito em julgado da decisão.
2.Entende o arguido, ao contrário do Douto Despacho ora posto em crise, na esteira do que aconteceu com o co-arguido BB, que não poderá ser julgado pelos mesmos crimes, pelos quais se encontrava acusado em co-autoria, precisamente com aquele arguido.
3.O arguido, aqui recorrente, encontra-se pronunciado, da prática em coautoria com o arguido BB, dos seguintes crimes: seis crimes de violação do segredo de justiça, p. e p. pelo art.º 371.º, n.º 1 e 26.º, do Código Penal (Inquéritos 143/17, 6785/15, 8/16, 872/16, 5340/17 e 7161/17); vinte e um crimes de violação de segredo por funcionário; nove crimes de acesso indevido, p. e p. pelo art.º 44.º, n.º 1 e 2, al. b) e c), da Lei n.º 67/98, de 26/10, e 26.º do Código Penal; nove crimes de violação do dever de sigilo, p. e p. pelo art.º 47.º, n.º 1 e 2, als. a) e b), da Lei n.º 67/98, de 26/10 e 26.º do Código Penal; vinte e oito crimes de falsidade informática, p. e p. pelo art.º 6.º, n.º 4, al. a), da Lei do Cibercrime, um crime de peculato, p. e p. pelo art.º 375.º, n.º 1, do Código Penal.
4.Os crimes que se enunciam na conclusão 4, pelos quais o arguido se encontra pronunciado para julgamento, são-no em coautoria com BB, pessoa que foi despronunciada por esses mesmos crimes, decisão com a qual o Ministério Público se conformou não apresentando recurso da mesma para o Tribunal da Relação de Lisboa.
5.A construção do Ministério Público vertida da Douta Acusação e, parcialmente, na pronúncia, encontra-se alicerçada na coautoria, isto é, na participação conjunta de mais que uma pessoa nos factos, designadamente do aqui recorrente.
6.Sucede que um desses pilares para os crimes já não se encontra nos autos por via da sua não pronúncia decretada pelo Supremo Tribunal de Justiça, não se tratando esta decisão duma mera questão formal de caso julgado, pois, embora tal seja a evidência, importa concluir que a mesma resulta duma opção do Ministério Público, que ao não recorrer da decisão de não pronuncia proferida do arguido BB, pelo Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa que se conformou pela “queda” da co-autoria, pois havia sido o mesmo Ministério Público a narrar a pratica de determinados crimes mediante a acção conjunta de mais que uma pessoa.
7.Se o Ministério Público construiu uma narrativa factual na acusação, na qual refere, expressamente, que o crime só se consuma com a acção conjunta do arguido recorrente com o BB e se este já não está – por opção do Ministério Público nos termos supra alegados (e não por acção do STJ que se limitou a corrigir um erro do Tribunal da Relação de Lisboa) – não poderá o arguido AA ser ele, também, julgado, na medida em que a inação do MP quanto ao BB, terá, necessária e forçosamente de ter consequências, quanto ao aqui recorrente.
8.De acordo com a nossa doutrina e a jurisprudência os elementos da comparticipação criminosa sob a forma de co-autoria são, os seguintes: A intervenção directa na fase de execução do crime (execução conjunta do facto); O acordo para a realização conjunta do facto; O acordo que não pressupõe a participação de todos na elaboração do plano comum de execução do facto; Esse acordo não tem de ser expresso, podendo manifestar-se através de qualquer comportamento concludente e não tem de ser prévio ao início da prestação do contributo do respectivo co-autor;
9.No caso dos autos resulta – e para tal basta uma simples leitura do libelo acusatório, bem como da pronúncia – que o Ministério pretendeu acusar e acusou mesmo o arguido AA, aqui recorrente da prática conjunta com o arguido BB de uma série de crimes, tendo para efeito descrito factos que pressupõem, para a prática dos 6 crimes de violação de segredo de justiça, vinte e um crimes de violação de segredo funcionário, 9 crimes de acesso indevido, 9 de violação de sigilo e vinte e oito de falsidade informática, a actuação conjunta e complementar dos arguidos BB e AA, aqui recorrente, ou seja, uma acção concertada com vista à realização de um facto previsto como crime.
10.Sucede que esta imputação fáctica e o grau de participação de cada um dos arguidos deixou de fazer sentido e deixou de ser possível pela simples razão de, neste momento, um dos comparticipantes deixar de estar acusado/pronunciado pelos crimes supra referido, não fazendo sentido, salvo o devido respeito por melhor opinião, sujeitar um os agentes a julgamento, in cau, o recorrente quando, na óptica do Ministério Público o crime apenas se consumou com a intervenção conjunta de vários co-autores.
11.Ao não recorrer da decisão de não pronuncia relativamente ao coautor e co-arguido BB, sabia o MP que a decisão de não pronuncia em co-autoria com o aqui arguido AA, implicaria o transito em julgado no que aos crimes não recorridos respeita, decisão essa que, fruto da acusação e dos moldes em que se encontra lavrada, deverá ser extensível aos demais arguidos, designadamente ao aqui recorrente.
12.Em face do exposto, deverá a decisão de não pronúncia do arguido BB ser extensível ao aqui recorrente nos termos do disposto no art.º 402º, n.º 2 do CPP, aliás entendimento diferente violaria o princípio da igualdade, constitucionalmente consagrado, devendo ser declarada inconstitucional a interpretação normativa conjugada dos artigos 26º do CP e 402º do CPP, quando entenda não ser extensível aos demais arguidos a decisão de não pronúncia dum deles, dos efeitos do recurso de co-arguido consigo acusado em coautoria por violação dos artigos 13º, 20º, 32º e 219º, n.º 1 da Constituição da República.»
Responderam Ministério Público e GG, concluindo como segue.
- da resposta do Ministério Público –
« Em conclusão, dir-se-á que:
- por decisão proferida em 21.12.2018, o Tribunal Central de Instrução Criminal não pronunciou o co-arguido BB pela prática dos referidos:
•- 6 crimes de violação do segredo de justiça (cfr. fls. 5145, 7º parágrafo);
•- 21 crimes de violação de segredo por funcionário (cfr. fls. 5007, 6º parágrafo);
•- 9 crimes de acesso indevido (cfr. fls. 5145, 7º parágrafo);
•- 9 crimes de violação do dever de sigilo (cfr. fls. 5145, 7º parágrafo);
•- 28 crimes de acesso ilegítimo (cfr. fls. 5077, 1º parágrafo).
-dessa decisão (na parte em que não pronunciou o co-arguido BB pela prática dos referidos crimes) não houve recurso;
- essa mesma decisão transitou, nessa parte, em julgado;
- quanto aos crimes em referência, e relativamente ao recorrente, aquela mesma decisão instrutória (proferida em 21.12.2018, pelo Tribunal Central de Instrução Criminal) foi no sentido de:
a). o pronunciar, quanto aos 6 crimes de violação do segredo de justiça; aos 9 crimes de acesso indevido; e aos 9 crimes de violação do dever de sigilo (cfr. 2º parágrafo de fls. 5148);
b). não o pronunciar, pela prática dos 21 crimes de violação de segredo por funcionário (cfr. fls. 5007, 6º parágrafo);
c). não o pronunciar, pela prática dos 28 crimes de acesso ilegítimo (cfr. fls. 5077, 1º parágrafo e fls. 5179 v.).
- a decisão instrutória, na parte em que não pronunciou o recorrente pela prática dos referidos 21 crimes de violação de segredo por funcionário e 28 crimes de acesso ilegítimo, foi objeto de recurso, por parte do Ministério Público, não tendo, por isso, transitado então em julgado;
- ao pronunciar o recorrente pela prática dos crimes em referência, o Venerando Tribunal da Relação de Lisboa não afrontou qualquer parcela da decisão instrutória que tivesse transitado em julgado, não incorrendo, por isso, em violação do caso julgado nem em excesso de pronúncia;
- a violação do caso julgado e o excesso de pronúncia foram os motivos (invocados no recurso interposto por BB junto do Colendo Supremo Tribunal de Justiça) que levaram este Tribunal, pelo referenciado acórdão de 03.12.2020, a revogar o acórdão do Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, de 11.09.2019, na parte em que este havia pronunciado o coarguido BB pela prática dos referenciados:
• - 6 crimes de violação do segredo de justiça;
• - 21 crimes de violação de segredo por funcionário;
• - 9 crimes de acesso indevido;
• - 9 crimes de violação do dever de sigilo.
- tais motivos (violação do caso julgado e o excesso de pronúncia) não se verificam, relativamente ao recorrente, no que se prende com os assinalados:
• - 6 crimes de violação do segredo de justiça;
• - 21 crimes de violação de segredo por funcionário;
• - 9 crimes de acesso indevido;
• - 9 crimes de violação do dever de sigilo.
e
• - 28 crimes de acesso ilegítimo.
- assim sendo, será de concluir que aquele recurso interposto pelo coarguido BB não poderá aproveitar ao requerente, no sentido por ele pretendido (de obter despacho que não lhe impute os: 6 crimes de violação do segredo de justiça; 21 crimes de violação de segredo por funcionário; 9 crimes de acesso indevido; 9 crimes de violação do dever de sigilo; e 28 crimes de acesso ilegítimo, pelos quais está pronunciado), não havendo por isso violação do disposto no artº 402º, nº 2, do CPP.
Pelo que a decisão recorrida deverá manter-se, mantendo-se, consequentemente, quanto ele (recorrente), integralmente o decidido pelo Venerando Tribunal da Relação de Lisboa.»
- da resposta do GG –
«i.Dão-se aqui por integralmente reproduzidas as motivações de recurso apresentadas pelo arguido AA . no âmbito do processo n.º 6421/17.2JFLSB, que corre os seus termos no Juízo Central Criminal de Lisboa - Juiz 16.
ii.De harmonia com o disposto no n.º 1 do artigo 413.º do Código de Processo Penal o GG, IP, na qualidade de assistente, vem apresentar a sua RESPOSTA.
iii.O recurso em apreço tem por objeto, definido pelo recorrente, o “despacho que indeferiu que o decidido pelo Supremo Tribunal de Justiça relativamente ao co-arguido BB lhe seja extensível”.
iv.Atento o teor das motivações de recurso conclui-se que, em rigor, o aqui recorrente pretende um tratamento como se tivesse exercido os seus direitos, designadamente, a recorrer.
v.Direito que, na verdade, por opção, não exerceu.
vi.Para o aqui recorrente a decisão transita em julgado, independentemente da pendência de recurso interposto por outros arguidos.
vii.Efetivamente, nos termos da alínea e) do n.º 1 do artigo 403.º do Código de Processo Penal, é admissível a limitação do recurso a cada um dos arguidos em caso de comparticipação.
viii.Em conformidade, a decisão torna-se efetiva em relação aos não recorrentes.
ix.Ressalva-se, contudo, o disposto nas alíneas a) e c) do n.º 2 do artigo 402.º do Código de Processo Penal;
x.Isto é, a circunstância do recurso interposto por algum dos outros co-arguidos aproveitar aos não recorrentes.
xi.Sucede, porém, como resulta claro do entendimento vertido na decisão recorrida, o n.º 2 do artigo 402.º do Código de Processo Penal impõe uma condição para a extensão da decisão do recurso aos restantes arguidos em caso de comparticipação: o recurso não ser fundado em motivos estritamente pessoais;
xii.Condição que no caso vertente não se verifica, como se revelará.
xiii.Coligidos os argumentos apresentados, pelo Digno Magistrado do Ministério Público, o GG, IP aqui recorrido, e pelo assistente EEE em resposta à pretensão aduzida pelo aqui recorrente, o recurso apresentado pelo arguido BB para o Supremo Tribunal de Justiça teve como único pilar a nulidade do acórdão da Relação de Lisboa por excesso de pronúncia – questão inequivocamente formal que delimitou o objeto do recurso e balizou os poderes de cognição do Tribunal;
xiv.E que, de modo algum, afrontou o mérito da acusação ou da pronúncia.
xv.Dizendo tal motivo respeito, apenas, ao arguido BB não poderá o mesmo ser extensível ao aqui recorrente.
xvi.Daqui se extrai que o recurso interposto pelo arguido BB, de acordo com o disposto no n.º 2 do artigo 402.º do Código de Processo Penal não pode aproveitar ao aqui recorrente.
xvii.A decisão recorrida, contrariamente ao invocado, não viola aquele normativo legal.
xviii.Mantendo-se inalterado quanto ao recorrente o decidido pelo Venerando Tribunal da Relação de Lisboa.»
Neste Tribunal da Relação de Lisboa foram os autos ao Ministério Público tendo sido emitido parecer no sentido da concordância com as respostas produzidas na Primeira Instância, reforçando o entendimento de que serão de improceder os recursos, mantendo-se a decisão recorrida.
Cumprido o disposto no art.º 417.º/2 do Código de Processo Penal, não foi apresentada resposta ao parecer.
Proferido despacho liminar e colhidos os vistos, foi realizada audiência e teve lugar a conferência.
Cumpre decidir.
QUESTÃO PRÉVIA
- do reenvio prejudicial -
Requereu o Arguido AA o reenvio prejudicial ao Tribunal de Justiça da União Europeia, para pronúncia sobre as seguintes questões prejudiciais:
«1. Em que medida os Tratados, concretamente o princípio da cooperação leal previsto no artigo 4.°, n.° 3 do Tratado da União (TUE), exigem que os tribunais nacionais investiguem e apreciem a compatibilidade das medidas nacionais de transposição da Diretiva 2006/24/CE com as garantias conferidas pela Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, incluindo o seu artigo 7.°, cujo conteúdo é inspirado no artigo 8.° o da Convenção Europeia dos Direitos Humanos (CEDH)?
2. A invalidade da Directiva 2006/24/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15.03.2006, declarada pelo TJUE no Acórdão Digital Rights Irei and, de 08.04.2006, nomeadamente no que respeita às exigências constantes dos seus artigos 3.° a 6.° implica a invalidade dos artigos 4.°, 6.° e 9.° da lei nacional que a transpôs (cfr. Lei n°. 32/2008, de 17.07) por exceder os limites impostos pelo respeito do princípio da proporcionalidade à luz dos artigos 7.° 8.° e 52.°, n°1 da Carta?
3. Deve o disposto no artigo 5.°, n° 1 alínea a) 2) iii) e alínea c) 2) i) da Diretiva 2006/24/CE, à luz do Direito da União Europeia, tal como interpretado nos Acórdãos Digital Rights Ireland, de 08.04.2014, Tele 2, de 21.12.2016 e La Quadrature du Net, de 06.10.2020, ser interpretado no sentido de que o endereço do protocolo IP atribuído a certa máquina no momento em que aquela se conexiona à rede e durante a sua ligação, envolvendo informação da sua utilização num determinado momento, revelando não apenas o utilizador, como também o posto/local de trabalho de quem o IP está atribuído e o acesso a informação, por via do mesmo, em determinado dia e hora, constitui dado de tráfego (metadado) gerado e tratado no contexto da oferta de serviços de comunicações electrónicas publicamente disponíveis ou de redes públicas de comunicações?
4. Deve o disposto nos artigos 2.°, n° 2 alínea a), 3.° e 5.° da Diretiva 2006/24/CE, à luz do Direito da União Europeia e da referida jurisprudência do TJUE, ser interpretado no sentido de as informações conservadas na aplicação informática denominada CITIUS (www.citius.mj.pt), nomeadamente a identificação de quem acedeu e consultou processos judiciais, a identificação destes, bem como o dia, hora e local em que tal acesso e consulta foi feita, designadamente através do IP usado para o efeito, constituírem dados de tráfego (metadados) gerados e tratados no contexto da oferta de serviços de comunicações electrónicas publicamente disponíveis ou de redes públicas de comunicações?
5. No caso de resposta afirmativa a qualquer uma das duas questões anteriormente formuladas, a conservação dos dados que constam da plataforma CITIUS, feita no âmbito dos artigos 4.°, 6.° e 9.° da lei de transposição (Lei n°. 32/2008, de 17.07), por força do determinado nos artigos 3.° a 6.° da Directiva 2006/24/CE é compatível com o respeito pelo (i) princípio da proporcionalidade, da necessidade e da adequação da restrição que a Directiva 2006/24/CE opera dos direitos ao respeito pela vida privada e familiar, (ii) princípio da protecção de dados pessoais previstos nos artigos 7.° e 8.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e, ainda, (iii) princípios gerais do direito comunitário previstos nos n.° 1 e 2 do artigo 6.° do Tratado da União Europeia?».
A figura do reenvio prejudicial é um mecanismo processual criado para dar exequibilidade ao primado da ordem jurídica comunitária. Através dele pode o juiz nacional ocorrer-se de uma ferramenta que vai produzir uma interpretação do direito comunitário, ao nível da União, supra Estado-membro.
Considerando que o Tribunal de Justiça da União Europeia tem a competência jurisdicional para definir o sentido da interpretação das normas comunitárias, impondo-se às ordens jurídicas nacionais, a possibilidade de auscultar a sua interpretação antes de proferir uma decisão ao nível da jurisdição nacional, assegura uma unidade do direito comunitário que se veria a breve trecho desfeita se cada Juiz navegasse solitariamente.
Assim seria se fosse permitido ao juiz nacional interpretar por si as normas comunitárias, desligado daquilo que, uniformemente, é pretendido na União Europeia. Ou seja, a regra comum intentada pela legislação comunitária poderia ver-se corrompida pela prática judicial de cada Estado-membro.
Como tal, foi firmado um mecanismo, o reenvio prejudicial, passível de ser accionado quando um tribunal nacional, cujas decisões não sejam susceptíveis de recurso jurisdicional interno, se veja confrontado com uma questão de interpretação de uma norma comunitária relevante para a decisão que tem em mãos.
Torna-se evidente que as questões que suscitem a intervenção do Tribunal de Justiça da União Europeia deverão ser, para o Tribunal nacional que tem de proferir a decisão final, relevantes para tal decisão. E apenas se houver dúvidas pertinentes quanto à interpretação da norma comunitária deverá ser suscitada tal intervenção do Tribunal de Justiça, pois apenas então tal consulta se tornará um dever para a jurisdição nacional.
Com o reenvio prejudicial promove-se, assim, uma interpretação uniforme do direito comunitário em toda a União Europeia.
Requereu o Recorrente o reenvio prejudicial no caso que nos ocupa. Fê-lo devidamente, pois apenas o Juiz nacional pode desencadear o procedimento de reenvio prejudicial, estabelecendo assim uma ligação entre as duas jurisdições: a nacional e a europeia. Porém, o Juiz nacional apenas deverá recorrer à pronúncia pelo TJUE se as questões suscitadas forem determinantes, indispensáveis, para a apreciação da questão concreta colocada perante a jurisdição interna.
Logo, se o Tribunal nacional entender que as questões colocadas não serão essenciais para dirimir a questão de direito sobre a qual terá de se pronunciar no caso concreto, não lhe pode ser imposta tal consulta, ainda que o recorrente tenha suscitado entendimento divergente.
O art.º 7.º do Código de Processo Penal consagra o princípio da suficiência da acção penal, segundo o qual esta tem jurisdição autónoma para decidir todas as questões que possam obstaculizar uma decisão penal. No fundo, procurou o legislador salvaguardar a pretensão punitiva do Estado, de forma a não permitir que sejam usados mecanismos que retardem a decisão em processo penal, nomeadamente recorrendo a decisão externas que demorem a ser conhecidas. Como tal, para efeitos de acionamento deste reenvio prejudicial, terá o Tribunal que entender que foi colocado perante uma causa prejudicial, fundamental para a sua apreciação do caso concreto.
Por sua vez, o reenvio prejudicial, implicará a suspensão da instância nacional, o que decorre da previsão do art.º 267.º do Tratado de Funcionamento da União Europeia o qual, com referência ao Tribunal de Justiça da União Europeia, determina: «O Tribunal de Justiça da União Europeia é competente para decidir, a título prejudicial :
a) Sobre a interpretação dos Tratados ;
b) Sobre a validade e a interpretação dos actos adoptados pelas instituições, órgãos ou organismos da União.
Sempre que uma questão desta natureza seja suscitada perante qualquer órgão jurisdicional de um dos Estados-Membros, esse órgão pode, se considerar que uma decisão sobre essa questão é necessária ao julgamento da causa, pedir ao Tribunal que sobre ela se pronuncie.
Sempre que uma questão desta natureza seja suscitada em processo pendente perante um órgão jurisdicional nacional cujas decisões não sejam susceptíveis de recurso judicial previsto no direito interno, esse órgão é obrigado a submeter a questão ao Tribunal.
Se uma questão desta natureza for suscitada em processo pendente perante um órgão jurisdicional nacional relativamente a uma pessoa que se encontre detida, o Tribunal pronunciar-se-á com a maior brevidade possível.»
Este entendimento, pacífico, traduz-se na formulação do Ac. do Tribunal da Relação de Évora de 02.07.2013, do Desembargador Renato Barroso (ECLI:PT:TRE:2013:4.08.5FAEVR.E3.D7), no qual se consignou que « Na verdade, o aludido reenvio prejudicial, apenas pode/deve acontecer, quando um tribunal nacional, se vê confrontado com uma situação de interpretação de uma norma comunitária cuja resolução se torne necessária para o julgamento do caso sub judice, pois só aí se justifica a submissão dessa questão prejudicial ao Tribunal de Justiça.
Acrescente-se, que mesmo no domínio do reenvio obrigatório - ou seja, nos casos em que a decisão do tribunal nacional não é passível de recurso - se vem entendendo que perante norma comunitária cuja interpretação não suscite nenhuma dúvida razoável, por respeitar a um caso em que, embora outras interpretações sejam possíveis, qualquer jurista ainda que pouco informado sempre optaria pela solução do juiz nacional, será caso de dispensa da obrigação de reenvio.»
Este mesmo acórdão explica com clareza a evidência da funcionalidade do mecanismo do reenvio prejudicial. Se solicitado, o Tribunal de Justiça da União Europeia irá produzir uma interpretação abstracta da regra comunitária, pronunciando-se sobre a interpretação ou a validade do direito comunitário aplicável ao caso concreto, e não do direito nacional.
Ou seja, o Tribunal de Justiça da União Europeia não se pronuncia sobre a compatibilidade de uma norma nacional com o direito comunitário, nem sobre a sua interpretação. Fazendo um paralelo com o Tribunal Constitucional percebemos que estas instâncias se afastam no seu escrutínio. Enquanto o Tribunal Constitucional se pronuncia sobre a interpretação, conforme a Constituição ou não, de uma norma aplicada no caso concreto, o Tribunal de Justiça da União Europeia pronuncia-se sobre a aplicabilidade da norma comunitária ao caso concreto, e qual a sua interpretação, nesse âmbito.
Por isso, o Juiz nacional deve rejeitar o pedido de reenvio prejudicial se o caso não implica a aplicação de direito comunitário, mas apenas de direito nacional.
Olhando para o âmbito da consulta pretendida pelo Recorrente, concluímos que são essas as águas por onde navega a formulação sugerida.
No caso concreto, não está a ser aplicada legislação de raiz Europeia, mas tão-só legislação nacional. E a conformidade desta legislação com os princípios fundamentais cabe ao Tribunal Constitucional. A consulta pretendida em sede de reenvio prejudicial não traduz uma questão essencial de aplicação ou interpretação de norma aplicada ao caso concreto.
Consequentemente, indefere-se o pedido de reenvio prejudicial formulado pelo Arguido Recorrente AA.
OBJECTO DO RECURSO
Nos termos do art.º 412.º do Código de Processo Penal, e de acordo com a jurisprudência há muito assente, o âmbito do recurso define-se pelas conclusões que o recorrente extrai da motivação por si apresentada. Não obstante, «É oficioso, pelo tribunal de recurso, o conhecimento dos vícios indicados no artigo 410.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito» [Acórdão de Uniformização de Jurisprudência 7/95, Supremo Tribunal de Justiça, in D.R., I-A, de 28.12.1995]
Desta forma, tendo presentes tais conclusões, são as seguintes as questões a decidir, relativamente a cada um dos recursos.
- do recurso interlocutório –
- os efeitos da decisão do Supremo Tribunal de Justiça, que despronunciou BB, relativamente a crimes pelos quais estava acusado em co-autoria com o Arguido AA, deverão ser extensíveis a este?
- é nulo o despacho recorrido que decidiu que tal decisão de não pronúncia não produz efeitos quanto ao Arguido agora Recorrente?
- do recurso final do Arguido AA –
- o Ministério Público carece de legitimidade para acusar o Arguido pelos crimes de violação do segredo de justiça e crimes de acesso indevido, por falta de queixa?
- a decisão de facto padece de vício de contradição? (vd. tb. 61)
- existe erro na apreciação da prova, tendo sido dado como provados factos para os quais não foi produzida prova?
- com violação do princípio do in dubio pro reo?
- a não realização da perícia constitui nulidade por violação do princípio do contraditório?
- as escutas são nulas, constituindo prova proibida?
- a destruição das escutas não relevantes para o inquérito constitui violação do princípio do contraditório?
- É nula toda a prova recolhida, quer directa, quer indirectamente, com recurso aos metadados recolhidos e guardados?
- o que implica uma diferente decisão quanto aos factos provados?
- os factos provados não permitem a conclusão de que foram praticados crimes de corrupção?
- assim como não permitem a conclusão de que o Arguido praticou o crime de peculato?
- relativamente aos seis crimes de violação do segredo de justiça, nove crimes de acesso indevido, nove crimes de violação do dever de sigilo, e vinte e oito crimes de acesso ilegítimo, apenas poderá o Arguido ser condenado por um único crime, por cada tipo, na forma continuada?
- as penas fixadas pecam por excessivas?
- do recurso final do Arguido CC –
- é nula a decisão que autorizou a realização de escutas e, como tal, nula e proibida toda a prova por estas obtida?
- bem como toda a prova subsequentemente recolhida, porque dela derivada?
- o que importa a revogação do acórdão, por nela se ter baseado?
- mesmo com os factos provados, não resulta que tenha sido entregue contrapartida penalmente relevante que permita preencher o tipo criminal de corrupção;
- o que importaria a sua absolvição?
- ou preenchem os factos o tipo de recebimento indevido de vantagem?
- foi a pena fixada em excesso?

DO ACORDÃO RECORRIDO
Do acórdão recorrido consta a seguinte matéria de facto provada:
«Da pronúncia
1.- O GG, é o organismo do ... responsável, para além do mais, pela gestão dos recursos informáticos, entre eles o programa Citius, estando sediado no Campus da Justiça, em Lisboa (Decreto-Lei n.° 164/2012 de 31 de julho).
2.- O Citius é o programa informático gerido pelo GG através do qual são tramitados, entre outros, os inquéritos criminais e processos judiciais.
3.- O arguido AA é ..., com os n.°s mecanográficos ... (GG) e ... (...), que prestou comissão de serviço no GG com funções de apoio informático aos tribunais designadamente de ... e ..., desde 1 de setembro de 2010 até 6 de março de 2018.
4.- O arguido AA utiliza habitualmente o n.° de telemóvel ..., sendo ainda utilizador do n.° ....
5.- O arguido BB é ..., com o n.° de mecanográfico ..., colocado no Tribunal de ... desde 9 de fevereiro de 2015.
6.- O arguido BB foi ainda ...nas ...2010/2011, 2014/2015 e 2015/2016, e da ... desde a ...2003/2004 até à época 2017/2018, tendo ... até ao ano de 2000.
7.- O arguido BB habitualmente utiliza o n.° de telemóvel ...
8.- O arguido CC era, à data dos factos adiante descritos, trabalhador da ..., por contrato de trabalho, em regime de comissão de serviços, celebrado em 22 de janeiro de 2007 e mantido por contrato de trabalho sem termo celebrado a 20 de novembro de 2009.
9.- O arguido GGG prestava a atividade de assessor da administração, assegurando a assessoria do presidente do conselho de administração para a área jurídica relacionada com o ... profissional e para as relações institucionais da sociedade, reportando diretamente à administração e também ao Presidente.
10.- Habitualmente utiliza o n.° de telemóvel ....
11.- O arguido GGG, na estrutura da..., ocupava posição equiparada a....
12.- Desempenhou a função de ...do conselho de administração da... por deliberação de 31 de outubro de 2008 até, pelo menos, 31 de julho de 2009.
13.- A ..., NIPC ..., é uma ..., com sede na ..., ..., ..., que tem por objeto a participação nas..., a promoção e organização de ... e o fomento, ou desenvolvimento, de atividades relacionadas com a ..., sendo...do conselho de administração, à data dos factos, HHH (Certidão permanente de fls. 1183).
14.- III é ... de ..., amigo comum dos arguidos CC, BB e JJJ e utiliza habitualmente o n.° de telemóvel ....
15.- XX é ... aposentado desde 1 de setembro de 2014, familiar do arguido AA, tendo como última colocação o Tribunal de ....
16.- Em data não apurada, mas pelo menos desde março de 2017, o arguido CC solicitou ao funcionário de justiça e arguido AA que acedesse a processos pendentes e lhe transmitisse informações relativas a esses processos, designadamente inquéritos que corriam no ..., ou outros processos a que conseguisse acesso dispersos por diversos tribunais.
17.- O arguido AA ., recebendo como contrapartida tratamento privilegiado junto do ..., designadamente para assistência a ... em condições favoráveis, aceitou proceder como solicitado.
18.- Tais processos incidiam sobre investigações na área do ..., ou a pessoas relacionadas com este ..., designadamente inquéritos que se encontravam em curso e em segredo de justiça em que era visada, ou denunciante, a ..., ou os seus elementos, e processos relativos a ... e seus ..., ou colaboradores.
19.- Uma vez na posse de tais informações, pretendia o arguido CC, além do mais, antecipar diligências processuais em que seria visada a ... e seus membros, ou obter informações sobre ... ou ainda informações antecipadas de decisões judiciais.
20.- Como recompensa, o arguido AA recebeu do arguido CC ...e ... para assistir gratuitamente a ... de ... no ..., em ..., designadamente no ..., designado por «...», incluindo acesso a lounge com comida e bebida e parqueamento automóvel.
21.- O arguido AA recebeu, ainda, produtos de ..., como camisolas e casacos da equipa de ... e, ainda, promessa de contrato de trabalho no ..., pertencente ao ..., para um sobrinho daquele, assim como tratamento privilegiado no ... designadamente sendo-lhe facilitado o acesso ao contacto com os ... nos espaços que passou a frequentar.
22.- Por forma a melhor esconder os pedidos e recompensas, por vezes, os contactos do arguido AA com o arguido CC eram realizados por intermédio de aplicações informáticas cujas mensagens se eliminam automaticamente.
23.- No exercício das suas funções de apoio informático aos tribunais, o arguido AA tinha acesso a computadores de todos os funcionários e magistrados da área de ... e ....
24.- Assim como era dotado de especiais habilitações em virtude da função de atribuição de credenciais de acesso aos sistemas informáticos do ....
25.- Assim, na execução do plano delineado entre os arguidos CC e AA ., e aproveitando-se das funções que exercia de apoio informático aos tribunais, o arguido AA acedeu às credenciais de acesso ao sistema Citius (username e password) dos seguintes utilizadores:
a. KKK, ...;
b. LLL, ...
c. KK, ... com o utilizador ..., ... com acesso a processos distribuídos na ..., assim como a processos da área ....
26.- Em especial, é à... que estão distribuídos os inquéritos referentes à investigação de crimes de corrupção, incluindo no fenómeno desportivo.
27.- Para melhor esconder o seu rasto informático, para além de utilizar credenciais de terceiros (NNN, OOO e KK) para acesso ao Citius, o arguido AA utilizou computadores instalados quer no Tribunal de ..., quer no Tribunal de ... para realizar os acessos, fazendo login nesses computadores com credenciais do próprio ou de...já aposentado,XX, com o n.° mecanográfico ....
28.- Permitindo-lhe, assim, aceder aos computadores como se de PPP se tratasse, mas sem o conhecimento ou consentimento do mesmo.
Assim:
29.- Após se registar no computador, com credenciais próprias, ou de José ., o arguido AA, sem o conhecimento ou consentimento da magistrada KK, inseriu, nas ocasiões abaixo indicadas, no Citius as credenciais desta magistrada, como se da mesma se tratasse, para aceder aos seguintes processos:
a. 9693/10.0JFLSB
b. 3656/12.8TTLSB-A
c. 2189/13.0TVLSB
d. 6255/15.9TDLSB
e. 143/17.1JGLSB
f. 6784/15.4TDLSB
g. 6785/15.2TDLSB
h. 8/16.4ZCLSB
i. 770/16.4JDLSB
j. 872/16.7JFLSB
k. 2074/16.3T9LSB
l. 15477/16.4T8LSB
m. 181/17.4JGLSB
n. 183/17.0JGLSB
o. 198/17.9JGLSB
p. 2879/17.8T9BRR
q. 5242/17.7T9LSB
r. 5310/17.5T9LSB
s. 5340/17.7T9LSB
t. 5354/17.7T9LSB
u. 7161/17.8T9LSB
v. 7566/17.4T9LSB
w. 7590/17.7T9LSB
x. 7957/17.0T9LSB
y. 8860/17.0T9LSB
z. 98/18.5T9LSB
30. - O arguido AA acedeu ainda, através de credenciais da QQQ, sem o conhecimento ou consentimento desta e como se da mesma se tratasse, ao inquérito n.° 9767/17.6T9PRT, da ....
31. - E ainda, sem o conhecimento ou consentimento da RRR, inseriu no Citius as credenciais desta, como se da mesma se tratasse, para aceder, pelo menos, ao processo n.° 44/15.8T9FAF, para efetuar pesquisas de dados pessoais na base de dados da Segurança Social.
Do inquérito n.° 9693/10.0JFLSB
32. - Neste inquérito investigou-se a eventual prática de crime de corrupção (na atividade desportiva), sendo um dos denunciados a....
33. - Este inquérito esteve em segredo de justiça decretado em 25 de novembro de 2010 e validado a 26 de novembro de 2010, tendo sido arquivado por despacho datado de 23 de setembro de 2016.
34. - O arguido AA, utilizando as credenciais de acesso ..., de KK, ..., acedeu ao sistema Citius e obteve informação da tramitação deste inquérito, nas seguintes datas e horas:

DATA
ACÇÃO
NOME MÁQUINAIP MÁQUINADESCRIÇÃO ACÇÃO
08-06-2017
09:50
BRG3NXHF3J—0410.161.196...43Acesso ao Processo 9693/10.0JFLSB
22-06-2017BRG3NXHF3J—0410.161.196...43Acesso ao Processo 9693/10.0JFLSB
17:39
24-07-2017
07:36
BRG4YMHH3J—0510.161.163...20Acesso ao Processo 9693/10.0JFLSB
24-07-2017
07:40
BRG4YMHH3J—0510.161.163...20Acesso ao Processo 9693/10.0JFLSB

35. - O que fez a partir dos tribunais de ... (IP's iniciados em 10.161.116) e ... (IP's iniciados em 10.161.163).
36. - Obtendo informações constantes do inquérito que depois transmitiu ao arguido CC.
Do processo n.° 3656/12.8TTLSB-A
37. - Esta acção executiva para pagamento de quantia certa - dívidas de salários, diferenças salariais e indemnizações - correu termos no Juízo do Trabalho de Lisboa, sendo exequente SSS e executado ....
38. - O arguido AA, utilizando as credenciais de acesso ..., de KK, acedeu ao sistema Citius e obteve informação da tramitação deste processo, na seguinte data e hora, que depois transmitiu ao arguido CC:

DATA ACÇÃONOME
MÁQUINA
IP
MÁQUINA
DESCRIÇÃO ACÇÃO
31-08-2017
16:04
CITWSP0210.0.140.67Acesso ao processo 3656/12.8TTLSB-A através do Visualizador de Processos.

Do processo n.° 2189/13.0TVLSB
39. - Esta acção de processo comum corre termos no juízo central cível de Lisboa, sendo autor o ... e réu TTT, UUU e a ....
40. - O arguido AA, utilizando as credenciais de acesso ..., de KK, acedeu ao sistema Citius e obteve informação da tramitação deste processo, nas seguintes datas e horas e transmitiu depois a informação recolhida ao arguido CC:

DATA ACÇÃONOME
MÁQUINA
IP
MÁQUINA
DESCRIÇÃO ACÇÃO
11-07-2017
14:52
CITWSP0210.0.140.67Acesso ao processo 2189/13.0TVLSB através do
Visualizador de Processos.
31-08-2017
16:05
CITWSP0210.0.140.67Acesso ao processo 2189/13.0TVLSB através do
Visualizador de Processos.

Do inquérito n.° 6255/15.9TDLSB
41. - Este inquérito teve origem em denúncia apresentada pela …contra desconhecidos, tendo sido posteriormente incorporadas as queixas apresentadas por … e queixa apresentada por .
42. - Os autos estiveram sujeitos a segredo de justiça entre 14 de outubro de 2015 e 14 de março de 2017.
43. - O arguido VVV ., utilizando as credenciais de acesso ..., de KK, acedeu ao sistema Citius e obteve informação da tramitação deste inquérito, nas seguintes datas e horas, a partir do Tribunal de ..., e transmitiu depois a informação recolhida ao arguido CC:

DATA
ACÇÃO
NOME MÁQUINAIP MÁQUINA DESCRIÇÃO ACÇÃO
10-07-2017
11:32
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 6255/15.9TDLSB
10-07-2017
11:36
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 6255/15.9TDLSB
13-07-2017
15:15
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 6255/15.9TDLSB

Do inquérito n.° 143/17.1JGLSB
44. - O inquérito n.° 143/17.1JGLSB iniciou-se com denúncia da ... contra incertos por acesso ao sistema informático do ..., designadamente ao correio eletrónico, com posterior divulgação pública.
45. - Tal inquérito encontrava-se em segredo de justiça desde 20 de junho de 2017.
46. - O arguido AA ., utilizando as credenciais de acesso ..., de KK, acedeu ao sistema Citius e obteve informação da tramitação deste inquérito, nas seguintes datas e horas:


DATA
ACÇÃO
NOME MÁQUINAIP MÁQUINA DESCRIÇÃO ACÇÃO
21-06-2017
16:13
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
26-06-2017
09:34
BRG3NXH
F3J—04
10.161.196.43Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
27-06-2017
15:53
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
27-06-2017
15:56
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
28-06-2017
14:37
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
28-06-2017
14:37
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
28-06-2017
14:42
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
28-06-2017
14:44
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
28-06-2017
14:44
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
29-06-2017
12:01
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
02-07-2017
16:42
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
03-07-2017
15:47
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
04-07-2017
09:45
BRG3NXH
F3J—04
10.161.196.43Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
05-07-2017
11:31
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
06-07-2017
14:54
BRG3NXH
F3J—04
10.161.196.43Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
06-07-2017
16:01
BRG3NXH
F3J—04
10.161.196.43Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
06-07-2017
16:02
BRG3NXH
F3J—04
10.161.196.43Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
07-07-2017
15:09
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
09-07-2017
22:41
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
10-07-2017
11:42
BRG3NXH
F3J—04
10.161.196.43Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
11-07-2017
14:55
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
12-07-2017
17:11
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
13-07-2017
09:30
BRG3NXH
F3J—04
10.161.196.43Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
13-07-2017
14:52
BRG3NXH
F3J—04
10.161.196.43Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
13-07-2017
15:23
BRG3NXH
F3J—04
10.161.196.43Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
14-07-2017
11:55
BRG3NXH
F3J—04
10.161.196.43Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
14-07-2017
4
BRG3NXH
F3J—04
10.161.196.43Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
14:01
14-07-2017
16:49
BRG3NXH
F3J—04
10.161.196.43Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
17-07-2017
09:43
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
18-07-2017
10:02
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
19-07-2017
08:14
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
20-07-2017
13:52
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
21-07-2017
15:06
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
24-07-2017
07:15
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
24-07-2017
15:59
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
24-07-2017
16:03
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
24-07-2017
16:05
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
25-07-2017
10:09
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
25-07-2017
10:09
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
26-07-2017
14:00
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
27-07-2017
07:01
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
27-07-2017
16:47
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
28-07-2017
18:49
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
29-07-2017
16:16
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
31-07-2017
07:43
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
31-07-2017
14:07
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
31-07-2017
23:13
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
01-08-2017
15:03
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
01-08-2017
15:08
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
01-08-2017
15:08
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
02-08-2017
15:27
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
03-08-2017
15:36
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
07-08-2017
09:33
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
07-08-2017
16:00
BRG3NXH
F3J—04
10.161.196.42Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
08-08-2017
09:30
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
08-08-2017
14:01
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
09-08-2017
08:35
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
09-08-2017
11:44
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
09-08-2017
15:37
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
10-08-2017
09:22
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
10-08-2017
09:43
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
10-08-2017
14:19
BRG3NXH
F3J—04
10.161.196.42Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
10-08-2017
14:20
BRG3NXH
F3J—04
10.161.196.42Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
10-08-2017
14:21
BRG3NXH
F3J—04
10.161.196.42Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
10-08-2017
14:24
BRG3NXH
F3J—04
10.161.196.42Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
10-08-2017
14:35
BRG3NXH
F3J—04
10.161.196.42Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
11-08-2017
09:05
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
11-08-2017
15:34
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
11-08-2017
16:55
BRG3NXH
F3J—04
10.161.196.42Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
14-08-2017BRG3NXH
F3J—04
10.161.196.42Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
10:24
14-08-2017
10:26
BRG3NXH
F3J—04
10.161.196.42Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
14-08-2017
10:29
BRG3NXH
F3J—04
10.161.196.42Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
14-08-2017
17:59
BRG3NXH
F3J—04
10.161.196.42Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
14-08-2017
18:01
BRG3NXH
F3J—04
10.161.196.42Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
16-08-2017
09:46
BRG3NXH
F3J—04
10.161.196.42Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
16-08-2017
09:55
BRG3NXH
F3J—04
10.161.196.42Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
16-08-2017
16:34
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F3J—04
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BRGCZC8381L8W0410.161.163.34Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
17-11-2017
17:30
BRGCZC8381L8W0410.161.163.34Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
25-11-2017
10:56
BRGCZC8381L8W0410.161.163.34Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
02-01-2018
14:30
BRGCZC8381L8W0410.161.163.34Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
07-01-2018
11:28
BRGCZC43723670510.161.163.80Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
24-01-2018
20:54
BRGCZC43724WH0510.161.163.60Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
29-01-2018
19:55
BRGCZC43723670510.161.163.80Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
29-01-2018
19:55
BRGCZC43723670510.161.163.80Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
03-03-2018
10:49
BRGCZC8381L8W0410.161.163.34Acesso ao Processo 143/17.1JGLSB
47.- O que fez a partir dos tribunais de ... (IP's iniciados em 10.161.116) e ... (IP's iniciados em 10.161.163).
48.- Obtendo informações constantes do inquérito que depois transmitiu ao arguido CC.
Do inquérito n.° 6785/15.2TDLSB
49.- Este inquérito iniciou-se a 21 de outubro de 2015, na sequência de denúncia da ... após «entrevista concedida por WWW, então ...da ... ao programa ... do canal de televisão ....
50.- Neste inquérito foi determinado o segredo de justiça a 23 de maio de 2016.
51.- O arguido AA, utilizando as credenciais de acesso ..., de KK, passou a controlar a tramitação do inquérito e acedeu ao sistema Citius e obteve informação da tramitação deste inquérito n.° 6785/15.2TPLSB nas seguintes datas e horas:

DATA
ACÇÃO
NOME MÁQUINAIP MÁQUINA DESCRIÇÃO ACÇÃO
14-03-2017
10:30
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
14-03-2017
11:21
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14-03-2017
11:29
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14-03-2017
11:29
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15-03-2017
16:18
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
15-03-2017
16:18
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16-03-2017
13:42
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20-03-2017
08:50
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
20-03-2017
14:50
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20-03-2017
14:51
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
20-03-2017
15:08
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
21-03-2017
10:45
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21-03-2017
18:51
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22-03-2017BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
08:38
22-03-2017
13:02
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22-03-2017
15:45
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23-03-2017
10:28
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23-03-2017
17:14
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24-03-2017
21:24
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24-03-2017
21:25
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
27-03-2017
08:48
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27-03-2017
09:49
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27-03-2017
10:14
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
27-03-2017
10:26
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
27-03-2017
11:21
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
27-03-2017
11:22
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
27-03-2017
11:22
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
27-03-2017
11:34
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
27-03-2017
11:39
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
27-03-2017
11:42
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
27-03-2017
11:42
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
27-03-2017
12:09
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
27-03-2017
12:15
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
27-03-2017
12:25
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
27-03-2017
12:28
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
27-03-2017
12:37
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
27-03-2017
13:45
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
27-03-2017
14:11
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
27-03-2017
14:18
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
27-03-2017
14:38
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
27-03-2017
14:59
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
27-03-2017
15:25
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
27-03-2017
15:50
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
27-03-2017
16:17
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
27-03-2017
19:37
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
28-03-2017
09:19
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
28-03-2017
10:00
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
28-03-2017
10:57
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
28-03-2017
12:08
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
28-03-2017
13:53
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
29-03-2017
18:12
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
31-03-2017
14:58
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
04-04-2017
12:16
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
05-04-2017
13:59
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
12-04-2017
15:30
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
17-04-2017
09:01
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
18-04-2017BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
09:21
28-04-2017
10:14
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
04-05-2017
11:30
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
08-05-2017
11:39
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
16-05-2017
10:28
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
23-05-2017
15:52
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
07-06-2017
13:46
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
09-06-2017
11:20
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
19-06-2017
14:08
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
20-06-2017
14:53
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
21-06-2017
10:34
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
22-06-2017
17:42
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
26-06-2017
09:38
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28-06-2017
14:42
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28-06-2017
14:43
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
04-07-2017
09:48
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06-07-2017
16:46
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11-07-2017
14:59
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12-07-2017
17:14
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
13-07-2017
10:11
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13-07-2017
14:52
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14-07-2017
11:58
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14-07-2017
14:02
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14-07-2017
16:50
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18-07-2017
10:05
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24-07-2017
07:22
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
25-07-2017
10:11
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26-07-2017
14:01
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
27-07-2017
07:02
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
27-07-2017
16:47
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
28-07-2017
18:52
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
29-07-2017
16:15
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
31-07-2017
07:44
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
31-07-2017
14:08
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
31-07-2017
23:14
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
02-08-2017
15:28
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
03-08-2017
15:37
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
07-08-2017
16:01
BRG3NXHF3J—0410.161.196.42Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
08-08-2017
09:31
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
08-08-2017
14:02
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
09-08-2017
08:36
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
09-08-2017
11:45
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
09-08-2017
15:35
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
10-08-2017BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
09:22
10-08-2017
09:32
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
10-08-2017
14:21
BRG3NXHF3J—0410.161.196.42Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
11-08-2017
15:37
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
14-08-2017
10:25
BRG3NXHF3J—0410.161.196.42Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
14-08-2017
18:00
BRG3NXHF3J—0410.161.196.42Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
16-08-2017
09:47
BRG3NXHF3J—0410.161.196.42Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
16-08-2017
16:35
BRG3NXHF3J—0410.161.196.42Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
17-08-2017
10:59
BRG3NXHF3J—0410.161.196.42Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
17-08-2017
15:39
BRG3NXHF3J—0410.161.196.42Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
18-08-2017
11:32
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
18-08-2017
16:21
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
22-08-2017
10:25
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
23-08-2017
15:04
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
24-08-2017
12:33
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
24-08-2017
15:43
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
25-08-2017
11:39
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
25-08-2017
15:42
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
28-08-2017
09:42
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
29-08-2017
18:30
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15:01
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27-09-2017
10:00
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27-09-2017
15:00
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11:04
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29-09-2017
12:23
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02-10-2017
09:39
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03-10-2017
09:22
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03-10-2017
19:01
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
04-10-2017
16:09
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
06-10-2017
10:56
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
09-10-2017
09:19
BRG3NXHF3J—0410.161.196.42Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
09-10-2017
14:06
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
10-10-2017
12:40
BRG3NXHF3J—0410.161.196.42Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
11-10-2017
08:28
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
13-10-2017
09:32
BRG3NXHF3J—0410.161.196.42Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
17-10-2017
09:14
BRG3NXHF3J—0410.161.196.42Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
18-10-2017
15:09
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
10-11-2017
18:13
BRGCZC8381L8W0410.161.163.34Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
17-11-2017
17:30
BRGCZC8381L8W0410.161.163.34Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
17-11-2017
17:32
BRGCZC8381L8W0410.161.163.34Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
25-11-2017
10:59
BRGCZC8381L8W0410.161.163.34Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
24-01-2018
20:52
BRGCZC43724WH0510.161.163.60Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
29-01-2018
19:53
BRGCZC43723670510.161.163.80Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB
03-03-2018
10:51
BRGCZC8381L8W0410.161.163.34Acesso ao Processo 6785/15.2TDLSB

52. - O que fez a partir dos tribunais de ... (IP's iniciados em 10.161.116) e ... [IP's iniciados em 10.161.163).
53. - Obtendo informações constantes do inquérito que depois transmitiu ao arguido CC.
Do inquérito n.° 8/16.4ZCLSB
54. - Neste inquérito investigaram-se eventuais crimes cometidos em departamento do ....
55. - Os autos estiveram sujeitos a segredo de justiça desde 15 de setembro de 2016, prorrogado por 3 meses por despacho de 21 de junho de 2017 e, novamente, prorrogado por despacho de 21 de setembro de 2017.
56. - No âmbito deste inquérito, no dia 2 de novembro de 2016 foi remetido pela investigação, via correio eletrónico, para os endereços... e..., pedido de informação sobre aquisição de ... do ... para dois ..., tendo sido objeto de resposta no dia 3 de novembro de 2016, por parte de XXX, diretor da ... do ....
57. - Em data não apurada, aproveitando-se do apoio de que dispunha por parte do arguido AA, o arguido CC transmitiu o número do processo àquele, para obter informações sobre o mesmo, que pudessem interessar- lhe.
58. - No dia 25 de agosto de 2017, a partir do Tribunal de ..., como solicitado, o arguido AA ., utilizando as credenciais de acesso ..., de KK, acedeu ao sistema Citius e obteve informação da tramitação deste inquérito, transmitindo a informação recolhida ao arguido CC:

DATA ACÇÃO NOME MÁQUINA IP MÁQUINA DESCRIÇÃO ACÇÃO
25-08-2017 15:40 BRG4YMHH3J 05 10.161.163.20 Acesso ao Processo 8/16.4ZCLSB
Do inquérito n.° 872/16.7JFLSB
59.-Neste inquérito investigaram-se factos suscetíveis de configurar crime de corrupção passiva praticado por ....
60.- Este inquérito esteve sujeito a segredo de justiça entre 30 de junho de 2016 e até 12 de janeiro de 2018.
61.- No âmbito desse inquérito e na sequência de informações bancárias que davam conta da existência de créditos em conta titulada pelo ..., foi solicitada informação contabilística.
62.- Assim, a 19 de abril de 2017, cerca das 14:30 horas, foi entregue em mão por inspetor-chefe da Polícia Judiciária ofício ao arguido CC, dirigido a «...
63.- Logo nessa tarde, o arguido CC transmitiu, ao arguido AA, o número do inquérito para este aceder ao mesmo e obter informações, o que este fez iniciando os acessos pelas 17:30 horas do mesmo dia, utilizando as credenciais de acesso ..., de KK, acedeu ao sistema Citius e obteve informação da tramitação deste inquérito, nas seguintes datas e horas:

DATA
ACÇÃO
NOME
MÁQUINA
IP
MÁQUINA
DESCRIÇÃO ACÇÃO
19-04-2017BRG4YMHH3J-10.161.163.20Acesso ao Processo
17:30--05872/16.7JFLSB
20-04-2017BRG4YMHH3J-10.161.163.20Acesso ao Processo
10:09--05872/16.7JFLSB
20-04-2017BRG4YMHH3J-10.161.163.20Acesso ao Processo
11:49--05872/16.7JFLSB
20-04-2017BRG4YMHH3J-10.161.163.20Acesso ao Processo
11:55--05872/16.7JFLSB
20-04-2017
12:09
CITWSP0210.0.140.67Acesso ao processo 872/16.7JFLSB através do Visualizador de Processos.
20-04-2017BRG4YMHH3J-10.161.163.20Acesso ao Processo
12:25--05872/16.7JFLSB
28-04-2017BRG3NXHF3J--10.161.196.43Acesso ao Processo
10:15-04872/16.7JFLSB
04-05-2017
10:53
BRG3NXHF3J--
-04
10.161.196.43Acesso ao Processo
872/16.7JFLSB
04-05-2017
11:05
BRG3NXHF3J--
-04
10.161.196.43Acesso ao Processo
872/16.7JFLSB
08-05-2017
11:38
BRG4YMHH3J-
--05
10.161.163.20Acesso ao Processo
872/16.7JFLSB
16-05-2017BRG4YMHH3J-10.161.163.20Acesso ao Processo
10:13--05872/16.7JFLSB
23-05-2017BRG3NXHF3J--10.161.196.43Acesso ao Processo
15:48-04872/16.7JFLSB
21-06-2017BRG3NXHF3J--10.161.196.43Acesso ao Processo
10:35-04872/16.7JFLSB
64. - O que fez a partir dos tribunais de ... (IP’s iniciados em 10.161.116) e ... (IP's iniciados em 10.161.163).
65. - Obtendo informações constantes do inquérito que depois transmitiu ao arguido CC
Do inquérito n.° 2074/16.3T9LSB
66. - Neste inquérito investiga-se a eventual prática de crime de recebimento indevido de vantagem entregue pela empresa ... a titulares de cargos políticos ou altos cargos públicos, no âmbito do ...».
67. - O inquérito esteve sujeito a segredo de justiça entre 8 de agosto de 2016 e 8 de junho de 2017.
68. - O arguido AA, no âmbito do plano estabelecido, utilizando as credenciais de acesso ..., de KK, acedeu ao sistema Citius e obteve informação da tramitação deste inquérito, nas seguintes datas e horas:

DATA
ACÇÃO
NOME MÁQUINAIP MÁQUINA DESCRIÇÃO ACÇÃO
09-07-2017
22:36
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 2074/16.3T9LSB
09-07-2017
22:38
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 2074/16.3T9LSB
10-07-2017
10:23
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 2074/16.3T9LSB
10-07-2017
10:27
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 2074/16.3T9LSB

69. - O que fez a partir dos tribunais de ... (IP's iniciados em 10.161.116) e ... fIP's iniciados em 10.161.163).
70. - Obtendo informações constantes do inquérito que depois transmitiu ao arguido CC.
Do processo n.° 15477/16.4T8LSB
71. - Esta acção declarativa de condenação sob a forma de processo comum foi intentada por … contra …, jogador profissional de ... do .... e o ....
72. - A pedido do arguido CC, o arguido AA .
consultou o processo no dia 31 de agosto de 2017, transmitindo posteriormente ao arguido CC a informação recolhida, utilizando as credenciais de acesso ao Citius do utilizador ..., de KK:

DATA ACÇÃONOME
MÁQUINA
IP
MÁQUINA
DESCRIÇÃO ACÇÃO
31-08-2017 16:04CITWSP0210.0.140.7Acesso ao processo 15477/16.4T8LSB através do Visualizador de Processos.

Do inquérito n.° 198/17.9JGLSB
73. - Neste inquérito foi denunciante o … e investigaram-se factos suscetíveis de configurar a prática de crime de acesso ilegítimo através do qual desconhecidos acederam a computador daquela instituição e colocaram no ecrã inicial pastas relacionadas com as «claques do ...».
74. - O inquérito não esteve sujeito a segredo de justiça.
75. - Por se inserir na estratégia delineada e poder conter informações relevantes para o S. L. ..., o arguido AAefetuou as seguintes pesquisas a partir do Tribunal de ..., utilizando as credenciais de acesso ao Citius do utilizador ..., de KK.

DATA
ACÇÃO
NOME MÁQUINAIP MÁQUINA DESCRIÇÃO ACÇÃO
09-06-2017
11:27
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 198/17.9JGLSB
09-06-2017
11:30
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 198/17.9JGLSB
12-06-2017
09:29
BRG3NXHF3J—0410.161.196.43Acesso ao Processo 198/17.9JGLSB

76. - Transmitindo as informações recebidas ao arguido CC.
Do processo n.° 2879/17.8T9BRR
77. - Este processo administrativo serviu de acompanhamento à acção especial de simples apreciação de reconhecimento da existência de contrato de trabalho que correu termos no Juízo do Trabalho do Barreiro, com o n.° 2558/17.5T8BRR, sendo autor o Ministério Público, em representação de trabalhadora, e réu o ....
78. - Por se inserir na estratégia delineada e poder conter informações relevantes para o S. L. ..., o arguido AAefetuou a seguinte pesquisa, utilizando as credenciais de acesso ao Citius do utilizador ..., de KK:

DATA ACÇÃONOME
MÁQUINA
IP MÁQUINADESCRIÇÃO ACÇÃO
16-08-2017
09:50
CITWSP0
1
10.0.140.66Acesso ao processo 2879/17.8T9BRR através do Visualizador de Processos.

79. - Obtendo informações que depois transmitiu ao Arguido CC.
Do inquérito n.° 5242/17.7T9LSB
80. - Este inquérito teve origem em certidão extraída de outro inquérito e iniciou-se a 5 de junho de 2017, investigando-se a prática de crime de corrupção ativa em competição desportiva, p. e p. pelo art.° 9.°, n.° 1, da Lei n.° 50/2007, de 31/08, no âmbito de manipulação de ... de ....
81. - Este inquérito não esteve sujeito a segredo de justiça.
82. - Por se inserir na estratégia delineada e poder conter informações relevantes para o S. L. ..., por se tratar de matéria desportiva, o arguido AAefetuou a seguinte pesquisa a partir do Tribunal de ..., utilizando as credenciais de acesso ao sistema Citius do utilizador ..., de KK:
DATA ACÇÃO NOME MAQUINA IP MAQUINA DESCRIÇÃO ACÇÃO
08-06-2017 09:54 BRG3NXHF3J 04 10.161.196.43 Acesso ao Processo 5242/17.7T9LSB
83. - Informações que obteve e depois transmitiu ao arguido CC.
Do inquérito n.° 5340/17.7T9LSB
84. - O Inquérito n.° 5340/17.7T9LSB iniciou-se a 8 de junho de 2017, na sequência de denúncia anónima em que era visada a por eventual «esquema de corrupção na arbitragem para beneficiar o ...».
85. - O inquérito encontra-se sujeito a segredo de justiça desde 12 de junho de 2017.
86. - O arguido AA ., utilizando as credenciais que não lhe pertenciam «...», credenciais de KK, iniciou um controlo da tramitação do processo e, para isso, acedeu ao sistema Citius e ao Inquérito n.° 5340/17.7T9LSB, pelo menos, nas seguintes datas e horas:










87. - O que fez a partir dos tribunais de ... (IP's iniciados em 10.161.116) e ... (IP's iniciados em 10.161.163).
88. - Obtendo informações constantes do inquérito que depois transmitiu ao arguido CC.
89. - No dia 15 de junho de 2017, pelas 10:37 horas, como atrás referido, o arguido AAacedeu e extraiu do Citius histórico do inquérito n.° 5340/17.7T9LSB.
90. -Tal histórico continha, designadamente, o número do processo, data de autuação, magistrada titular e oficial de justiça encarregue do cumprimento, identificação dos denunciados (YYY, ZZZ e ...), conclusão e remessa dos autos à Unidade Central de Lisboa- Juízo de Instrução Criminal, conclusão ao juiz ..., devolução dos autos ao ..., conclusão à magistrada titular, informação da remessa dos autos ao OPC para investigação e respetivo prazo, classificação do processo como confidencial, fenómeno criminoso indiciado (corrupção na atividade desportiva) e origem da denúncia (...).
91. - Em data e por meio não concretamente apurados, mas entre 15 de junho de 2017 e 19 de outubro de 2017, o arguido AAentregou ao arguido CC a impressão do histórico atrás referida.
92. - No dia 19 de outubro de 2017, o arguido CC tinha no seu gabinete, sito no ...do ..., ..., impressão do histórico do processo n.° 5340/17.7T9LSB, atrás referida.
Do inquérito n.° 7161/17.8T9LSB
93. - O Inquérito n.° 7161/17.8T9LSB foi incorporado no Inquérito n.° 143/17.1JGLSB a 14 de agosto de 2017 (atrás referido).
94. - Tal inquérito (7161/17) foi iniciado a 11 de agosto de 2017, após denúncia da ... contra AAAA e..., por divulgação de correspondência eletrónica de elementos da ...
95. - Sabendo da queixa apresentada pela ... o arguido CC transmitiu tal informação ao arguido AA
. para, como delineado, obter informações do inquérito.
96. - O arguido AA ., utilizando as credenciais de acesso ..., de KK, acedeu ao sistema Citius e obteve informação da tramitação deste inquérito, desde o seu início, nas seguintes datas:

DATA
ACÇÃO
NOME MÁQUINAIP MÁQUINA DESCRIÇÃO ACÇÃO
11-08-2017
17:03
BRG3NXHF3J—0410.161.196.42 Acesso ao Processo 7161/17.8T9LSB
14-08-2017
10:26
BRG3NXHF3J—0410.161.196.42Acesso ao Processo 7161/17.8T9LSB
30-08-2017
14:36
BRG4YMHH3J—0510.161.163.20Acesso ao Processo 7161/17.8T9LSB
01-09-2017
14:28
BRG3NXHF3J—0410.161.196.46Acesso ao Processo 7161/17.8T9LSB

97. - O que fez a partir dos tribunais de ... (IP's iniciados em 10.161.116) e ... (IP's iniciados em 10.161.163).
98. - Obtendo informações constantes do inquérito que depois transmitiu ao arguido CC.
Do inquérito n.° 8860/17.0T9LSB
99. - Este inquérito surge com denúncia anónima contra «BBBB, ...». estando em segredo de justiça desde 31 de janeiro de 2018.
100. - O arguido AA ., utilizando as credenciais de acesso ..., acedeu ao sistema Citius e obteve informação da tramitação deste inquérito, a partir do Tribunal de ..., nos dias.

DATA
ACÇÃO
NOME MÁQUINAIP MÁQUINA DESCRIÇÃO ACÇÃO
02-01-2018
14:44
BRGCZC8381L8W0410.161.163.34Acesso ao Processo 8860/17.0T9LSB
07-01-2018
11:23
BRGCZC43723670510.161.163.80Acesso ao Processo 8860/17.0T9LSB

101. - Obtendo informações constantes do inquérito que depois transmitiu ao arguido CC.
Do inquérito n.° 98/18.5T9LSB
102. - Este inquérito iniciou-se a 9 de janeiro de 2018 e neste investigou-se a «suspeita de que a disponibilização recebimento pelo...de ... para o ... entre ... e ... foi a contrapartida por algum tipo de influência na ... detidos pela ..., designadamente CCCC.
103. - Este inquérito esteve sujeito a segredo de justiça por despacho do Ministério Público de 9 de janeiro de 2018 e da Mma. JIC de 11 de janeiro de 2018 e foi arquivado por despacho de 1 de dezembro de 2018.
104. - No dia 26 de fevereiro de 2018, cerca das 20:28 horas, o arguido CC solicitou ao arguido AAa obtenção de informações relativamente a tal inquérito indicando «Processo 98/18.5T9LSB IMI de um prédio de CCCC»
105. - O que o arguido AAacedeu e pesquisou no dia 3 de março de 2018, pelas 10:40 horas, a partir do Tribunal de ..., utilizando as credenciais de acesso ..., de KK:

DATA
ACÇÃO
NOME MÁQUINAIP MÁQUINA DESCRIÇÃO ACÇÃO
03-03-2018
10:40
BRGCZC8381L8W0410.161.163.34 Acesso ao Processo
98/18.5T9LSB

106. - Transmitindo a informação obtida ao arguido CC.
Outros acessos
107. - Para rastrear os inquéritos de forma a saber quais os que continham informações pretendidas pelo arguido CC, e dessa forma obter o respetivo NUIPC e demais elementos, o arguido AA consultou vários inquéritos, distribuídos na … secção do DIAP de Lisboa, entre eles alguns sem relação com a área do ..., utilizando as credenciais de acesso ..., pertencentes à Procuradora da República KK.
108. - O que sucedeu, designadamente, nos seguintes inquéritos e datas: Inquérito n.° 181/17.4JGLSB

Outros pedidos e acessos:
109. - No dia 13 de novembro de 2017, pelas 12:33 horas, o arguido AA ., via WhatsApp, intitulando-se de «…», através do n.° ... perguntou ao arguido CC se já tinha visto a informação que lhe tinha enviado, tendo o arguido CC referido «interessante. Depois de estudar bem Cheguei à conclusão que falta algo depois falamos».
110. - O Inquérito n.° 9531/17.2T9LSB correu termos no DIAP de Lisboa tendo-se iniciado por denúncia de DDDD contra EEEE, ..., por declarações deste, relativas a ocorrência no ...... - ..., de 22 de outubro de 2017.
111. - No dia 5 de janeiro de 2018, a titular do inquérito determinou a constituição como arguido deEEEE, por despacho notificado a 8 de janeiro de 2018 e recebido a 9 de janeiro de 2018.
112. - Pelo menos no dia 15 de janeiro de 2018, o arguido AAguardava informação referente ao Inquérito n.° 9531/17.2T9LSB no seu computador.
113. - No dia 21 de fevereiro de 2018, pelas 12:51 horas, via WhatsApp, programando as mensagens para se eliminam automaticamente, o arguido CC solicitou a pesquisa do Processo n.° 997/18.4T9LSB ao arguido AA
114. - O Inquérito n.° 997/18.4T9LSB iniciou-se a 2 de fevereiro de 2018, por denúncia apresentada por ... contra …, ...,..., na sequência de declarações efetuadas por … em programa da ....
115. - No dia 21 de fevereiro de 2018, pelas 15:33 horas, GGGG, após receber notificação para constituição de arguido no Processo n.° 9767/17.6T9PRT, remeteu, via WhatsApp, mensagem ao arguido CC a solicitar ajuda, mensagem por este lida pelas 15:55 horas desse dia.
116. - No dia 1 de março de 2018, pelas 12:43 horas, via WhatsApp, o arguido CC solicitou a pesquisa do Processo n.° 9767/17.6T9PRT ao arguido AA ., com indicação «...».
117. - No dia 3 de março de 2018, pelas 11:11 horas (Sábado), o arguido AA ., introduzindo no sistema Citius as credenciais da QQQ, sem que esta o tivesse autorizado a tal, acedeu ao referido Inquérito n.° 9767/17.
118. - O arguido AAobteve a informação, através dessa consulta, que tinha sido expedida carta precatória para o ..., a qual teve o n.° 703/18.3T9AMD, assim como a informação de que HHHHhavia sido notificado para interrogatório, no IIII, no dia 7 de março de 2018.
119. - Tal inquérito não esteve sujeito a segredo de justiça e iniciou-se por queixa entrada a 28 de julho de 2017, apresentada por JJJJ, ... contra HHHH, autor, entre outras, da página do Facebook «GGGG e ...» por afirmações por este efetuadas na referida página.
120. - Em data não apurada, mas entre 8 de junho de 2016 e 6 de março de 2018, o arguido CC solicitou e obteve, de pessoa não identificada, cópia por impressão do Citius, da acusação e da sentença referentes ao processo n° 6/15.5PASXL, sendo arguido nesse processo KKKK, trabalhador do ... e antigo..., pessoa em relação à qual também pediu informações constantes da base de dados da Segurança Social.
Dos .../...e produtos:-
121. - O arguido CC integrava a estrutura do como assessor do conselho de administração, sendo considerado internamente como «diretor de primeira linha», responsável pelo departamento jurídico para as questões do ..., reportando diretamente ao conselho de administração.
122. - Foi ainda ...do conselho de administração no período atrás identificado.
123. - Os diretores de «primeira linha» do ... estão tacitamente autorizados a pedir produtos do ...que se destinem a ser entregues em benefício da ..., sem que seja necessária qualquer autorização do presidente.
124. - Os diretores pedem diretamente ao armazém do ... os produtos que pretendem, que são depois faturados à...
125. - Para a obtenção de .../...para assistência a ..., os diretores podem pedir ..., para fins institucionais de interesse do ...
126. - Não é necessária justificação verbal, ou escrita, quer para cedência de ..., quer para a cedência de produtos aos diretores.
127. - Não existem regras instituídas na ..., quer quanto aos procedimentos a adotar, quer quanto a eventual controlo de produtos e ...cedidos aos diretores ou por estes pedidos para entrega a terceiros.
128. - Não é registado o destinatário final dos ...e produtos, quem vai usufruir deles, apenas se registando a que diretor, ou departamento são entregues.
129. - Só há regras definidas quanto à cedência de ...para os ... da ....
130. - O ...para...a ... de ... normalmente não inclui parque de estacionamento.
131. - A... permite o acesso exclusivo a um lounge onde são servidas refeições quentes e bebidas.
132. - O ... do ... tem cadeiras estofadas, melhor visibilidade e é menos massificado, sendo o piso globalmente mais caro e foi designado, pela ..., como ....
133. - O preço de cada bilhete (sem parque) para ... de ... profissional no ... do ...varia entre € 30,00 e € 60,00.
134. - O preço da... é de € 30,00 por....
135. - O parque de estacionamento não é vendido ..., mas apenas à ..., e tem o valor anual de € 550,00.
136. - O arguido CC entregou ao arguido LLLL, pelo menos, um blusão em algodão, estilo vintage tamanho S, da marca ..., no valor aproximado de, pelo menos, € 59,99.
137. - Em várias ocasiões em que o ...... em …, no ..., ..., nas últimas … da ...2016/2017 e em vários ... da ... 2017/2018 (até 6 de março de 2018), o arguido CC disponibilizou ao arguido AA, pelo menos 4 (quatro) ..., com parque incluído e lounge para os ... em casa, no ..., o mesmo sucedendo, por vezes, nos ..., designadamente quando se realizaram em zona mais próxima da morada do arguido AA.
138. - No caso dos ... do ..., o arguido CC entregou ao arguido AA ...pertencentes ao ..., disponibilizados a este pelos ....
139. - Os bens disponibilizados pertenciam ao ... ...e foram depois faturados à arguida ..., ou pertenciam à própria ..., conforme se tratasse de produtos de ..., ou ...(incluindo parque de estacionamento e lounge de refeições e bebidas).
140. - Assim ocorreu, entre outros, nos seguintes ..., nos quais o arguido AArecebeu pelo menos 4 (quatro) ... por ... para assistir aos mesmos:
a. - ... ... contra ...da ... 2016/2017, para a ..., realizado a 29 de abril de 2017;
b. - ... ... contra ...) da ... 2016/2017, para a ..., realizado a 13 de maio de 2017;
c. - ... ...e o ..., para a ..., realizado a 19 de agosto de 2017;
d.- ... ... contra ..., realizado a 12 de setembro de 2017, para a ...;
e.- ... Aves contra ..., de 22 de outubro de 2017, para a ...;
f.- ... ... contra ..., realizado a 9 de dezembro de 2017, da ...;
g.- ... ... contra ... de 13 de dezembro de 2017 (Quarta-feira), para a ... - tendo os ... sido entregues através de PP;
h.- ... ... contra ..., de 20 de dezembro de 2017 (Quarta- feira), para a ...);
i.- ... ... contra..., realizado dia 3 de janeiro de 2018, para a ...;
j.- ... ... contra ... de 7 de janeiro de 2018 para a ...;
k.- ... ...contra ... a 13 de janeiro de 2018 para a ... tendo os ... sido entregues pelo próprio CC na casa de ...M;
l.- ... ... contra ..., de 20 de janeiro de 2018, para a ...;
m.- ... ... contra ..., para a ..., realizado a 24 de fevereiro de 2018;
n.- ... ... contra ..., para a ..., realizado a 3 de março de 2018.
141. - Ao ... ... contra ...) de 13 de maio de 2017, com os ... entregues pelo arguido CC, o arguido AA levou consigo os seus dois filhos, assim como o seu amigo NNNN (utilizador do n.° de telemóvel ...) e o filho deste, OOOO.
142. - O arguido AA e o filho mais novo ficaram no ..., com ... de acesso ao lounge e parque de estacionamento, enquanto NNNN, OOOO e PPPP, filho mais velho do arguido AA ., assistiram no ....
143. - No ... realizado no dia 19 de agosto de 2017, entre o ... e o ... de ... os Belenenses, para a ..., o arguido CC entregou 5 ... ao arguido AA.
144. - Para tal, no dia 17 de agosto de 2017, o arguido CC solicitou a QQQQ,... do ..., cinco ... para o ... do ..., com parque incluído.
145. - Após, no dia seguinte, o arguido CC deu indicações a RR, também ...do ..., para levantar os ... e os deixar na ..., em nome de RRRR «...».
146. - Ainda no dia 18 de agosto de 2017, o arguido CC, em conversa com o arguido BB, solicitou informações sobre um acórdão do... relativo a classificações de ..., assim como o seu envio no dia seguinte por intermédio do arguido AA, sendo que, todavia, nesse mesmo dia, o arguido CC obteve ele próprio o referido acórdão, por o mesmo ter sido publicado no site daquela instituição.
147. - No dia 19 de agosto de 2017, o arguido AA foi assistir ao ... entre o ... e o ..., com os ... cedidos pelo arguido CC.
148. - No dia 28 de agosto de 2017, pelas 11:33 horas, o arguido BB informou o arguido CC que o arguido AA, que se encontrava ao seu lado «manda dizer que não há novidades processuais».
149. - Nesse dia, o arguido AAjá havia consultado os inquéritos com os n.°s 5340/40.7T9LSB pelas 09:41 horas, 143/17.1JGLSB e 6785/15.2TDLSB para obter informações da tramitação dos inquéritos para transmitir ao arguido CC.
150. - Ao ... ... contra ..., realizado a 12 de setembro de 2017, o arguido AA entregou dois dos ...que havia recebido ao seu amigo SSSS (utilizador do n.° de telemóvel ...) e ao filho deste.
151. - Para o ... ...contra ..., de 22 de outubro de 2017, o arguido CC entregou ao arguido AA ., ...para este assistir ao ..., tendo por seu turno o arguido AA entregue dois dos ... ao seu amigo SSSS e ao filho deste;
152. - Para o ......contra ..., de 13 de dezembro de 2017, para a ..., os ... foram entregues através de PP, tendo ainda assistido ao ..., com um dos ...oferecidos ao arguido AA, o seu amigo SSSS.
153. - Para o ... ... contra Portimonense, de 20 de dezembro de 2017, os ...incluíam parque e pulseiras LL e foram solicitados pelo arguido CC a QQQQ, no dia 18 de dezembro de 2017, pelas 11:56 horas, o que aquela ... diligenciou junto da ..., TTTT, que por sua vez os entregou a RR,... do arguido CC.
154. - Nesse ... ... contra ..., de 20 de dezembro de 2017, o arguido AA encontrou-se com PP e com o arguido CC tendo este entregue ao arguido AA uma «prendinha», designadamente o casaco do ... supra mencionado.
155. - Para o ... ... contra ..., realizado a 13 de janeiro de 2018, para a ..., os ... foram entregues pelo próprio arguido CC na casa do arguido AA tendo assistido ao..., também com os ... entregues pelo arguido CC, o sobrinho do primeiro, UUUU.
156. - No ... ... contra ..., realizado a 20 de janeiro de 2018, o arguido CC entregou ao arguido AA cinco ....
157. - No decurso deste... os arguidos AA e CC conversaram, ainda, sobre a eventual contratação do sobrinho do arguido AA, UUUU licenciado em ..., para o ..., do ....
158. - A esse ... foi também o próprio UUUU, levando consigo um curriculum querendo o arguido CC falar diretamente com ele, o que foi intermediado por PP.
159. - Já em data anterior o arguido CC comunicou que tinha entregue os dados de UUUU no ....
160. - Ao ..., utilizando os ... cedidos pelo arguido CC, assistiram os referidos arguido AAe UUUU e ainda a irmã do primeiro, VVVV, convidada pelo próprio arguido CC por a considerar «castiça», o arguido BB e PP, assim como WWWW (filho do arguido AA) e XXXX, filho de YYYY, amigo do arguido ZZZZ .), todos nos lugares ..., ....
161. - Nesse dia e durante o..., os arguidos AAe CC, junto da ..., mantiveram uma conversa e combinaram encontrar-se novamente no final do ....
162. - Pelas 20:27 horas, na ..., o arguido CC, o arguido AA, VVVV e UUUU conversaram sobre a contratação deste último e pelas 20:49 horas dirigiram-se ao parque de estacionamento, tendo o arguido AA, VVVVe UUUU saído do ….
163. - Pelas 21:04 horas, no ..., o arguido CC encontrou-se com PP e o arguido BB, tendo entregue a estes camisolas do ....
164. - Para o ... ... - ... para a ... realizado a 24 de fevereiro de 2018, o arguido CC entregou ao arguido AA, quatro ..., informação que transmitiu a PP, no dia 20 de fevereiro de 2018, pelas 22:51 horas, solicitando-lhe que, no encontro que iria ter com o arguido AA, este trouxesse «resposta».
165. - No dia 3 de março de 2018, o arguido AA assistiu, juntamente com o arguido BB e PP, com ...oferecidos pelo arguido CC, ao ... S. L. ... - ..., para a ....
166. - Após esse ... o arguido CC permitiu ao arguido AAo acesso a..., junto aos ... dos ... da ..., onde este pôde contactar diretamente com ....
167. - O que o arguido AAfez, tirando fotografias com ..., AAAAA, BBBBB, CCCCC, DDDDD e EEEEE, que depois publicou no seu perfil de Facebook.
168. - No dia seguinte, 4 de março de 2018, pelas 00:33 horas, o arguido CC pediu a PP para o arguido AA«resguardar se e não exibir muitas fotos e camisolas do ... (...] Senão podem desconfiar......
169. - Logo de seguida, na madrugada de 4 de março de 2018, pelas 00:35 horas, PP diz ao arguido AA que não deveria «postar as fotos no face amigo», «para as pessoas não ficarem com ideias», «é melhor prevenir».
170. - E pelas 11:00 horas AAFF diz ao arguido AA«só disse isso, para evitar desconfianças... Entendes?».
171. - No dia 4 de agosto de 2017, pelas 10:24 horas, o arguido BB informou o arguido CC que tinham sido publicadas as listas de ... e que tinham saído 3 do ... e «mandaram para cima» GGGGG, assim como que tinha saído da lista HHHHH, que iria trabalhar para o ....
172. - Sabendo assim da ida de DD para o ..., o arguido CC afirma «vou já foder... por cá fora», pretendendo revelar publicamente a informação antecipada pelo arguido BB.
173. - Ao que o arguido BB responde para ter calma «eu estou atento .... E não me esqueço».
174. - No dia 18 de agosto de 2017, pelas 12:17 horas, o arguido BB informa o arguido CC que tinha boas notícias mas que não podiam ser já reveladas: «o mandatário do JF foi notificado da procedência do recurso... depois envio - te o acórdão», reportando-se a classificações ....
175. - Ainda nesse dia, o arguido CC pede ao arguido BB para enviar o acórdão através do arguido AA, embora, como já supra referido, tenho acabado por aceder ele próprio a esse acórdão através do site onde estava publicado.
176. - No dia 28 de agosto de 2017, pelas 11:33 horas, o arguido BB enviou mensagem ao arguido CC solicitando ajuda para «falar com alguém dos bancos hoje» para auxílio no desbloqueio de empréstimo no... relacionado com conta caucionada da esposa.
177. - Para o ... do dia 20 de janeiro de 2018, o arguido CC entregou pelo menos 3 ...ao arguido BB para assistir ao ... de ..., tendo o arguido BB convidado, por sua vez, IIIII, antigo ..., e o filho deste, pois queria que KKKKK «falasse com um amigo» durante o ....
178. - O arguido CC entregou, ainda, ao arguido BB, pelo menos:
a.- Um ...para o ... … - …, para o ..., que decorreu no dia 29 de abril de 2017, oferecido pelo ...no valor aproximado de € 40,00 a € 60,00.
b.- Dois ... para o... ...- ..., para o ..., que decorreu no dia 13 de maio de 2017, oferecidos pelo ... no valor aproximado de € 75,00 a € 90,00;
c.- Quatro ...para o ..., com estacionamento, para o... ... - ..., realizado no dia 5 de abril de 2017, para a ..., os quais foram solicitados por correio eletrónico de 5 de abril de 2017, pelas 10:12 horas, para a ... QQQQ, com conhecimento ao...do ..., EEEE, o qual tomou conhecimento do pedido pelas 11:27 horas;
d.- ...com estacionamento (para o veículo com matrícula ..-IR-..) para o arguido BB, pessoa considerada «importante», para o ... da ..., ...- ... realizado a 3 de fevereiro de 2018;
e.- ... ... contra ..., de 20 de janeiro de 2018, onde esteve também o arguido AAe atrás referido;
f.- ... ... contra..., de 3 de março de 2018, onde esteve também o arguido AAe atrás referido. Dos acessos à base de dados da Segurança Social:
179. - Em data não determinada, mas entre 1 de novembro de 2017 e 6 de março de 2018, o arguido CC solicitou, a pessoa não identificada, a pesquisa nas bases de dados da Segurança Social de elementos referentes a dois ...do ...e das ....
180. - Assim, nesse período, o arguido CC recebeu os resultados das pesquisas efetuadas na base de dados da Segurança Social, incluindo o nome completo, números de identificação de contribuinte e da segurança social, data de nascimento, morada, entidades patronais, data de início de funções, última remuneração ou valor da pensão, referentes a KKKK, ..., LLLLL e da entidade patronal deste, a ...
181. - Foi através do arguido BB, como atrás referido, que o arguido CC obteve a informação que DDhavia ingressado no ... deixando a ..., como atrás descrito.
182. - Quanto a DD, o arguido CC obteve igualmente impressões de processo no qual foi interveniente, como atrás descrito, informações (pesquisas na base de dados e cópias de despachos) que o arguido CC compilou e guardou numa pasta no seu gabinete no ...
183. - No dia 5 de dezembro de 2017, a pedido do arguido CC, o arguido AAobteve dados inscritos na base de dados da Segurança Social relativos a pessoas com ligações à ....
184. - Para melhor esconder a origem das pesquisas, no dia 5 de dezembro de 2017, pelas 10:22 horas, o arguido AA acedeu ao sistema Citius com as credenciais da funcionária do Tribunal de ..., ...MM e entrou no processo com o n.° 44/15.8T9FAF que ali corria termos e efetuou pesquisas referentes a:
a.- NNNNN
b.- EEE;
c.- II
d.- OOOOO;
e.- HH
f.- PPPPP
g.- JJ
h.- QQQQQ; e
i.- RRRRR.
185. - Assim obtendo informações pessoais daqueles, como o nome completo, números de identificação de contribuinte e da segurança social, data de nascimento, morada, entidades patronais, data de início de funções, última remuneração ou valor da pensão.
186. - NNNNN foi ... durante cerca de 24 anos, pertencendo à ..., tendo surgido como interveniente no processo denominado «...» pela existência de uma escuta que o relacionava com o ... e colaborando atualmente num grupo fechado no Facebook («polvo inteligente») comentando arbitragens.
187. - EEE foi ... até ao ano de 2005 e desde 15 de agosto de 2017 é analista de arbitragem no ..., em vários programas.
188. - II foi ... até 2016, altura em que iniciou funções como ..., trabalhando diretamente com os atuais ..., quer no auxílio ao ..., quer na análise interna das ...
189. - OOOOO foi ... até 1993, membro do ... entre 1994 e 1997, presidente do ... entre, aproximadamente, 1998 a 2011, retomando estas funções de presidente em novembro de 2016, tendo sido arguido no processo denominado «...».
190. - No programa «...» da ..., de 20 de novembro de 2017, surge como pessoa com ligações ao ....
191. - HH foi ... entre, aproximadamente, 1981 e 1994 pertencendo à ..., observador de ... até 2012 e presidente do ...até 4 de outubro de 2016.
192. - No programa «...» da..., de 20 de novembro de 2017, surge como pessoa com ligações ao ...
193. - PPPPP foi ... entre, aproximadamente, 1984 e 2008, tendo sido interveniente no denominado processo «...», primeiro como arguido e, no julgamento, como testemunha e escreve num grupo do Facebook ...».
194. - No programa «...» da ..., de 20 de novembro de 2017, surge como pessoa com ligações ao ...
195. - JJ foi... entre aproximadamente 1990 e 2001, após foi ...e entre 2005 e 2009, vice-presidente da ...) e desde 2011 é presidente do ..., tendo sido testemunha no processo conhecido por «...».
196. - QQQQQ foi ...aproximadamente entre 1997 e 2013 e após ..., tendo sido interveniente no processo conhecido por «...», primeiro como arguido e, no julgamento, como testemunha.
197. - Na época 2017/2018 observou o ... dos ...entre o ...e o ..., disputado dia 13 de dezembro de 2017, com o resultado de 3-2 (vitória do ...).
198. - RRRRR foi presidente do ... aproximadamente entre 2003 e 2011 e, desde dezembro de 2011, é vogal da ..., que inclui o ..., assim como as ....
199. - Sensivelmente em abril de 2017, YYY, pessoa afeta ao ..., fez referência à nomeação de um ... efetuada por SSSSS, num programa de ... no canal...
Dos computadores do ... (MJ):
200. - Desde data não determinada, mas pelo menos no dia 6 de março de 2018, o arguido AAtinha na sua posse, guardados na sua residência:
a. Um computador portátil da marca Dell, com bateria e n.° de série DSZJ5Q1, pertencente à ..., sem valor patrimonial;
b. Um computador portátil da marca Dell, sem bateria e sem disco rígido com n.° de série 2HR623J, pertencente à ..., sem valor patrimonial;
c. Um computador portátil da marca Dell, com bateria, sem disco rígido e n.° de série 4KQ623J, pertencente à ..., sem valor patrimonial;
d. Um computador portátil da marca Dell, com bateria, sem disco rígido e n.° de série F2HYG3J, pertencente à ..., sem valor patrimonial;
e. Um computador portátil da marca Dell, sem bateria e sem disco rígido e n.° de série DW2623J, pertencente à ..., sem valor patrimonial;
f. Um computador desktop da marca Dell, funcional e em utilização, n.° de série 23YZB3J, pertencente à ..., sem valor patrimonial;
g. Um computador da marca Dell, com a referência DPN:CFGY2A00, pertencente à ..., sem valor patrimonial;
h. Uma impressora da marca Samsung, modelo Pro Xpress M 3870FW, com o n.° de série ZDG8BJFF8000018W pertencente à ... e com o valor de € 77,16;
i. Um monitor da marca HP, funcional e em utilização, com o n.° de série 3CQ3440J1N pertencente à ..., sem valor patrimonial;
j. Um monitor da marca HP funcional e em utilização, com o n.° de série 3CQ3440GJL pertencente à ..., sem valor patrimonial;
k. Um teclado da marca HP funcional e em utilização, com o n.° de série BDB SEOARZ7G65U, pertencente à ..., sem valor patrimonial;
l. Um computador HP PRO desk 600 G1 Base Model Tower PC, pertencente ao GG, cujo valor concreto não foi possível apurar.
201.- Todos estes equipamentos e acessórios informáticos pertencem ao ..., através da ... e GG, não podendo ser mantidos, ou utilizados, pelo arguido na sua residência para fins particulares.
202. - Com estas conduta, o arguido AA agiu fazendo uso das suas funções de funcionário judicial, que exercia nos tribunais, para obter proveitos (recompensas) que lhes não eram devidos, sabendo que assim violava os deveres legais e funcionais a que estava adstrito, o que quis e conseguiu.
203. - Actos que, por essa razão, lhe estavam vedados, colocando a razão de ser de funções públicas ao serviço de propósitos pessoais, ilícitos, preterindo os seus deveres para benefício de terceiros e de si próprio, o que fez a troco de recebimentos das vantagens atrás descritas.
204. - O arguido CC bem conhecia as funções públicas exercidas pelo funcionário e arguido AA e bem sabia que este, com as condutas descritas, que o beneficiavam, violava os seus deveres funcionais e legais.
205. - Bem sabia o arguido CC que não podia actuar daquela forma e que as ofertas que entregava ao arguido AA e que este recebia, eram contrárias às regras do funcionamento transparente dos serviços e aos deveres funcionais inerentes ao cargo daquele e que o fazia no âmbito dessas funções.
206. - Fê-lo de forma a condicioná-lo e, assim, a obter informações reservadas a que não tinha direito, não se coibindo de actuar daquela forma, o que quis e conseguiu para benefício próprio ou de terceiros.
207. - Mais sabia o arguido AA que, com os seus actos, não só acedia como facultava e permitia o acesso indevido a informação confidencial de investigações criminais e que iludia a investigação ao ter conhecimento antecipado de diligências e actos processuais que comunicava ao arguido CC.
208. - Tudo para favorecerem o arguido CC e, indiretamente, o ... nas investigações em curso.
209. - O arguido AA sabia que alguns dos inquéritos atrás referidos estavam a coberto de segredo de justiça, com as implicações de confidencialidade de tal estatuto, encontrando-se a investigação em curso.
210. - Quis aceder e divulgar, como divulgou, informações do andamento das investigações, designadamente actos e diligências processuais, querendo ultrapassar o segredo de justiça que vigorava e indiferente aos efeitos que causaria aos interesses da investigação.
211. - Os arguidos AA e CC bem sabiam que a informação que o primeiro transmitia ao segundo, de processos pendentes, ainda que não estivessem em segredo de justiça, não podia ser divulgada, especialmente aos visados, mas ainda assim transmitiu as informações ao arguido CC.
212. -Tudo para o beneficiarem com informações reservadas, ou antecipadas, de processos e diligências que visavam a ... ou seus elementos, ou ..., assim permitindo acesso a informação a que não tinham direito.
213. - Os arguidos AA e CC bem sabiam que não podiam aceder a elementos referentes a pessoas singulares, confidenciais, como o nome, morada, data de nascimento, remuneração, morada, contacto e outros elementos pessoais.
214. - Fizeram-no com o propósito de obter dados dessas pessoas para posteriormente os poderem utilizar se tal lhes fosse conveniente, designadamente para prejuízo público dos visados pelo acesso aos seus dados pessoais.
215. - O que o arguido AA fez também para obter recompensas do arguido CC.
216. - Mais sabia o arguido AA que não podiam transmitir e aceder aos dados atrás descritos, pois não tinham qualquer justificação legal ou funcional, nem autorização dos titulares dos dados, o que fez no âmbito das suas atribuições de funcionário judicial, que lhe permitia o acesso às informações.
217.- Quis aceder e divulgar, como divulgou, informações privadas e confidenciais para daí obter vantagens.
218. - Tudo em concertação com o arguido CC, que bem conhecia as funções públicas exercidas pelo arguidoAA
220. - O arguido AA ., ao inserir nos sistemas informáticos do ..., entre os quais o sistema Citius, credenciais de magistrada, funcionárias e funcionário aposentado, dados que não podia utilizar, sabia que dessa forma atuava sem autorização e contra a vontade dos titulares das credenciais, do gestor do sistema informático e contra as regras de utilização do próprio sistema.
221. - Tudo em detrimento do serviço público prosseguido pelas autoridades judiciárias, atingindo assim os deveres e obrigações decorrentes das funções de natureza pública e estatuto profissional dos funcionários.
222. - Ao inserir no sistema informático tais credenciais de terceiros, o arguido AA transmitiu ao sistema informação (permissão de acesso) sem correspondência com a realidade, pretendendo que tais dados passassem por verdadeiros, bem sabendo, no entanto, que não o eram, o que quis e conseguiu.
223. - Tinha perfeito conhecimento que, com aquelas condutas, resultava prejuízo para a integridade e fiabilidade dos sistemas de informação e dos dados informáticos e que não podia introduzir no sistema informático dados que não correspondessem à verdade, no âmbito da sua atividade funcional, não se coibindo, ainda assim, de actuar da forma descrita.
224. - Tudo tendo o arguido CC conhecimento das funções públicas exercidas pelo arguido AA ..
225. - Ao transportar para a sua residência e colocar em uso, para fins particulares, os equipamentos informáticos atrás descritos, o arguido AAfez seus tais equipamentos, bem sabendo que pertenciam ao Estado (...).
226. - O arguido atoou com o propósito, concretizado, de fazer seus e usar em proveito próprio equipamentos com o valor supra descrito, que bem sabia não lhe pertencerem, os quais sabia afetos à atividade pública, e cujo acesso apenas lhe era possibilitado em razão das funções que desempenhava ao serviço do ..., o que quis e conseguiu.
227. - O arguido sabia que, dessa forma, atuava sem autorização e contra a vontade do ..., em detrimento do serviço público prosseguido por esta entidade, atingindo assim os deveres e obrigações decorrentes das suas funções de natureza pública e estatuto profissional.
228. - Os arguidos AAe CC agiram de modo livre, deliberado e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas pela lei penal.
Dos pedidos de indemnização civil
Pedido apresentado por EEE
229. - TTTTT foi, durante mais de 10 anos, ... (..., tendo mesmo chegado à categoria de ...
230. - Carreira que abandonou em 2005.
231. - Desde agosto de 2017, e até ao presente, é ..., nos programas ... e UUUUU, transmitido pelo ..., da propriedade da sociedade ..., do grupo ...
232. - Os demandados AA e CC, à data dos factos objetos dos presentes autos, tinham os cargos e exerciam as funções supra referidas.
233. - Não havendo entre eles e o demandante qualquer ligação, direta ou indireta.
234. - Em 5 de dezembro de 2017, pelas 10.22 h, sem que nada o justificasse, o demandado AA acedeu a dados pessoais do demandante, inscritos na base de dados da Segurança Social.
235. - Acedeu, nomeadamente, ao seu nome completo, número de contribuinte e de segurança social, data de nascimento, morada, entidades empregadoras, datas de início de funções, valor da última remuneração e valor da
pensão.
236.- Para o efeito, o demandado AA usou indevidamente a plataforma Citius, à qual acedeu através das credenciais de ...MM, ... no Tribunal de ..., entrando, nomeadamente, no processo n.° 44/15.8T9LSB, ali pendente.
237. - Tal acesso permitiu-lhe conhecer, revelar e divulgar, pelo menos ao demandado CC, todos aqueles dados pessoais do demandante.
238.- Tudo sem o conhecimento ou consentimento do demandante.
239. - Criando condições para que tais dados pudessem tornar-se públicos, contrariamente à sua natureza.
240. - O demandado AA atuou do modo descrito com o reconhecido propósito de obter para si vantagem patrimonial e/ou outros benefícios ilegítimos, nomeadamente recompensas da ..., atribuídas pelo demandado CC.
241. - Assim, colocou o demandado CC em condições de, também ele, obter vantagens.
242. - Dando resposta à solicitação do demandante CC, permitiu que ele ficasse na posse de dados pessoais do demandante TTTTT e os pudesse usar como lhes fosse conveniente, e bem assim divulgá-los.
243. - Tudo, indiretamente, em benefício da ...
244. - E em prejuízo do demandante, contra a sua vontade e conhecimento.
245. - O demandante desconhece o uso que os demandados deram aos seus dados pessoais.
246. - Pelo menos os demandados AA e CC tiveram acesso, conheceram e puderam usar e divulgar dados sigilosos e pessoais do demandante.
247. - Dados pessoais que o demandante tinha direito a que fossem mantidos em sigilo, cabendo-lhe definir o círculo de pessoas que a eles podiam aceder e os termos desse acesso.
248. - Em face ao que sucedeu, o demandante teme que, a qualquer momento, aqueles dados pessoais possam ser devassados na comunicação social, em blogs ou em redes sociais, permitindo que o público em geral conheça informações que só a si dizem respeito.
249. - Parte dessas informações (por exemplo, a morada), uma vez divulgadas, podem pôr em risco a sua segurança e a da sua família.
250. - Desde que tomou conhecimento da pendência destes autos que o demandante se questiona acerca dos motivos daquela atuação, no que a si diz respeito.
251. - Sente-se invadido, despeitado, vivendo com um sentimento de desconfiança e insegurança.
252. - O presente processo teve uma grande cobertura mediática, que se intensificou ainda mais com a prolação de divulgação da acusação pública.
253. - A consulta dos autos está acessível a quem nisso manifestar interesse, sendo, pois, já do conhecimento público que o demandante foi um dos visados pelos demandados nas suas pesquisas ilegais.
254. - Por via disso, o demandante tem sido questionado e abordado, nem sempre de forma agradável ou simpática, tendo até que gerir piadas e insinuações.
Pedido apresentado pelo GG
255. - O demandado AAexercia funções de ...aos tribunais, em comissão de serviço noVVVVV
256. - A plataforma Citius é o projeto de desmaterialização dos processos nos tribunais judiciais, desenvolvido pelo ..., por intermédio do WWWWW.
257. - Englobando aplicações informáticas para os diversos operadores judiciais: magistrados judiciais e do Ministério Público, funcionários judiciais e mandatários judiciais.
258. - Com a implementação da plataforma Citius visou-se assegurar, por um lado, uma maior segurança ao processo e aos respetivos actos praticados, e, por outro, um elevado nível de transparência.
259. - Nessa medida, os factos supra considerados como provados colocaram em causa a intangibilidade do sistema, minando os principais objetivos traçados, acima elencados, com a adoção e introdução desta ferramenta.
260. - Acresce que, sendo o demandado oficial de justiça, em comissão de serviço no VVVVV.. ficará este instituto público, também por esta via, irremediavelmente associado aos presentes autos.
261. - Com as repercussões negativas daí decorrentes.
Pedido apresentado por HH
262. - O demandado AA ao aceder ao processo n.° 44/15.8T9FAF, efetuou pesquisas referentes ao demandante.
263. - Obtendo assim informações pessoais do demandante, como o nome completo, números de identificação do contribuinte e da segurança social, data de nascimento, morada, entidades patronais, data de início de funções, última remuneração ou valor de pensão.
264. - O demandante foi ... entre, aproximadamente, 1981 e 1994, pertencendo à..., observador de ... até 2012 e Presidente do ...até 4 de outubro de 2016.
265. - Após ter ficado bastante abalado com a divulgação a larga escola de um conjunto de afirmações altamente caluniosas e falsas no programa ... da ..., emitido a 20 de novembro.
266. - As quais davam conta de uma associação entre o demandante e um "braço armado" que perpetrava violência e coação a ... a mando do ...
267. - Recorreu às instâncias judiciais para repor a verdade e a dignidade da sua imagem.
268. - Com a descoberta de todo o teor do despacho de acusação dos presentes autos, o demandante viu toda a sua informação pessoal devassada.
269. - Como consequência direta e necessária da conduta dos demandados, o demandante sofreu tristeza, angústia e insegurança, incluindo pela sua família.
Pedido apresentado por II
270. - O demandante, desde o ano de 2016 até à presente data, exerce as funções de ..., no âmbito do ....
271. - O demandante foi também, durante 21 anos, e até ao no de 2016, período que antecedeu ao referido cargo de ... ....
272. - E durante 18 anos ..., participando em ...
273. - Sem que soubesse, o fizesse prever, sem motivo aparente e ainda sem qualquer autorização, os demandados acederam a informação constante da base de dados da Segurança Social do demandante.
274. - O que ocorreu através do acesso supra referido, que o demandado AA fez ao processo n.° 44/15.8t9FAF.
275. - O demandado AA obteve assim informações do demandante, nomeadamente o seu nome completo, número de contribuinte, número da segurança social, data de nascimento, morada e última remuneração.
276. - Como consequência direta e necessária dos actos praticados pelos demandados, o demandante viu a sua vida privada e informação pessoal, a ser vasculhada e revistada, sem motivo e sem que tivesse dado a devida autorização.
277. - A sua vida privada e a sua família, incluindo a sua filha, foram expostas em meios de comunicação social.
278. - Após a comunicação social ter conhecimento da acusação proferida, onde é referido o nome do demandante, imediatamente os meios de comunicação social mostraram fotos do demandante, juntamente com a sua filha.
279. - Sendo, em consequência, exposta a sua imagem.
280. - Mal soube do acesso a dados e informações pessoais, o demandante sentiu receio, inquietação e temeu pela vida, segurança e privacidade da sua família, que passou a ser exposta na comunicação social.
281. - Mas também pela sua vida, segurança e privacidade.
Pedido apresentado por JJ
282. - O demandando, com a sua conduta, teve acesso a informações da vida privada do demandante, que veio a revelar e partilhar com terceiros.
283. - As informações reveladas dizem respeito ao seu número de identificação de contribuinte, o número da segurança social, a morada e o valor da última remuneração por si obtida.
284. - O demandante viu ainda serem publicadas informações enquanto testemunha de um processo conhecido por "...", processo esse muito mediático e que o demandante ainda estava a tentar ultrapassar a visibilidade que deu à sua vida pessoal.
285. - Uma vez que as informações foram divulgadas junto de pessoas com as quais o demandante tem relações de amizade e trabalho.
286. - O demandante viu a sua vida pessoal ser criticada junto de colegas, sentindo vergonha por ser sujeito a observações e comentários.
Das contestações ao despacho de pronúncia
287. - O arguido AA é pessoa social, profissional e pessoalmente integrada, goza de boa imagem social na sua zona de residência.
288. - É casado há mais de vinte anos e tem três filhos, mantendo uma estrutura familiar forte e coesa.
289. - É pessoa querida junto da comunidade local e dos seus colegas de trabalho, que mesmo no período em que esteve detido lhe manifestaram apoio.
290. - No regresso ao trabalho, após a sua reclusão, foi bem recebido por todos.
291. - Recebeu na última avaliação como ... a nota máxima: muito bom.
292. - O arguido CC conheceu o arguido AA em maio de 2015 numa situação em que lhe ficou agradecido e que gerou empatia entre os dois, passando este, desde então, a ser seu convidado para assistir aos ... do ... quer no ..., quer em ....
293. - Após o ... disputado entre o ... e o ..., no dia 23 de maio de 2015, que consagrou ..., o arguido CC - como era hábito -enquanto esperava pelo seu filho, junto à … do …, uma vez que este assistira ao ... na bancada e não consigo na tribuna presidencial, foi sendo saudado por dezenas de adeptos então em euforia.
294. - Acontece que, tendo reconhecido o arguido CC, o arguido AA fez questão de o saudar, de lhe confidenciar o seu profundo "amor" pelo ... - que levara a que fosse batizado com o nome de AA por ter nascido em ..., ano em que essa "... - e o gosto e honra que era para si conhecê-lo.
295. - A conversa fluiu, de forma que os arguidos constataram que eram ambos do "norte" do país, e com amigos comuns, tendo-se gerado uma empatia entre os dois.
296. - O arguido CC é um homem naturalmente atencioso, e considerou, além do mais, aquele encontro como simpático.
297. - Desde essa altura, que os dois homens estreitaram entre si e de forma natural uma relação de amizade.
298. - E desde aquele dia que o arguido AA não mais comprou um ... para assistir aos ... do ..., passando a fazê-lo, sempre que possível, a ... do arguido CC.
299. - O arguido AA passou a ... frequentemente na companhia do filho do arguido CC, XXXXX, com quem criou, também, uma relação de proximidade.
300.- De tal forma que, o XXXXX passou a tratá-lo, atenciosamente, como o "...
301. - Frequentes vezes, quando o..., o arguido AA vinha até ... no seu carro e daqui dava boleia ao filho do arguido CC para o estádio, o mesmo acontecendo no regresso.
302. - O relacionamento entre a família do arguido CC e a do arguido AA foi-se estreitando, de tal forma que passou a ser de amizade.
303. - Quando o filho mais novo do arguido CC, YYYYY, teve um acidente muito grave, que o colocou entre a vida e a morte, o arguido AA visitou-o no ... em ..., o que apenas ocorreu com as pessoas mais próximas uma vez que aquele se encontrava na ....
304. - A prática de o arguido CC oferecer ...ao arguido AA, para este e algumas pessoas próximas assistirem aos ... do ..., teve início antes dos factos acima descritos.
305. - O arguido CC tinha direito aos ... que entendesse "requisitar", sendo normal pedir cerca de 30 ... por ..., quando o mesmo era disputado no... destinando, regra geral, quatro ...para o arguido AA quando este lho solicitava.
306. - Constitui uma incumbência dos ... distribuírem ..., de forma a contribuírem para que o ... encha (o que, salvo nos ... de maior destaque, não acontece), de forma não só a que a...seja apoiada pelo maior número de ...possível, mas, também, com vista a contentar os patrocinadores e todos os fornecedores de bens e serviços.
307. - O ... do ... tem cerca de 7.368 lugares, sendo o acesso feito por ZZZZZ ou por ....
308. - Consoante o tipo de ... e a respetiva lotação é aumentada ou diminuída a zona diferenciada.
309. - Os lugares mais caros no ...do... são nos camarotes situados no … e não no ....
310. - Os ...entregues pelo arguido CC aos arguidos AA
e BB não têm qualquer preço neles inscrito, não sendo, por conseguinte, sequer faturados.
311. - No que toca à oferta de ... para assistência a ... do ... realizados fora do ..., um diretor de primeira linha ou elemento relevante da estrutura da ... como era o caso do arguido CC, pode solicitar ...para assistir a tais partidas de ..., sem ter que avançar qualquer tipo de justificação para o efeito e sem que haja qualquer controlo quanto ao pedido propriamente dito e quanto à(s) pessoa(s) que, depois, se apresente(m) no ...para assistir ao ....
312. - Não existe nenhuma regra escrita quanto a isto, sendo, por isso, uma prática corrente.
313. - Não obstante o pedido poder ser feito com a assinalada "liberdade", os ...solicitados só são disponibilizados se os mesmos sobrarem, depois de satisfeitas as necessidades do chamado ...onde se inserem familiares de ..., e os pedidos feitos por órgãos sociais, por exemplo, para membros da respetiva família.
314. - O apelidado parque de estacionamento ...mais não é que uma área ..., delimitada por um gradeamento transparente com máximo de dois metros de altura, ao qual, por solicitação de qualquer convidado ou por iniciativa do anfitrião, é, não raras vezes, permitido, no..., o acesso, para ali falarem com ... ou com ....
315. - É habitual haver ... no ..., no final de ...
316. - Qualquer pessoa que tenha acesso ao ..., isto é que entre de carro ...consegue, posteriormente, movimentar-se nos diversos pisos, tendo a possibilidade de se dirigir ao local onde os jogadores têm as suas viaturas parqueadas, momento em que, então sim, se deparam com o tal gradeamento transparente.
317. - No que toca ao ..., os pedidos de ... são dirigidos à área de ..., normalmente na pessoa do AAAAAA, que os remete à área de armazém ou às lojas, sendo o pedido satisfeito por essa via.
318. - O arguido CC é um bom pai de família, amado, considerado e respeitado pelos filhos e familiares, encontrando-se socialmente integrado.
319. - O arguido é competente, diligente e responsável no desempenho da sua atividade profissional e como tal respeitado.
320. - O arguido participa na vida da coletividade em que se insere, na cidade de ..., perfeitamente integrado, ajudando instituições e pessoas, sendo considerado por todos os que com ele convivem como uma pessoa educada, atenciosa, solidária, generosa e preocupada com o seu semelhante.
Das contestações aos pedidos de indemnização civil
321. - O demandante BBBBBB civil não é um cidadão anónimo.
322. - Uma pesquisa na internet do nome do demandante permite obter o acesso ao seu nome, data de nascimento e dados sobre a carreira.
323.- A exposição pública do demandante é algo que o demandante aceita ao ser ....
324. - O demandante HH não é um cidadão anónimo.
325. - Uma pesquisa na internet do nome do demandante permite obter o acesso ao seu nome, data de nascimento e dados sobre a carreira.
326. - O demandante II não é um cidadão anónimo.
327. - Uma pesquisa na internet do nome do demandante permite obter o acesso ao seu nome, data de nascimento e dados sobre a carreira.
Das condições pessoais dos arguidos
328.- O arguido AA integra um núcleo de quatro descendentes de um casal de emigrantes, tendo nascido em ..., onde viveu até aos 11 anos de idade.
329.- O pai ... e a mãe ... garantiam aos descendentes as condições materiais necessárias, num ambiente referenciado como socialmente ajustado.
330.- Iniciou escolaridade em ... onde concluiu o primeiro ciclo do ensino básico, findo o qual ingressou na Escola em Portugal, na sequência do regresso da família ao país.
331.- Iniciou o percurso profissional na Câmara Municipal de ..., com cerca de 19 anos, interrompendo a frequência do 12° ano.
332.- Neste contexto profissional realizou formação, curso técnico de fiscal de obras, de modo a responder às necessidades da entidade patronal.
333.- Esta atividade foi interrompida pelo cumprimento do serviço militar obrigatório, tendo obtido posteriormente colocação no ..., um estabelecimento particular de ensino, onde trabalhou cerca de nove meses.
334.- Em 1997 concorreu para os Tribunais, ingressando na carreira de oficial de justiça no Tribunal Judicial de ..., ainda no decurso desse ano.
335.- No ano seguinte passou a trabalhar no Tribunal de ... na área do ...e aí permaneceu em funções até 2001.
336.- Em fevereiro de 2001 foi colocado no Tribunal de ..., onde manteve as funções de ..., com exercício regular até 2018.
337.- Casou em ..., fixando residência em freguesia do concelho de ..., de onde a família de origem é natural.
338.- O casal teve três descendentes e o arguido descreve um acompanhamento próximo do processo educativo dos mesmos, tendo sido representante dos pais na escola básica que estes frequentaram e integrado o ... até março de 2018.
339.- O arguido refere ainda participação cívica e política no contexto da sua comunidade de inserção, tendo integrado lista candidata às ..., mas não sendo eleito.
340.- O arguido vive com a cônjuge, em moradia própria, com boas condições de habitabilidade (adquirida com recurso a crédito bancário, cuja prestação mensal se situa nos € 850,00), situada na freguesia de ... em ....
341.- O arguido trabalha atualmente na ... do Tribunal Judicial de ..., como ... com um vencimento base de € 1.411,67.
342.- No contexto profissional, o seu responsável direto à data dos factos, referiu- se ao arguido como um trabalhador prestável no desempenho das suas funções e com "grande sentido de urbanidade".
343.- A cônjuge é ...e o casal dispõe, em conjunto, de um rendimento mensal líquido proveniente do trabalho no valor aproximado de € 2.600,00.
344.- Os dois descendentes mais velhos frequentam ambos o ensino superior público, encontrando-se deslocados, um em ...) e outro no ...
345.- A filha mais nova frequenta o 10° ano na ..., localidade onde permanece durante a semana.
346.- As despesas com os descendentes são assumidas pelos pais, tendo contado com o apoio da família de origem no período em que o arguido esteve sem vencimento.
347.- Desde março de 2018 (data em que foi sujeito a prisão preventiva no âmbito do presente processo) não se encontra formalmente envolvido em atividades de caráter cívico, dedicando parte significativa do seu tempo livre à atividade agrícola e pecuária caseira que criou em terreno familiar.
348.- O arguido privilegia os convívios com o grupo familiar, embora mantenha relações de amizade no contexto profissional e comunitário.
349.- Referiu ser amigo e colega de trabalho do coarguido BB, também residente no concelho de ....
350.- Descreve ainda manter uma relação de amizade com o coarguido CC, desenvolvida a partir de 2014/2015, altura em que se conheceram numa deslocação ao ... para assistir a um ... do ..., ... de que os três arguidos são ....
351.- Na sua comunidade de inserção dispõe de uma imagem social positiva, sendo descrita a adoção de uma interação prestável e cordial.
352.- O processo em curso teve um impacto relevante na vida do arguido, desde logo aquando da aplicação da medida de coação de prisão preventiva de março de 2018 a setembro de 2018, com o consequente afastamento do seu meio familiar e socioprofissional e, posteriormente, com a sujeição a obrigação de permanência na habitação com vigilância eletrónica, até dezembro do mesmo ano.
353.- A sua situação jurídica implicou a interrupção do exercício profissional e o afastamento das funções de ... que exercia até março de 2018, com suspensão de vencimento.
354.- Esta situação implicou uma redução significativa do rendimento familiar disponível, atenuada com o suporte do grupo familiar alargado.
355.- Este grupo familiar apresenta indicadores de solidariedade e coesão, mantendo o apoio ao arguido, tanto no decurso do cumprimento das medidas de coação, como atualmente.
356.- O arguido foi alvo de processo disciplinar, que se encontra suspenso até trânsito em julgado da decisão relativa ao presente processo.
357.- Não obstante, não foi sujeito a suspensão preventiva de funções, tendo retomado a atividade profissional no início de 2019, regressando à carreira de ..., na ... do Tribunal Judicial de ... com funções diversas, onde se mantém.
358.- O presente processo, pela sua mediatização, é conhecido da comunidade de inserção do arguido, assim como a sua constituição como arguido no mesmo.
359.- No entanto, não se observam indicadores de rejeição, ou de alteração da sua imagem social no meio sociocomunitário.
360.- O arguido BB é o mais velho de uma fratria de dois, de um agregado familiar cuja dinâmica foi avaliada como positiva, embora pautada por um estilo parental autoritário, com regras rígidas e punições.
361.- O progenitor trabalhou, quase toda a vida ativa, no setor ...e, posteriormente, numa loja de ..., no concelho de residência.
362.- A progenitora ficou precocemente inativa, por motivos de doença, razão pela qual se reformou.
363.- Neste sentido, a situação financeira da família foi descrita como estável e suficiente para a manutenção de um estilo de vida sem constrangimentos a este nível.
364.- Atualmente, ambos os pais são falecidos.
365.- O percurso escolar do arguido decorreu sem incidentes até ao 7° ano de escolaridade, quando o absentismo e o desinteresse pelas matérias escolares conduziram ao abandono.
366.- Mais tarde, frequentou ensino noturno até à obtenção do 12° ano de escolaridade.
367.- Durante a adolescência, e em três anos consecutivos, o arguido passou o período de férias de Verão em ..., com amigos dos seus pais, onde prestava serviços indiferenciados num ..., em troca de montantes pecuniários vários.
368.- O arguido salienta a constante motivação para o exercício de atividades laborais, por forma a obter autonomia financeira para os gastos pessoais.
369.- A sua primeira experiência profissional foi numa ótica, mas onde permaneceu apenas durante seis meses.
370.- Cumpriu serviço militar, como paraquedista, durante cerca de três anos, após os quais registou outras experiências profissionais no setor têxtil, como empregado de escritório e afinador de máquinas, e no setor da construção civil, como orçamentista e comercial de imobiliário.
371.- Aos 23 anos de idade, o arguido iniciou o curso de ..., por influência de amigos.
372.- No âmbito desta atividade registou um percurso estável, passando por funções de..., ... e ...
373.- Nos últimos anos exerceu funções como ..., em ...
374.- Com 29 anos de idade, o arguido concorreu ao concurso de acesso para funcionário judicial.
375.- Depois de um estágio com a duração de seis meses, no Tribunal de Comarca de ..., foi colocado no Tribunal de ..., onde permaneceu durante cerca de dois anos.
376.- Registou, de seguida, um percurso com alguma mobilidade, entre comarcas (..., ..., ...), mas de forma estável e sem períodos de inatividade.
377. - Desde 2015 que exerce funções no Tribunal de ....
378.- O arguido estabeleceu uma relação afetiva com jovem residente no mesmo concelho.
379.- Após um período de tempo, em que ambos residiram em ... (onde ele trabalhava e ela frequentava curso superior), contraíram casamento e residiram temporariamente em ..., antes de se fixarem em ..., em 1999.
380.- O casal teve uma filha, atualmente maior.
381.- Por volta de 2001/2002, o casal investiu no setor da..., ao qual o cônjuge se dedica a tempo inteiro.
382.- Além da exploração de ..., em ..., o cônjuge é proprietário de um ... na cidade do ..., desde 2015.
383.- À data dos factos, o arguido exercia funções de...no Tribunal de ..., concretamente no....
384.- Em setembro de 2019, foi nomeado ..., em regime de substituição, sendo ...
385.- Em simultâneo, era ..., em ... de ..., em regime de prestação de serviços, para a...e para a ...
386.- Com a sua constituição como arguido refere que deixaram de lhe atribuir ..., acabado por abandonar esta atividade por sua iniciativa.
387.- O arguido constitui agregado familiar com o cônjuge e a filha do casal, maior.
388.- O cônjuge gere estabelecimentos de ..., em ..., e a filha é estudante de ...no ...), no ....
389.- A dinâmica familiar é descrita como positiva e de interajuda, sendo estas as principais fontes de suporte do arguido.
390.- O casal vive em imóvel próprio, adquirido com recurso a crédito bancário, um apartamento, tipologia 3, dotado de adequadas condições de habitabilidade e conforto, localizado na cidade de ....
391.- Além do imóvel, o casal é proprietário de três viaturas.
392.- A situação financeira da família é descrita como estável e suficiente para os encargos do quotidiano.
393.- O arguido aufere um vencimento mensal líquido aproximado de € 1.600,00, e a esposa cerca de € 1.200,00 mensais, ainda que este montante possa oscilar.
394.- À data dos factos, o arguido acumulava, ainda, o montante auferido da atividade de ..., que oscilava entre os 10 e 18 mil euros anuais.
395.- Como despesas fixas, menciona as relacionadas com o imóvel (aproximadamente € 400,00) e as propinas da faculdade da filha (€ 400,00).
396.- O arguido tem problemas de saúde de ..., que lhe ditaram uma incapacidade permanente de 77%.
397.- Não se envolve em atividades estruturadas de ocupação dos tempos livres, por ausência de disponibilidade para tal.
398.- Manifesta interesse pessoal por desporto motorizado, tendo sido proprietário de vários motociclos.
399.- Tem grupo de pares que funcionam como suporte positivo.
400.- O arguido assume conhecer os coarguidos, sendo amigo de longa data de CC, que conheceu em atividades ligadas ao ....
401.- É colega de trabalho do coarguido AA, com quem partilha as viagens até ao local de trabalho.
402.- O arguido goza de uma imagem social positiva e de interação adequada com os elementos da comunidade residencial, sendo descrito como um indivíduo afável, cordial e educado.
403.- Demonstra adequada capacidade de análise sobre o seu percurso de vida e descreve-se como um indivíduo muito organizado, rigoroso e imparcial no exercício laboral, nomeadamente enquanto ...
404.- Neste âmbito, o arguido considera que esta característica pessoal lhe causou uma imagem pouco favorável no âmbito do exercício desta última atividade.
405.- O arguido manifesta revolta pela sua constituição como arguido no presente processo e descreve um impacto significativo a vários níveis, em especial decorrente da mediatização pela comunicação social.
406.- Considera ter sofrido um impacto pessoal expressivo, com crises de ansiedade, pelo que recorreu a apoio psicológico.
407.- A família evidencia desgaste e descreve a ocorrência de represálias, através das redes sociais.
408.- O arguido mantém, no entanto, apoio consistente por parte do cônjuge e filha.
409.- O arguido considera, ainda, que o presente processo impactou negativamente na sua imagem profissional.
410.- Todavia, o próprio é descrito como um funcionário trabalhador, metódico e organizado, tendo sido nomeado ..., já após a existência do presente processo.
411.- O envolvimento do arguido neste processo é do conhecimento geral da comunidade, contudo não se percecionou a existência de impacto significativo.
412.- A nível profissional, foi instaurado processo disciplinar, sem aplicação de medida, que se encontra suspenso a aguardar decisão do processo penal.
413.- O arguido CC nasceu em …., mas na sequência do processo de descolonização daquele país migrou para Portugal, juntamente com os pais e três irmãos, quando contava 6 anos de idade.
414.- O agregado, inicialmente, arrendou uma casa em …., terra natal dos avós paternos do arguido e, posteriormente, no …., onde o arguido viveu dos 9 aos 39 anos de idade.
415.- A vinda do agregado para Portugal, na qualidade de migrantes pós-coloniais, suscitou diversos constrangimentos, nomeadamente ao nível económico, dificuldades que foram sendo progressivamente superadas, primeiro com o apoio material do …, e, posteriormente, com o empenho e dedicação do pai ao trabalho.
416.- O pai, … e a mãe …, proporcionaram-lhe, segundo o próprio, um modelo educacional ajustado, com transmissão de regras e valores sociais normativos.
417.- Ao nível escolar/académico efetuou um trajeto regular, ingressando na …com 19 anos de idade e concluindo a licenciatura em … em 1994, com 25 anos.
418.- Seguidamente, realizou com êxito o estágio e exame na … ficando habilitado para exercer ….
419.- Fez também uma pós-graduação em …, na Faculdade …, devido ao seu interesse desde jovem pelo …, praticando ... até aos 14 anos e assistindo, com particular interesse, refere, aos ... de ..., ….
420.- Constituiu agregado familiar próprio há mais de vinte anos, através do casamento com …, também …, a exercer funções na …, vindo a nascer dois filhos.
421.- Começaram por residir no … e, mais tarde, em …, por razões de local de trabalho do arguido, acompanhando-o o cônjuge, que veio a obter transferência na …
422.- Em 2014 radicam-se em zona de características rurais, próxima de …, onde constroem moradia, com terreno envolvente e por recurso a crédito bancário (ainda por liquidar).
423.- Esta vinda para … relaciona-se, segundo o arguido, com o facto de ali poderem ter acesso a uma maior qualidade de vida.
424.- Qualifica a interação relacional no agregado como estruturada e afetivamente coesa, desde a sua constituição, no que é corroborado pelo cônjuge.
425.- Em termos profissionais, começou a trabalhar como …., ainda enquanto estudante universitário, como forma de obter alguma autonomia económica e também para não sobrecarregar os pais, uma vez que o arguido frequentava o ensino universitário privado.
426.- Em 1995, quando ainda se encontrava a concluir o …, integrou o departamento jurídico do …, onde exerceu funções de … até junho 1999.
427.- Após um curto intervalo de tempo em que se dedicou à …, em março de 2000, ingressou no ..., onde, diz, teve um papel preponderante na constituição da …, vindo a ser diretor geral do … e de onde saiu em agosto de 2006 por iniciativa própria.
428.- Em janeiro de 2007, por convite do então presidente do ..., passou a integrar o … onde exerceu, as funções de … para o ... , sentindo-se profissionalmente realizado com o desempenho dessas funções.
429.- O arguido beneficia de um enquadramento familiar estruturado, mantendo com o cônjuge (…, na situação de…) para apoio na … a …e com os dois filhos do casal (22 e 19 anos, estudantes) uma relação caracterizada pela qualidade dos vínculos afetivos, segundo o próprio e cônjuge, partilhando o casal decisões familiares e responsabilidades parentais.
430.- A avó materna do cônjuge, de …anos de idade, também integra o agregado familiar.
431.- Em maio de 2017 o filho mais novo foi …, no qual …, acontecimentos que reforçaram a união familiar entre os vários elementos.
432.- Mantêm a situação habitacional supra descrita, desde 2014.
433.- Do ponto de vista profissional e na sequência da instauração deste processo e sobretudo, diz, devido à visibilidade pública do mesmo, o arguido, em setembro de 2018, deixou, por comum acordo, de exercer funções no .., como … para o …, onde se mantinha há onze anos.
434.- Após isso, o arguido retomou atividade laboral por conta própria, constituindo, em janeiro de 2019, a empresa …., passando a dedicar-se, desde aí, à …e … a ..., … e …, sobretudo na área da …., manifestando satisfação pela atividade profissional atualmente desenvolvida.
435.- A sede da empresa é em …, mantendo também, em …, um escritório.
436.- O cônjuge figura como ….
437.- A situação económica foi avaliada como suficiente para assegurar as necessidades materiais do agregado provindo os rendimentos fixos do vencimento do arguido e do cônjuge, cujos valores mensais foram referidos em € 2368,00 e € 2215,94, respetivamente.
438.- Das despesas fixas mensais salientou a prestação bancária referente a crédito de habitação no valor aproximado de € 1000,00 e as propinas universitárias do filho mais velho de 500,00 e empregada doméstica (€ 400,00).
439.- No plano social o arguido é uma pessoa considerada e respeitada na comunidade de residência, sendo reconhecido sobretudo, pelo facto de interagir com simpatia e afabilidade com as pessoas da sua localidade, onde decorre parte do seu quotidiano.
440.- O cônjuge integra, como …, a direção de uma …, de cariz social da cidade de …, participação desenvolvida a título pro bono e que é valorizada pelo arguido.
441.- Nos tempos livres privilegia o convívio com a família e com um restrito número de amigos, alguns dos quais são antigos colegas de … do arguido e do cônjuge, residentes no …, com quem mantém atualmente contactos mais distantes, e outros são seus vizinhos e com os quais tem uma relação mais próxima.
442.- Este núcleo de amizades partilha entre os seus membros o … e, nesse âmbito, a dedicação à pratica … que, aliás o arguido, desde jovem, professa.
443.- Num contexto mais alargado mantém outras relações com pares, muitas delas fruto da sua atividade profissional, presente e passada.
444.- Neste contexto mantinha uma relação de proximidade com AA ., coarguido neste processo, que conheceu no ano de 2015, e BB, também coarguido neste processo.
445.- Embora o seu relacionamento com este último fosse mais formal e distante, o primeiro coarguido foi estabelecendo consigo contactos relacionados com os ... de ..., contactos que se tornaram mais frequentes quando o filho do arguido sofreu o acidente de viação e que levaram a posterior desenvolvimento de laços de amizade.
446.- O arguido considera que o presente processo carreou impactos relevantes na sua vida, quer emocionais, desde logo, quando teve que encarar a privação de liberdade, referindo-se ao período de permanência no Estabelecimento Prisional da Policia Judiciária para apresentação a 1.° interrogatório judicial, quer profissionais, uma vez que determinou a saída, ainda que por mútuo acordo, do .., bem como o processo de disciplinar na … que se mantém a correr os seus trâmites legais.
447.- Reconhece ainda, impacto nos membros do seu contexto familiar, sobretudo junto dos filhos e dos pais, considerando que a visibilidade pública do processo judicial, bem como o modo com que a situação tem sido tratada pela comunicação social, tem suscitado constrangimentos para os filhos e pais, que vêm a imagem do pai e do filho, respetivamente, denegrida pelos órgãos de comunicação social.
Dos certificados de registo criminal
448.- Dos certificados de registo criminal dos arguidos nada consta.»
Igualmente do acórdão recorrido, constam os seguintes factos não provados:
«A- Que o arguido CC na estrutura do .. reportasse diretamente ao então do ..., EEEE.
B- Que em data não apurada, mas pelo menos desde março de 2017, o arguido CC tenha solicitado ao funcionário de justiça BB que acedesse a processos pendentes e lhe transmitisse informações relativas a esses processos, designadamente inquéritos que corriam no … de … e …, ou outros processos a que conseguisse acesso dispersos por diversos tribunais.
C- Que o arguido BB, com a promessa de tratamento privilegiado junto do ..., designadamente para assistência a ... em condições favoráveis, aceitou proceder como solicitado.
D- Que tenha sido apenas a partir de março de 2017 que o arguido CC apresentou ao arguido AAa promessa de tratamento privilegiado junto do ..., designadamente para assistência a ... em condições favoráveis.
E- O arguido CC foi oferecendo, pelo menos, nas … de 2016/2017 e 2017/2018 e até 3 de março de 2018, ...e produtos de ..., ao arguido BB, de forma a criar condições de permeabilidade por parte do … e arguido BB, tendo em vista decisões favoráveis, conhecimento privilegiado de informações desportivas e de pessoas e contactos ligados à arbitragem.
F- Que tenha sido como recompensa que o arguido BB recebeu do arguido CC ...e ... para assistir gratuitamente a ... de ... no ..., em …, designadamente no ..., designado por «…», incluindo acesso a lounge com comida e bebida e parqueamento automóvel.
G- Que o arguido BB tenha recebido, ainda, produtos de ..., assim como tratamento privilegiado no ..., designadamente acesso a espaços reservados para contacto com ….
H- Que fosse concretamente por forma a melhor esconder os pedidos e recompensas que, por vezes, os contactos do arguido AAcom o arguido CC eram realizados através de PP ou do arguido BB, conhecidos de todos.
I- Que o referido no ponto 25 e ss. tenha ocorrido, na execução do plano delineado também com o arguido BB.
J- Que em data não apurada o arguido CC tenha transmitiu ao arguido AAa necessidade de pesquisa de processos relativos a CCCCCC, empresário de …
K- Que o convite para assistência a ... de ... incluindo parque de estacionamento seja uma exceção só utilizada para fins institucionais de relevo.
L- Que o arguido CC tenha entregue ao arguido AA os seguintes artigos de vestuário da marca ...:
- Uma camisola vermelha com inscrição de patrocínio Radler no valor aproximado de € 76,46;
- Uma camisola n.º 7 do AAAAA, autografada no valor aproximado de € 89,95;
- Uma camisola branca de ... com o n° 1 do DDDDDD no valor aproximado de €32,50.
M- Que para tais entregas o arguido CC tenha feito acionar os procedimentos e estrutura do ... e respetivos recursos humanos.
N- Que sempre que o ...... em …, no ..., …, nas últimas jornadas da época 2016/2017 e em todos os ... da … 2017/2018 (até 6 de março de 2018), o arguido CC tenha disponibilizado ao arguido BB, pelo menos 4 (quatro) .../ …, com parque incluído e lounge para os ... em casa, no ..., o mesmo sucedendo, por vezes, nos ... fora de casa.
O- Que no caso dos ... fora do ..., o arguido CC tenha entregue ao arguido BB ...pertencentes ao ..., disponibilizados a este pelos ....
P- Que no final do ... contra ..., de 22 de outubro de 2017, o arguido CC tenha diligenciado para que DDDDDD,..., entregasse, a um dos filhos do arguido AAuma camisola, o que sucedeu.
Q- Que já anteriormente a 20 de dezembro de 2017, em data não apurada, o arguido CC tenha entregue uma camisola do ... ao arguido AA ., que este entregou ao seu filho José.
R- Que no decurso do ... ... contra …, realizado a 20 de janeiro de 2018, o arguido BB tenha delineado a eventual contratação do sobrinho do arguido AA ., UUUU, licenciado em …, para o …, do ....
S- Que no momento referido em 161 os arguidos tenham concretamente acertado pormenores quando conversaram.
T- Que em data não apurada, mas perto do dia 22 de janeiro de 2018, o arguido CC tenha transmitiu ao arguido BB informação sobre a contratação de UUUU, para, por sua vez, o arguido BB a transmitir ao arguido AA ., o que fez.
U- Que, nesse mesmo dia, o arguido AA tenha eliminado dados informáticos, a pedido de o arguido BB.
V- Que o referido em 166 tenha ocorrido concretamente para que o arguido AA pudesse contactar diretamente com os ….
W- Que as duas camisolas do ... entregues no dia 20 de janeiro de 2018, pelo arguido CC, no parque de estacionamento reservado do ... se tenham destinado concretamente ao arguido BB.
X- Que o material informático que o arguido AA tinha na sua posse, guardado na sua residência, tivesse concretamente o seguinte valor:
- o computador portátil da marca Dell, com bateria e n.° de série DSZJ5Q1, o valor de €140,00;
- o computador portátil da marca Dell, sem bateria e sem disco rígido com n.° de série 2HR623J, o valor de € 50,00;
- o computador portátil da marca Dell, com bateria, sem disco rígido e n.° de série 4KQ623J, m o valor de € 50,00;
- o computador portátil da marca Dell, com bateria, sem disco rígido e n.° de série F2HYG3J, o valor de € 50,00;
- o computador portátil da marca Dell, sem bateria e sem disco rígido e n.° de série DW2623J, o valor de € 40,00;
- o computador desktop da marca Dell, funcional e em utilização, n.° de série 23YZB3J, o valor de € 100,00;
- o computador da marca Dell, com a referência DPN:CFGY2A00, o valor de € 175,00;
- a impressora da marca Samsung, modelo Pro Xpress M 3870FW, com o n.° de série ZDG8BJFF8000018W, o valor de € 350,00;
- o monitor da marca HP, funcional e em utilização, com o n.° de série 3CQ3440J1N, o valor de € 50,00;
- o monitor da marca HP funcional e em utilização, com o n.° de série 3CQ3440GJL, o valor de € 50,00;
- o teclado da marca HP funcional e em utilização, com o n.° de série BDB SEOARZ7G65U, o valor de € 5,00;
- o computador HP PROdesk 600 G1 Base Model Tower PC, o valor de € 140,00.
Y- Que, com estas condutas, o arguido BB tenha agido em concertação de esforços e vontades, fazendo uso das suas funções de funcionário judicial, que exercia nos tribunais, para obter proveitos (recompensas) que lhe não eram devidos, sabendo que assim violava os deveres legais e funcionais a que estava adstritos, o que quis e conseguiu.
Z- Actos que, por essa razão, lhe estavam vedados, colocando a razão de ser de funções públicas ao serviço de propósitos pessoais, ilícitos, preterindo os seus deveres para benefício de terceiros e de si próprios, o que fez a troco de recebimentos de vantagens.
AA- Que o arguido BB pretendeu, ainda, utilizar as suas funções de observador de arbitragem, que vinha exercendo junto da … ... e..., para obter proveitos para si, que sabia que não podia receber e a que não tinha direito, sabendo que, assim, violava os seus deveres funcionais.
AB- Ainda assim, aceitou as ofertas, cedendo informações, e pedindo ele próprio favores, o que quis e conseguiu.
AC- O arguido CC bem conhecia as funções públicas exercidas pelo arguido BB e bem sabia que este, com as condutas descritas, que o beneficiavam, violava os seus deveres funcionais e legais.
AD- Bem sabia o arguido CC que não podia actuar daquela forma e que as ofertas que entregava ao arguido BB, e que este recebia, eram contrárias às regras do funcionamento transparente dos serviços e aos deveres funcionais inerentes aos cargos e que o fazia no âmbito dessas funções.
AE- Fê-lo de forma a condicionar o arguido BB e, assim, a obter informações reservadas a que não tinha direito, não se coibindo de actuar daquela forma, o que quis e conseguiu para benefício próprio ou de terceiros.
AF- O arguido CC bem conhecia as funções de … do arguido BB, pretendendo, através da oferta de bens e vantagens, criar com o mesmo uma relação de proximidade e de favor para a obtenção de benefício inerente às funções ligadas à …, designadamente informações antecipadas e privilegiadas, contactos ou informações pessoais.
AG- A actuação do arguido CC pretendeu criar, junto do arguido BB, um canal de acesso interno a informações da …, não se coibindo de, para tal, oferecer ..., ...e outros produtos e vantagens ao ….
AH- Mais sabia o arguido BB que, com os seus actos, não só acedia como facultava e permitia o acesso indevido a informação confidencial de investigações criminais e que iludia a investigação ao tem conhecimento antecipado de diligências e actos processuais que comunicava ao arguido CC.
AI- Que os factos praticados tivessem como finalidade permitir, se necessário, a dissipação antecipada de elementos de prova.
AJ- Que os arguidos tenham agido com o propósito de evitar que o ... e o arguido CC fossem acusados, julgados e condenados numa pena.
AK- O arguido BB sabia que alguns dos inquéritos atrás referidos estavam a coberto de segredo de justiça, com as implicações de confidencialidade de tal estatuto, encontrando-se a investigação em curso.
AL- Que o arguido BB quis aceder e divulgar, como divulgou, informações do andamento das investigações, designadamente actos e diligências processuais, querendo ultrapassar o segredo de justiça que vigorava e indiferentes aos efeitos que causaria aos interesses da investigação, mormente a dissipação de prova por parte dos visados, o que aliás até pretendia.
AM- Que o arguido BB bem soubesse que a informação que transmitia a CC de processos pendentes, ainda que não estivessem em segredo de justiça, não podia ser divulgada, especialmente aos visados, mas ainda assim transmitiu as informações a CC.
AN- Tudo para o beneficiar com informações reservadas, ou antecipadas, de processos e diligências que visavam a … ou seus elementos, ou ..s e elementos de …, assim permitindo acesso a informação a que não tinham direito.
AM- O arguido BB bem sabia que não podia aceder a elementos referentes a pessoas singulares, confidenciais, como o nome, morada, data de nascimento, remuneração, morada, contacto e outros elementos pessoais.
AO- O arguido BB fê-lo com o propósito de obter dados dessas pessoas para posteriormente os poderem utilizar se tal lhes fosse conveniente, designadamente para prejuízo público dos visados pelo acesso aos seus dados pessoais.
AP- O que o arguido BB fez também para obter recompensas de CC.
AR- Mais sabia o arguido BB que não podia transmitir e aceder aos dados atrás descritos, pois não tinham qualquer justificação legal ou funcional, nem autorização dos titulares dos dados, o que fez no âmbito das suas atribuições de funcionário judicial, que lhe permitia o acesso às informações.
AS- O arguido BB quis aceder e divulgar, como divulgou, informações privadas e confidenciais para daí obter vantagens.
AT- Tudo em concertação com CC, que bem conhecia as funções públicas exercidas por BB.
AU- O arguido BB, na execução do plano delineado conjuntamente, ao inserir, através de AA, nos sistemas informático do ..., entre os quais o sistema Citius, credenciais de magistrada, funcionárias e funcionário aposentado, dados que não podia utilizar, sabia que dessa forma actuava sem autorização e contra a vontade dos titulares das credenciais, do gestor do sistema informático e contra as regras de utilização do próprio sistema.
AV- Tudo em detrimento do serviço público prosseguido pelas autoridades judiciárias, atingindo assim os deveres e obrigações decorrentes das funções de natureza pública e estatuto profissional dos funcionários.
AW- Ao inserirem no sistema informático tais credenciais de terceiros, o arguido BB, através de AA, transmitiu ao sistema informação (permissão de acesso) sem correspondência com a realidade, pretendendo que tais dados passassem por verdadeiros, bem sabendo, no entanto, que não o eram, o que quis e conseguiu.
AX- O arguido BB tinha perfeito conhecimento que, com aquelas condutas, resultava prejuízo para a integridade e fiabilidade dos sistemas de informação e dos dados informáticos e que não podia introduzir no sistema informático dados que não correspondessem à verdade, no âmbito da sua atividade funcional, não se coibindo, ainda assim, de actuar da forma descrita.
AY- Tudo em concertação com CC, que bem conhecia as funções públicas exercidas por BB.
AZ- Actuação deliberada, delineada e executada por CC, assessor direto do presidente da SAD, a quem reportava, desempenhando função de relevo na sociedade, sendo integrado na estrutura da mesma como diretor.
BA- O arguido AAatuou com o propósito, concretizado, de fazer seus e usar em proveito próprio equipamentos de valor concreto superior a € 102,00.
BB- O arguido BB agiu de modo livre, deliberado e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida pela lei penal.
BC- Que o demandante HH tenha visto a informação pessoal que foi acedida exposta e partilhada.
BD- Que como consequência direta e necessária da conduta dos demandados, o demandante HH tenha sofrido de uma forte perturbação do equilíbrio sócio psíquico e emocional.
BE- Tendo inclusive já pensado em alterar a sua residência.
BF- Vivendo com um medo e um temor diário e constante, pois nem em casa se sente seguro, dado que os demandados têm conhecimento da sua morada, podendo fornecê-la a outras pessoas, que possam ter más intenções, seja de injuriar, agredir ou até matar o demandante.
BH- Assim, o demandante não se sente seguro quando anda na rua e nem em casa consegue encontrar paz e tranquilidade, devido ao estado de receio em que vive.
BI- O demandante teme que possam usar a sua morada para perpetrarem qualquer ataque à sua esposa, como represália de qualquer situação, como meio de se vingarem de si.
BJ- O arguido CC passou a frequentar a casa do arguido AA ., visitando-o na sua casa em ..., tal como este passou a frequentar a casa do arguido em ….
BK- A oferta de ...ao arguido AAnão tinha qualquer distinção relativamente a muitas outras pessoas com quem o arguido CC praticava igual liberalidade, pela simples razão de gostar delas ou de pretender ser agradável com as mesmas, caso, por exemplo do seu jardineiro,
BL- A bancada a que os ...davam acesso não é a bancada com maior destaque no Estádio, nem sequer a seguir à bancada presidencial.
BM- Os ... fora do ... (a saber: ... do …X ... 22.10.2017; …X ... 07.01.2018; … X ... 13.01.2018; … X ... 24.02.2018), o preço dos ... para esses ... situou-se entre os € 10,00 e os € 37,00.
BN- Uma simples pesquisa na internet permite o acesso à morada dos demandantes civis.
BO- Que a exposição dos dados pessoais dos demandantes decorra do facto de aceitarem ser comentadores em programas de televisão.
BP- Sendo o demandante II vogal do …, terá o mesmo fornecido os seus dados - morada, número de identificação fiscal e número da segurança social - à ..., composta por dezenas de … de ..., de …, ..., etc, sendo que qualquer associado da... terá acesso a tais dados.»

FUNDAMENTAÇÃO
Apreciemos, então, as diversas questões colocadas pelos recursos, começando pelas provenientes do recurso interlocutório.

a)-dos efeitos da decisão do Supremo Tribunal de Justiça
A primeira questão colocada pelo recurso interlocutório prende-se com os efeitos da decisão do Supremo Tribunal de Justiça, que despronunciou BB, relativamente a crimes pelos quais estava acusado em co-autoria com o Arguido AA. Entende o recorrente que, sendo o crime praticado, nos termos da acusação, em co-autoria, deverão ser-lhe extensíveis os efeitos dessa decisão.
Olhemos, então, para o que se passou no presente processo.
A acusação acusou, em co-autoria, o recorrente AA e BB, pela prática de 6 crimes de violação do segredo de justiça, 21 crimes de violação de segredo por funcionário, 9 crimes de acesso indevido, 9 crimes de violação do dever de sigilo e 28 crimes de acesso ilegítimo.
Porém, nos termos dos respectivos requerimentos de abertura de instrução, respeitando assim o seu objecto, foi proferida decisão instrutória em 21.12.2018. Nela, o Tribunal Central de Instrução Criminal não pronunciou BB pela prática daqueles crimes e, nesta parte, não houve recurso.
Concordamos, pois, nesta parte, com a conclusão do Ministério Público na sua resposta, de que tal decisão transitou em julgado no tocante à não pronúncia de BB.
Mas, o recurso que apreciamos reporta-se a AA e, quanto a este, o Tribunal de Instrução decidiu pronunciá-lo, quanto aos 6 crimes de violação do segredo de justiça, aos 9 crimes de acesso indevido, e aos 9 crimes de violação do dever de sigilo. Apenas os 21 crimes de violação de segredo por funcionário e os 28 crimes de acesso ilegítimo foram objecto de decisão de não pronúncia.
Contudo, nesta parte, recorreu o Ministério Público que não se conformou com a não pronúncia, o que impediu o trânsito da decisão instrutória. Repete-se, apenas nesta parte.
Assim, foi o Tribunal da Relação de Lisboa chamado a decidir sobre se deveria ser mantida, ou não aquela decisão de não pronúncia do Arguido, agora Recorrente. E ao fazê-lo, em acórdão de 11.09.2019, a decisão foi no sentido de reverter a decisão da primeira instância, e determinar que o Arguido respondesse em julgamento, também, por aqueles 21 crimes de violação de segredo por funcionário e 28 crimes de acesso ilegítimo.
Porém, o Tribunal da Relação de Lisboa foi mais longe e decidiu pronunciar também BB, relativamente ao qual o Ministério Público se conformara com a decisão de não pronúncia do Tribunal central de Instrução Criminal e não apresentara recurso. Fê-lo, pronunciando-o pela prática daqueles 6 crimes de violação do segredo de justiça, 21 de violação de segredo por funcionário, 9 de acesso indevido e 9 de violação do dever de sigilo. E foi quanto a essa parte que o Supremo Tribunal de Justiça foi chamado a pronunciar-se por recurso interposto pelo Arguido BB.
Ora, no seu acórdão de 03.12.2020, o Supremo Tribunal de Justiça decidiu que o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa fora além do objecto do recurso e, com isso, decidira em violação do caso julgado. Tal excesso de pronúncia tinha que ser corrigido, e isso mesmo fez o Supremo ao revogar o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa na parte em que pronunciou BB pelos crimes relativamente aos quais merecera decisão de não pronúncia na primeira instância.
Não se vislumbra como poderá a situação de co-autoria inicialmente desenhada pelo Ministério Público na acusação levar a que o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça referente a BB possa ser extensível ao Recorrente. Porque, como resulta da análise agora realizada, as posições processuais dos dois acusados são diferentes no momento em que o Supremo Tribunal de Justiça se pronuncia.
Ainda assim, atentemos na posição de comparticipação criminosa desenhada com a acusação original. São elementos da co-autoria a execução conjunta do facto; que tal execução ocorra nos termos de um acordo para tal realização conjunta [sendo que tal acordo não pressupõe a participação na elaboração do plano comum, tem de ser expresso, declarado, bastando a sua verificação através de um comportamento que o evidencie, antes ou após o facto praticado]; e o domínio funcional do facto, que se revela pelo facto de o contributo individual de cada agente ser determinante para a verificação do resultado, ou seja, a sua omissão impedir a realização do facto típico tal como previamente planeado.
Ora, a falta de qualquer destes elementos importará que não se faça prova de uma situação de co-autoria e pode reportar-se apenas a um dos agentes. Quer isto dizer que, quando o Tribunal decide não pronunciar um dos Arguidos acusado como co-autor, tal não terá que se estender necessariamente aos demais.
Já em sede de recurso, há, efectivamente, situações nas quais a procedência de um recurso quanto a um dos co-autores, pode aproveitar aos demais. Nomeadamente, citamos a título de exemplo, a decisão que conclua que os factos não ocorreram.
Nasce tal possibilidade do disposto no artigo 402.º do Código de Processo Penal, segundo o qual o âmbito do recurso se alargará nos seguintes termos:
«1-Sem prejuízo do disposto no artigo seguinte, o recurso interposto de uma sentença abrange toda a decisão.
2-Salvo se for fundado em motivos estritamente pessoais, o recurso interposto:
a) Por um dos arguidos, em caso de comparticipação, aproveita aos restantes;
b) Pelo arguido, aproveita ao responsável civil;
c) Pelo responsável civil, aproveita ao arguido, mesmo para efeitos penais.
3-O recurso interposto apenas contra um dos arguidos, em casos de comparticipação, não prejudica os restantes.»
Desta forma, quando a primeira instância não pronunciou BB, não tinha que o fazer de igual forma quanto ao Arguido agora Recorrente. Aliás, quanto a este, apenas numa parte decidiu de igual forma pela não pronúncia, mantendo a pronúncia quanto aos demais crimes.
Mas, como o Ministério Público não se conformou com a decisão nesta parte, obteve vencimento em sede de recurso e conseguiu que o Tribunal da Relação de Lisboa determinasse o julgamento de AA pelos crimes que tinham merecido decisão de não pronúncia.
A decisão do Supremo Tribunal de Justiça versa sobre outro segmento decisório. Aquele em que o Tribunal da Relação de Lisboa reverte uma decisão da primeira instância que, referindo-se a BB, não estava a ser alvo de reapreciação. Por esse motivo, apenas quanto a esse segmento, pode ser válida a conclusão do Supremo Tribunal de Justiça sobre excesso de pronúncia.
Consequentemente, e nesta parte, não se vislumbra qualquer violação do disposto no citado art.º 402.º/2, sendo acertado o entendimento de que o segmento decisório do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça relativamente ao co-arguido BB não é extensível ao Recorrente AA.
b)- da nulidade do despacho recorrido
É nulo o despacho recorrido que decidiu que tal decisão de não pronúncia não produz efeitos quanto ao Arguido agora Recorrente?
As nulidades em processo penal estão especificamente desenhadas e previstas na lei processual. No art.º 119.º do Código de Processo Penal estão tipificadas as nulidades insanáveis, absolutas nos seus termos. No art.º 120.º do Código de Processo Penal elencam-se as nulidades dependentes de arguição, ou susceptíveis de sanação. Destas, para além das especificamente ali enunciadas, há que destacar todas as nulidades cominadas noutras disposições legais, ou seja, particularmente previstas nalguns dos passos do processo.
Qualquer outro desvio ao processo, tal como construído nos respectivos normativos, importa apenas a verificação de irregularidade, com consequências moderadas e, amiúde, sem relevância para o desfecho da causa.
O desvio apontado pelo recorrente ao despacho recorrido reportava-se à incorrecta aplicação do disposto no art.º 402.º do Código de Processo Penal. Como já vimos supra, não assiste razão ao seu entendimento, razão pela qual improcede o recurso, mantendo-se inalterada a decisão que indeferiu que o segmento decisório do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça relativamente ao co-arguido BB seja extensível ao Recorrente AA.
c)-da legitimidade do Ministério Público
Passando agora para o recurso final do Arguido AA, a primeira questão que se coloca é a de saber se o Ministério Público carece de legitimidade para acusar o Arguido pelos crimes de violação do segredo de justiça e crimes de acesso indevido, por falta de queixa.
A questão suscitada não é nova, e já foi objecto de decisão no processo, mormente no despacho de 06.09.2021, no qual decidiu o Tribunal de primeira instância: «Como facilmente se constata do invocado pelo arguido, embora a nulidade arguida se estribe, em termos gerais, na falta de legitimidade do Ministério Público para deduzir acusação relativamente aos vinte e um crimes de violação do segredo por funcionário, nove crimes de acesso indevido e nove de violação de sigilo, por falta de queixa, na realidade, aquilo que invoca quanto aos vinte e um crimes de violação do segredo por funcionário é que não existe queixa porquanto a mesma foi apresentada extemporaneamente, e já quanto aos nove crimes de acesso indevido e nove violação de sigilo, só consegue invocar a inexistência de queixa quando considerado o tipo de crime base ou simples e não os crimes na forma agravada que foram imputados ao arguido, posto que quanto a estes não se exige queixa, daí o arguido vir invocar a falta de indícios que permita a imputação de tais crimes na forma agravada, para, reconduzindo-se aos tipos de crime simples, poder assumir relevo a alegada falta de queixa.
Não poderemos deixar de salientar que esta matéria foi já considerada e apreciada no acórdão do Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, mormente no que tange com a tempestividade da queixa apresentada pelo GG, IP, sendo que quanto à existência de indícios suficientes que sustentem a imputação ao arguido de todos os crimes pelos quais foi acusado/pronunciado ela foi, igualmente, avaliada, pois caso contrário o arguido não teria sido acusado/pronunciado.
(…)
Já quanto aos crimes de acesso indevido e violação de sigilo, defende o arguido que apesar de o Ministério Público acusar o arguido pelas agravantes do artigo 44.º, n.º 2, al. b) e c), e do artigo 47.º, n.º 2, alíneas a) e b), da Lei 67/98, de 26 de outubro, as mesmas não se verificam, pois inexistem nos autos, indícios para tal.
E, ainda que se verifiquem indícios dos acessos, a verdade é que, em momento algum resulta indiciado que o arguido tenha proporcionado o conhecimento de tal a terceiros, nem que, com isso, tenha recebido benefícios ou vantagem patrimonial, inexistindo nexo causal.
Não existindo matéria indiciária das circunstâncias agravantes e exigindo o procedimento criminal no caso dos tipos de crime simples queixa, carecia o Ministério Público de legitimidade para a ação penal, porquanto ninguém a apresentou.
Acima já se havia salientado que quanto a estes tipos de crimes o arguido só consegue invocar a falta de legitimidade do Ministério Público ancorando-se nos tipos simples ou base.
(…)
Refere o arguido que não existem indícios suficientes que permitam imputar-lhe os crimes em causa na forma agravada.
Dado que a imputação operada ocorreu na sequência de uma acusação, seguida de pronúncia, apreciada mesmo pelos Tribunais Superiores, é porque se considerou que esses indícios existiam. De qualquer modo, não tem este Tribunal qualquer competência para, nesta fase processual, aferir da existência ou não de indícios suficientes da prática dos crimes pelos quais os arguidos estão acusados/pronunciados.
Consequentemente, o arguido não pode afastar, como pretende, a agravação dos crimes de acesso indevido e violação de sigilo, para poder enquadrar os factos nos tipos base e, dessa forma, fazer relevar a questão da necessidade de queixa.
Ademais, mesmo que considerássemos os tipos simples ou base, face ao supra exposto quanto aos crimes de violação de segredo profissional, vimos já que existiu queixa atempadamente apresentada.
Nestes termos, carece de fundamento a invocação da existência de ilegitimidade do Ministério Público para prosseguir com a ação penal, por falta de queixa, e geradora de nulidade, motivo pelo qual improcede a questão prévia suscitada pelo arguido AA ..»
Chegados agora ao momento da decisão final, já se conhecem os factos, não apenas indiciários, mas sim factos provados, que passaram pelo crivo da audiência de julgamento e foram validados com a produção de prova.
Ainda assim, constrói a defesa a argumentação de que «Percorridos os autos, resulta que nenhuma participação/queixa da entidade que superintende o serviço - GG - foi apresentada, tendo o Ministério Público, na sequência da denúncia anónima, partido, sem mais, para a investigação que fez como bem entendeu, terminando com a acusação - e agora com a condenação - para o qual não dispondo de legitimidade, situação que gera nesta parte a nulidade da acusação/pronúncia e por consequência a nulidade da condenação, impondo-se a absolvição do arguido pela prática destes crimes
Compulsada a condenação, constata-se que o Arguido foi condenado pela prática de seis crimes de violação de segredo de justiça, p. e p. no art.º 371.º/1 do Código Penal, segundo o qual «Quem, independentemente de ter tomado contacto com o processo, ilegitimamente der conhecimento, no todo ou em parte, do teor de acto de processo penal que se encontre coberto por segredo de justiça, ou a cujo decurso não for permitida a assistência do público em geral, é punido com pena de prisão até dois anos ou com pena de multa até 240 dias, salvo se outra pena for cominada para o caso pela lei de processo (…)». Ou seja, os crimes pelos quais o Arguido foi condenado não dependem de queixa, tendo natureza pública, pelo que não se coloca qualquer questão de legitimidade do Ministério Público.
Porque insiste o Arguido nesta construção, então? Apelando ao disposto no art.º 383.º do Código Penal, o qual prevê o crime de “violação de segredo por funcionário”, o qual integra o Capítulo IV, Secção IV, relativo aos crimes cometidos no exercício de funções públicas e à violação de segredo. Este tipo corresponde a uma incriminação distinta daquela pela qual o Arguido se mostra condenado.
Com efeito, o crime de violação de segredo de justiça do art.º 371.º/1 está integrado no Capítulo III, reservado aos crimes contra a realização da justiça pelo que tutela um bem jurídico distinto, não se confundindo uma incriminação com a outra.
Pretender estender ao crime de violação de segredo de justiça a mesma natureza que o crime de violação de segredo por funcionário é desprovido de fundamento legal e viola o princípio da tipicidade penal. Como tal, improcede a pretensão do Arguido de ver declarada a ilegitimidade do Ministério Público para acusar por factos correspondentes à prática deste crime, invocando a inexistência de participação do GG.
Tanto assim é que, no que toca aos vinte e um crimes de violação do segredo por funcionário pelos quais vinha pronunciado, o Arguido foi absolvido.
No que respeita ao crime de acesso indevido, o mesmo está consagrado no art.º 47.º/1 da L. 58/2019, segundo o qual «Quem, sem a devida autorização ou justificação, aceder, por qualquer modo, a dados pessoais é punido com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias».
A decisão recorrida condenou o Arguido por esse mesmo tipo de crime - «-9 (nove) crimes de acesso indevido, p. e p. pelo artigo 47.°, n.° 1, da Lei n.° 58/2009, de 26 de outubro, na pena de 6 (seis) meses de prisão por cada um desses crimes». À luz desta versão da lei, o procedimento criminal não depende de queixa e o crime assume natureza pública.
Porém, o Arguido, no seu recurso, em vez de apelar a este preceito, aponta como incriminação o crime p. e p. pelo art.º 44.º/1 da Lei 67/98 de 26.10, diploma este revogado por aqueloutro, de 2019. Com efeito, a incriminação constante da pronúncia passava por esse artigo mas não se quedava pelo n.º1, acrescendo o n.º 2, al. b) e c).
Atenta a data da prática dos factos, coloca-se, então, uma questão de sucessão de leis no tempo e foi essa a abordagem feita no acórdão recorrido o qual explica claramente a razão pela qual não foi aplicada a lei já revogada, a lei antiga, antes sendo aplicada a lei nova. - «A conduta do arguido AAacima descrita, que se considerou estar provada, preenche os elementos objetivos e subjetivos, quer do tipo de crime de acesso indevido, quer do tipo de crime de violação do dever de sigilo, e quer de acordo com o regime jurídico-penal vigente à data da prática dos factos (Lei n.° 67/98), quer ao abrigo do regime jurídico-penal que lhe sucedeu (Lei n.° 58/2019).
Contudo, face aos factos provados, a sua conduta preenche a tipicidade do crime de acesso indevido da Lei n.° 67/98 agravado pela alínea b) do n.° 2 (por ter possibilitado ao agente ou a terceiros o conhecimento de dados pessoais), mas não preenche a agravante da alínea c) uma vez que não resulta demonstrado que com esta conduta tenha proporcionado a terceiros benefício ou vantagem patrimonial (até porque não ficou demonstrado em concreto qual a utilização que foi dada às informações acedidas, salientando-se que não basta fazer referência a um conceito genérico para que possamos considerar verificada a agravante em causa).
E preenche a tipicidade do crime de violação de dever de sigilo da Lei n.° 67/98 agravado pela alínea a) do n.° 2, pelos factos terem sido praticados por funcionário público, mas não pela alínea b) do mesmo artigo, uma vez que não se demonstrou que os acessos tenham sido determinados pela intenção de obter qualquer vantagem patrimonial ou outro benefício ilegítimo.
Já face à lei posterior, a tipicidade do crime de acesso indevido da Lei 58/2019 foi preenchido na forma simples, por não se verificar a agravante da alínea b) do n.° 3, já que não se provou que o agente tenha proporcionado terceiros benefício ou vantagem patrimonial.
E a tipicidade do crime de violação de dever de sigilo da Lei 58/2019 é preenchida com a agravante da alínea a) do n.° 2, por o agente ser trabalhador em funções públicas ou equiparado, nos termos da lei penal, não se verificando qualquer que respeita ao agente ter sido determinado pela intenção de obter qualquer vantagem patrimonial ou outro benefício ilegítimo, da alínea c) (pelos mesmos motivos já expostos), mas verificando-se também a agravante decorrente de o agente ter posto em perigo a reputação, a honra ou a intimidade da vida privada de terceiros, alínea d), uma vez que se provou que na sequência da do acesso aos dados estes acabaram por ser utilizados com tais contornos.
No entanto, importa ter presente que, de acordo com o regime da Lei n.° 67/98, a atuação do arguido preenche os elementos típicos do n.° 1 do citado artigo 44.°, bem como a circunstância modificativa agravante prevista na alínea b) do n.° 2 do mesmo preceito legal. Estaria assim em causa a prática do crime de acesso indevido agravado [artigo 44.°, n.°s 1 e 2, alínea b)] e do crime de violação do dever de sigilo agravada [artigo 47.°, n.°s 1 e 2, alínea a)]. Sucede que entre este crime de violação do dever de sigilo e a agravação do crime de acesso indevido prevista na alínea b) do n.° 2 do artigo 44.° verifica-se uma situação de concurso aparente ou de normas. Como refere Paulo Pinto de Albuquerque, o concurso de normas (também designado por concurso aparente ou concurso legal de crimes) consiste na subsunção formal dos factos a uma pluralidade de tipos criminais, sendo a aplicação de um desses tipos incriminadores suficiente para punir o facto, que no caso em apreço ocorre por via de uma relação de especialidade que, de acordo com o mesmo Autor, se verifica quando duas normas se encontram numa relação de género e espécie, ou seja, quando duas normas têm os mesmos elementos típicos, mas uma delas apresenta ainda outros elementos distintivos que a particularizam.
Assim, consumindo a previsão do crime de violação do dever de sigilo a circunstância modificativa agravante do crime de acesso indevido prevista na alínea b) do n.° 2 do artigo 44.°, subsistiria, para além daquele crime de violação do dever de sigilo, o crime de acesso indevido, mas na sua forma simples, prevista no n.° 1 do artigo 44.°.
Do exposto resulta que na Lei n.° 67/98 a previsão da violação do dever de sigilo exclui a aplicação da circunstância modificativa agravante do crime de acesso indevido prevista na alínea b) do n.° 2 do artigo 44.°. Na Lei n.° 58/2019 deixou de estar prevista a referida circunstância modificativa agravante do crime de acesso indevido, e o crime de violação do dever de sigilo agravado, que está numa relação de concurso efetivo com este ilícito criminal, passou a ser punido de forma menos gravosa do que o era o crime de violação do dever de sigilo agravada da Lei n.° 67/98.
Estando em causa uma situação de sucessão de leis penais e, portanto, a aplicação do disposto no artigo 2.°, n.° 4, do Código Penal, o regime atualmente em vigor é aquele que é mais favorável ao arguido AA ., por ser aquele que consagra uma moldura penal abstrata inferior (já que quanto ao crime de acesso indevido há a considerar nos dois regimes o tipo simples, com a mesma moldura penal, e quanto ao crime de violação de dever de sigilo o tipo agravado, que na Lei 58/2019 é punida com moldura menos gravosa).
Assim, o tribunal optará pela aplicação deste regime legal agora vigente (sendo que não existe necessidade de comunicar ao arguido esta alteração de qualificação jurídica, por se tratar do mesmo tipo de crime e da aplicação de uma versão legal que lhe é mais favorável).»
Explicando exaustivamente o raciocínio seguido para a resolução do concurso aparente de normas e, assim, concluir pela prática do crime de acesso indevido, o Tribunal a quo justificou a escolha da lei nova como a mais favorável, aplicando-a.
Com efeito, a nova versão do tipo criminal revogou a versão anterior, na íntegra. Por isso, o Tribunal não pode aplicar apenas uma parte da norma antiga ou uma parte da norma nova, antes tendo que conhecer de forma global e sistemática o âmbito de cada incriminação. Assim, terá sempre que optar por uma ou outra das versões do crime, em toda a sua amplitude. E, como explicado no acórdão recorrido, a norma incriminadora antiga é, concretamente, mais desfavorável ao Arguido.
Deste modo, apelar à necessidade de queixa prevista na norma revogada não tem fundamento, pois foi a lei nova a sustentar a condenação do Arguido. E esta última já não prevê a natureza semi-pública do crime, que apenas existia na versão simples do mesmo que, como vimos, nem sequer era aplicável à condição do Arguido, à luz da lei antiga.
Como tal, e face ao exposto, não merece acolhimento a pretensão do Arguido ver declarada a ilegitimidade do Ministério Público para acusar pelos factos que determinaram a sua condenação pela prática do crime de acesso indevido.
d)-do invocado vício de contradição entre factos provados e não provados
São dois os pontos identificados pelo recurso nos quais, segundo o recorrente, existe uma contradição entre os factos provados e os não provados.
Assim, «O Tribunal a quo comete um erro, verificando-se contradição entre factos provados e não provados, na medida em que dá como provado a oferta de artigos de ... - no plural, o que indica a existência de várias prendas -, quando, na verdade, só foi feita prova da entrega de um casaco, casaco esse oferecido pelo arguido CC, nada mais é do que uma lembrança de Natal, bastando ter em atenção na data em que o mesmo foi oferecido - ... ... contra o Portimonense, a 20 de dezembro de 2017, pago com cartão do próprio arguido CC.»
Dos factos provados resulta que (facto 21) - O arguido AA recebeu, ainda, produtos de ..., como camisolas e casacos da equipa de ... e, ainda, promessa de contrato de trabalho no …, pertencente ao ..., para um sobrinho daquele, assim como tratamento privilegiado no ..., designadamente sendo-lhe facilitado o acesso ao contacto com os jogadores da equipa principal de ... profissional masculino nos espaços que passou a frequentar.
A contradição entre factos provados e não provados importa que o Tribunal dê como provada uma realidade, da qual ficou convicto, incompatível com a decisão de que um outro facto não ficou provado quando, analisada a prova, a resposta deveria ter sido no mesmo sentido para ambos os factos.
Ora, o que o Arguido Recorrente vem dizer, é que o facto provado referente ao recebimento de um casaco não poderia ir mais além do que isso, pois não ficou provado o recebimento de qualquer outro artigo de ....
Compulsados os factos não provados, destes consta que não ficou provada a entrega deste tipo de artigos ao Arguido BB, pelo que não há contradição entre os factos provados e não provados.
Quanto à convicção do Recorrente de que só foi feita prova da entrega de um casaco, choca a mesma com a fundamentação do acórdão que explica as razões pelas quais se convenceu o julgador de que outras ofertas existiram, nomeadamente de peças de vestuário que, naturalmente, se enquadram na expressão que constava da pronúncia e passou para o elenco dos factos provados. Com efeito, da fundamentação, consta, a dado passo, que: «Esta conversa é bem reveladora da expetativa que o arguido AAtem de receber da parte do arguido CC ofertas, sendo que nos autos apenas são referidos ...para ... de ... ou peças de vestuário, pelo que não podemos extrapolar que tenham existido ofertas de outra natureza. Certo é que as referidas ofertas não surgem de forma esporádica e inopinada. Este é um exemplo de que como, na relação criada entre os dois arguidos, não existem ofertas que sejam verdadeiramente inesperadas; a esta data estava criada claramente no arguido AAa expetativa de receber oferendas, o que, de acordo com as regras da experiência comum, se compreende no contexto de disponibilidade em que o mesmo se colocou face ao arguido CC e, por outro lado, na permeabilidade que este último foi conseguindo obter do arguido AAcom as oferendas que ao longo dos anos lhe foi fazendo.»
Não há, pois, nesta parte, a invocada contradição, seja entre factos provados e não provados, seja entre os factos e a respectiva fundamentação.
A segunda situação apontada respeita a: «No que ao crime de peculato respeita, verifica-se uma contradição entre os factos provados - 225, 226 e 227- e não provados - BA - o que gera, nesta parte, a nulidade do Douto Acórdão.»
Compulsados os apontados factos, aqui os reproduzimos. Está provado que:
«225- Ao transportar para a sua residência e colocar em uso, para fins particulares, os equipamentos informáticos atrás descritos, o arguido AA fez seus tais equipamentos, bem sabendo que pertenciam ao Estado (...).
226- O arguido [atoou] actuou com o propósito, concretizado, de fazer seus e usar em proveito próprio equipamentos com o valor supra descrito, que bem sabia não lhe pertencerem, os quais sabia afetos à atividade pública, e cujo acesso apenas lhe era possibilitado em razão das funções que desempenhava ao serviço do ..., o que quis e conseguiu.
227- O arguido sabia que, dessa forma, atuava sem autorização e contra a vontade do ..., em detrimento do serviço público prosseguido por esta entidade, atingindo assim os deveres e obrigações decorrentes das suas funções de natureza pública e estatuto profissional.»
Já na matéria de facto não provada consta que:
«BA- O arguido AAatuou com o propósito, concretizado, de fazer seus e usar em proveito próprio equipamentos de valor concreto superior a € 102,00.»
Comecemos pela análise da fundamentação do acórdão quanto a este facto não provado, pois a mesma delimita o âmbito da leitura do Tribunal a quo e permite alicerçar a apreciação que compete agora ao recurso. Diz-se no acórdão que «O que não ficou provado neste trecho da matéria de facto respeito ao valor dos bens, pelos motivos já expostos e que aqui de dão por reproduzidos.»
E o que antes se diz quanto aos valores dos equipamentos é que: « A fls. 2438 a 2439 consta a informação prestada pela ... sobre o valor de parte do material informático apreendido nos autos.
Quanto a esta informação, cumpre salientar que foi a que o tribunal teve em consideração para demonstrar o valor dos bens que foram apreendidos ao arguido AA ., pois trata-se do valor que lhes foi atribuído pela própria entidade que forneceu o equipamento.
Não se escamoteia que existe um auto de exame direto e avaliação destes bens realizado pela Polícia Judiciária, que aponta para valores distintos. Todavia, face àquilo que é o valor indicado pela própria entidade proprietária dos bens e ao valor indicado por inspetores da Polícia Judiciária, sem que se tenha explicitado porque razão alcançam valores distintos dos indicados pela ..., o tribunal tem que ter como adequados os valores indicados pela ... (e que estão até em consonância com aquilo que as testemunhas que eram «responsáveis» pelo equipamento em causa vieram declarar em tribunal sobre o assunto).
Quanto ao último computador indicado no despacho de pronúncia - computador HP PROdesk 600 G1 Base Model Tower PC - a ... não indicou o valor do mesmo, nem o GG, pelo que o tribunal teria apenas como referência o valor indicado na avaliação realizada pela Polícia Judiciária. Todavia, face à diferença de valores já mencionada, ficou o tribunal com dúvidas sobre o valor real desse equipamento, pelo que se deu como provado que não foi possível apurar qual fosse.»
Ora, quando no facto 225 se referem os equipamentos informáticos atrás descritos, o Tribunal reporta-se ao facto provado 200, no qual todos os equipamentos estão referidos sem qualquer valor apurado, pelas razões acima enunciadas, com excepção de uma impressora no valor de €77,16. Como tal, sendo este valor inferior aos €102,00 do facto da pronúncia, bem esteve o Tribunal em deixar tal concretização monetária cair para o elenco dos factos não provados.
Inexiste, assim, qualquer contradição entre os apontados factos provados e não provados.
e)-do erro na apreciação da prova
Segundo o Recorrente, existe erro na apreciação da prova, tendo sido dados como provados factos para os quais não foi produzida prova.
Onde aponta o Recorrente tais erros?
Segundo o Recorrente, os factos dados como provados em 16,17,18,19,20,21,22,25,27,28,29 - excecionado os acessos aos proc.° 15477/16.4T8LSB, proc.° n.° 5340/17.7T9LSB e proc.º n.° 997/18.4T9LSB -, 31, 34, 35, 36, 38, 40, 43, 46, 47, 48, 51, 52, 53, 57, 58, 63, 64, 65, 68, 69, 70, 75, 76, 78, 79, 82, 83, 95, 96, 97, 98,100,101,104,105,106,107,108,148 - excetuando a consulta ao inquérito com o número 5340/17.7T9LSB -183,184,185,202, 203, 204, 205, 206, 207, 208, 209, 210, 211, 212, 213, 214, 215, 216, 217, 218, 220, 221, 222, 223, 224, 225, 226, 227, 228, 234, 235, 236, 237, 240, 241, 242, 243, 244, 246, 259, 260, 261, 262, 263, 273, 274, 275, 276, 277, 278, 282 e 283, deveriam ser dados como não provados.
No seu entender, a conclusão de que o arguido AA era autor de acessos não autorizados a processos judiciais, em troca de benefícios junto do..., sendo corrompido pelo arguido CC para esse efeito, é feita sem qualquer base probatória concreta.
Não nega o recurso do Tribunal à prova indireta, mas afirma-o sem sustento legal, pelo que conclui que tal solução ocorreu em violação do princípio da livre apreciação da prova. Comecemos, pois, por aqui.
[da prova indirecta]
Nada obsta ao recurso da figura da prova indirecta para obter uma resposta quanto à matéria de facto levada à apreciação do Tribunal. Com efeito, «Sabido é que o tribunal a quo pode prevalecer-se da prova indirecta ou indiciária para chegar à convicção que formou, pois esta prova (que se distingue da prova directa) é admissível pelo nosso ordenamento jurídico.
A prova indirecta ou indiciária reporta-se a factos diversos do tema da prova, mas que permitem, com o auxílio de regras da experiência (sendo estas “definições ou juízos hipotéticos de conteúdo genérico, independentemente do caso concreto sub judice, assentes na experiência comum e por isso independentes dos casos individuais em cuja observação se alicerçam, mas para além dos quais têm validade.
A eficácia probatória da prova indiciária está dependente da verificação de quatro requisitos, a saber: a prova dos indícios; concorrência de uma pluralidade de indícios; raciocínio dedutivo entre os indícios provados e os factos que deles se inferem, devendo existir um nexo preciso, directo, coerente, lógico e racional.
Se o tribunal recorre à prova indiciária, tem de dar a conhecer o seu raciocínio dedutivo e, sendo este omitido, impede a instância de recurso de sindicar se efectuou (ou não) uma apreciação objectiva da prova produzida, em conformidade com as regras da experiência, da lógica e dos conhecimentos científicos.» [ac. Tribunal da Relação de Lisboa de 24/09/2019, Desembargador Artur Vargues, ECLI:PT:TRL:2019:294.17.2JGLSB.L1.5.7B](negrito nosso).
Como este mesmo Desembargador acrescenta, no acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 12/09/2023, [ECLI:PT:TRE:2023:147.21.0PCSTB.E1.1E], «De acordo com o artigo 349º, do Código Civil, “presunções são as ilações que a lei ou o julgador tira de um facto conhecido para afirmar um facto desconhecido”, admitindo-se as presunções judiciais nos casos e termos em que é admitida a prova testemunhal, como se extrai do artigo 351º do mesmo.
E é perfeitamente possível o recurso à prova indirecta ou indiciária para chegar à convicção que formou o tribunal a quo, pois esta prova (que se distingue da prova directa) é admitida no nosso ordenamento jurídico também no âmbito do processo penal – cfr. neste sentido, entre outros, os Acs. do STJ de 11/12/2003, Proc. nº 03P3375; 07/01/2004, Proc. nº 03P3213; 09/02/2005, Proc. nº 04P4721; 04/12/2008, Proc. nº 08P3456; 12/03/2009, Proc. nº 09P0395 e de 18/06/2009, Proc. nº 81/04PBBGC.S1, todos disponíveis em www.dgsi.pt e também o Ac. do Tribunal Constitucional nº 391/2015, em DR nº 224, II Série, de 16/11/2015, que decidiu não julgar inconstitucional a norma constante do artigo 127º, do CPP, na interpretação de que a apreciação da prova segundo as regras da experiência e a livre convicção do julgador permite o recurso a presunções judiciais em processo penal –assim também o Acórdão deste mesmo Tribunal nº 521/2018, de 17/10/2018, que pode ser lido no respectivo sítio.
A prova indirecta reporta-se a factos diversos do tema da prova, mas que permitem, com o auxílio de regras da experiência, da lógica, do raciocínio indutivo e inferência, extrair uma ilação quanto ao tema da prova.»
No mesmo sentido encontramos o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 23/11/2006, Conselheiro Santos Carvalho, [ECLI:PT:STJ:2006:06P4096.3A] «As normas dos artigos 126° e 127° do CPP podem ser interpretadas de modo a permitir que possam ser provados factos sem que exista uma prova directa deles. Basta a prova indirecta, conjugada e interpretada no seu todo.
Essa interpretação não ofende quaisquer princípios constitucionais, como o da legalidade, ou das garantias de defesa, ou da presunção de inocência e do contraditório, consagrados no art.º 32.°, n.º 1, 2, 5 e 8 da Constituição da República Portuguesa, desde que haja uma fundamentação crítica dos meios de prova e um grau de recurso em matéria de facto para efectivo controlo da decisão.»
Ou seja, não há que temer a prova indirecta. Existem regras para a sua utilização e não produz decisões arbitrárias ou incoerentes. Tem um substracto objectivo e é fruto de um processo sindicável. «A prova indirecta (ou indiciária) não é um “minus” relativamente à prova directa. Pelo contrário, pois se é certo que na prova indirecta intervêm a inteligência e a lógica do julgador que associa o facto indício a uma regra da experiência que vai permitir alcançar a convicção sobre o facto a provar, na prova directa intervém um elemento que ultrapassa a racionalidade e que será muito mais perigoso de determinar, como é o caso da credibilidade do testemunho. No entanto, a prova indirecta exige um particular cuidado na sua apreciação, uma vez que apenas se pode extrair o facto probando do facto indiciário quando tal seja corroborado por outros elementos de prova, de forma a que sejam afastadas outras hipóteses igualmente possíveis.
A nossa lei processual penal não estabelece requisitos especiais sobre a apreciação da prova indiciária, pelo que o fundamento da sua credibilidade está dependente da convicção do julgador que, sendo embora pessoal, deve ser sempre motivada e objectivável, nada impedindo que, devidamente valorada, por si e na conjugação dos vários indícios e acordo com as regras da experiência, permita fundamentar a condenação.» - ac. Tribunal da Relação de Lisboa de 16/11/2010, Desembargadora Alda Tomé Casimiro ECLI:PT:TRL:2010:3607.05.6TASNT.L1.5.D3.
Revelou a decisão recorrida o cuidado de expressar o quão consciente foi o recurso à prova indirecta, indicando os pressupostos desse mesmo recurso, e indicando-o pontualmente à medida que foi desenvolvendo as referências probatórias de cada parcela da matéria de facto. Fê-lo de forma ampla, socorrendo-se de inúmera jurisprudência e doutrina que, pela sua pertinência, sem necessidade de reprodução. Vale pelo reforço do acima explanado, e pela demonstração do correcto recurso a este tipo de prova que o tribunal desenvolveu ao longo da sua decisão.
Por exemplo, fê-lo para alcançar a autoria dos diversos acessos, de forma que não merece reparo: «A fls. 52 a 63 dos autos consta cópia do auto de busca, realizado pela Polícia Judiciária em 19 de outubro de 2017. no âmbito do inquérito com o NUIPC 5340/17.7T9LSB, que corria termos na 9.ã secção do DIAP de Lisboa, no escritório do arguido CC, no ..., onde foram localizados e apreendidos um conjunto de documento que se percebe terem sido extraídos da plataforma Citius (até porque existe um histórico do processo - fls. 60 a 62 - que só nessa plataforma pode ser obtido), relativos a esse mesmo inquérito, os quais estavam no interior de um livro.
O arguido CC nas suas declarações reportou-se à forma como estes elementos chegaram à sua posse, mas sobre isso falaremos em momento oportuno.
De todo o modo, o que se pode constatar pela documentação, que comprova o acesso ao processo em questão, conjugado com a análise feita aos acessos ao Citius, é que este foi um dos processos que mais vezes foi acedido. Mas que a primeira vez que foi acedido foi em 15 de junho de 2017, pelo que confrontando essa data com o que está impresso e que é o processado até 14 de junho de 2017, há que concluir que o que foi entregue ao arguido CC e que este guardou no seu gabinete foi precisamente o resultado desse primeiro acesso, que ocorreu numa fase ainda inicial do processo, o que não terá sido, com certeza, mera coincidência.
Retomaremos este tema a propósito da valoração das declarações prestadas pelo arguido CC sobre esta matéria.
Mas, este é um dos elementos que contribui para a conclusão de que o arguido AA fez o acesso a estes processos e transmitiu ao arguido CC o resultado daquilo que visualizou, embora nas demais situações possam não existir, como existiu neste caso, documentação impressa que comprova o que, logo, no primeiro acesso, e numa fase embrionária do inquérito, foi transmitido ao arguido CC. Trata-se, contudo, de um pressuposto que poderá ser valorado ao nível da prova indiciária, para nos permitir concluir que a seguir aos acessos se seguia a transmissão da informação visualização ao arguido CC, ainda que nem sempre possa ter havido necessidade de fazer impressão do que era visualizado.»
Mais adiante, conjugando a prova pericial das análises informáticas com a demais provada, escreveu-se no acórdão recorrido: «O tribunal, conjugando toda esta prova respeitante aos acessos realizados, quer por aquilo que havia sido auditado pelo GG na fase de inquérito, quer pela perícia realizada ao material informático apreendido, quer ainda através da prova oralmente produzida a esse propósito, alcançou a conclusão segura de que foi o arguido AA quem realizou todos os acessos comprovados nos autos, ainda que parte deles e mormente aqueles que ocorreram quando se encontrava em período de férias, possam ter sido realizados remotamente.
Trata-se de conclusões seguras que a partir das premissas existentes nos autos e por raciocínios lógicos se puderam alcançar, havendo ainda que considerar, quanto a essa matéria também prova produzida oralmente, a que faremos menção em seguida.» Prossegue, então, com a análise de declarações que até sumaria, contribuindo assim para cimentar o juízo realizado para, a partir de certos elementos, extrair outros factos, recorrendo à prova indirecta.
[da valoração da prova]
Quando o Arguido alega que o Tribunal optou por, em sede de motivação, não relevar em devida conta a relação de forte amizade existente entre o arguido AA e o arguido CC, faz um juízo de intenção completamente desprovido de fundamento, insinuando uma opção discricionária. Não é isso que decorre da fundamentação, quando lida na totalidade e de forma integrada. Dela se retira um percurso lógico e estruturado, no qual o Tribunal assentou as premissas da sua decisão. E em momento algum o Tribunal “optou” por dar um sentido à decisão que não fosse aquele determinado pelos critérios seguidos na sua fundamentação.
Claramente, o que o Arguido pretende é que a valoração da prova seja outra, mais de feição ao seu interesse e de acordo com aquilo que defende. Para si, essa é que é a valoração devida, por contraposição àquela que o Tribunal fez “indevidamente”. Porém, não se vislumbra a razão pela qual a sua visão se deva impor à do Tribunal, expressa no acórdão recorrido, determinando a sua substituição.
Atentemos aos princípios que regem a valoração da prova e avaliemos a bondade da decisão recorrida.
Merecedor de um Livro autónomo no do Código de Processo Penal (art.º 124.º a 190.º) aqui encontramos tais princípios e regras quanto à validade da prova bem como da sua recolha.
Assim, desde logo importa ter presente que «Constituem objecto de prova todos os factos juridicamente relevantes para a existência ou inexistência do crime, a punibilidade ou não punibilidade do arguido e a determinação da pena ou da medida de segurança aplicáveis» (art.º 124.º/1).
Ademais, a convicção sobre a matéria de facto dada como provada terá que resultar da prova produzida em audiência, na qual foi livremente apreciada de acordo com os critérios estabelecidos pelo art.º 127.º; ou seja, tal livre apreciação apenas é limitada nos casos em que a lei dispuser diferentemente.
Este princípio basilar não pode ser confundido com a permissão para o livre arbítrio ou para uma valoração puramente subjectiva. Importa o mesmo a sujeição a critérios lógicos e objectivos que determinam uma convicção racional, concreta e transmissível. O decisor tem que explicar as razões da sua decisão, e estas têm que ser sindicáveis pelo destinatário e, nesta sede, pelo Tribunal de recurso.
Não olvidemos, porém, o factor humano envolvido na função jurisdicional, que incute em cada decisão uma vertente subjectiva inerente ao decisor (singular ou colectivo) pois cada qual contribui com o seu saber e experiência para o resultado que produz. Por essa razão, alude o referido art.º 127.º à «livre convicção».
Deste modo, a livre valoração da prova não é uma actividade exclusivamente subjectiva assente numa inexplicável certeza no julgador causada por sentimentos ou impressões sem consistência. Não pode ser insusceptível de explicação de acordo com critérios racionais, lógicos e críticos, decorrentes quer da experiência comum quer, do saber científico das ciências exactas e das ciências sociais, seja ainda da experiência profissional e pessoal do julgador. Impõe-se que seja demonstrável e explicável na respectiva fundamentação.
Ora «O dever [de fundamentação das sentenças] resultante da Constituição e da lei (CPC) tem por objetivo a explicitação por parte do julgador acerca dos motivos pelos quais decidiu em determinado sentido, dirimindo determinado litígio que lhe foi colocado, de forma a que os destinatários possam entender as razões da decisão proferida e, caso o entendam, poderem sindicá-la e reagir contra a mesma.» [ECLI:PT:STJ:2021:434.17.1T8PNF.P1.S1.39].
Ao Tribunal são apresentados diversos meios de prova que, pela sua natureza, serão apreciados de formas distintas. Poderemos estabelecer a divisão, desde logo, entre a prova pré-constituída, recolhida no processo em momento anterior ao julgamento, e aquela cuja produção ocorreu em sede de audiência.
Na primeira encontramos a chamada prova científica, produzida a partir de vestígios recolhidos e que traduz, sobre os mesmos, uma resposta à luz dos critérios científicos vigentes. Temos também a prova documental, cuja valoração pode estar, ou não, condicionada de acordo com a natureza do documento, seja ele em suporte escrito, áudio, vídeo, físico ou virtual (digital). E ainda poderemos aqui enquadrar a prova decorrente dos objectos apreendidos e juntos ao processo, estejam eles examinados ou não.
Na prova produzida em audiência encontramos a mais volúvel das provas pelo pendor de subjectividade que a sua ponderação acarreta: a prova testemunhal, à qual se junta a apreciação das declarações dos sujeitos processuais, Arguidos, Assistentes e Demandantes.
Neste domínio, o primeiro e mais significativo vector da decisão é o da credibilidade a testemunha ou declarante. Aqui importa referir o papel essencial da imediação, pois a forma como se sucedem questões e respostas, os tempos e a forma destas, as reacções do depoente ou declarante, a sua consistência, as explicações que emergem para discrepâncias, omissões ou certezas, imprimem no decisor uma convicção que nem sempre é racionalmente explicável.
Ultrapassado esse patamar, há que valorar o resultado da produção desse meio de prova, então, explicando qual a análise que sobre os depoimentos ou declarações foi efectuada através de deduções, inferências, aplicação das regras da lógica ou da experiência comum, de conhecimentos científicos, das ciências exactas ou sociais, e quais os resultados que essa análise produziu.
Aqui chegados, ponderemos então o âmbito da apreciação que cabe ao Tribunal de recurso sobre a prova. Citando o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 08.07.2020, relatado pelo Juiz Conselheiro Raul Borges [ECLI:PT:STJ:2020:142.15.8PKSNT.L1.S1.B7], e a síntese do seu sumário, « XIII – A sindicância de matéria de facto consentida pelo artigo 410.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, tem um âmbito restrito, pois nesta forma de impugnação, as anomalias, os vícios da decisão elencados no n.º 2 do artigo 410.º têm de emergir, resultar do próprio texto, da peça escrita, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, o que significa que os mesmos têm de ser intrínsecos à própria decisão, como peça autónoma.
XIV– O erro-vício previsto na alínea c) do n.º 2 do artigo 410.º do Código de Processo Penal não se confunde com errada apreciação e valoração das provas, com o erro de julgamento relativamente à apreciação e valoração da prova produzida.
XV– Tendo como denominador comum a sindicância da matéria de facto, são muito diferentes na sua estrutura, alcance e consequências. Aquele examina-se, indaga-se, através da análise do texto; esta, porque se reconduz a erro de julgamento da matéria de facto, analisa-se em momento anterior à produção do texto, na ponderação conjugada e exame crítico das provas produzidas do que resulta a formulação de um juízo, que conduz à fixação de uma determinada verdade histórica que é vertida no texto; daí que a exigência de notoriedade do erro vício se não estenda ao processo cognoscitivo/valorativo, cujo resultado vem a ser inscrito no texto, só este sendo susceptível de apreciação.
XVI– Por outras palavras. Uma coisa é o vício de erro notório na apreciação da prova, outra é a valoração desta, o resultado da prova, que o recorrente pode considerar não correcta, dela divergir, afrontá-la, só que a manifestação desta divergência, este confronto não é passível de enquadramento em estratégia recursiva atendível (não cabe no plano da impugnação da matéria de facto possível nos quadros restritos consentidos pelo artigo 410.º, n.º 2, como extravasa os limites da mais ampla, mas nem por isso de contornos ilimitados, impugnação nos termos do artigo 412.º, n.º 3 e 4, do CPP).
XVII– Enquanto a valoração da prova, que compete aos julgadores, e só a eles, obedece ao regime do artigo 127.º do CPP e é necessariamente prévia à fixação da matéria de facto, o vício da alínea c), bem como os demais constantes das alíneas a) e b) do n.º 2 do artigo 410.º do CPP, só surge perante o texto da decisão proferida em matéria de facto, que resultou daquela valoração da prova.
XVIII– Estamos perante duas realidades que correspondem a dois passos distintos, sequenciais, tendo uma origem na outra: o de aquisição processual em resultado do julgamento; um outro, posterior, de consignação do que se entendeu ter ficado provado e não provado, no exercício final de um juízo decisório que se debruçou sobre a amálgama probatória carreada para os autos e dissecada/ponderada/avaliada após o exame crítico das provas, no seu conjunto e interligação, no ... dialéctico das conexões, proximidades, desvios, disfunções, antagonismos.
XIX– A primeira relaciona-se com a actividade probatória que consiste na produção, exame e ponderação crítica dos elementos legalmente admissíveis - excluídas as provas proibidas - a habilitarem o julgador a formar a sua convicção sobre a existência ou não de concreta e determinada situação de facto.
XX– O erro vício será algo detectável, necessariamente a juzante desse iter cognoscitivo/deliberativo, lançado no texto da decisão, cujo sentido e conformação resultou da convicção assumida, que tem a natureza intrínseca de um “produto” de uma reflexão sobre dados adquiridos em registo de oralidade e imediação e que a partir daí ganha alguma cristalização.
XXI– Será, se assim quisermos apelidar, no processo cognoscitivo/decisório da matéria de facto, um “produto de terceira geração”, sendo o primeiro passo a aquisição processual com a produção das provas em julgamento; em segundo lugar, a avaliação crítica do acervo probatório adquirido; por último, a formulação do juízo integrativo ou não.
XXII– Não se pode confundir o vício de erro notório na apreciação da prova com a valoração desta. Enquanto esta obedece ao regime do artigo 127.º do CPP e é prévia à fixação da matéria de facto, aquele – bem como os demais vícios constantes das alíneas do n.º 2 do art.º 410.º do CPP – só surgem perante o texto da decisão em matéria de facto que resultou daquela valoração da prova”.»
Como já se enunciou acima, a fundamentação de facto do acórdão, extensa e minuciosa, cuida de explicar os raciocínios seguidos para alcançar a resposta dada aos factos provados e, consequentemente, aos não provados.
Certamente se compreende que o Arguido pretendesse outra decisão, apreciando subjectivamente a prova produzida, inspirado pela proximidade que tem aos acontecimentos e a percepção que interiorizou com o decorrer dos factos e do tempo. Por isso é que a questão é apreciada, para decisão, por um Tribunal isento, que conhece da matéria com base naquilo que é produzido em audiência e tem um olhar virgem sobre a prova. E esse olhar, sem preconceito ou pre-juízo, produziu uma decisão correctamente fundamentada que se sustenta pela sua coerência. Logo, carece de fundamento a pretensão do Arguido de ver alterada a matéria provada e não provada.
Veja-se, a conclusão do Recorrente de que nenhum dos acessos foi realizado mediante contrapartida e/ou vantagem, nem tal alguma vez lhe foi prometida pelo co-arguido, Defende antes que o fez sempre como favor de amigo, pela sua simpatia clubística e por uma necessidade natural de se sentir agradável, simpático e cordial junto do seu amigo CC. Porém, como acima já vimos, ficaram provadas ofertas que o Tribunal, recorrendo às regras da experiência comum e ao natural encadeamento dos factos, relacionou com os actos praticados. É fácil, para quem está directamente envolvido nos factos, procurar designações mais brandas, explicações mais favoráveis, pretensões menos gravosas para os justificar. Mas, visto de fora, pelo resto da sociedade e pelo Tribunal em particular, é manifesto que a troca de “favores” propiciada entre “amigos”, tem outra tradução, tal qual foi feito constar dos factos.
Por isso, é desprovida de fundamento a afirmação de ter o Tribunal violado «o art.° 127° do CPP na forma como, erradamente apreciou a prova e assim sucedeu na desvalorização e desconsideração do depoimento do arguido CC e nos factos relatados pelas testemunhas QQ, RR, SS e TT», quando o que temos, apenas, é uma diferente valoração realizada pelo Arguido, sem que seja posta em causa aquela realizada pelo decisor. E, pela mesma ordem de razões, não incorre a decisão em qualquer vício quando, como a lê o Arguido, desvaloriza «infundadamente, ainda, os depoimentos das testemunhas MM . e NN, (…) do perito informático da Polícia Judiciária UU e da testemunha VV». Aliás, retoma-se, a decisão recorrida fundamenta as razões da sua valoração, de forma válida e coerente, não obstante a discordância do Recorrente.
Assim chegamos àquilo que o Arguido aponta como a violação do princípio do in dubio pro reo.
f)- da violação do princípio do in dubio pro reo
Entende o Recorrente que o Tribunal a quo foi confrontado com dúvidas. E que, na «presença de dúvidas, o Tribunal, apreciou-a[s] em desfavor do arguido». Para si, resulta «evidente do texto da decisão recorrida, por si só e ainda conjugada com as regras da experiência comum, que a dúvida só não foi reconhecida, em virtude de erro na apreciação da prova».
Como já vimos acima, não é reconhecido à decisão recorrida o vício de erro notório na apreciação da prova. Ora, o que o Recorrente defende é que teve dúvidas quanto aos factos, atenta a prova produzida. Logo, se o Tribunal as não teve, violou o princípio do in dubio pro reo.
Naturalmente, esta é uma visão equivocada da questão, já que o Tribunal, com a amplitude permitida pela livre apreciação da prova, superou as dúvidas que poderia ter e produziu uma decisão fundamentada na qual expressa como chegou aos factos provados. Não se vislumbra qualquer vício argumentativo que questione tal grau de certeza e, do conjunto da prova produzida, não se alcança a existência de uma dúvida tão evidente que o Tribunal a quo não pudesse ignorar. Com efeito, as provas produzidas, assim valoradas, são aptas ao esclarecimento dos factos.
«O princípio in dubio pro reo resume-se a uma regra de decisão: produzida a prova e efectuada a sua valoração, subsistindo no espírito do julgador uma dúvida insanável sobre a verificação ou não de determinado facto, deve o julgador decidir sempre a favor do arguido, dando como não provado o facto que lhe é desfavorável.» [ac. Tribunal da Relação de Lisboa de 14/01/2014, Desembargadora Alda Tomé Casimiro, ECLI:PT:TRL:2014:76.10.2GTEVR.L1.5.8C]
Conforme referido no acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 17/11/2010, Desembargador Artur Oliveira, [ECLI:PT:TRP:2010:997.08.2GCSTS.P1.3F] «O princípio in dubio pro reo pressupõe que, após a produção e apreciação exaustiva de todos os meios de prova, o julgador se defronte com a existência de uma dúvida razoável sobre a verificação dos factos; não de uma dúvida hipotética e abstracta, sugerida pela apreciação da prova feita pelo recorrente, mas antes de uma dúvida assumida pelo próprio julgador.
Só há violação do princípio in dubio pro reo quando for manifesto que o julgador, perante uma dúvida relevante, decidiu contra o arguido, acolhendo a versão que o desfavorece».
Com efeito, «A diversidade das versões não faz, necessariamente, operar o princípio in dubio pro reo. Este pressupõe um juízo positivo de dúvida resultante de um inultrapassável impasse probatório.»
[ac. Tribunal da Relação de Coimbra de 30/09/2009, Desembargador Gomes de Sousa, ECLI:PT:TRC:2009:195.07.2GBCNT.C.71].
Apesar de limitado na amplitude do seu conhecimento sobre a matéria, veja-se o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24/11/2022, Conselheiro Orlando Gonçalves, [ECLI:PT:STJ:2022:76.20.4T9VLS.L1.S1.75], segundo o qual «Se na fundamentação da sentença/acórdão oferecida pelo tribunal, este não invoca qualquer dúvida insanável, ou, ao invés, se a motivação da matéria de facto denuncia uma tomada de posição clara e inequívoca relativamente aos factos constantes da acusação, com indicação clara e coerente das razões que fundaram a convicção do tribunal, inexiste lugar à aplicação do princípio in dubio pro reo.
No caso em apreciação, não é nesta perspetiva que o recorrente coloca a questão, mas antes no entendimento, seu, de que a prova produzida em julgamento impunha uma diversa decisão da que foi tomada, como se verifica quando defende, designadamente, que face à ausência de provas impunha-se ao tribunal de 1.ª instância e ao da Relação ter dúvidas sobre os factos dados como provados, o que traduz diferente questão, apreciada no âmbito do erro de julgamento no acórdão recorrido.»
Podendo a Relação ir mais além - «Sendo o Supremo Tribunal de Justiça um tribunal de revista, compreende-se o entendimento, repetidamente afirmado na jurisprudência do Supremo, de que não resultando da decisão que o tribunal ficou num estado de dúvida sobre os factos e que «ultrapassou» essa dúvida, dando-os por provados, contra o arguido, ao S.T.J. fica vedada a possibilidade de decidir sobre a violação do princípio «in dubio pro reo» dado o quadro dos respectivos poderes de cognição, restritos a matéria de direito.
Por isso se diz que no S.T.J. só pode conhecer-se da violação desse princípio quando da decisão recorrida resultar que, tendo o tribunal a quo chegado a um estado de dúvida sobre a realidade dos factos, decidiu em desfavor do arguido; ou então quando, não tendo o tribunal a quo reconhecido esse estado de dúvida, ele resultar evidente do texto da decisão recorrida, por si só ou em conjugação com as regras da experiência comum, nos termos do vício do erro notório na apreciação da prova.
Não se compreende que se siga o mesmo raciocínio na Relação.
O princípio in dubio pro reo deve ser entendido objectivamente, e nessa perspectiva, no caso de o tribunal dar como provados factos duvidosos desfavoráveis ao arguido, mesmo que não tenha manifestado ou sentido a dúvida, mesmo que não a reconheça, há violação do princípio se, do confronto com a prova produzida, se conclui que se impunha um estado de dúvida.» [ac. Tribunal da Relação de Lisboa de 07/05/2019, Desembargador Jorge Gonçalves, ECLI:PT:TRL:2019:485.15.0GABRR.L2.5.86] – certo é que, na decisão que nos ocupa, não se vislumbra existirem razões que imponham a invocada dúvida, quando confrontados com a decisão de facto recorrida e a fundamentação que a acompanha, atentas as provas produzidas em audiência.
«O princípio in dubio pro reo, não significa dar relevância às dúvidas que as partes encontram na decisão ou na sua interpretação da factualidade descrita e revelada nos autos. É, antes, uma imposição dirigida ao juiz, no sentido de este se pronunciar de forma favorável ao réu, quando não houver certeza sobre os factos decisivos para a solução da causa. Mas daqui não resulta que, tendo havido versões díspares e até contraditórias sobre factos relevantes, o arguido deva ser absolvido em obediência a tal princípio.
A dúvida que há-de levar o tribunal a decidir pro reo tem de ser uma dúvida positiva, uma dúvida racional que ilida a certeza contrária, ou, por outras palavras ainda, uma dúvida que impeça a convicção do tribunal.» [ac. Tribunal da Relação de Lisboa de 02/11/2021, Desembargador Luis Gominho, ECLI:PT:TRL:2021:50.19.3JELSB.L1.5.F1]
Logo, no caso concreto, não se mostra violado o princípio do in dubio pro reo, como pretendido pelo recorrente.
g)-da não realização da perícia
Outra questão suscitada pelo recorrente prende-se com a não realização da perícia que, no seu entender, constitui nulidade por violação do caso julgado.
Da motivação consta que, se o Tribunal determinou a realização da perícia, sem que alguém tenha recorrido dessa decisão, não poderá, posteriormente, dispensá-la, sob pena de violação de uma decisão transitada em julgado.
Antes de mais, veja-se o que o acórdão recorrido diz sobre a questão da não realização da perícia, e a prova à mesma respeitante: «Quanto ao arguido AA o tribunal não ficou também com dúvidas quanto ao facto de ter sido o mesmo quem realizou todos os acessos comprovados nos autos, ainda que quanto aos acessos realizados durante o período em que o mesmo esteve de férias e em que invocou ter estado no ..., a prova se se alcançou seja indireta.
Desde logo, nunca ao longo de todo o processo houve qualquer narrativa alternativa quanto à possibilidade de uma outra pessoa determinada ter realizado os acessos que desde cedo se apurou terem sido realizados a partir dos Tribunais de ... e ... e dos IPs associados aos computadores que o arguido AA utilizava como máquinas de trabalho. Note-se que na auditoria realizada pelo GG quando foram analisados os logs (que nesta data já não existem) se conclui que os acessos foram feitos a partir desses IPs.
Foi explicado em audiência de julgamento por todos os especialistas inquiridos, que podem ter sido feitos acessos remotos, por diferentes modos. Se o fossem por VPN, seria através das «máquinas de salto», ou seja, os computadores fixos que o arguido AA tinha instalado nos referidos tribunais e os IPs que surgiriam seriam os das «máquinas de salto». Também podem ter sido utilizados programas específicos para fazer acessos remotos, sendo que na análise aos computadores apreendidos ao arguido AA também havia registos da existência desse tipo de programas. Mais poderia o arguido ter utilizado ferramentas para tentar «disfarçar» os acessos, como também foi identificado numa das análises realizadas pelo GG.
Nas diligências feitas pelo tribunal já na reta final do julgamento, procurou-se registos no material informático apreendido ao arguido desses acessos remotos, sendo que num deles existiam registos de acessos remotos e noutro nada estava registado, por ter sido reposto o sistema operativo.
Certo é que todos os auscultados sobre a matéria foram concordantes em afirmar que a forma de confirmar como esses acessos foram feitos seria através da análise aos logs do Citius, que neste momento já não estão disponíveis. Não podemos, porém, olvidar que houve uma auditoria inicial em que todos esses logs foram analisados e em que os IPs de acesso estão claramente identificados em todos os acessos como sendo sempre os IPs dos computadores que o arguido AA utilizava. Sabendo-se que mesmo nos acessos remotos o arguido utilizaria um «computador de salto», cujo IP seria o que ficava registado no acesso, impõe-se concluir que tendo os acessos sido realizados de forma direta ou remota, o foram sempre pelo arguido AA ., ainda que neste momento, por força do decurso do tempo, não tenha sido possível fazer uma análise mais direta que aquela que o tribunal tentou por todos os meios realizar.»
A perícia em causa não era exequível. A matéria em apreço estava coberta pela prova produzida em audiência, e não se afigurava possível ir mais longe no que à demonstração dos factos.
É certo que em 01.02.2022, por despacho, o Tribunal determinou a realização de perícia «tendo em vista o esclarecimento das questões relacionadas os acessos imputados ao arguido AA no período em que este veio invocar estar de férias».
Subsequentemente, o Arguido Recorrente AA ., pronunciou-se quanto ao objecto da perícia formulando quesitos que não chegaram a ser respondidos por via de perícia pois esta não veio a realizar-se.
Corresponderá tal decisão, posterior, de não realização da perícia, uma nulidade por violação de caso julgado?
Não, é a resposta. O Tribunal não pode ficar refém de decisões desta natureza se, justificadamente, explicar as razões pelas quais vem a decidir em sentido contrário. Acontece amiúde nas matérias da prova. Decide-se ouvir uma testemunha que não se encontra. Decide-se obter um documento que não aparece. Pede-se uma informação e a entidade interpelada nunca responde. Decide-se realizar uma perícia e o objecto da perícia não está disponível ou o estado da arte não permite a diligência.
Desde que o Tribunal justifique as circunstâncias que determinam a mudança de posição, por forma a garantir que seja a motivação sindicável, e esta seja coerente e compreensível, inexiste qualquer violação do caso julgado.
Pode, inclusivamente, o Tribunal chegar à conclusão de que, perante a prova produzida, se torna desnecessária a realização de uma diligência probatória anteriormente determinada, sem que tal importe qualquer nulidade.
Tal emerge do princípio de controlo, pelo Tribunal, da necessidade da prova, que se traduz no princípio da livre apreciação da mesma, tal como está consagrado, genericamente, no art.º 340.º do Código de Processo Penal. Aqui se percebe a abrangência dos poderes do Tribunal que se revelam na apreciação dos requerimentos de prova mas, igualmente, e a cada momento, da prova a produzir em audiência. A redação deste artigo, configurando assim os poderes do Tribunal, mereceu inclusivamente juízo do Tribunal Constitucional no Acórdão n.º 171/2005, in DR, II Série de 06.05.2005, segundo o qual «Há, pois, que concluir que o artigo 340.º, nº 4, do Código de Processo Penal, na medida em que confere ao juiz poderes de disciplina da produção de prova, exigindo para o indeferimento desta a notoriedade do seu carácter irrelevante ou supérfluo, inadequado, de obtenção impossível ou muito duvidosa, ou, ainda, da sua finalidade meramente dilatória, não viola as garantias de defesa do arguido (... )».
Não é, pois, válida a conclusão do Recorrente de que o Tribunal emitiu despacho contraditório ao considerar a perícia desnecessária e ao pronunciar-se sobre questões que, pela sua natureza técnica, só poderiam ser esclarecidas e respondidas com a realização de perícia. Como se viu pela fundamentação reproduzida supra, o Tribunal logrou apreciar as matérias e fundamentar o seu juízo quando confrontado com a inviabilidade da perícia.
Não havendo lugar à invocada violação do caso julgado, estando devidamente justificada a decisão do Tribunal que, assim, não é arbitrária nem desconsidera os direitos de defesa do Arguido, e sendo correctamente fundamentada a decisão quanto aos factos visados pela pretendida perícia, inexiste qualquer nulidade na decisão do Tribunal, pelo que improcede a pretensão do Recorrente.
h)-da violação do princípio do contraditório
Conclui ainda o Recorrente que a não realização da perícia constitui uma omissão de diligências fundamentais para a descoberta da verdade material e corresponde a uma violação do princípio do contraditório.
Como vimos acima, reportando-nos à latitude dos poderes do Tribunal no que à determinação da prova a produzir respeita, a decisão de não prosseguir com a intenção de realização de perícia não importa qualquer violação das garantias de defesa do Arguido, nomeadamente do princípio do contraditório, o qual foi sempre assegurado com a possibilidade do Arguido apresentar toda a prova pertinente e realizável. Contrariamente ao que defende, como explicado no acórdão recorrido, aquilo que aponta como uma divergência nas conclusões científicas não é apenas susceptível de ser esclarecida por intermédio duma nova perícia. Assim, insistir com um tipo de prova que não é exequível, nem sequer essencial, não é um direito que lhe assista, pelo que inexiste qualquer vício que inquine esta decisão.
i)-a validade das escutas
Alega o Recorrente que as escutas nas quais o Tribunal baseou a sua decisão são nulas, constituindo prova proibida.
A questão não é nova e o acórdão aborda-a com uma profundidade que não merece reparo. Na decisão do Tribunal a quo consta:
«(…) o arguido CC, em sede de alegações finais, invocou que as interceções telefónicas determinadas e efetuadas nos autos constituem prova proibida ou, caso assim não se entenda, estão feridas de nulidade.
Isto porquanto, no raciocínio que segue, se verificaria nulidade por falta de indícios da prática de crime de catálogo aquando da prolação do despacho de 29 de novembro de 2017, assim violando o artigo 187° do Código de Processo Penal, pelo que quando, em 29 de dezembro de 2017, são determinadas as escutas ao arguido CC (porque houve uma escuta anterior em que se falou de um "…", o que permitiu a associação ao arguido), estamos perante escutas ilegais e prova proibida que, por sê-lo, acaba por contaminar a prova produzida subsequentemente.
A questão suscitada não é nova no âmbito dos presentes autos.
Já na decisão instrutória proferida em primeira instância havia sido abordada a questão da existência de nulidade ou proibição de prova associada às interseções telefónicas realizadas nos autos.
Aí se refere:
"1. Dispõe o art.º 18.°, n.° 2, da C.R.P., que a "... lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo a restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente garantidos (...).
Por sua vez, diz o art.º 34.°, n° 1, da C.R.P., que "...o domicilio e o sigilo da correspondência e de outros meios de comunicação privada são invioláveis...", acrescentando o n.º 4 que "...é proibida toda a ingerência das autoridades públicas na correspondência, nas telecomunicações e nos demais meios de comunicação, salvo os casos previsto na lei em matéria de processo criminal (...)" e dizendo o art.º 32.°, n.° 8, do mesmo diploma, que "...são nulas todas as provas obtidas mediante (...) abusiva intromissão na vida privada, no domicílio, na correspondência ou nas comunicações(...)".
Passando ao regime de intercepção e gravação de conversações ou comunicações, face à redacção dos art.º 187.° e 188.°, do C.P.Penal - e acompanhando, de perto, o Ac. STJ de 26/03/2014, proferido no âmbito do processo n.° 15/10.0JAGRD.E2.J1, in www.dgsi.pt - os eixos essenciais do actual regime legal são os seguintes:
Este meio de obtenção de prova é confinado à fase de inquérito e exige-se, de forma expressa, requerimento do Ministério Público e despacho fundamentado do juiz, tendo sido alargado pela referida lei o elenco de crimes em relação aos quais é admitida a intercepção e gravação de conversações.
Terão de estar preordenadas à perseguição de um dos crimes do catálogo - enunciados no art.º 187.°, n.° 1 e 2, do C.P.Penal -, nomeadamente crime punível com pena de prisão superior a 3 anos, tráfico de estupefacientes, detenção de arma proibida e de tráfico de armas, contrabando, injúria, ameaça, coacção, devassa da vida privada e perturbação da paz e do sossego, quando cometidos através de telefone, ameaça com prática de crime ou de abuso e simulação de sinais de perigo e de evasão, quando o arguido haja sido condenado por algum dos referidos ilícitos penais.
A lei limita as escutas a um universo determinado de pessoas ou ligações telefónicas, exigindo o n.° 4, do artigo 187.°, do Código de Processo Penal, que este meio de obtenção de prova seja dirigido contra:
a) suspeito ou arguido;
b) pessoa que sirva de intermediário, relativamente à qual haja fundadas razões para crer que recebe ou transmite mensagens destinadas ou provenientes de suspeito ou arguido; ou
c) vítima de crime, mediante o respectivo consentimento, efectivo ou presumido.
Exige-se uma forma relativamente qualificada da suspeita da prática do crime pois não se exigindo os fortes indícios, não se basta o ordenamento jurídico com meras suposições ou boatos não confirmados. "(...) A suspeita terá de atingir um determinado nível de concretização, a partir de dados do exterior ou da vida psíquica" (cfr. Costa Andrade, ln "Sobre as Proibições de Prova em Processo Penal", página 290) (...)".
E este meio de obtenção de prova está, também, subordinado a um princípio de subsidiariedade, dado que não será legítimo ordenar ou prorrogar as escutas nos casos em que os resultados probatórios possam ser alcançados sem dificuldades particularmente acrescidas.
A ideia da subsidiariedade resulta do art.º 187.°, n.° 1, do C.P.P., ao exigir que a mesma seja "...indispensável para a descoberta da verdade ou que a prova seria de outra forma, impossível ou muito difícil de obter...".
É exigido que a prova ou a descoberta da verdade não possa ser alcançada por outro método de cariz menos restritivo dos direitos fundamentais do visado, sendo também que a escuta telefónica tem que ser necessária, no sentido em que é o único meio através do qual se pode obter o material probatório relevante, dando-se assim cumprimento ao princípio da necessidade ou indispensabilidade, enquanto princípio que emana da proibição do excesso e, por isso, com assento constitucional no art.º 18.°, n.° 2. da CRP.
É também necessário que a escuta telefónica se revele um meio em concreto adequado a mediatizar aquele resultado, que a medida seja adequada para a descoberta do material probatório pretendido pela investigação.
2. Desenvolvendo o que antecede - e acompanhando, de perto, o Ac. Do STJ de 26/03/2014, proferido no âmbito do processo n.° 15/10.0JAGRD.E2.J1, in www.dgsi.pt -
"...consagraram-se em letra de lei as seguintes linhas essenciais no capítulo dos requisitos materiais de admissibilidade:
(...).Onde anteriormente se exigia que houvesse razões para crer que a diligência se revelaria de grande interesse para a descoberta da verdade, ou para a prova, passou agora a impor-se que haja razões para crer que a diligência é indispensável para a descoberta da verdade ou que a prova seria, de outra forma, impossível ou muito difícil de obter.(...)", tratando-se, "... no momento de autorização e na comprovação dos seus fundamentos, de um juízo de prognose face á situação concreta das investigações e aos elementos recolhidos, abrangendo a sua complexidade, mas também a sua eficácia.
(...) A diligência tem agora de ser «indispensável» e não apenas «de grande interesse». O legislador terá pretendido que as escutas sejam o único meio de atingir a verdade material, ou seja, quando existirem outras formas de obtenção da prova aptas a atingir uma das finalidades últimas de todo o processo penal, as escutas serão ilegais.
Quanto à relevância para a obtenção da prova, diz-se agora que elas só devem ser usadas quando, de outra forma: esse material seja «impossível ou muito difícil de obter» (...)" (cfr. Ac. Do STJ de 26/03/2014, proferido no âmbito do processo n.º 15/10.0JAGRD.E2J1, in www.dgsi.pt )...
No entanto e como é assinalado pelo Supremo Tribunal de Justiça, no acórdão que temos citado, perante tão exigente enquadramento teórico, são correspondentemente acrescidas as dificuldades de aplicação prática do critério, "...uma vez que, como refere Fátima Mata Mouros (...) com a reforma não se ultrapassou o limiar mais elementar da vacuidade e indeterminação conceptual. Entre as razões de tal situação, refere a mesma
Autora, destaca-se a inexequibilidade da cláusula de subsidiariedade nas normas habilitantes das medidas para além das dificuldades praticamente inultrapassáveis na aplicação rigorosa do princípio da proporcionalidade. É que, não sendo viável uma graduação em abstracto das medidas de investigação em função de critérios como o da respectiva potencialidade lesiva para os direitos dos visados, ou do grau de eficiência que oferecem para a investigação de cada tipo de crime, dificilmente a cláusula da subsidiariedade poderá adquirir eficácia prática.
(...) O respeito pelo princípio da proporcionalidade na autorização destas medidas pressupõe desde logo uma estabilização, ou delimitação, dos factos a investigar que, por via de regra, não se encontra ainda determinada no momento em que a polícia solicita a realização da escuta. (...) A realização de uma escuta telefónica... só tem cabimento em sede de processo penal, como impõe a Constituição (art.º 34.º n.°4).
Por outro lado a consagração de tais requisitos suscita desde logo a sua adequação à própria finalidade do meio de obtenção de prova em causa.
Efectivamente, a apreciação dos pressupostos enunciados implica a instauração de um inquérito, e para tanto, é necessária a notícia de um crime, ou seja, em princípio, o campo de utilização das escutas telefónicas no nosso país reconduz-se à investigação de crimes já cometidos ou, pelo menos já iniciados.
Todavia, a importância das escutas não reside muitas vezes na prova de crimes já consumados, mas sim na investigação, e mesmo na prevenção, de crimes que se suspeita poderem vir a ser cometidos.
Tal conclusão é, precisamente o inverso das limitações que decorrem da nossa Lei Fundamental e do regime estabelecido no nosso Código de Processo Penal.
A ponderação da indispensabilidade para descoberta da verdade, ou o juízo sobre a impossibilidade, ou a muita dificuldade, em obter prova por outra forma pressupõe que, num determinado contexto de inquérito, se tenha a noção precisa de qual a verdade material que se pretende obter ou, então, um juízo de valor sobre meios de obtenção de prova alternativos relativamente aos quais, porém, não se tem a noção exacta da respectiva configuração porque ainda não foram produzidos.
Na verdade, caso tais meios de obtenção de prova fossem produzidos previamente á decisão sobre a escuta esta perderia todo o interesse investigatório, uma vez que os eventuais escutados estariam já alertados para a possibilidade da sua existência.
A conjugação de tais circunstâncias implica que o juízo de ponderação que fundamenta a autorização tenha, normalmente de ser avaliado em relação a hipóteses, ou possibilidades, que são os elementos de prova que poderiam ser obtidos através dos meios alternativos de obtenção de prova e os que se pretende obter através da escuta telefónica.
O segundo pressuposto material é a consagração do princípio da «reserva do juiz», através da exigência de um despacho fundamentado, quando antes apenas se aludia a «despacho do juiz». O legislador quis acentuar o papel do juiz, dentro daquele princípio de reserva, como garante dos direitos, liberdades e garantias fundamentais, no confronto da restrição destes com os pressupostos da autorização das escutas (cfr. Ac. Do STJ de 26/03/2014, proferido no âmbito do processo n° 15/10.0JAGRD.E2.J1, in www.dgsi.pt .
Ora quanto à adequação e suficiência do juízo de ponderação e da fundamentação que deve constar do despacho judicial, diz o Supremo Tribunal de Justiça, no acórdão que temos estado a seguir, que "(...) importa precisar que o facto de a fundamentação assentar num juízo hipotético, deve configurar a forma como se desenham as exigências relativas a tal fundamentação. Se o tipo de crime tem de ser indicado nos estritos limites do catálogo já as razões da sua indiciação, que podem ser efectuadas com remissão para os elementos relevantes, não podem conter uma exigência de precisão que torne inviável a sua concretização. Avaliar a impossibilidade de obter por outra forma a prova que se pretende com a escuta pressupõe um juízo tanto mais genérico quanto mais próximo estamos na fase inicial da investigação sendo certo que, mesmo dentro dos crimes do catálogo, alguns existem que, pela sua gravidade e especificidade imprimem desde logo uma ideia de indispensabilidade da escuta.
Efectivamente, a escuta é exactamente o meio de obtenção de prova que se pretende para obter prova de um determinado crime e estar a exigir previamente uma indiciação profunda do crime para o qual se pretende a escuta é uma contradição. Como refere Benjamim Rodrigues (Das Escutas Telefónicas Coimbra Editora 2008 Tomo I, pág. 228) não se deve cair no exagero de que a motivação seja tão completa como se se tivesse a certeza de que o investigado cometeu o crime, pois, a ser assim, ficaria deslegitimado o recurso a tal meio visto que os factos teriam já a clareza e concisão suficientes para autonomizarem e fundarem um juízo de acusação. Aliás, é essa ausência
de certeza que permite e justifica a intervenção nas comunicações privadas levadas a cabo pelas redes de comunicações electrónicas publicamente acessíveis (...)" (cfr. Ac. do STJ de 26/03/2014, proferido no âmbito do processo n.° 15/10.0JAGRD.E2.J1, in www.dgsi.pt ).
Assim, diz o Supremo Tribunal de Justiça que o despacho de autorização da escuta deve, fundamentalmente, tornar perceptíveis as razões que, em face do artigo 187.º do Código de Processo Penal, levam o juiz a autorizar a escuta, permitindo o escrutínio da sua decisão.
Só o incumprimento de tal ónus de fundamentação dos requisitos legais da escuta pode justificar a sanção da nulidade, do art.º 190.º, do C.P.Penal, sendo bastante uma fundamentação suficientemente explicita nos seus fundamentos, afastando a necessidade de o tribunal ter que expor as razões pelas quais os outros meios de obtenção de prova não servem no caso concreto, a fim de fundamentar que a prova seria, de outra forma, impossível ou muito difícil de obter, sendo que, por exclusão de meios, só resta o recurso às intercepções.
Isto porque, prossegue o Supremo Tribunal, para se afirmar que os outros meios não serviriam para o caso concreto, o juiz teria que avançar para conjecturas quanto ao valor desses outros meios, que não foram produzidos e que, a produzirem-se previamente às escutas, torná-las-ia inúteis, dado que buscas, depoimento de testemunhas ou prova pericial, colocaria de sobreaviso o arguido.
E, como consequência, diz ainda que a utilidade da escuta depende do facto de aqueles meios ainda não se terem produzido e, consequentemente, o juízo valorativo que fundamenta a concessão da autorização para a escuta emerge daquilo se pensa ser o resultado de outros meios de obtenção de prova e não aquilo que eles efectivamente são (...) (cfr. Ac. Do STJ de 26/03/2014, proferido no âmbito do processo n.° 15/10.0JAGRD.E2.J1, in www.dgsi.pt ).»
Não conseguiremos explicar melhor o entendimento seguido e com o qual concordamos, ao encontro da citada jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça. O que importa que a invocada nulidade não se verifica como, bem, o acórdão recorrido explica:
«Feito o enquadramento quanto ao que deverá ser o conteúdo e pressupostos subjacentes ao despacho de admissibilidade ou rejeição das intercepções, passemos à análise da sanção que a lei determina, para a violação quer do art.º 187.°, quer do art.º 188.°, do C.P.Penal, violação esta invocada pelo arguido.
Dispõe o art.º 190.º, do C.P.Penal, que "...os requisitos e condições referidos nos art°s. 187.°, 188.° e 189.°, são estabelecidos sob pena de nulidade".
No entanto a lei, ao cominar com a consequência da nulidade a inobservância dos requisitos constantes do referido art.º 187°, do C.P.P., requisitos estes de admissibilidade - correspondentes às "condições base" para que uma escuta possa ser determinadas, nomeadamente tipos de ilícitos em relação aos quais são admitidas as escutas; que sejam autorizadas pelo Juiz; quem pode estar sob escuta, por quanto tempo e em que processo pode ser feito o uso das escutas - e do referido art.º 189.°, do C.P.Penal, este quanto às formalidades inerentes às intercepções , não diz qual a nulidade que está em causa.
As nulidades estão sujeitas ao princípio da tipicidade, por força do disposto no art.º 118.°, n.° 1 e 2, do C.P.Penal, o qual diz que "... a violação ou inobservância das disposições da lei do processo penal só determina a nulidade do acto quando esta for expressamente cominada na lei...", sendo que "... nos casos em que a lei não cominar a nulidade, o acto ilegal é irregular...".
Dispõe, por sua vez, o n.º 3, deste preceito, que " ...as disposições do presente capítulo não prejudicam as normas deste código relativas a proibições de prova...", pelo que as normas relativas às proibições de prova mantêm, necessariamente, a sua autonomia.
O princípio da tipicidade, estatuído no art.º 118.°, do C.P.P., não permite a sua extensão por analogia, pois só são nulos os actos que a lei considera como tal.
Assim, diz o art.º 119.º, n.º 1, do C.P.Penal, que "...constituem nulidades insanáveis, que devem ser oficiosamente declaradas em qualquer fase do procedimento, além das que como tal forem cominadas em outras disposições legais:
a) A falta do número de juízes ou de jurados que devam constituir o tribunal, ou a violação das regras legais relativas ao modo de determinar a respectiva composição;
b) A falta de promoção do processo pelo Ministério Público, nos termos do artigo 48.°, bem como a sua ausência a actos relativamente aos quais a lei exigir a respectiva comparência;
c) A ausência do arguido ou do seu defensor, nos casos em que a lei exigir a respectiva comparência;
d) A falta de inquérito ou de instrução, nos casos em que a lei determinar a sua obrigatoriedade;
e) A violação das regras de competência do tribunal, sem prejuízo do disposto no
artigo 32.°, n.° 2;
f) O emprego de forma de processo especial fora dos casos previstos na lei.".
Constituindo nulidades insanáveis devem ser oficiosamente declaradas em qualquer fase do procedimento, sendo que, como expressamente resulta da redacção inicial do preceito, as nulidades expressamente enunciadas nas referidas alíneas dizem respeito a nulidades insanáveis específicas, às quais haverá que acrescentar as que "...como tal forem cominadas em outras disposições legais...".
Por sua vez, dispõe o art.º 120.°, n.° 1, do C.P.Penal - sob a epígrafe "Nulidades dependentes de arguição” - , que "... qualquer nulidade diversa das referidas no artigo anterior deve ser arguida pelos interessados e fica sujeita à disciplina prevista neste artigo e no artigo seguinte.
Diz o n.° 2, que "...constituem nulidades dependentes de arguição, além das que forem cominadas noutras disposições legais:
a) O emprego de uma forma de processo quando a lei determinar a utilização de outra, sem prejuízo do disposto na alínea f) do artigo anterior;
b) A ausência, por falta de notificação, do assistente e das partes civis, nos casos em que a lei exigir a respectiva comparência;
c) A falta de nomeação de intérprete, nos casos em que a lei a considerar obrigatória;
d) A insuficiência do inquérito ou da instrução, por não terem sido praticados actos legalmente obrigatórios, e a omissão posterior de diligências que pudessem reputar-se essenciais para a descoberta da verdade
Acrescenta o n.° 3, os prazos em que que "...as nulidades referidas nos números anteriores devem ser arguidas...".
Estamos, assim, no âmbito das nulidades sanáveis e dependentes de arguição, como resulta do n.° 1, do referido preceito e estando expressamente referido, no seu n.° 2, situações especificas de nulidades sanáveis. Mas, também por força da redacção deste n.° 2, há que acrescentar às nulidades dependentes de arguição expressamente previstas "...as que forem cominadas noutras disposições legais (...)".
Por fim, os art.º 121.°, 121.° e 123.°, do C.P.Penal, referem-se, respectivamente, à "sanação de nulidades", "efeitos da declaração de nulidades" e às "irregularidades".»
Mais uma vez, julgando este raciocínio irrepreensível, encontramos na fundamentação do acórdão recorrido a resposta à questão suscitada pelo recurso: «Passando à matéria das "proibições de prova", dispõe o art.º 126.°, n.° 1, do C.P.Penal, que "...são nulas, não podendo ser utilizadas, as provas obtidas mediante tortura, coacção ou, em geral, ofensa da integridade física ou moral das pessoas [...].
Enuncia, o n.° 2, que "...são ofensivas da integridade física ou moral das pessoas as provas obtidas, mesmo que com consentimento delas, mediante:
a) Perturbação da liberdade de vontade ou de decisão através de maus tratos, ofensas corporais, administração de meios de qualquer natureza, hipnose ou utilização de meios cruéis ou enganosos;
b) Perturbação, por qualquer meio, da capacidade de memória ou de avaliação;
c) Utilização da força, fora dos casos e dos limites permitidos pela lei;
d) Ameaça com medida legalmente inadmissível e, bem assim, com denegação ou condicionamento da obtenção de benefício legalmente previsto;
e) Promessa de vantagem legalmente inadmissível (...)".
Por sua vez, o n.º 3, do preceito diz que "...ressalvados os casos previstos na lei, são igualmente nulas, não podendo ser utilizadas, as provas obtidas mediante intromissão na vida privada, no domicílio, na correspondência ou nas telecomunicações sem o consentimento do respectivo titular...".
Há, então, que proceder à interpretação do art.º 190.°, do C.P.Penal e às questões que tal interpretação convoca, quer quanto às consequências da violação do regime constante dos art.º 187.° e 188.°, do C.P.Penal, quer quanto ao n.° 3, do art.º 126.°, do C.P.Penal, no que diz respeito às provas obtidas mediante intromissão na vida provada, no domicílio, na correspondência ou nas comunicações, sem o consentimento do respectivo titular.
E, aqui, quanto à necessária interpretação e inerente análise jurídica, o Tribunal segue de perto - no que possa tocar e seja relevante para o caso concreto -, Acórdão do S.T.J. n.° 1/2018, relatado pelo Senhor Conselheiro Souto de Moura (Ac. do STJ a argumentação e sustentação do decidido de 30/11/2017, publicado no DR n° 30/2018, Série I, de 12/02/2018, in www.dgsi.pt, e de onde são as citações ou transcrições que se seguem, salvo referência expressa a diferente jurisprudência; sendo da responsabilidade da signatária o acentuar de passagens), pois tudo o que o Tribunal fosse dizer seria, na sua essência e referências, o que já está dito.
Assim e convocando o acima referido, o art.º 190.°, do C.P.Penal, diz que a violação dos requisitos e condições impostos pelos art.º 187.°, 188.° e 189.°, do C.P.Penal, são estabelecidos "sob pena de nulidade", não dizendo contudo o legislador qual a nulidade
que está em causa.
Diz o S.T.J., que nunca perdendo de vista os critérios de interpretação do art.º 9, do C.Civil, há que começar "...pela literalidade do dito art.º 190.°, e das normas com que se relaciona mais de perto, no tratamento da questão. A letra da lei é o ponto de partida necessário de toda a interpretação, acabando, aliás, por ser também, tendo em vista o n.° 2 do preceito, o seu ponto de chegada...", associando também, o contributo fornecido pelo elemento sistemático de interpretação.
E, implicando o desrespeito pelos pressupostos do art.º 187.° e pelas formalidades do art.º 188.°, do C.P.Penal, a nulidade do acto praticado, diz o STJ que "(...) por um lado a lei não distingue violações do preceituado, tendo todas a mesma consequência e, por outro, não acrescenta que tal nulidade seja insanável (...)". Isto quer para o art.º 187.°, quer para o art.º 188.°, do C.P.Penal e "(...) não estando cominada como tal, face ao que nos diz o corpo dos arts. 119.° e 120.° do CPP, terá que se considerar nulidade sanável, caindo no regime do art.º 120.° do CPP (...)".
Portanto, a lei não distingue a nulidade, quanto aos efeitos da violação dos art.º 187.° e 188 °, do C.P.Penal e da bem não diz que estamos perante nulidade insanável.
Mas, avançando, porque tal releva para o caso concreto face ao fundamento da nulidade arguida, diz o STJ que "...acontece porém que o n.° 3, do art.º 118.°, do CPP, estipula que as disposições do título em que se insere, relativo às nulidades processuais, "não prejudicam as normas deste Código relativas a proibições de prova".
Portanto, ao sistema de nulidades de actos processuais, que podem muito bem ser meios de obtenção de prova (exames, revistas, buscas, apreensões ou escutas telefónicas), o Código justapõe um regime próprio de proibições de prova. E é assim que nos surge com autonomia o art.º 126.°, do CPP, que contempla os "Métodos proibidos de prova", certo que da sua utilização resulta que as provas "São nulas não podendo ser utilizadas".
Enquanto as nulidades atingem o acto processual, as proibições de prova dirigem-se directamente à utilidade que o acto se propôs obter. Não só o acto será inválido, como o contributo que fornece para a reconstituição dos factos tem que ser ignorado. Por outras palavras, estar-se-á perante uma prova que o deixa de ser enquanto tal, na medida em que no processo não serve para nada. É dizer, estamos no domínio da proibição da valorização da prova.
Nas palavras de FIGUEIREDO DIAS [In "Revisitação de algumas ideias-mestras da teoria das proibições de prova em processo penal (também à luz da jurisprudência constitucional portuguesa)", Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 146.°, n.° 4000, Setembro-Outubro, 2016, pág. 5 e 6], "a consequência jurídica da violação de uma simples regra processual probatória, tratando-se nesta de uma prescrição que apenas determina o procedimento a observar na produção probatória, sem declarar o ser- proibido da prova ela própria, não constitui motivo bastante para recusar o resultado de prova enquanto tal. Por outras palavras, prescrições há que visam somente obrigar à observância de um determinado caminho de obtenção de prova, sem todavia imporem que se afaste do processo a prova ilicitamente lograda [...]. Diferentemente, é sabido, se passam as coisas com as consequências processuais de uma autêntica proibição de prova. Tais proibições constam de normas jurídicas cuja violação afecta a prova como tal, por mais que esta possa revelar-se adequada à investigação da verdade e corresponda, em pura verdade histórica, efectivamente a esta (...)".
Como resulta do art.º 32.°, n° 8, da C.R.P., os métodos proibidos de prova inscrevem-se num "...círculo de atentados graves aos direitos fundamentais da pessoa, como a integridade física ou moral, ou a privacidade, que se considerou digna de tutela constitucional expressa e daí o art.º 32.°, n.° 8 da CR. Por isso que, à "nulidade" de que fala o preceito constitucional devam corresponder, na expressão da lei de processo, as "provas nulas que não podem ser utilizadas".
Na parte que nos interessa agora, a previsão constitucional usa a expressão "abusiva intromissão [...] nas telecomunicações" (art.º 32.°, n.° 8 da CR), "salvos os casos previstos na lei em matéria de processo criminal" (art.º 34.°, n.° 4 da CR).
Portanto, para o legislador constitucional, a intromissão nas comunicações é abusiva, desde logo quando a lei ordinária a não admite.
Se formos ver de seguida a previsão do art.º 126.°, n.° 3 do CPP, a prova será proibida quando ocorre "intromissão nas telecomunicações sem o consentimento do respectivo titular", mas, ainda, "Ressalvados os casos previstos na lei". A intromissão é proibida, porque abusiva, se não houve consentimento do escutado, e se estiver fora dos casos em que a lei, apesar disso, permite a intromissão. E evidentemente se não houver nenhum controlo judicial (...)".
Mas acentua o STJ, que tanto a lei constitucional como a lei ordinária ao usar as expressões "salvos os casos" ou "ressalvados os casos" permitidos, visa situações em que estão preenchidas as condições de que depende a intromissão, portanto, em que estão verificados os requisitos de admissibilidade que acima já enunciámos.
E prossegue dizendo que "...nesta aproximação à problemática, afigura-se-nos pois que a lei do processo penal prevê a nulidade sanável de actos processuais em que se violaram os comandos relativos aos pressupostos e formalidades prescritos concretamente para as escutas telefónicas. Mas uma vez delimitado esse círculo, importa ainda ver se, para além disso, se está perante um método proibido de prova à luz do art.º 126.°, n.° 3 do CPP, podendo dar-se o caso de depararmos com áreas secantes.
Assim sendo, dir-se-á que, tendencialmente, essa zona secante se traduzirá em nulidade do acto por falta dos pressupostos da escuta estabelecidos no art.º 187.° do CPP, e em "nulidade" da prova estando impedida a sua utilização, prevista no art.º 126.°, n.° 3 do CPP.
A lei ficou ambígua, porque atirou para a vala comum das nulidades toda e qualquer violação em matéria probatória. Continuou a falar de "nulidade" mesmo quando já se estava perante realidade diferente, porque atinente a proibições de valoração de prova. Mas importa evidentemente distinguir conceitos.
O respaldo constitucional assinalado (art.º 32.°, n.° 8 da CR) contende com proibições de prova no sentido de proibições de valoração de prova e é a isso que se refere o art.º 126.° do CPP. No campo das nulidades dos actos processuais ficam todos os atropelos praticados na obtenção de provas à luz dos art.s 187.° e 188.° do CPP.
Saber se, para além de um acto nulo na obtenção de certa prova, estamos também perante uma prova ela mesma não valorizável, depende de uma interpretação da lei face ao caso concreto.
Como pano de fundo, poderá atender-se às ideias mestras, caras ao Tribunal de Justiça Federal Alemão e ao Tribunal Constitucional Federal Alemão, segundo as quais haverá uma proibição de valoração da prova quando "a utilização da informação recolhida puder conduzir a uma intervenção desproporcionada no direito geral de personalidade", na ponderação que importa fazer, dos interesses conflituantes da descoberta da verdade material e da protecção dos direitos individuais.
E ainda quando, no modo como a prova foi obtida, tenha havido "violações do direito sérias, conscientes e objectivamente arbitrárias, através das quais tenham sido sistematicamente ignoradas garantias jurídicas fundamentais" (citado por FIGUEIREDO DIAS ibidem, pág. 12) (...).
Em face da nossa lei, tudo apontará para que estejamos perante prova proibida quando obtida através de uma escuta não consentida pelo visado, ou então não autorizada pelo juiz de instrução, ou ainda quando autorizada pelo mesmo, nas situações em que o não podia fazer face à lei (por exemplo, face ao tipo legal de crime em questão, ou as pessoas escutadas).
Pelo que dito fica, serão de excluir do círculo das proibições de prova as inobservâncias sem mais, das formalidades prescritas para o processamento das escutas, no art. 188.° do CPP, subsistindo como também enquadráveis no âmbito das proibições de prova, os resultados de actos nulos de produção de prova por força do 190.Q, por desrespeito do art.º 187.° ambos do CPP
3.2. Aqui chegados - e porque o acórdão que temos vindo a seguir passa, pelo que a economia do acórdão reclama, a pronunciar-se sobre a violação do n.° 4 do art.º 188.°, do C.P.Penal -, estando em causa, no caso concreto, a arguição da violação do disposto no art.º 187.° e do 188.°, n° 6, do C.P.Penal, temos, assim, que seguindo a posição que pensamos maioritariamente adoptada pelo STJ, a lei "aponta" para que estejamos perante prova proibida, quando obtida através de uma escuta não consentida pelo visado, uma escuta não autorizada pelo juiz de instrução ou ainda quando autorizada pelo mesmo, nas situações em que o não podia fazer face à lei, por não estarmos perante um crime de catálogo; as pessoas a escutar nas serem arguidos, suspeitos ou pessoa que sirva de intermediário, relativamente à qual haja fundadas razões para crer que recebe ou transmite mensagens destinadas ou provenientes de suspeito ou arguido, ou vitima de crime, mediante o respectivo consentimento; determinada por tempo para além do enunciado na lei; ou não observando a lei quanto ao processo em que pode ser feito o uso das escutas; tudo requisitos constantes do art.º 187.°, do C.P.Penal.
Serão, assim, de excluir do círculo das proibições de prova as inobservâncias sem mais, das formalidades prescritas para o processamento das escutas e a que se refere o art.º 188.°, do C.P.Penal.
Mas, repetimos e porque tal não era a questão concreta a decidir pelo STJ, quanto às consequências da violação do determinado pelo art.º 187.°, do C.P.Penal, o STJ não decidiu, apenas o decidiu quanto a uma situação concreta do art.º 188.°, do C.P.Penal, uma vez que, como resulta, a decisão do Tribunal cingiu-se ao conhecimento da questão da interpretação do art.º 190.° e 126.°, do C.P.P., face ao art.º 188°, do mesmo código.
2.3. A questão da interpretação do art.º 190.° e 126.°, do C.P.P., face a violação do art.º 88.°, do C.P.P. é controversa, tal tem expressão na actual jurisprudência dos Tribunais superiores e está igualmente enunciada no "voto de vencido" constante do referido acórdão, subscrito pelo Senhor Conselheiro Vínicio Pereira ..
Percorrendo a argumentação e sustentação da posição vencida, está delimitado que a questão que está na base da oposição de julgados - como acima exposto -, tem a ver com a interpretação do art.º 190.°, do C.P.Penal e com o tipo de vício que a lei quis ferir a violação, quer do artigo 187.°, quer do artigo 188.°, todos do CPP.
Para o conhecimento desta questão, além da Lei Constitucional, nomeadamente dos art°s 18.°, n.° 2; 25.°, n.° 1; 32.°, n.° 8; 34.°, n.° 4, e das normas genéricas do Código Penal, nomeadamente arts. 118.°, 119.° e 120.°, "... está em causa, fundamentalmente, a conjugação do disposto nos artigos 190.° e 126.° do CPP.
Tanto o artigo 126.°, como o artigo 190.°, foram objecto de alterações introduzidas pela reforma de 2007 (L 48/2007, de 29 de Agosto). Primeiras e únicas.
(...) O presente artigo (189.°) considera que os requisitos e condições referidos nos artigos 187.° e 188.° são estabelecidos sob pena de nulidade.
Sobre o que deve entender-se por tal nulidade (será uma proibição de prova? E se for nulidade será sanável ou insanável?) é assunto muito longe de encerrado, quer na doutrina, quer na jurisprudência. Parece-nos existir alguma confusão e indefinição. A questão terminológica ainda não se encontra definitivamente consolidada na doutrina.
O CPP faz a destrinça entre as nulidades, que têm o seu regime configurado nos artigos 118.° a 123.°, e as proibições de prova (v. artigo 118.°, n.° 3). O termo nulidade utilizado no art.º 126.° não se encaixa no conceito geral de nulidade consagrado nos artigos 118.° e seguintes.
A nulidade do artigo 126.° é uma figura atípica, sui generis, que a doutrina (Manuel Augusto Alves Meireis, O Regime das Provas Obtidas pelo Agente Provocador em Processo Penal, Almedina, 1999, págs. 190 e ss.; Francisco Aguilar, Dos Conhecimentos Fortuitos Obtidos Através de Escutas Telefónicas. Contributo Para o seu Estudo nos Ordenamentos Alemão e Português, Almedina, 2004, págs. 88; André Lamas Leite, As escutas telefónicas - Algumas reflexões em redor do seu regime e das consequências processuais derivadas da respectiva violação, Revista Fac. Dto. U. Porto, pág. 53) e a jurisprudência (v. g. Ac. STJ de 6 de Maio de 2004, Proc. 04P908, Rel. Santos Carvalho) apelida de nulidade de prova. O seu regime aproxima-se do das nulidades insanáveis (Francisco Aguilar, cit., pág. 89), embora se não confundam.
A nulidade do n.° 1, do artigo 126.° tem os mesmos efeitos da nulidade do n.° 3, do mesmo normativo.
Em ambos os casos estamos perante proibições de prova.
É esta a posição de uma corrente doutrinária (cf. os autores acabados de citar; cf., igualmente, José Mouraz Lopes, Escutas Telefónicas: seis teses e uma conclusão, na Revista do MP n.° 104, 2005, págs. 150, nota 24; ao que parece, também, MM Damião da Cunha, A Jurisprudência do Tribunal Constitucional em Matéria de Escutas Telefónicas. Anotação aos Acórdão do Tribunal Constitucional n.° 407/97, 374/01, 411/02 e 528/03, Jurisprudência Constitucional, n.° 1, Jan./Março 2004, págs. 55-56), que segue na esteira da posição defendida por Teresa Pizarro Beleza, Apontamentos de Direito Processual Penal, II vol., AAFDL, 1993, pág. 150-151 e por Germano Marques da ., Curso de Processo Penal, II vol., cit., pág. 205-206.
A questão é controversa, com muitas interrogações (...)".
Mas, enuncia o Senhor Conselheiro, no seu voto de vencido, as dúvidas quanto à identidade do regime do n.° 1 e do n.° 3, do art.º 126°, do C.P.Penal, dizendo que "...se a lei pretendesse atribuir o mesmo regime às nulidades do n.° 1 e do n.° 3, de tal normativo, não teria autonomizado o n.° 3. A nulidade poderia ser consagrada apenas num único número.
O n.° 3 não reproduz o segmento "não podendo ser utilizadas" constante do n.° 1. Os crimes abrangidos pelo n.° 3 são crimes contra a reserva da vida privada, enquanto os do n.° 1 protegem outros valores.
Se as proibições de prova do n.° 1 são absolutas, ao passo que as do n.° 3 são relativas (ou direitos irrestritíveis no n.° 1 e direitos restritíveis no n.° 3, na terminologia de Manuel Augusto Alves Meireis, cit., pág. 190), por que razão as consequências terão que ser similares em ambos os casos (um exemplo sobre a possibilidade de consequências diferentes encontra-se no A. STJ de 6 de Maio de 2004, Proc. 04P774, Rel. Pereira Madeira).
De qualquer modo, os que defendem idêntico regime para o n.° 1 e o n.° 3, do cit. artigo, entendem que a nulidade do artigo 189.° deve ser apreciada em conformidade com o n.° 3, do referido artigo 126.°, do CPP e n.° 8 do artigo 32.° da CRP, isto é, como autêntica proibição de prova.
Porém, a questão acaba por se colocar, também, no âmbito do presente artigo. Será a nulidade por violação do disposto no artigo 187.° semelhante à nulidade por violação do estatuído no artigo 188.°?
Face ao acórdão para uniformização de Jurisprudência 1/2018, que acima assinalámos e à Jurisprudência do Tribunal Constitucional que iremos expor e à posição que seguimos, decorrente de tal Jurisprudência, afigura-se-nos que não.»
Invoca o Arguido/Recorrente, que a nulidade advém do primeiro momento, aquando da decisão do Juiz de Instrução Criminal que autorizou as escutas. No seu entender, tal despacho será nulo por faltarem indícios da prática de crime de catálogo. Levanta-se mesmo a questão da inconstitucionalidade da interpretação do artigo 187.° do Código de Processo Penal, no sentido da admissibilidade, sem elementos indiciários do crime de corrupção e somente com base na informação constante de denúncia anónima, do tribunal determinar a realização de intercepções telefónicas (violação das garantias de defesa do arguido e dos princípios da legalidade em material criminal - art.º 29.º/1 e 32.º/1; violação do princípio do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva -art.º 20.º/1; dos artigos 18.º/2, 34.º/1 e 4 todos da Constituição da República Portuguesa).
Então, aqui chegados, e depois de tudo o que, por citação, já foi exposto, impõe-se concluir. E o acórdão recorrido fê-lo sem reparo, descrevendo todos os passos seguidos no processo e que conduziram à decisão que determinou a realização das escutas impugnadas. Pela sua exaustividade e rigor, continuamos a citar: «(…) por promoção de fls. 180 a 184, o Ministério Público, ao abrigo do disposto nos art°s. 187°, n° 1, al. a), 188°, 189° e 269°, n° 1, al. e), do C.P.Penal, e dizendo que está em investigação o crime de corrupção, requereu à JIC, entre o mais, a intercepção e gravação de todas as comunicações efectuadas pelos telemóveis com:
- o n.° 962 618 331, utilizado pelo suspeito Augusto ., pelo período de 30 dias;
- o n.° 966 253 168, utilizado pelo suspeito MM ., pelo período de 30 dias;
Alegou e fundamentou o Ministério Público, para o efeito e em síntese, que:
(i) nos presentes autos investiga-se o acesso efectuado através do Citius, a um inquérito que se encontra em segredo de justiça, com o n° 5340/17.7T9LSB, em que é o ...( e acessos a outros inquéritos entretanto apurados);
(ii) através desses acessos foi obtido, pelo menos, histórico dos actos processuais que foi comunicado aos suspeitos desse inquérito e respectivos advogados, designadamente a CC, que colabora e tem gabinete no ...do ... visado na investigação;
(iii) os suspeitos entregaram uma cópia do histórico do inquérito a CC, histórico este que veio a ser encontrado no gabinete que este ocupa no ..., aquando da realização das buscas no inq. 5340/17.7T9LSB;
(iv) tais acessos foram efectuados pelos oficiais de justiça MM . e AA .;
(v) conforme informação de fls. 18 e segs., do Apenso A, os suspeitos não efectuaram apenas ao inquérito acima citado, mas a outros, tendencialmente relacionados com o Sport Lisboa e ..., indicando os n°s. de mais seis inquéritos;
(vi) tais inquéritos ainda se encontram pendentes, pelo que os suspeitos mantêm interesse nas consultas, quiçá utilizando outros utilizadores para aceder ao Citius;
(vii) é muito provável que os suspeitos estabeleçam contactos telefónicos entre si e com terceiros;
(viii) resulta pois, inequívoco que AA, com eventual apoio de ..., a pedido de CC, do ...e a troco de vantagem ainda não apurada, tem vindo a fazer monitorização com cedência de informação inacessível ao público de processos que se encontram em investigação e em segredo de justiça, violando deveres funcionais;
3.2.- Passando agora aos elementos constantes dos autos, na informação de serviço de fls. 2, datada de 29/09/2017, com a qual se iniciaram os presentes autos, é dada informação à Direcção da UNCC que, na sequência de um contacto anónimo, ocorrido no dia 27/09/2017, a PJ teve conhecimento de factos que foram considerados fortemente indiciadores de prática, por "funcionário", entre os mais, de factos que que em abstracto poderiam integrar os crimes de violação do segredo de justiça, violação de segredo por funcionário, e de corrupção passiva para acto ilícito.
Nessa informação é descrita a informação recebida, designadamente que foi dado a conhecer "canal privilegiado" no "campus de justiça", por parte de responsáveis do Sport Lisboa e ..., através dos quais, responsáveis daquele terão acedido a peças processuais do inquérito em curso na 9- Secção do DIAP de Lisboa, conhecido como " caso dos mails" e que, por essa via, terão sido transmitidos já a uma ou mais sociedades de advogados com as quais o ... manterá relação contratual, relativa á prestação de serviços jurídicos.
Da informação recebida "tratar-se-ia de um canal privilegiado", "avençado" e cujo alcance das contrapartidas seria evidente para a investigação. Foi pedida informação quanto às contrapartidas, mas não foi dada informação adicional relevante.
É, ainda referido que, na tentativa de credibilizar a denúncia foram colocadas questões quanto à documentação que estaria em causa, tendo sido dada descrição pormenorizada sobre alguns exemplares, com descrição de peças concretas dos processos, como autuação, capa do processo, termos de remessa, de recebimento, termos de envio de correspondência, onde é dito, pelo Coordenador que fez a informação de fls. 2, que se encontraria mesmo o seu nome, o que presumia ter ocorrido após a delegação de competências.
É dito, pelo coordenador que fez a informação de fls. 2, que deu conhecimento à Sra. Procurador Geral-Adjunta e à Sra. Procuradora-Adjunta, titular do inquérito com o NUIPC 5340/17.7T9LSB, o inquérito em relação ao qual foram feitas as referências concreta, como resulta do entendimento do texto da informação.
Com a informação foram juntas cópias de um artigo da revista Sábado, de 28/09/2017, obtido pelo Coordenador que subscreveu a informação junto do gabinete de impressa da PJ, por ter tido conhecimento, no dia a seguir à denuncia, tal artigo fora publicado, versando sobre matéria que entendeu estar relacionada com a denuncia recebida.
Com base nestes elementos, por despacho do M°P°, de fls. 13, datado de 4/10/2017, foi enviado oficio para o GG, a fim de obter a informação de todos os acessos ao citius, relativos ao p° n° 5340/17.7T9LSB, listagem que foi obtida pessoalmente em 4/10/2017, pelo Senhor Magistrado do Ministério Público, titular do processo (cfr. fls. 15), listagem esta apensada aos autos, termo de apensação a fls. 31, termo de apensação datado de 6/10/2017.
Por promoção de fls. 15, datada de 6/10/2017, foi determinado o segredo de justiça, estando indicado, como um dos crimes em investigação, o crime de corrupção passiva, p. e p. pelos art°s 367°, 368°, 371° e 373°, do C.Penal e, com base nas listagens recebidas do GG, constantes do Apenso A, foi promovido pelo Ministério Público, que fosse requerido ao GG, com base nos art°s 2°, al. c) e 18°, n° 1, al. a), 2 e 3, da Lei do Cibercrime, o envio da identificação dos IPs das máquinas de acesso e/ou outros elementos que permitam identificar os autores de 191 acessos ao processo n° 5340/17.7T9LSB, que corre termos no DIAP, operações efectuadas e pela pessoa que acedeu (visualizações, impressões, alterações ou outros actos que seja possível identificar).
Tudo por referência aos utilizadores do citius, que estavam identificados como tendo acedido aos processos nas listagens contantes do referido Apenso A (com indicação, na relação enviada pelo Ministério Público, na promoção em causa, da hora, dia e número de identificação do "utilizador citius", elementos que constavam nas listagens do Apenso A).
Tal foi determinado por despacho de fls. 33, elementos recebidos a fls. 38, que foram juntos ao Apenso A (cfr. fls. 40).
A fls. 41, foi enviado para os autos, pelo GG, a informação quanto à pessoa a quem estava atribuído a máquina CITWSP02 com o IP 10.0.14067, no dia 17/08/2017, pelas 16.35 e demais informação quanto a entrega de credenciais e emissão de certificados.
Informação que consta de fls. 65 a 67 e constando como cartão digital utilizado, o da utilizadora KK, Procuradora da República.
A fls. 43 foi junto aos autos certidão do processo n° 5340/17.7T9LSB, de onde consta, o auto de busca e apreensão datado de 19/10/2017, efectuado a CC, nas instalações do ..., e documentos apreendidos, entre os quais se encontram fotocópias de documentos relacionados e com a natureza dos identificados na informação de fls. 2 (cfr. fls. 43 a 63).
Por promoção de 30/10/2017, fls. 68/69, e considerando, entre o mais, a já referida entrega do histórico do p° n° 5340/17.7T9LSB, a CC, por referência ao auto de busca e apreensão de fls. 43 e segs., que a pessoa que está identificada no acesso é Magistrada do Ministério Público, mas conduzindo os elementos do processo a acesso abusivo por parte de alguém, com os dados da Magistrada, havendo máquinas utilizadas nos acessos que não correspondem a máquinas utilizadas por Magistrados ( com referencia aos elementos constantes do documento do GG de fls. 65.1)., com acessos efectuados em áreas geográficas não coincidentes, por pessoa com conhecimentos informáticos suficientes, para conseguir alteração de IP's ( quando tal não deveria de ocorrer, de acordo com a informação do GG de fls. 65), o Ministério Público promoveu a monitorização ao GG, através de acesso remoto, às máquinas expressamente identificadas na promoção de fls. 68/69, pelo período de 30 dias.
Tal foi determinado por despacho de fls. 72, datado de 30/10/2017.
Na promoção de fls. 80, datada de 7/11/2017, por ter sido obtida informação junto do GG, pelo Senhor Magistrado do Ministério Público titular do processo, a informação de que os acessos podiam ter sido efectuados por técnico de informática, por esse motivo não foram efectuados os acessos remotos.
Foi determinado que fosse oficiado ao Sr. Vogal do Conselho Directivo do GG, solicitando informação completa referente ao funcionário "…@GG.mj.pt", locais de trabalho (informação recebida a fls. 101, datada de 10/11/2017, também em relação a MM .).
Igualmente foi determinada impressão de informação em relação ao funcionário aposentado MM . e pedido de informação à ....
Foi delegada na PJ-UNCC a investigação dos factos, quanto aos crimes indiciados, favorecimento pessoal praticado por funcionário, violação de segredo de justiça e corrupção passiva, p. e p. pelos art°s 367°, 368°, 371° e 373°, do C.Penal, falsidade informática e acesso ilegítimo, p. e p. pelo art° 3° e 6°, n° 1 e 4, da Lei do Cibercrime.
A fls. 105 a 116, foi remetido pelo GG, pela pessoa do Vogal do Conselho Directivo, informação quanto ao funcionamento do citius e "permissões do utilizador" FJ50756, relatório confidencial a fls. 119 a 130 (orig. fls. 134 a 147) , com informação sobre os sistemas envolvidos nos acessos aos citius, com a identificação de AA e ... (em relação ao p° n° 5340/17.7T9LSB, cfr. promoção de fls. 152).
Com base nos elementos existentes nos autos e que ora descritos, veio o OPC, por relatório de fls. 162/3, sugerir, entre o mais, a intercepção dos cartões telefónicos dos suspeitos MM. e AA ..
No entanto e previamente, por despacho do Ministério Público de fls. 165, de 27/11/2017, foi determinado o levantamento do sigilo bancário e pedidas informações quanto a contas e créditos tituladas ou co-tituladas por MM. e AA ..
Por despacho do Ministério Público de fls. 170, de 27/11/2017, foi pedido o envio de certidão, quanto a oito processos (identificados), das denuncias ou participações apresentadas, informações de intervenientes e histórico do processo, elementos que foram remetidos para os autos, constituído Apenso B, termo de apensação de 28/11/2017 (cfr. fls. 178) .
Vem, então, a fls. 180 e em 28/11/2017, a promoção do Ministério Público para intercepções telefónicas.
3.3.- Por despacho judicial de fls. 186, datado de 29/11/2017, e com os fundamentos que no mesmo constam, a Sra. J.I.C., por considerar verificada a existência de indícios da prática de um crime de corrupção passiva, determinou ao abrigo do dispostos no art° 187°, n° 1, al. a) do C.P.Penal e art° 6°, da lei n° 5/2002, de 11/01, autorizar as intercepções telefónicas e gravação das comunicações em relação suspeitos e números constantes na promoção do Ministério Público (fls. 182) e autorizou a recolha de som e imagem dos suspeitos AA e MM ., bem como de terceiros que com eles se relacionem no âmbito do crime em investigação, o que autorizou até 5/01/2018.
Previamente e no inicio do despacho, a Sra. J.I.C. diz que analisou a prova até à data recolhida, constatou que as informações ilegitimamente transmitidas ao advogado CC, terão sido fornecidas pelos funcionários judiciais MM. e MM. (o que, pelos documentos dos autos, está a referir-se à certidão do processo n° 5340/17.7T9LSB, de fls. 43 a 63, onde consta o auto de busca e apreensão datado de 19/10/2017, busca efectuada a CC, nas instalações do ...e documentos apreendidos, entre os quais se encontram fotocópias de documentos referidos pela PJ na informação de fls. 2 ; bem como aos documentos constantes nos A e B, referentes aos acessos a processos, elementos remetidos pelo GG, os quais, conforme termo de fls. 185, foram remetidos para o TIC).
Refere que a actuação não terá sido isolada, indiciando-se que estes poderão estar envolvidos numa actuação mais vasta e a troco de benefícios económicos, acrescentando que o crime de corrupção é em regra praticado num ambiente de secretismo e sob a aparência de legalidade, dizendo que se revela essencial realizar as diligências de investigação propostas pelo Ministério Público, não sendo possível obter a prova da prática dos factos e dos seus autores sem a realização das mesmas.
3.3.1.- O Tribunal convoca o acima exposto, aquando da análise dos pressupostos inerentes ao art° 187°, do C.P.Penal e à verificação de tais pressupostos pelo Tribunal, no momento do proferimento da decisão Judicial destinada a autorizar uma intercepção telefónica (ou o registo de som e imagem) e a que se refere a citada Jurisprudência constante do Ac. do STJ de 26/03/2014, relatado pelo Senhor Conselheiro Santos Cabral (Ac. STJ de 26/03/2014, p°.n° 15/10.0JAGRD.E2.S1, inwww.dgsi.pt).
Diz o Supremo Tribunal de Justiça que o despacho de autorização da escuta deve, fundamentalmente, tornar perceptíveis as razões que, em face do artigo 187 do Código de Processo Penal, levam o juiz a autorizar a escuta, permitindo o escrutínio da sua decisão.
Só o incumprimento de tal ónus de fundamentação dos requisitos legais da escuta pode justificar a sanção da nulidade, do art° 190, do C.P.Penal, sendo bastante uma fundamentação suficientemente explicita nos seus fundamentos, afastando a necessidade de o tribunal ter que expor as razões pelas quais os outros meios de obtenção de prova não servem no caso concreto, a fim de fundamentar que a prova seria, de outra forma, impossível ou muito difícil de obter, sendo que, por exclusão de meios, só resta o recurso às intercepções.
E quanto à adequação e suficiência do juízo de ponderação e da fundamentação que deve constar do despacho judicial, diz o Supremo Tribunal de Justiça, no referido acórdão, que "(...) importa precisar que o facto de a fundamentação assentar num juízo hipotético, deve configurar a forma como se desenham as exigências relativas a tal fundamentação. Se o tipo de crime tem de ser indicado nos estritos limites do catálogo já as razões da sua indiciação, que podem ser efectuadas com remissão para os elementos relevantes, não podem conter uma exigência de precisão que torne inviável a sua concretização. Avaliar a impossibilidade de obter por outra forma a prova que se pretende com a escuta pressupõe um juízo tanto mais genérico quanto mais próximo estamos na fase inicial da investigação sendo certo que, mesmo dentro dos crimes do catálogo, alguns existem que, pela sua gravidade e especificidade imprimem desde logo uma ideia de indispensabilidade da escuta.
Efectivamente, a escuta é exactamente o meio de obtenção de prova que se pretende para obter prova de um determinado crime e estar a exigir previamente uma indiciação profunda do crime para o qual se pretende a escuta é uma contradição...".
Ora, no caso concreto, da conjugação do teor da denuncia a que se refere a informação de fls. 2, com o conteúdo das demais diligências e documentos que foram obtidos até ao despacho de fls. 186, o Tribunal entende que atenta a fase inicial da investigação em que se estava e em que as intercepções foram promovidas e determinadas, era possível fazer juízo de alguma indiciação quanto ao crime de catálogo, o crime de corrupção passiva, invocado na Promoção do Ministério Público de fls. 180 e no Despacho da J.I.C. de fls. 186.
Assim, da informação de fls.2 ressalta a circunstância de os factos comunicados, terem, desde logo, o relato de "canal privilegiado" no "campus de justiça", por parte de responsáveis do Sport Lisboa e ..., através dos quais, responsáveis daquele terão acedido a peças processuais do inquérito em curso na … Secção do … de …, conhecido como " …" e que, por essa via, terão sido transmitidos já a uma ou mais sociedades de advogados com as quais o ... manterá relação contratual, relativa á prestação de serviços jurídicos. Da informação recebida "tratar-se-ia de um canal privilegiado", "avençado" e cujo alcance das contrapartidas seria evidente para a investigação, embora tenhamos também tenhamos que referir que quando pedida informação quanto às contrapartidas, não tenha sido dada informação adicional relevante.
Da informação do Sr. Coordenador resulta ter sido adoptado procedimento para credibilização da denúncia, tendo sido colocadas questões quanto à documentação que estaria em causa e que pelo denunciante foi dada descrição pormenorizada sobre alguns exemplares, com descrição de peças concretas dos processos, como autuação, capa do processo, termos de remessa, de recebimento, termos de envio de correspondência, onde é dito, pelo Coordenador que fez a informação de fls. 2, que se encontraria mesmo o seu nome, o que presumia ter ocorrido após a delegação de competências e tendo feito a identificação, como resulta do teor de fls. 2, com o inquérito com o NUIPC 5340/17.7T9LSB (o chamado processo dos e-mails relacionado com o ... de ... indicado na denúncia).
A fls. 43 foi junto a aos autos certidão do processo n° 5340/17.7T9LSB, de onde consta, o auto de busca e apreensão datado de 19/10/2017, efectuado a CC, nas instalações do ..., e documentos apreendidos, entre os quais se encontram fotocópias de documentos a que, e sempre forma indiciária, se referia a denuncia e informação de fls. 2., elemento que, também de forma indiciária, permite dar alguma credibilidade ao conteúdo da denuncia.
Para a sustentação dessa credibilidade e indiciação dos factos denunciados e sempre de forma indiciária - quer quanto ao modo de procedimento (os acessos pelo citius) que foi revelado, quer quanto às pessoas envolvidas (incluindo a circunstância do funcionário), quer quanto ao tipo de informação obtida e destinos objecto de acessos, quer quanto à eventual ocorrência de contrapartidas -, concorrem os documentos contantes do Apenso A e B, bem como os documentos e informações obtidos, obtidos na sequência das promoções do D.° Magistrado do Ministério Público, já atrás enunciadas, nomeadamente os documentos ou informações de fls. 65 a 67, 101 e 105 a 116.
Dos documentos dos Apensos A e B e destes documentos ou informação, resultam os documentos que permitiram a indiciação, naquele momento processual, dos acessos, a que processos, de que equipamentos ou com que credenciais foram feitos.
Tudo elementos a que, face ao teor do despacho de fls. 186, o mesmo se refere.
Afigura-se-nos, por conseguinte, que, no caso concreto, não ocorre a violação do art° 187°, do C.P.Penal e consequentemente, não estamos perante prova proibida nos termos do art° 126°, n° 3, do C.P.Penal.
Tal só ocorreria se estivéssemos perante uma prova obtida através de uma escuta não consentida pelo visado, uma escuta não autorizada pelo juiz de instrução ou ainda quando autorizada pelo mesmo, nas situações em que o não podia fazer face à lei, por não estarmos perante um crime de catálogo, as pessoas a escutar não serem arguidos, suspeitos ou pessoa que sirva de intermediário, determinada por tempo para além do enunciado na lei; ou não observando a lei quanto ao processo em que pode ser feito o uso das escutas; tudo requisitos constantes do art° 187°, do C.P.Penal.
3.3.2.- Mas tendo em consideração a argumentação desenvolvida pelo arguido, resulta que o mesmo discorda da avaliação que o Tribunal fez, no despacho de fls. 186, quanto à existência de indícios em relação ao crime de corrupção, discorda das razões subjacente ao despacho proferido e nos termos que do mesmo constam, dizendo que a fundamentação do despacho que decretou a autorização judicial é exígua.
Ora, como acima já dissemos, se a não verificação dos pressupostos previstos no art° 187°, do C.P.Penal, é sancionada, por força do artigo 190°, do C.P.Penal, como nulidade, a falta de fundamentação da decisão judicial é sancionada como irregularidade, a qual pode ser invocada pelos interessados nos termos do artigo 123°, do C.P.Penal.
A considerar-se o despacho de fls. 186 com falta de suficiência de fundamentação, o vicio de que padeceria seria de mera irregularidade.
A Jurisprudência - e neste sentido o acórdão que acimas citámos do STJ - Ac. STJ de 26/03/2014, P° n° 15/10.0JAGRD.E2.J1, in www.dgsi.pt - , tem vindo a caracterizar a falta ou insuficiência de fundamentação dos despachos judiciais de autorização de intercepções telefónicas, aquelas situação que se traduzem na falta de especificação dos motivos de facto e de direito da decisão - art.° 205.°, n.° 1, da CRP e 97.°, n.° 4, do CPP - constituindo mera irregularidade - art.° 118.°, n.°s 1 e 2 -, com excepção daquelas situações em que tal se verifica sentença, dado que é um acto processual em que a lei impõe que obedeça a fundamentação especial, sob pena de nulidade, nos termos do art° 379.º, n.° 1 e 374°, n° 2, do C.P.Penal (cfr., neste sentido, "Ac. do STJ de 21/2/07, proc. 06P3932).
Ora, como acima já dissemos, entendemos que, no caso concreto, estavam verificados os pressupostos materiais que condicionam a realização duma intercepção telefónica e para a recolha de som e imagem.
Na verdade, os direitos fundamentais cuja violação está no núcleo do regime de proibições de prova não são colocados em causa por uma decisão incorrectamente fundamentada, mas sim se tal decisão não respeitar os pressupostos substanciais que são o pressuposto da admissibilidade daquele meio de obtenção de prova e que acima expressamente referimos.
Deste modo, uma anomalia de natureza processual, não tem os mesmos efeitos com o não cumprimento das disposições substantivas aplicáveis. A deficiente fundamentação de um despacho não equivale à sua falta ou violação do art° 187°, do C.P.penal.
Já dissemos e expusemos, que aquando da promoção das intercepções e da recolha de som e imagem, os autos já continham elementos probatórios suficientes que, naquela fase da investigação, permitiam fazer um juízo de indiciação quanto ao então configurar o crime de corrupção.
Assim, se aquando da autorização das escutas telefónicas e da recolha de som e imagem, os autos já continham elementos probatórios que tornavam possível, com alguma verosimilhança, configurar a existência de crime de corrupção, não se verifica a omissão dos pressupostos substantivos previstos no artigo 187°, do CPP, não se verifica, por conseguinte, a violação do art° 187°, do C.P.Penal, nãos ocorrendo a nulidade prevista no art° 190°, do C.P.Penal, havendo que improceder a arguida nulidade".
Terminada a fase de julgamento, sem que neste particular, a prova produzida tenha interferido com os elementos que já foram considerados no que foi decidido em sede de decisão instrutória, não temos entendimento divergente do agora expendido, com o qual se concorda inteiramente.
Assim, e dando por reproduzido o que já fora analisado quanto a esta mesma matéria numa anterior fase processual, conclui-se pela inexistência in casu de qualquer nulidade ou proibição de prova ao nível da autorização das interceções telefónicas ordenadas nos autos.»
Nada mais pode este Tribunal da Relação de Lisboa acrescentar. Concordando-se com o juízo da primeira instância, dada a exaustiva fundamentação da decisão, sustenta-se a mesma nos seus precisos termos.
j)- da destruição das escutas não relevantes com eventual violação do princípio do contraditório
Segundo o recorrente, a destruição das escutas não relevantes, sem que lhe tenha sido dada oportunidade para as ouvir de antemão, constitui uma violação do princípio do contraditório, e inquina a validade da prova obtida por este meio de obtenção da mesma.
Actualmente, a destruição imediata dos suportes de gravação das escutas realizadas num determinado processo está prevista no art.º 188.º/6 do Código de Processo Penal, nos seguintes termos: «Sem prejuízo do disposto no n.º 7 do artigo anterior, o juiz determina a destruição imediata dos suportes técnicos e relatórios manifestamente estranhos ao processo:
a)Que disserem respeito a conversações em que não intervenham pessoas referidas no n.º 4 do artigo anterior;
b) Que abranjam matérias cobertas pelo segredo profissional, de funcionário ou de Estado; ou
c) Cuja divulgação possa afectar gravemente direitos, liberdades e garantias;
ficando todos os intervenientes vinculados ao dever de segredo relativamente às conversações de que tenham tomado conhecimento.»
As demais conversações ficam sujeitas ao disposto nos números 12 e 13 do mesmo artigo, segundo os quais «12 - Os suportes técnicos referentes a conversações ou comunicações que não forem transcritas para servirem como meio de prova são guardados em envelope lacrado, à ordem do tribunal, e destruídos após o trânsito em julgado da decisão que puser termo ao processo.
13 - Após o trânsito em julgado previsto no número anterior, os suportes técnicos que não forem destruídos são guardados em envelope lacrado, junto ao processo, e só podem ser utilizados em caso de interposição de recurso extraordinário.»
A questão colocada pelo recorrente prende-se com as escutas cuja destruição foi ordenada ao abrigo do citado número 6, matéria introduzida com a alteração produzida no preceito pela Lei n.º 48/2007, de 29/08, acudindo aos mais recentes juízos de inconstitucionalidade relativos à destruição de conversações tidas por não relevantes, mas apenas por avaliação do Ministério Público e do Juiz de Instrução Criminal. Já depois dessa alteração foi o Tribunal Constitucional chamado a pronunciar-se sobre a destruição de escutas efectuada ao abrigo da norma nova e concluiu, no Acórdão do 293/2008 «Não julgar inconstitucional a norma do artigo 188.º, n.º 6, alínea a) do Código de Processo Penal, na redacção dada pela Lei n.º 48/2007, de 29 de Agosto, quando interpretada no sentido de que o juiz de instrução determina a destruição imediata dos suportes técnicos e relatórios manifestamente estranhos ao processo, que digam respeito a conversações em que não intervenham pessoas referidas no n.º 4 do artigo 187.º do mesmo Código, sem que antes o arguido deles tenha conhecimento e possa pronunciar-se sobre a sua relevância» - [https://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20080293.html]
Seguindo o entendimento exposto neste acórdão, conclui igualmente este Tribunal que nenhum dano foi causado aos direitos de defesa do Arguido com as decisões proferidas em inquérito sobre as escutas que foram sendo realizadas, mormente as que se viram destruídas por força do disposto no art.º 188.º/6 do Código de Processo Penal.
Assim, por não haver a apontada violação do princípio do contraditório, julga-se improcedente a argumentação do recorrente quanto à questão da destruição dos suportes de escutas realizadas durante o inquérito.
k)-da nulidade de toda a prova recolhida, quer directa, quer indirectamente, com recurso aos metadados recolhidos e guardados.
Também esta questão não é nova, tendo sido abordada no acórdão recorrido. Profusamente argumentada a posição assumida, não mereceu a posição do recorrente acolhimento, como se constata do seguinte excerto. «Mais suscitou o arguido que, face à aplicação aos autos da jurisprudência do acórdão do Tribunal Constitucional referentes aos «metadados» também seriam nulas as interseções telefónicas realizadas nos autos e, em consequência proibida a prova respetiva, que, por seu turno, teria o efeito de contaminar a restante prova que se lhe seguiu.
Nos autos a prova produzida por interceções telefónicas em constitui prova que tenha acrescentado particular valor probatório à demonstração dos factos acima considerados (mais relevantes serão, por exemplo, as mensagens trocadas pelos arguidos e apreendidas na sequência de análises informáticas a equipamentos informáticos, à qual o referido acórdão do Tribunal Constitucional não tem aplicação). Sem prejuízo disso, não deixaremos de abordar a questão que nos foi colocada.
O acórdão do Tribunal Constitucional n.° 268/2022, de 19 de abril de 2022, publicado no DR - I Série de 3 de junho de 2022, decidiu declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral (sendo que já anteriormente, outros acórdãos do Tribunal Constitucional, v.g., acórdãos n.°s 403/2015, de 27 de agosto e 464/2019, de 18 de setembro, ambos relatados pelo Conselheiro Lino Rodrigues ., se pronunciaram sobre a temática dos metadados):
a) da norma constante do artigo 4.° da Lei n.° 32/2008, de 17 de julho, conjugada com o artigo 6.° da mesma lei;
b) da norma do artigo 9.° da Lei n.° 32/2008, de 17 de julho, relativa à transmissão de dados armazenados às autoridades competentes para investigação, deteção e repressão de crimes graves, na parte em que não prevê uma notificação ao visado de que os dados conservados foram acedidos pelas autoridades de investigação criminal, a partir do momento em que tal comunicação não seja suscetível de comprometer as investigações nem a vida ou integridade física de terceiros.
No entanto, a inaplicabilidade do acórdão ao caso dos autos é evidente. É que não estamos, in casu, perante um meio de prova de recolha e transmissão de metadados. Nos termos do artigo 6.° da Lei 32/2008, de 17 de julho, os fornecedores de serviços de comunicações eletrónicas publicamente disponíveis ou de uma rede pública de comunicações têm o dever de conservar pelo período de um ano, os dados de tráfego e de localização de todas as comunicações eletrónicas, os quais vêm especificados no artigo 4° do mesmo diploma.
Fora da obrigação de conservação dos dados estão os dados relativos ao conteúdo das comunicações, porquanto, nos termos do disposto no n° 2 do artigo 1°, a conservação de tais dados é expressamente proibida.
É logo o artigo 1° da Lei 32/2008 que, sob a epígrafe "Objeto", opera a diferença entre o seu objecto, n° 1, - "a conservação e a transmissão dos dados de tráfego e de localização relativos a pessoas singulares e a pessoas colectivas, bem como dos dados conexos necessários para identificar o assinante ou o utilizador registado, para fins de investigação, deteção e repressão de crimes graves por parte das autoridades competentes, transpondo para a ordem jurídica interna a Directiva n.° 2006/24/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Março, relativa à conservação de dados gerados ou tratados no contexto da oferta de serviços de comunicações eletrónicas publicamente disponíveis ou de redes públicas de comunicações, e que altera a Directiva n.° 2002/58/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de Junho, relativa ao tratamento de dados pessoais e à proteção da privacidade no sector das comunicações eletrónicas" -, e a interceção e gravação de comunicações, de que não cura, estabelecendo, n.º 2, que "a conservação de dados que revelem o conteúdo das comunicações é proibida, sem prejuízo do disposto na Lei n.° 41/2004, de 18 de Agosto, e na legislação processual penal relativamente à interceção e gravação de comunicações."
O acórdão do Tribunal Constitucional visou apenas os artigos 4°, 6° e 9° da Lei 32/2008, a chamada lei dos metadados, no que tange ao seu armazenamento, no primeiro segmento decisório, e à sua transmissão, no que toca ao segundo segmento do dispositivo. Metadados por, não abrangendo o conteúdo das comunicações, dizerem respeito apenas às suas circunstâncias, por isso se fala em dados sobre dados, que são os marcos ou pontos de referência que lhe dão o respetivo suporte e que permitem circunscrever a informação sob todas as formas, e que acabam num registo arquivístico do tráfego. Como o assinalou o Tribunal Constitucional o que está em causa nos metadados é que são dados que revelam, a todo o tempo, aspetos da vida privada, familiar e social dos cidadãos, permitindo rastrear a localização do indivíduo ao longo do dia, todos os dias, desde que transporte o telemóvel e identificar quem contactou, quando, duração e regularidade.
De todo o modo, o acórdão do Tribunal Constitucional faz questão de distinguir os dados de base dos dados de tráfego.
"Ora, de acordo com a jurisprudência deste Tribunal, a tutela constitucional dos metadados das comunicações (dados que não abrangem o conteúdo das comunicações, mas dizem respeito somente às suas circunstâncias) não é uniforme: a distinção entre dados de base, relativos à identificação dos sujeitos que se conectam à rede, e dados de tráfego — «os dados funcionais necessários ao estabelecimento de uma ligação ou comunicação e os dados gerados pela utilização da rede (por exemplo, localização do utilizador, localização do destinatário, duração da utilização, data e hora, frequência)» — tem refração nos parâmetros convocáveis. Deste modo, o padrão invocado pela requerente (o direito à inviolabilidade das comunicações, consagrado no artigo 34.° da Constituição) não protege os dados de base, como se concluiu nos Acórdãos n.°s 486/2009 e 403/2015, e se reiterou no Acórdão n.° 463/2019:
«Assim, quer os dados de base, quer os dados de localização de equipamento, a que se refere o artigo 3.° da Lei Orgânica, n.° 4/2017, não devem ser considerados como dados atinentes a uma comunicação, já que tanto nuns quanto noutros inexiste qualquer dimensão subjetiva inerente à comunicação. Os primeiros são, nos termos da alínea a) do n.° 2 do artigo 2.° da mesma Lei, dados escritos atinentes a uma relação contratual entre uma pessoa e uma empresa operadora de telecomunicações, referindo- se à identificação e morada do titular e ao próprio contrato de ligação à rede; os segundos abrangem a deteção de dados de localização a partir de um telefone ligado, mas em stand by, e/ou através do sistema de satélite GPS ou outro (ver, neste sentido, Manuel da Costa Andrade, "Comentário ao artigo 194.Q do Código Penal", in J. Figueiredo Dias (direção), Comentário Conimbricense do Código Penal — Tomo I, 2.ã Edição, Coimbra Editora, 2012, pág. 1104)».
Neste contexto, nem todos os dados a que se refere o artigo 4.° da Lei n.° 32/2008, de 17 de julho, estão protegidos pelo disposto nos números 1 e 4 do artigo 34.° da Constituição. De acordo com a jurisprudência reiterada deste Tribunal, aquele parâmetro abrange os dados de tráfego quando pressuponham uma comunicação entre pessoas, mas já não os dados que, independentemente de qualquer comunicação, sejam atinentes à conexão de certo equipamento a uma rede de comunicações ou à mera identificação de um utilizador a quem estava atribuído um determinado número de telefone ou um endereço de protocolo IP estático (dados de base — cfr. Acórdão n.° 420/2017); nem os dados de tráfego gerados pela comunicação entre um sujeito e uma máquina — v. g., a consulta de sítios da internet."
Ou seja, na síntese efetuada no voto de vencido, a primeira conclusão a extrair do acórdão é a de que, "no que respeita à obrigação dos fornecedores de serviços de comunicações eletrónicas conservarem os dados de base que não pressupõem a análise de quaisquer comunicações (incluindo os endereços de protocolo IP que identificam a fonte de comunicação), "o Direito da União Europeia não põe em causa a ponderação de proporcionalidade feita pelo Tribunal Constitucional no Acórdão 420/2017, sendo esta conforme ao parâmetro europeu, cujo sentido foi clarificado pela jurisprudência do Tribunal de Justiça."
Perante a diversidade de meios de prova vêm a doutrina e a jurisprudência assinalando que, em termos de unidade do sistema jurídico, se impõe a necessidade de harmonização entre o regime dos artigos 187° a 189°, do Código de Processo Penal e o regime da Lei n° 32/2008, de 17 de julho, donde resulta que o daquele se aplica à interceção de comunicações, obtida em tempo real, a decorrer, e interceção das comunicações entre presentes, enquanto o desta tem como âmbito de aplicação a obtenção de dados que concernem a comunicações relativas ao passado ou seja, conservadas ou armazenadas, em arquivo, como se extrai até do consagrado no seu artigo 1°, n° 1. Os artigos 187.° a 189.° do Código de Processo Penal, regulam o recurso aos dados relativos a conversações ou comunicações telefónicas em tempo real, enquanto o acesso aos dados conservados pelas operadoras por conversações ou comunicações telefónicas passadas é regulado pela Lei n°32/2008, de 17 Julho.
O n°1 do artigo187.° citado, delimita o objeto dessa regulação, "a interceção e a gravação de conversações ou comunicações telefónicas", seja, o que diz respeito a comunicações a ocorrer, a conversações ou comunicações telefónicas em tempo real. O que aí se visa é a interceção e a gravação de dados de conteúdo das ditas conversações ou comunicações telefónicas em tempo real. Por isso, seja conversação ou comunicação e o que lhe é conexo, necessariamente, a fonte telefónica ou informática, caberá nas normas dos artigos 187.° a 189.°. Já se o que interessa são comunicações passadas, localizadas no tempo e no espaço, chama-se à colação a Lei n°32/2008, de 17 de Julho, que define o seu objeto no seu artigo 1.° "... regula a conservação e a transmissão dos dados de tráfego e de localização relativos a pessoas singulares e a pessoas coletivas, bem como dos dados conexos necessários para identificar o assinante ou o utilizador registado, para fins de investigação, deteção e repressão de crimes graves...", e enuncia no seu artigo 4.°, as categorias de dados a conservar e, no artigo 6°, o período de conservação (um ano a contar da data da conclusão da comunicação).
O meio de prova de transmissão desses dados só pode ser autorizado, por despacho fundamentado do JIC, como prevê o artigo 9, n.º 1, daquela Lei "... se houver razões para crer que a diligência é indispensável para a descoberta da verdade ou que a prova seria, de outra forma, impossível ou muito difícil de obter no âmbito da investigação, detecção e repressão de crimes graves".
São, pois, dois meios de prova diferentes, um as escutas telefónicas, outro a conservação e transmissão dos dados. O primeiro regulado nos artigos 187.° a 190.° do Código de Processo Penal. O segundo previsto nos artigos 4°, 6° e 9° da Lei 32/2008, agora declarados inconstitucionais nos termos do acórdão n° 268 do Tribunal Constitucional.
O acórdão do Tribunal Constitucional não tem aplicação no segundo segmento de declaração de inconstitucionalidade, no que tange ao artigo 9° porque não se vislumbra que a falta de notificação de qualquer dado armazenado tenha estado na base da autorização das interceções telefónicas autorizadas nos autos.
E também não tem aplicação o primeiro segmento de tal acórdão. Por uma razão simples. O meio de obtenção de prova que está em causa - autorização de interceções telefónicas - não foi o aproveitamento ou transmissão dos metadados a que os artigo 4° e 6° se referem.
O artigo 4.° identifica as categorias de dados a armazenar pelos fornecedores de serviços de comunicações eletrónicas publicamente disponíveis ou de uma rede pública de comunicações; o artigo 6.° determina a obrigação da sua conservação pelo período de um ano, a contar da data da conclusão da comunicação; e o artigo 9.° estabelece as condições de transmissão de dados armazenados ao Ministério Público ou à autoridade de polícia criminal competente.
O que determinou a autorização das interceções telefónicas não foi o aproveitamento ou a transmissão dos metadados armazenados ao abrigo das normas agora declaradas inconstitucionais. Nos autos não houve aproveitamento da aplicação dessas normas. Nem as mesmas foram invocadas. Nem sequer houve despacho judicial exigido pelo artigo 9°.
Dispõe o artigo 187.°, n° 1, do Código de Processo Penal,: «A intercepção e a gravação de conversações ou comunicações telefónicas só podem ser autorizadas durante o inquérito, se houver razões para crer que a diligência é indispensável para a descoberta da verdade ou que a prova seria, de outra forma, impossível ou muito difícil de obter, por despacho fundamentado do juiz de instrução e mediante requerimento do Ministério Público, quanto a crimes:
a) Puníveis com pena de prisão superior, no seu máximo, a 3 anos;"
Ora, ao crime que determinou a autorização das interceções telefónicas no início do inquérito cabe, em abstrato, pena de prisão superior a 3 anos. Integrando-se, pois, no catálogo de crimes, suscetíveis de serem investigados por via de escutas, desde que preenchidos todos os pressupostos legais de validade das interceções e gravações telefónicas. Como no caso estiveram, com promoção do Ministério Público e autorização do Juiz de Instrução Criminal, nos termos dos artigos 187.° a 189.° do Código de Processo Penal.
Com o que, forçoso é concluir pela inaplicabilidade ao caso dos autos do mencionado acórdão do Tribunal Constitucional, dado que o que aqui está em causa é um meio de prova diferente, as escutas telefónicas, como o próprio arguido não deixa de reconhecer. Escutas telefónicas cuja legalidade foi até atacada, nos termos a que acima se aludiu.
Escutas telefónicas como meio de obtenção de prova, nos termos do Código de Processo Penal, e aproveitamento e transmissão dos metadados ao abrigo da Lei 32/2008 são meios diferentes de obtenção de prova, com pressupostos de utilização diferentes, teleologicamente orientados para finalidades diversas, obtenção de dados de conteúdo no primeiro caso e obtenção de dados de identificação, tráfego ou localização no segundo. Obtenção de conteúdo em tempo real no primeiro caso, aproveitamentos de dados armazenados no segundo, Não são, pois, confundíveis. E um e outro têm assento legal distinto.
As interceções realizadas ao abrigo do normativo do Código de Processo Penal visaram captar e gravar conversações ou comunicações em trânsito, a ocorrerem, em tempo real. Não visaram conversações já realizadas nem objetivaram obtenção de dados de tráfego.
O acórdão do Tribunal Constitucional não bole em mínima medida sequer com o regime processual penal das interceções telefónicas. Nem tal acórdão visou qualquer das normas em que assentam, nem o objeto de análise do acórdão era a obtenção de dados de conteúdo em tempo real.
Forçoso é, pois, concluir que não se aplica às interceções autorizadas nos autos o citado acórdão do Tribunal Constitucional.
Assim sendo, também por este fundamento, não se verifica qualquer nulidade ou proibição de prova que possa ser assacada às escutas autorizadas nos autos.
Mas ainda que assim fosse, ou seja, ainda que se concluísse pela nulidade deste meio de prova, não estaria posta em causa a validade dos restantes meios de prova.
A questão que podemos considerar aceite denominar da "contaminação dos restantes meios de prova" será neste momento ponderada, para que na pressente decisão, em que é valorada a demais prova produzida, se tenha assente quais os meios de prova de que o tribunal se irá socorrer.
E a questão é ainda mais pertinente quando aquilo que habitualmente se aborda a este nível é o efeito à distância das proibições de prova em processo penal.
Com efeito, como bem expõe Helena Mourão (O efeito-à-distância das proibições de prova no direito processual penal português, Revista Portuguesa de Ciência Criminal, ano 16, n° 4, p. 586), não só ao nível da jurisprudência, mas também a nível doutrinal, se tem defendido, entre nós, que as proibições de prova constituem não só instrumentos de protecção de direitos individuais, mas também de interesses de carácter supra-individual, representados pelo Estado e pela comunidade, que ultrapassa a esfera jurídica do arguido, e que, enquanto valores do Estado de Direito, consubstanciam barreiras à busca da verdade (Jorge de Figueiredo Dias, "Para uma reforma global do processo penal português — Da sua necessidade e de algumas orientações fundamentais", in Para Uma Nova Justiça Penal, Coimbra, 1983, pp. 208 e ss.; João Castro e Sousa, A Tramitação do Processo Penal, Coimbra, 1985, p. 197, nota 264; Manuel da Costa Andrade, Sobre as Proibições de Prova em Processo Penal, pp. 33, 75 e ss. e 142; Germano Marques da ., Curso de Processo Penal - II, Lisboa, 1999). Distinguindo-se, assim, das meras regras de produção de prova que visam apenas disciplinar o procedimento exterior da prova na diversidade dos seus meios e métodos, não determinando a sua violação a reafirmação contrafáctica através da proibição de valoração (Manuel da Costa Andrade, op. cit., p.84; Jorge de Figueiredo Dias, Direito Processual Penal, 1° vol., p. 446; Germano Marques da ., op. cit., pp. 118 e ss.; e ainda João Conde Correia, op. cit., p. 156, que afirma (em sentido próximo ao de Teresa Beleza, "Tão amigos que nós éramos" - O valor probatório do depoimento de co-arguido no processo penal português", Revista do Ministério Público, n9 74, 1998, p. 45) a "necessidade de distinguir entre a obtenção ou valoração de uma prova proibida e a obtenção de provas permitidas, mas logradas sem a observância das respectivas formalidades legais. Naquela situação, o vício cometido é a violação de uma proibição de prova, conduzindo à eventual proibição da sua valoração. Já, nesta situação, o vício cometido pode constituir causa de inexistência, de nulidade ou de mera irregularidade, consoante o teor da previsão legislativa").
E propõe aquela que se alcance uma delimitação mais precisa e menos genérica dos conceitos em causa, acabando por concluir parece-nos que proibição de prova em sentido próprio no sistema processual penal português é somente aquela norma probatória proibitiva cuja violação possa redundar na afectação de um dos direitos pertencentes ao núcleo eleito no artigo 32/8 da Lei Fundamental e que o artigo 126 do Código de Processo Penal manteve, sem alargar. Não basta a mera violação de uma proibição legal em matéria probatória, como na lei italiana, nem a violação de um qualquer direito fundamental, como na lei espanhola (...).
Assim, se o critério fundamental aqui apontado é o da afectação do núcleo valorativo dos direitos elencados no artigo 32/8 da Lei Fundamental, não é necessário que a lei comine, expressamente, a sanção da nulidade ou outra fórmula análoga para que estejamos perante uma proibição de prova. Por seu turno, não é por existir uma regra que comine a nulidade no Livro III do Código de Processo Penal que estaremos diante de uma proibição de prova (op. cit., pp. 589 e 590).
E encontra a autora a justificação do efeito-à-distância das proibições de prova em fundamentos constitucionais e não com recurso à norma do artigo 122° n° 1 do Código de Processo Penal (op. cit., pp. 595 a 601).
Não obstante, o artigo 122° n° 1 do Código de Processo Penal, sem dúvida aplicável às nulidades decorrentes da violação de regras de produção de prova (como a outras nulidades), tem sido, na maioria das vezes, interpretado como se nele se encontrasse o fundamento para o efeito-à-distância das proibições de prova, assim como tem sido a propósito deste ou da denominada doutrina do "fruit of the poisonous tree" que mais se tem desenvolvido o alcance do normativo.
O artigo 122° n° 1 determina que as nulidades tornam inválido o acto em que se verificarem, bem como os outros que dele dependerem e aquelas puderam afectar.
No mesmo sentido que já se afirmou no processo relativamente aos actos processuais subsequentes à prática do meio de prova declarado nulo, também quanto a outros meios de prova, só poderiam ter-se como afectados por aquela nulidade se fossem dependentes funcionalmente das interceções telefónicas declaradas nulas (Germano Marques da Silva,, em trecho já citado, afirma "É necessário que entre o acto viciado e os demais exista um nexo funcional e não uma simples dependência acidental ou temporal: o acto afectado de nulidade derivada deve encontrar no acto originariamente viciado a premissa lógica e jurídica da sua validade. Tal relação entre os actos há-de ser, pois, uma dependência substancial e não uma sucessão meramente cronológica de modo que, faltando o primeiro, o outro não possa sobreviver autonomamente. A dependência há-de ser uma dependência causal e necessária, lógica e jurídica").
Ora, analisados os restantes elementos de prova produzidos nos autos e com relevo neste particular - vigilâncias policiais, apreensões, depoimentos de testemunhas e declarações de arguidos - não se poderá concluir que estes dependam substancialmente das interceções telefónicas. Há informações que foram recolhidas por essa via, mas a investigação decorreu, paralelamente, com outras diligências, que igualmente contribuíram para alcançar os resultados que foram obtidos e que sempre o poderiam ser, independentemente das escutas.
Por exemplo, como se referiu já, das apreensões realizadas aos arguidos e da análise informática aos seus aparelhos telefónicos e computadores resultaram elementos de prova bem mais preponderantes que os que resultaram das interceções telefónicas.
Não existe, portanto, uma dependência funcional entre os restantes meios de prova do processo e as interceções telefónicas cuja nulidade o arguido pretendia ver declarada.
No mais, a conexão e interpretação que tem sido feita quanto ao artigo 122° n° 1 do Código de Processo Penal com o efeito-à-distância das proibições de prova, tem a virtualidade de nos permitir compreender o que poderá ser considerado prova secundária válida neste processo.»
Sustentada em jurisprudência, doutrina e na interpretação do acórdão do Tribunal Constitucional que declarou a inconstitucionalidade de normas da chamada “lei dos metadados”, não se vislumbra como poderá o Tribunal da Relação de Lisboa ir mais longe na justificação da legitimidade da investigação no tocante à prova recolhida, e na conformidade do seu uso em sede de julgamento.
É certo que o recorrente ainda invoca o efeito de contaminação da prova recolhida posteriormente, naquilo que é a teoria da “poisonous tree”, mas cujos efeitos ficam exauridos desde logo por não se reconhecer a ilegalidade na obtenção da prova por escutas, nem o acesso a metadados em termos que o Tribunal Constitucional tenha declarado como inadmissíveis à luz da constituição.
Ainda assim, sempre se dirá que, de forma profilática, também nesta matéria o acórdão recorrido tomou a dianteira acrescentando: « interesses e exigências é garantido.
E nessa matéria assume particular relevo o bem fundamentado Acórdão do Tribunal Constitucional, proferido no processo n° 39/2004, de 24 de Março de 2004 e que continua atual.
Aí se faz notar que as outras provas, que não a originariamente ferida de nulidade, constituem, quando isoladamente consideradas, meios legais de prova, aptos, em princípio, a ser utilizados no processo. A sua supressão, quando ocorra, constitui assim uma extensão da ilegalidade de meio de prova anterior.
(...) Pode, assim, afirmar-se com segurança que o sentido de uma norma prescrevendo que a invalidade do acto nulo se estende aos que deste dependerem ou que ele possa afectar (artigo 122°, n° 1 do CPP) é, desde logo, o de abrir caminho à ponderação que - como adiante se verá - subjaz à chamada doutrina dos «frutos proibidos». Isto, cotejado com a apontada amplitude das garantias de defesa contidas no artigo 32° da CRP, leva a que este Tribunal considere que, efectivamente, situações de «efeito-à-distância» não deixam de constituir uma das dimensões garantísticas do processo criminal, permitindo verificar se o nexo naturalístico que, caso a caso, se considere existir entre a prova inválida e a prova posterior é, também ele, um nexo de antijuridicidade que fundamente o «efeito-à-distância», ou se, pelo contrário, existe na prova subsequente um tal grau de auto autonomia relativamente à primeira que a destaque substancialmente daquela.
Outro sentido não tem, alias, a doutrina dos «frutos da arvore venenosa», desde a sua formulação no direito norte-americano, que não seja aquele que exige a ponderação do caso concreto determinando a existência, ou não, desse nexo de antijuridicidade entre a prova proibida e a prova subsequente que exige para esta última o mesmo tratamento jurídico conferido àquela.
Efetivamente, o desenvolvimento doutrinal e jurisprudencial que a teoria dos frutos da árvore venenosa tem sofrido ao longo de décadas está suficientemente sedimentada para que dela se possam retirar ensinamentos inteiramente válidos para o nosso direito processual penal.
Seguindo de perto o supra referido Acórdão do Tribunal Constitucional, através de uma longa elaboração jurisprudencial o Supremo Tribunal norte-americano pôde particularizar as circunstâncias em que uma prova reflexa deve ser excluída do efeito próprio da doutrina do «fruto da árvore venenosa». São fundamentalmente três esses grupos de circunstâncias: a chamada limitação da «fonte independente» (independent source limitation); a limitação da «descoberta inevitável» (inevitable discovery limitation); e a limitação da «mácula (nódoa) dissipada» (purged taint limitation).
A primeira situação, a «fonte independente» (..) onde se excepcionou, expressamente, a existência de uma independent source corroborando os conhecimentos que também eram derivados da prova proibida; tal fonte possibilitaria a aceitação daqueles conhecimentos (...) a prova não será excluída como «fruto» a não ser que a ilegalidade tenha sido causa sine qua non da própria descoberta dessa prova(...).
A outra restrição (...) assenta na ideia de que a projecção do efeito da prova proibida não impossibilita a admissão de outras provas derivadas quando estas tivessem inevitavelmente (...) sido descobertas, através de outra actividade investigatória legal(...). Nestas situações, está em causa a demonstração pela acusação de que uma outra actividade investigatória levada a cabo, mas que seguramente iria ocorrer naquela situação, não fora a descoberta da prova proibida, conduziria inevitavelmente ao mesmo resultado.
A terceira limitação pode ser denominada «mácula dissipada». Nesta admite-se que uma prova, não obstante derivada de outra prova ilegal, seja aceite, sempre que os meios de alcançar aquela apresentem uma forte autonomia relativamente a esta, em termos tais que produzam uma decisiva atenuação da ilegalidade procedente.
Mas o desenvolvimento doutrinal da questão do efeito-à-distância das proibições de prova tem sofrido, igualmente, grande evolução fora do sistema jurídico-criminal norte-americano.
Seguindo o estudo aprofundado por Helena Mourão (na obra já citada, pp. 601 a 620), ao nível dos restantes sistemas jurídico-criminais, para além das já mencionadas restrições ou em sentido idêntico às excepções apontadas pela jurisprudência norte- americana, tem-se defendido a excepção da "esfera de protecção da norma", de acordo com a qual se deve averiguar relativamente a cada proibição de prova concreta se o seu fim de protecção exige ou não o afastamento processual das provas secundárias obtidas na sequência da violação inicial (encontramos ecos desta posição em José Costa Pimenta e Manuel da Costa Andrade).
Também a doutrina dos percursos hipotéticos de investigação aduz novos elementos a esta questão, representando a projecção no plano processual do instituto substantivo do comportamento lícito alternativo. Esta construção afirma a irrelevância do efeito-à-distância das proibições de prova e a admissibilidade da utilização da prova mediata nos casos em que, com base num juízo de causalidade hipotética, seja possível afirmar que as autoridades de investigação teriam certamente, ou com fortes probabilidades, chegado igualmente ao mesmo meio de prova secundário, através de outro percurso de indagação, lícito e respeitador das proibições de prova. Trata-se de constatar que, nestas situações, o respeito pelos limites impostos aos métodos de obtenção de prova não teria protegido o arguido da condenação.
As concretizações desta ideia inicial variam, no entanto, no que respeita ao grau de certeza de que se deve revestir o processo de investigação hipotético para que se possa rejeitar o tele-efeito.
Segundo a jurisprudência do Bundesgerichtshof alemão, basta que não fique provado que, sem a violação, os órgãos de investigação não teriam alcançado as provas secundárias. Claus Roxin reclama um grau de probabilidade máximo, a aferir em face das investigações desenvolvidas até então, quanto ao alcance das mesmas provas indirectas. Manuel da Costa Andrade entende ainda que deve ser exigido um grau de convicção semelhante ao requerido para fundar a condenação do arguido, uma vez que a valoração da prova secundária ilicitamente obtida pode, muitas vezes, significar o afastamento do último obstáculo que se levanta à sua condenação. Deverá, por isso, valorar-se pro reo os coeficientes de dúvida e indeterminação em concreto subsistentes.
Finalmente, há a notar a posição adotada pela autora, que defende que limitações aceitáveis ao efeito-à-distância das proibições de prova no sistema processual penal português, serão as que resultam dos processos de conhecimento independentes e limpeza do processo. Nada obstaria a que as provas mediatas possam ser valoradas quando provenham de um processo de conhecimento independente e efetivo, uma vez que não há nestas situações qualquer relação de causalidade entre o comportamento ilícito inicial e a prova mediatamente obtida. Também poderá ser utilizada no processo toda a prova secundária a que os órgãos de investigação criminal não teriam chegado, de uma perspetiva de relação causal, sem a violação da proibição de prova, mas relativamente à qual se pode dizer que já nenhum nexo causal efetivo subsiste entre tal prova mediata e a violação inicial.
Em todas estas situações de limpeza do processo nenhum obstáculo se coloca também à possibilidade de utilização de prova indiretamente obtida através da violação de uma proibição de prova, uma vez que, mediante um acontecimento superveniente, traduzido numa atuação dos órgãos de investigação, do próprio arguido ou de um terceiro, e dotado da capacidade de interferir na relação causal que se estabelece entre a primitiva conduta violadora e o resultado probatório secundário, a prova mediata cessa de poder ser perspetivada como tendo sido obtida através do comportamento inicial ilícito.
Perante o que assim fica exposto, no caso dos autos, em caso de eventual consideração da nulidade/proibição de prova das interceções telefónicas, não pode concluir-se que os restantes meios de prova produzida em audiência de julgamento tenha sido afetados de forma causal e necessária por essa putativa nulidade daquele meio de prova resultante das interceções telefónicas.
Por conseguinte, não só se entende não se verificar qualquer nulidade ou proibição de prova por aplicação do acórdão do Tribunal Constitucional que rege sobre os metadados, como, ainda que tal sucedesse, sempre a demais prova produzida nos autos poderia ser livremente valorada e seria suficiente para a demonstração da essencialidade dos factos supra considerados.»
Pelo exposto, também neste argumento naufraga o recurso.
l)- das consequências sobre os factos provados
Aqui chegados, temos que concluir que não se justifica alterar o acervo factual provado, tal como definido pelo Tribunal a quo. Nenhum vício é reconhecido que inquine as provas produzidas nas quais se baseia a decisão, a qual não padece de vícios que a invalidem.
Como acima se expôs, as escutas são válidas e o Tribunal delas se socorreu com acerto quando as aceitou como tal. É extensa a fundamentação que as analisa, não se detectando alguma imprecisão, desacerto ou incongruência na análise valorativa das intercepções telefónicas.
Assim sendo, mantendo-se inalterada a decisão de facto, cumpre entrar nas questões relativas ao enquadramento jurídico.
m)- qualificação jurídica dos crimes de corrupção e peculato
O recurso do Arguido AA questiona, mais do que uma vez, a prática, pelo mesmo, dos crimes de corrupção e peculato. Compulsados os termos das suas motivações, de forma a melhor compreender as conclusões apresentadas, poderemos concluir que a discordância não se prende com a operação de qualificação jurídica dos factos, mas sim com a prova desses mesmos factos.
Com efeito, o recorrente mistura amiúde a sua discordância com a decisão de dar certo facto como provado, com a conclusão que, dessa forma, não poderia o Tribunal condená-lo pela prática do referido crime. Porém, à luz da metodologia seguida pelo Tribunal para produzir a sua decisão, a única coerente com os termos do processo e do julgamento tal como consagrados na lei processual, não pode este Tribunal de recurso censurar a decisão do Tribunal recorrido.
Como vimos supra, não há motivos para alterar o elenco factual provado. Não foram detectadas as invocadas nulidades, as violações dos princípios do in dubio pro reo, do caso julgado, do contraditório que determinassem alguma alteração ao conjunto de factos provados o qual constitui a reconstituição possível da verdade ontológica, ou seja, tais factos traduzem a realidade judiciária sobre a qual o Tribunal é chamado a aplicar a lei.
Ora, com os factos provados, tal como resultaram no acórdão recorrido, não restam dúvidas de que se mostram preenchidos os tipos de crime em causa, tal como ficou por demais fundamentado pelo Tribunal a quo.
Quando o Recorrente pede ao Tribunal da Relação de Lisboa que verifique se há factos bastantes para sustentar a condenação por todos os crimes imputados ao arguido a resposta é francamente positiva, compulsados os fundamentos de direito do acórdão. A exposição sobre os elementos de cada tipo e o seu preenchimento com os factos provados é manifestamente suficiente, sendo redundante repeti-la ou acrescentar mais considerandos, num exercício fútil e contrário ao princípio de síntese que deverá guiar a decisão judicial. O Tribunal de Recurso não intervém para repetir fundamentos ou acrescentar mais argumentos no mesmo sentido da decisão recorrida, quando esta é sustentável com a fundamentação original.
Assim, e porque a discordância expressa no recurso não é, verdadeiramente, de direito, mas apenas de facto, pois entende o Recorrente que certos factos, essenciais para o preenchimento destes tipos, não teriam ficado demonstrados pela prova produzida, nada mais há a acrescentar. Não lhe assistindo razão nessa parte, como acima foi referido, também aqui naufraga a sua pretensão.
O mesmo é válido para a pretensão recursiva do Arguido CC. Entende este Arguido que, mesmo com os factos provados, não resulta que tenha sido entregue contrapartida penalmente relevante que permita preencher o tipo criminal de corrupção, o que importaria a sua absolvição.
Da decisão recorrida retira-se: « o arguido procedeu à entrega de inúmeros ...para ... de ... e outras benesses, o que constitui uma vantagem com expressão até pecuniária (mesmo que não tenha que a ter), dádivas essas que só ocorreram nos termos provados - pela sua reiteração e duração - por força das funções que aquele exercia profissionalmente, e que foram aceites pelo mesmo, neste caso em troca de actos praticados contrários aos seus deveres, como era pretensão do arguido CC.».
Dos factos provados retira-se que «17.- O arguido AA ., recebendo como contrapartida tratamento privilegiado junto do ..., designadamente para assistência a ... em condições favoráveis, aceitou proceder como solicitado.
20.- Como recompensa, o arguido AA recebeu do arguido CC ...e ... para assistir gratuitamente a ... de ... no ..., em Lisboa, designadamente no ..., designado por «..», incluindo acesso a lounge com comida e bebida e parqueamento automóvel.
21.- O arguido AA recebeu, ainda, produtos de ..., como camisolas e casacos da... e, ainda, promessa de contrato de trabalho no Museu Cosme Damião, pertencente ao ..., para um sobrinho daquele, assim como tratamento privilegiado no ..., designadamente sendo-lhe facilitado o acesso ao contacto com os jogadores da … nos espaços que passou a frequentar.»
São estas as ofertas que, no entender do Arguido CC, não são contrapartida penalmente relevantes que permitam preencher o tipo criminal de corrupção.
Não podemos escamotear que os factos provados traduzem a oferta, e a promessa de oferta, de um conjunto de benefícios que, indubitavelmente, têm expressão pecuniária. Porém, mais do que o valor dos artigos de ..., dos ..., do acesso ao ...e aos jogadores, a própria proximidade ao ..., a familiaridade com o espaço da Luz, da equipa, do ... são claramente relevantes para um adepto do .... Qualquer adepto do ... gostará de sentir-se próximo da equipa, do ... da sua preferência. Qualquer fã de uma banda musical gostará de estar próximo dos seus momentos em palco ou fora dele. Qualquer entusiasta cinematográfico valorará a possibilidade de estar presente na criação de um filme.
Esta proximidade, ainda que não seja traduzível em valor monetário, e pareça desprezível, tem um conteúdo que ao qual o cidadão comum concede um valor. O acesso gratuito, ainda que a pequenos artigos, de reduzido valor, é um factor de satisfação pessoal que configura uma clara vantagem relativamente aos demais. Vantagem essa que tem relevo pela indisponibilidade para o comum dos cidadãos.
Veja-se como já foram julgadas relevantes despesas de deslocação e alojamento no estrangeiro [ECLI:PT:TRL:2011:504.04.6JFLSB.L1.5.62 – Acórdão de 15/11/2011 do Tribunal da Relação de Lisboa, Desembargador Artur Vargues], ou mesmo como, mesmo que nada tenha sido prometido ou entregue, o crime se consume ainda assim [ECLI:PT:TRC:2008:247.94.7JAAVR.C1.EE - Acórdão de 01/10/2008 do Tribunal da Relação de Coimbra, Desembargador Fernando Ventura] e [ECLI:PT:TRP:2021:102.16.1TRPRT.P1.88 - Acórdão de 14/04/2021 do Tribunal da Relação do Porto, Desembargadora Maria Deolinda Dionísio] no qual se refere que «Na promessa de suborno, a consumação do crime de corrupção ativa não depende do efetivo recebimento da vantagem ou do suborno, não sendo sequer necessário que o corruptor tenha a intenção de efetivamente cumprir a promessa e entregar o suborno ou a peita ao funcionário.»
Como tal, não merece censura o enquadramento jurídico realizado no acórdão recorrido, mantendo-se, pois, que com os factos provados ficaram preenchidos os elementos objectivos e subjectivos do crime de corrupção activa, praticado pelo Arguido CC.
n)- do crime único, continuado
Diferente é a discordância quanto ao número de crimes praticados. Ou seja, é de questionar: relativamente aos seis crimes de violação do segredo de justiça, nove crimes de acesso indevido, nove crimes de violação do dever de sigilo, e vinte e oito crimes de acesso ilegítimo, poderá o Arguido apenas ser condenado por um único crime, por cada tipo, na forma continuada?
Mais uma vez, a questão suscitada pelo Recorrente não é nova, pelo que não foi escamoteada na decisão recorrida. Após um largo considerando que define os parâmetros do crime continuado, recorrendo à citação de pertinente doutrina e deixando claros os pressupostos para tal figura, concluiu o acórdão recorrido da seguinte forma:
«O índice da unidade ou pluralidade de resoluções criminosas e da sua unificação face a solicitações de uma mesma situação exterior permite no caso vertente concluir que o arguido AApreencheu efetivamente por seis vezes o tipo - objetivo e subjetivo - do crime em apreço, o mesmo sucedendo em relação aos demais crimes de que vem acusado e pronunciado.
Com efeito, face à matéria de facto provada, é possível destrinçar distintas resoluções criminosas de cada vez que o arguido se decide a aceder a um diferente processo, sem que exista qualquer circunstância externa que diminua sensivelmente a conduta do agente e que possa levar à conclusão de estamos face a um crime continuado.
O que dissemos quanto a este tipo de crime aplica-se igualmente aos demais tipos de crime que iremos analisar.»
Esta conclusão merece acolhimento por se mostrar de acordo com as premissas da figura do crime continuado.
Ademais, sempre aditaremos que, tal como se mostram provados os factos, não é possível concluir que o Arguido agiu animado por uma única resolução criminosa, sob a qual pudéssemos unificar a prática de diversas comissões de um mesmo crime.
Com efeito, a oferta e aceitação de diversas “contrapartidas” em diferentes momentos configura um constante renovar da resolução criminosa, correspondendo a um novo momento de preenchimento do elemento subjectivo, depois traduzido na prática objectiva apurada, ou seja, à prática de diversos crimes autónomos.
Por outro lado, e porque, efectivamente, não foi demonstrada qualquer circunstância externa que diminua sensivelmente a culpa do Arguido AA, também não se mostra sustentável o entendimento do Recorrente segundo o qual, no caso que nos ocupa, deveriam os factos ser unificados como uma única comissão criminosa, sob a cobertura do crime continuado.
p)- das penas
Ambos os recorrentes questionam as penas determinadas pelo Tribunal a quo. O Arguido AA conclui que os crimes de violação do segredo de justiça, de acesso indevido, de violação do dever de sigilo, de acesso indevido e de peculato, deveriam ser punidos com pena de multa, e o crime de corrupção ver a pena reduzida para o seu limite mínimo legal. Consequentemente, com novo cumulo jurídico, a pena única deverá ser suspensa na sua execução.
Por seu turno, o Arguido CC pugna no sentido da pena dever situar-se abaixo de metade da moldura penal abstracta do tipo de crime.
As razões do primeiro Arguido assentam na sua integração profissional, no seu comportamento anterior e posterior à prática do crime, sem reparos, a sua idade e a sua integração familiar, com família estável e três filhos, todos estudantes, reveladoras da desadequação da pena fixada.
Por seu turno, o Arguido CC, sopesando as exigências de prevenção especial, no seu entender reduzidas, com as reconhecidas exigências de prevenção geral que este tipo de crimes reclama, alcança a necessidade de uma menor punição. Apela às circunstâncias já decorrentes deste processo e desta condenação, para além da pena. A repercussão na sua vida profissional, com a perda do posto de trabalho no ..., com repercussão pública, já será suficiente para acautelar tais exigências de prevenção geral.
Vejamos o que ponderou o Tribunal no seu acórdão:
«Ponderando, temos, desde logo, e em primeiro lugar, o dolo direto com que os arguidos sempre agiram. E se o arguido CC, por um lado, surge como o elemento preponderante que desencadeou toda a sequência de crimes que se veio a consumir, por seu turno, o arguido AA levou a cabo um número significativo de crimes, sendo que sem a sua participação, aquele outro arguido não teria logrado alcançar os seus desideratos.
O modus operandi seguido não configura uma atividade rudimentar, antes se mostrando revelador de alguma determinação criminosa, pois que os arguidos agiram reiteradamente (ainda que o arguido CC no âmbito de uma única resolução criminosa), como o comprova o elevado número de situações demonstradas nos autos.
Na consideração da gravidade da conduta e do grau de culpa dos arguidos no que respeita em especial aos crimes mais graves (aqueles a que correspondem molduras penais mais pesadas) há a considerar os benefícios obtidos, que no caso do arguido AA não são elevados, mas no caso do arguido CC já temos uma situação diversa, posto que este arguido era quem, em última instância beneficiava mais com toda esta situação, tendo em vista as finalidades últimas pretendidas com a sua conduta.
Acresce que a motivação para a prática dos crimes não diminui em nada a gravidade dos factos, antes pelo contrário, estando-se perante práticas que, ainda que enraizadas na nossa comunidade, revelam um claro desrespeito pelos valores que devem em ultima ratio presidir à atividade desportiva e ao papel que ...s desportivos de grande dimensão desempenham na nossa sociedade.
Tudo quanto fica dito já revela bem a dimensão a nível de exigências de prevenção, que a decisão a adotar impõe em face dos crimes em causa.
Muito particularmente, as exigências de prevenção de ordem geral são muito elevadas. Ou seja, cabe no âmbito das funções de que se reveste o Tribunal reforçar por via da presente decisão a confiança nas normas violadas, e dar ao cidadão cumpridor um sinal de que os seus sacrifícios e o cumprimento da Lei não são em vão e que essa é a opção que compensa. De outra forma estar-se-á a incentivar a continuação de atividades criminosas já em curso ou mesmo a decisão de percorrer tal via, atenta a falta de resposta eficaz das autoridades ao seu combate.
Note-se que apesar de não termos aqui uma situação que choque do ponto de vista dos valores envolvidos, o resultado final decorrente da prática dos crimes, visa finalidades que importa desmotivar e, porventura mais do que isso, sensibilizar para a necessidade de alteração de comportamentos e práticas, tendo em vista alcançar uma mudança de mentalidade que não se antevê seja fácil de atingir.
Em termos de prevenção especial, é certo que os arguidos parecem ser pessoas com adequado enquadramento socioeconómico; tal, porém, não os inibiu de praticar os factos dos autos, o que demonstra que a motivação para a prática dos crimes nada tem a ver com a falta de enquadramento social, familiar ou profissional.
Acresce que o arguido AA em audiência de julgamento optou pelo direito ao silêncio, o que não o poderá prejudicar, mas também não o beneficia, posto que não existe uma situação de arrependimento comprovada que possa ser considerada a seu favor.
Já o arguido CC, tendo optado por prestar declarações, embora assumindo que praticou uma minoria de factos, nem sequer esses verbalizou como crimes relativamente aos quais revelasse verdadeiro arrependimento, sendo que em relação à maioria dos factos imputados na acusação/pronúncia, procurou passar para terceiros (no caso para a arguido AA .) a responsabilidade pela prática desses actos. O que ficou patente foi uma total falta de capacidade de auto-censura ou de interiorização do errado das suas condutas, bem como de sincero arrependimento.
Nestes termos, as exigências de prevenção especial não são insignificantes em relação a nenhum dos arguidos, ainda que nenhum deles tenha sofrido anteriores condenações (o que não constitui circunstância atenuante de relevo, dado que não praticar crimes é precisamente aquilo que se exige a todos os cidadãos).
O Tribunal acompanha ainda de perto as considerações expendidas a propósito do percurso de vida e da situação pessoal dos arguidos em sede de relatório social.»
Na determinação da medida da pena há que atender ao critério estabelecido no art.º 71.º do Código Penal. Foi o que o Tribunal de primeira instância fez.
Assim, e em primeiro lugar, há que atender à culpa. Sendo o juízo de culpa uma ponderação valorativa do processo de formação da vontade do arguido, tendo como critério aquilo que uma pessoa (enquanto homem médio com características pessoais similares à condição do agente) colocada na posição daquele faria perante a mesma situação, não poderemos deixar de a considerar elevada, relativamente a ambos os Arguidos, no caso que nos ocupa.
No fundo, o juízo de culpa releva, necessariamente, da intuição do julgador, sendo este assessorado pelas regras da experiência que lhe permitem proceder à valoração nos termos descritos. E no caso vertente, cada um dos arguidos deliberadamente violou normas que punem actos de conhecida gravidade, socialmente perniciosos, pelo desgaste do tecido social que deverá unir os cidadãos, minando as relações de confiança nas instituições e seus agentes.
Sendo ainda de ponderar o grau de ilicitude dos factos, o Tribunal não hesitou em qualificá-lo como elevado atento o modo de execução dos crimes, bem como graves as repercussões, pelas consequências que provocaram. A intensidade do dolo, sempre directo, foi igualmente tida em conta. Assim como o foram as condições pessoais de cada arguido, estado de integração social, profissional e familiar, bem como as suas habilitações literárias e situação económica tudo em conformidade com os respectivos relatórios sociais. Ao ter em conta os Certificados de Registo Criminal de ambos os condenados, o Tribunal avaliou a sua conduta anterior e posterior ao facto.
Ou seja, aquilo que os Arguido apontam como determinante para outro juízo quanto à medida da pena não é novo, e foi considerado na decisão recorrida. Estamos, pois, apenas perante uma discordância quanto à avaliação feita e decisão alcançada.
Quanto à escolha da pena de prisão em detrimento da pena de multa, ponderado o teor do art.º 70.º do Código Penal, não se vê como pode ser censurado o juízo de que em «(…) relação aos crimes em que é aplicável em alternativa pena de prisão ou de multa, o Tribunal optará pela aplicação de pena de prisão, por se entender que a aplicação de penas de multa neste caso, e atentas em particular as correspondentes exigências em termos de prevenção geral e especial, não satisfaria de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, nos termos e para os efeitos do artigo 70.° do Código Penal - não se afigurando necessárias mais considerações do que as já efetuadas a esse respeito supra».
Seguindo estes critérios, foram fixadas as seguintes penas:
a)- aos Arguido AA:
i. pela prática de um crime de corrupção passiva (1 a 8 anos de prisão), 2 anos de prisão;
ii. pela prática de seis crimes de violação de segredo de justiça (prisão até 2 anos ou pena de multa até 240 dias), 1 ano de prisão por cada um;
iii. pela prática de nove crimes de acesso indevido (prisão até 1 ano ou pena de multa até 120 dias), 6 meses de prisão por cada um;
iv. pela prática de nove crimes de dever de sigilo (prisão até 2 anos ou pena de multa até 240 dias), 9 meses de prisão para cada um;
v. pela prática de vinte e oito crimes de acesso ilegítimo (prisão até 3 anos ou multa), 1 ano e 6 meses de prisão por cada um;
vi. pela prática de um crime de peculato (prisão até 3 anos ou multa), 1 ano de prisão.
Dentro das molduras abstractas aplicáveis a cada um dos crimes, e acima enunciadas em itálico, a opção por valores situados no meio da moldura ou abaixo deste, mostram-se conformes aos critérios enunciados. Não ultrapassam a culpa apurada, revelam a ilicitude elevada, ponderam as necessidades de prevenção geral, e não esquecem as condições pessoais do Arguido.
Claro que, estando todos estes crimes numa relação de concurso (art.º 77.º/1 do Código Penal), a sua punição deverá realizar-se nos termos deste artigo. Assim, a pena única a fixar terá que atender à personalidade do condenado e aos factos no seu conjunto que resultam das respectivas condenações bem como às finalidades da punição (a prevenção geral, ou seja procurar evitar que sejam praticados mais crimes na comunidade não transmitindo uma imagem de impunidade, antes assegurando a efectiva aplicação da penalização consagrada na lei; bem como a prevenção especial, i.e., procurar atingir a reabilitação do condenado).
Assim, será necessário determinar a medida da pena no intervalo entre 2 anos (a mais alta) e 25 anos (a soma de todas, limitada a este máximo, nos termos do art.º 41.º/2 e 3 do Código Penal) para as penas de prisão a cumular. O Tribunal recorrido fixou a pena única em 5 anos de prisão. Não se vislumbra como poderia ser mais benevolente. Calculando 1/6 do intervalo lograria uma pena única de 5 anos e 10 meses. Ou seja, o Tribunal ficou aquém desse 1/6 do intervalo, critério por demais benevolente, posto que é média jurisprudencial apontar para 1/5 do intervalo apurado quando se pretende estabelecer uma pena única favorável ao condenado.
Tendo presente o critério que presidiu à fixação das penas individuais, a opção da primeira instância quanto à pena única só pode ser explicada pelo especial relevo dado às condições pessoais do Arguido e avaliação, como muito reduzidas, das necessidades de prevenção especial e pela apontada ponderação de que as penas aplicadas aos crimes de menor gravidade, em grande número, justificam um factor de compressão mais significativo.
Como tal, nada há a alterar no que toca à pena única encontrada.
Tal como pretendido pelo Recorrente, a pena única foi suspensa na sua execução pelo Tribunal a quo, pelo que nada há a acrescentar.
Relativamente ao arguido CC, foi o mesmo condenado, pela prática de um crime de corrupção ativa (1 a 5 anos de prisão), na pena de 2 anos e 6 meses de prisão. Está em causa apenas um crime, pelo que a opção por uma pena concreta abaixo da metade, mas acima do 1/3 do intervalo apurado, não merece censura. Assim como o juízo de suspensão da execução da mesma, tal como pretendido pelo Recorrente e já fixado na primeira instância. Não tendo sido questionadas as condições da suspensão, nada mais se impõe conhecer.
Inexiste, pois, fundamento para alterar a pena fixada.

DECISÃO
Nestes termos, e face ao exposto, decide o Tribunal da Relação de Lisboa julgar improcedentes os recursos apresentados pelos Arguidos AA . e CC.
Custas pelos Recorrentes, fixando-se em 5 UC a respectiva taxa de justiça.


Lisboa, 09 de Abril de 2024


Rui Coelho
(Relator)
Sara Reis Marques
(1.º Adjunto)
Alda Casimiro
(2.º Adjunto)
Luis Gominho
(Presidente da 5.ª Secção)