Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
1412/18.9YRLSB-2
Relator: VAZ GOMES
Descritores: DECISÃO ARBITRAL
FUNDAMENTAÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 03/21/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I - Por fundamentação de decisão arbitral deve entender-se o exame prático da prova produzida, a especificação dos factos provados, nomeadamente os admitidos por acordo ou por confissão, as razões que justificam a aplicação da lei aos factos e a conclusão resultante da conjugação dos factos provados com a lei aplicável.
II - A decisão arbitral não se limita a dirimir um litígio, ela constitui uma peça na ordem global prevenindo geral e especialmente novos litígios, tem um papel pedagógico que apenas pode ser lavado a cabo mediante uma fundamentação consistente, a decisão deve ser apoiada na prova deve indicar os depoimentos documentos ou peritagem em que se apoie, a decisão deve responder a todos os factos relevantes sempre com justificação e todas as questões decisivas devem ser solucionadas de modo justificado, o que não quer dizer que todos os argumentos jurídicos das partes tenham de ser considerados ou que as soluções possíveis careçam de exposição e de decisão, os pontos essenciais não podem ser passados em branco. A fundamentação não pode ser apenas formal deve ser efectiva, deve indicar as razões reais que levaram a tomar as opções feitas, opções essas que se fundam na prova e no Direito, os árbitros devem aplicar o Direito, as opções tomadas fundadas no Direito devem ser apresentadas em termos sérios, plausíveis e convincentes. As questões nucleares de que dependa a decisão, decididas e fundamentadas devem ser explicadas.
III - Se a sentença arbitral, na sua fundamentação não só discrimina os factos provados e não provados que criticamente analisa, identifica sem mácula o objecto do litígio, interpreta o art.º 25 do Contrato Constitutivo (em causa) à luz do Direito, explicita as normas jurídicas e as leis, assim como o iter lógico que, embora sucinto, não é ininteligível no seu todo, não ocorre fundamento para a sua anulação.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: I – RELATÓRIO
AUTORES na ACÇÃO de ANULAÇÃO de SENTENÇA ARBITRAL /AUTORES nesta última : S… (representados, juntamente com outro pelo ilustre advogado …, com escritório em Lisboa, conforme cópia do instrumento de procuração de 19/6/2017).
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RÉUS na ACÇÃO de ANULAÇÃO de SENTENÇA ARBITRAL /RÉS NESTA ÚLTIMA: F… (…), Fu…, S.A. (…) e N…, E.P.E. (…), interveniente principal na acção arbitral. (representada, entre outros pelo ilustre advogado com escritório em Lisboa, conforme  instrumento de procuração de 11/5/2017 e substabelecimento com reserva de fls. 396/397)
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Com os sinais dos autos. Valor da acção: 30.001, 00 euros (indicado na petição inicial)
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I. Inconformados com a decisão arbitral proferida aos 18/4/2018 pelo Tribunal Arbitral Ad Hoc instalado em Lisboa a 12/9/2016 com sede na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa,  que julgou a acção proposta pelo Autor S... contra os aqui Réus improcedente, consequentemente absolveu o demandado Fundo de Pensões assim como  Interveniente Principal N..., EPE PORTUGAL do pedido formulado, veio o Autor ao abrigo das disposições dos art.º 46/3/a subalínea vi e 42/3 da Lei 63/2011 de 14/12 e 2 intentar a presente acção de anulação dessa sentença, em suma dizendo:
a) O requerido Fundo de Pensões foi criado em 1999 e, a partir desse ano, através do contrato constitutivo do fundo de pensões N..., EPE/S...e do contrato de gestão do Fundo de pensões N..., EPE/S...entre o requerente, o requerido, passou a Fu..., S.A. a ser entidade gestora do Fundo, aos 15/3/2012 todos acordaram na introdução de alterações ao contrato constitutivo, celebraram uma nova versão, que é a vigente e se encontra junta como doc 1, o mesmo acontecendo em 2/1/2013, com uma nova versão junta como doc 2 constando do art.º 22 do Contrato constitutivo uma cláusula compromissória segundo a qual os diferendos que venham a surgir entre o requerente, o requerido e a requerida (N..., EPE) devem ser definidos com recurso à arbitragem, aos 7/3/2016 o requerente notificou o requerido da sua intenção de iniciar uma acção arbitral ao abrigo do art.º 22 citado, tendo aos 31/3/2016 indicado como seu árbitro Rui Pinto Duarte, os árbitros escolheram como juiz presidente Pedro Romano Martinez, aos 12/9/2016 foi assinada a acta de instalação do tribunal arbitral ad hoc com os 3 árbitros conforme doc 3, aos 20/10/2016 o requerente, então demandante, apresentou a sua petição inicial ao tribunal arbitral, conforme doc 4, o requerido, então demandado apresentou a sua contestação a 23/11/2016 conforme doc 5, aos 24/1/2017 o requerente apresentou a sua resposta às excepções conforme doc 11, o tribunal arbitral decidiu aos 10/2/2017 que a requerida deveria ser notificada para manifestar sobre se pretendia intervir na acção arbitral aceitando a composição do mesmo conforme doc 7, a requerida (N..., EPE) então interveniente principal veio apresentar a sua contestação aos 28/4/2017 conforme doc 8, o requerente apresentou a sua resposta às excepções da requerida conforme doc 9, tendo o tribunal proferido a sentença arbitral que foi notificada às partes a 18/4/2018 conforme doc 10 (Conclusões 1 a 22).
b) O litígio entre as partes está relacionado com o pagamento das pensões complementares pelo requerido (Fundo) aos associados do requerente que estejam reformados ou aposentados ou ainda em situação de invalidez, pensão que nos termos do art.º 25 do contrato constitutivo é calculada pela diferença entre a pensão correspondente à retribuição líquida que o CTA[1] auferiria se permanecesse ao serviço com as mesmas funções e categoria daquelas que desempenhava quando se reformou ou aposentou e a pensão paga pelos organismos oficiais  [PCf (pensão complementar)=PB (Pensão bruta correspondente à mencionada retribuição líquida do CTA)-PSS (Pensão mensal da CGA ou do CNP, líquida consoante o regime a aplicar], o requerido Fundo deve proceder ao pagamento mensal de uma pensão complementar aos CTA`s que se encontrem numa situação de reforma aposentação ou invalidez em relação à pensão paga pelo Estado; o cálculo dessa pensão implica 4 operações distintas, uma primeira que consiste em determinar a retribuição mensal bruta que o beneficiário receberia se permanecesse ao serviços com as mesmas funções e categoria, uma segunda que consiste em retirar àquela retribuição bruta todos os descontos mensais aplicáveis, por exemplo contribuições para a segurança social ou para a Caixa Geral de Aposentações e impostos em cumprimento do art.º 26 do contrato constitutivo, operação essencial porque serve de base de cálculo da pensão a pagara pelo Fu..., S.A., de acordo com a fórmula indicada, uma terceira operação que consiste que consiste na “brutalização”, ou seja é necessário projectar a pensão bruta virtual mensal para uma pensão líquida virtual mensal igual à retribuição líquida mensal que o beneficiário receberia se permanecesse ao serviço com as mesmas funções e categoria e é esse o sentido da expressão do art.º 25 de que a pensão líquida = a retribuição líquida, por isso é necessário que a pensão bruta virtual mensal projectada inclua todos os impostos e quaisquer outras contribuições ou montantes que seriam aplicáveis caso fosse paga essa pensão bruta virtual mensal, ou seja, parte-se do valor da retribuição líquida mensal que o beneficiário receberia se permanecesse ao serviço com as mesmas funções e categoria e projecta-se nesse valor a pensão bruta virtual com todos os impostos e quaisquer outras contribuições ou montantes que seriam aplicáveis caso fosse paga essa pensão bruta virtual mensal, uma quarta operação, efectuada a brutalização descrita, pode, então, subtrair-se o valor da pensão bruta mensal paga pelo Estado, obtendo-se então o valor da pensão complementar bruta mensal paga pelo Fundo de Pensões; no exemplo prático o documento 11 a retribuição líquida mensal que o beneficiário receberia se permanecesse ao serviço com as mesmas funções e categoria seria de 4.746,57, e sobre esse valor é necessário efectuar a operação de brutalização ou seja é necessário que a pensão bruta virtual mensal projectada inclua impostos contribuições e montantes que seriam aplicáveis, caso fosse paga essa pensão bruta virtual mensal, e o do 11 reflecte essa operação de brutalização, tendo sido efectuado o desconto  de 59,37 euros, relativo à contribuição para a ADSE, valor que deve ser tido em conta para a brutalização e bem assim como os descontos de IRS que, na linha oitava, surgem pelo valor de 7.532,93 euros, que é o resultado da brutalização, valor esse que é igual ao valor da pensão líquida mensal, a ele é necessário subtrair, finalmente, o valor da pensão bruta mensal paga pelo Estado, nesse exemplo no valor de 4.240,55 euros, valor que subtraído ao mencionado valor de 7.532,93 permite encontrar o valor da pensão complementar bruta paga pelo Estado, no montante de 3.292,39 euros no mencionado exemplo e referente ao ano de 2011 e é esse valor que surge descrito na 10ª linha da primeira coluna de Abonos do quadro do doc 11, valor, relativamente ao qual, será então necessário efectuar as retenções de IRS e contribuição do beneficiário para o Fundo que incidam sobre a própria pensão complementar paga pelo Fundo no exemplo referido os montantes respectivos de 988,00 euros+37,66 euros o que dá a pensão também descrita no doc 11 de 2.267,73 euros [art.ºs 23 a 118].
c) No cerne da operação de brutalização estão as suas diversas componentes que no entender do Autor incluem a Contribuição Extraordinária de Solidariedade (CES), Sobretaxa de IRS, IRS da categoria H e Contribuições para a ADSE, aquela operação de brutalização incluiu a Sobretaxa do IRS mas não incluiu o CES mas a operação de brutalização tem de incluir uma e outra, o requerido não realizou a operação de brutalização incluindo a CES nos anos de 2012, 2013, 2014, 2015 e 2016 que, por força do art.º 25, deveria ter sido incluída, já que o pagamento da pensão complementar pelo requerido estará sujeito, posteriormente, a todas as contribuições aplicáveis, como o IRS, CES e Sobretaxa de IRS; em 2013 a Sobretaxa do IRS foi criada de forma permanente, em 2103 o Fundo não procedeu à operação de brutalização incluindo o CES como resulta do doc 12, analisando esse documento verifica-se que somente a sexta e sétima linhas correspondem à operação de brutalização, a 4.ª linha referente a abonos do cálculo da retribuição líquida caso o beneficiário permanecesse ao serviço com as mesmas funções que é de 4.273,81 euros com esse montante efectua-se a operação de brutalização projectando a pensão bruta virtual, na sexta linha da 1.ª coluna Abonos surge líquido inflacionado com IRS+sobretaxa 7.707,23 euros ou seja contem as parcelas de IRS e sobretaxa de IRS, a Sobretaxa de IRS, que é um imposto extraordinário excepcional e transitório aplicável a todos os rendimentos sujeitos a IRS, incluindo os rendimentos que seriam auferidos pelos beneficiários do Fundo, daí que o Fundo tivesse que brutalizar a Sobretaxa do IRS para projectar a pensão brutal mensal virtual; na 7.ª linha, primeira coluna Abonos surge, então, a segunda operação de brutalização ADSE 63,61 euros, donde, adicionando ao anterior valor, temos 7.140,84 euros, o Fundo subtraiu a pensão bruta mensal paga pelo Estado e obteve o valor da pensão complementar bruta mensal de 2.900,29 euros que está indicada na 9.ª linha da primeira coluna de Abonos, a qual, sujeitando-se a impostos e outras contribuições, corresponde na 10.ª linha ao valor líquido de IRS e de contribuição para o Fundo de Pensões e ainda o valor correspondente ao CES que, forçosamente, se teria de aplicar à pensão complementar paga pelo requerido estando correcta a sua retenção e cobrança, mas essa cobrança e retenção da CES não substitui nem desobriga o requerido de fazer a operação de brutalização, incluindo o CES, pois que se trata de operações distintas, uma é a operação de brutalização para cálculo da pensão bruta virtual mensal para projectar o valor líquido da retribuição líquida mensal que o beneficiário receberia se permanecesse ao serviço com as mesma funções e categoria que é igual ao valor da pensão liquida mensal, a qual tem de incluir o CES além de todo os outros impostos e, outra operação, é a de aplicar o CES à pensão complementar que é paga pelo Fundo de Pensões, o que resulta de imposição da lei. [art.ºs 119 a 176].
d) No ano de 2011, o requerido procedeu ao pagamento das pensões complementares efectuando a brutalização incluindo o CES já nos anos de 2012, 2013, 2014, 2015, 2016 o requerido não efectuou a brutalização, incluindo o CES, que foi criado no Orçamento de Estado para 2011 e se manteve nos Orçamentos de Estado seguintes de 2012, 2013, 2014, 2015, 2016, acabando extinta a partir de 1/1/2017, nos termos do art.º 2/2, da Lei 159-B/2015, de 30/12, mas deveria ter feito, nos termos do art.º 25/1, do contrato constitutivo, incluiu a sobretaxa do IRS, que foi criada, de forma permanente, para o ano de 2013, através do art.º 187 da LOE (Lei do Orçamento do Estado) de 2013, sendo consagrada em 2014, pelo art.º 176 da LOE, em 2015 pelo art.º 191 da LOE e em 2016 pela LOE 159_D/2015 de 30/12 que manteve a sobretaxa do IRS para o ano de 2016 extinguindo-a a partir de 1/1/2017  e o ADSE [art.ºs 177/201 ].
e) De acordo com a doutrina do AcTC 187/2013, de 5/4, publicado no DR I série, de 22/4/2013, o CES é uma contribuição parafiscal para a segurança social com natureza excepcional e temporária adequada a fazer face, juntamente com outras medidas, à crise económico-financeira pela qual Portugal passou, tendo o mesmo Tribunal, aos 30/7/2014, pelo Ac 572/2014  mantido o mesmo entendimento, naquele acórdão 187/2013 entendeu-se  que a sobretaxa de IRS é um imposto extraordinário ou um adicional extraordinário a um imposto, qualificação que foi, aliás seguida no acórdão 412/2012 a respeito da sobretaxa extraordinária de 2011, apesar de aí apenas se apreciar a validade constitucional da norma do art.º 4/2, da Lei 49/2011, na parte em que fazia reverter, integralmente, a receita da sobretaxa para o Orçamento de Estado, a sobretaxa respeita a unidade e a progressividade do imposto sobre o rendimento e conclui que a criação da sobretaxa em sede de IRS tem carácter excepcional e transitório destinada a dar resposta à necessidades das finanças públicas extraordinárias, não contende com as regras da progressividade e da unidade de tributação do rendimento pessoal, do art.º 104/1 da CRP, ou seja, segundo o Tribunal Constitucional a sobretaxa do IRS é um imposto extraordinário excepcional e transitório, e tal como o CES têm a mesma natureza, são contribuições com natureza excepcional e transitória o que deveria ter levado o requerido a tratá-las da mesma forma e, assim, proceder também à brutalização incluindo o CES nos anos de 2012, 2013, 2014, 2015 e 2016 [art.ºs 202 a 226].
f) O contrato constitutivo é um contrato de direito privado celebrado ao abrigo da autonomia contratual das partes segundo o art.º 405/1, do CCiv que o LOE de 2012 não alterou nem as sucessivas leis do Orçamento do Estado dos anos de 2013, 2014, 2015, 2016, por isso, o art.º 25/1 está em vigor, segundo o requerente a vontade das partes nesse contrato consistiu em aplicar o princípio da equalização dos líquidos sem qualquer excepção ou limitação o que determiN..., EPEa que a operação de brutalização teria sempre que se fazer, incluindo eventuais agravamentos de impostos ou novas contribuições especiais, entretanto criadas, sendo o contrato constitutivo um negócio formal por força do n.º 1 do art.º 238 do CCiv qualquer interpretação que excepcione da operação de brutalização incluindo o CES não tem correspondência com o teor dessa disposição contratual, a sobretaxa do IRS e a CES têm a mesma natureza são ambas contribuições com natureza excepcional e transitória, o requerido não tinha qualquer possibilidade de as distinguir, ao não brutalizar o CES nos anos de 2012, 2013, 2014, 2015 e 2016 o demandado incumpriu o n.º 1 do art.º 25; a decisão arbitral considerou que sendo o contrato constitutivo de 1999, tendo o CFES surgido em 2011, as partes subscritoras do contrato constitutivo não poderiam ter previsto o CES, têm diferente previsão legal, a inexistência do CES aplicável aos associados do requerente no activo, criaria uma aplicação enviesada da equalização dos líquidos e por isso não a poderiam brutalizar. [227 a 257]
g) Uma vez que se trata de contribuições com a mesma natureza excepcional e transitória, a sentença arbitral teria que justificar, de forma clara, porque é que o requerido poderia distingui-las, a decisão arbitral no 5.º parágrafo da pág. 76 refere que “poder-se-ia concluir como o demandante que há uma conduta díspar ao não se proceder à brutalização da CES mas atender à mesma operação no que respeita à sobretaxa do IRS” subscreve a posição do demandante, adianta depois 3 razões para justificar que o requerido possa distinguir a operação de brutalização da CES e a operação de brutalização da sobretaxa do IRS, em primeiro lugar refere que ambas têm diferente previsão legal, mas a sentença não desenvolve esta conclusão, ou seja não é possível saber quais são as diferenças na previsão legal de uma e outra o que era essencial para a fundamentação, sendo essa passagem da sentença ininteligível e desprovida de fundamento, em segundo lugar a sentença refere que o IRS e a sobretaxa do IRS se encontram directamente na previsão do art.º 25 “justificando-se, por isso, a correspondente brutalização”, o raciocínio é o de que a CES não estaria prevista no art.º 25, mas no art.º 25 não se encontra nenhuma previsão relativa ao IRS e à sobretaxa do IRS, a fórmula de cálculo ali prevista consiste no cálculo da pensão bruta virtual mensal que é necessário projectar para o valor da retribuição líquida mensal que o beneficiário receberia se permanecesse ao serviço com as mesmas funções e categoria, por isso é necessário que a pensão bruta virtual mensal projectada inclua todos os impostos e quaisquer outras contribuições ou montantes que seriam aplicáveis caso fosse paga essa pensão onde se incluem a sobretaxa do IRS e o CES, o que significa que a sentença arbitral teria que justificar porque considera que a sobretaxa do IRS está incluída na operação de brutalização ou seja na fórmula de cálculo do art.º 25 e a CES não está, aliás não poderia haver nenhuma previsão da sobretaxa do IRS no contrato constitutivo que foi celebrado em 1999 pois a sobretaxa só começou a vigorar, de forma permanente, a partir de 2013, o que faz com que exista uma contradição insanável da sentença arbitral que torna a sentença insuficiente e incompreensível; em 3.º lugar, de acordo com a sentença arbitral, haveria diferenças relevantes entre a sobretaxa do IRS e o CES dado que a inexistência da CES aplicável aos associados do requerente no activo daria origem a “uma aplicação enviesada da equalização dos líquidos”, mas a sentença não explica os fundamentos desta passagem, o art.º 25 não faz nenhuma distinção na sua fórmula de cálculo entre contribuições que incidam sobre associados do requerente no activo e outras contribuições que incidam sobre pensionistas no activo, como a alegada diferença entre a sobretaxa do IRS e a CES não encontra apoio no contrato constitutivo ao Tribunal Arbitral, caberia justificá-la face ao contrato e ao direito aplicável, nenhuma das 3 razões é inteligível e, por consequência, o 5.º parágrafo do art.º 76, não tem fundamento, razão pela qual a decisão tem de ser anulada, nos termos da subalínea vi, da alínea a), do n.º 3, do art.º 46 e do n.º 3, do art.º 42, da LAV, por falta de fundamentação na parte relativa à comparação entre a CFES e a sobretaxa de IRS [258 a 352]
Conclui que a sentença arbitral deve ser anulada com base nesse fundamento e no n.º 1 do art.º 205 da CRP
I.2. Opondo-se ao pedido de anulação a Ré Fundo conclui, em suma:
1. Dos ensinamentos doutrinais acima referidos e as decisões a este respeito têm vindo a ser proferidas pelos Tribunais superiores, impõe-se concluir que a sentença arbitral e o percurso lógico que a acompanha não padece da inovada causa de nulidade, o Tribunal Arbitral delimitou em termos suficientes e inteligíveis a matéria de facto tida por assente convoca para a decisão os preceitos aplicáveis à questão, analisa de foram suficiente consistente, razoável e acoima de todo inteligível as razões pelas quais entende não poder proceder a posição da Requerente, não padecendo de ausência de fundamentação. [Conclusões I e III]
2. As decisões arbitrais consentem um nível inferior de fundamentação face às decisões dos tribunais judiciais, o que à cautela se invoca sem conceder caso se admita que a sentença arbitral não cumpre nos termos da lei o nível de fundamentação exigido para as sentenças judiciais, não se mostrando violado nenhum preceito legal máxime os invocados nem a exigência constitucional de fundamentação das decisões judiciais. [Conclusões IV a V]
I.3. Também N..., EPEEGAÇÃO AÉREA DE PORTUGAL-N..., EPE PORTUGAL E.P.E. se veio a opor concluindo em termos idênticos aos do F... e que se não mostra violado qualquer preceito legal, designadamente, nenhum dos que foi invocado pelos Recorrente/requerido sejam os art.ºs 46/3/a vi e 42/1 e 3 da LAV, nem a exigência constitucional de fundamentação das decisões judiciais, prevista no art.º 205, da Lei Fundamental, devendo da acção ser julgada improcedente.
I.4. O Autor veio responder ao abrigo do art.º 3/3, do CPC, sustentando que o requerido Fundo alega que a p.i. é prolixa e passível de por em causa os aspectos materiais da lide e de fazer perigar a eficácia da tramitação processual devendo ser convidado a aperfeiçoar a exposição da matéria de facto aí alegada mas tal pretensão não faz sentido em primeiro lugar porque a p.i. é calara precisa e detalhada e não prolixa, foi redigida de forma completamente esclarecedora através de uma organização cuidada de matérias, em segundo lugar o requerida termina a sua oposição com conclusões finais onde pede ao Tribunal que indefira a acção o que demonstra que compreendeu o que está em causa, por outro lado não está em risco a eficácia da tramitação processual prevista no art.º 46, da Lei 63/2011, de 14/12, por último não há lugar ao aperfeiçoamento da p.i. porque nem sequer há qualquer matéria de facto alegada, nenhuma razão fazendo o convite ao aperfeiçoamento.
I.5. O art.º 46/2/d, da LAV estatui que, findos os articulados é produzida a prova a que houver lugar e a alínea f) estatui que se segue a tramitação do recurso de apelação com as necessárias adaptações. O Tribunal é o competente, a petição inicial ao invés do sustentado pela Ré Fundo não é inepta apesar de a narrativa ser detalhada e longa, que a Ré entendeu, tanto que termina pela improcedência da acção; por outro lado não se justifica qualquer convite ao aperfeiçoamento porquanto o fundamento da anulação, consiste na invocação da nulidade da decisão arbitral por falta de fundamentação, questão para cuja decisão não é preciso mais do que o teor da decisão arbitral; não há nulidades que invalidem o processado. As questões são apenas questões de direito, o estado dos autos permite (art.º 595/1/b do C.P.C.), desde já que se profira decisão sobre as questões de direito suscitadas na acção, nada obsta ao conhecimento do recurso. Os Autores na p.i. atacam a decisão arbitral suportados nos art.ºs vi da alínea a) do n.º 3 do art.º 46 e do n.º 3 do art.º 42 da LAV, sendo este o objecto da acção de anulação da decisão arbitral.
Saber se a decisão do Tribunal Arbitral, na circunstância em que não foi dispensada a fundamentação pelas partes nem tendo havido transacção conforme prevê o n.º 3 do art.º 42 da LAV, a mesma deve ser fundamentada, o que não ocorre na decisão arbitral o que constitui fundamentod e anulação nos termos do art.º 46/3/a iv;
II- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
II.1. Deu a sentença arbitral- que consta da pasta 10 da certidão e bem assim como de fls. 155 e ss desta acção e cujo teor aqui na íntegra se reproduz-, como provados os seguintes factos:
(i) O Fundo de Pensões N..., EPE/S...
A. O Fundo de Pensões N..., EPE/S...foi constituído no ano de 1999 como um fundo de pensões fechado, tendo então sido celebrados os respectivos contrato Constitutivo e Contrato de Gestão de que são parte S..., a Sociedade Gestora do Fundo (a FU..., S.A.) e a. (art.º 19 da p.i.)
A1. A N..., EPEEGAÇÃO AÉREA DE PORTUGAL- N..., EPE PORTUGAL, E.P.E foi criada como uma empresa pública pelo D.L. 404/98 de 18/12 tendo visto os seus estatutos alterados pelo DL 74/03 de 16/4, passando esta entidade pública empresarial (E.P.E) a ser considerada como pessoa colectiva de direito pública, dotada de autonomia administrativa e financeira e de património próprio (art.º 1/1 dos Estatutos alterados em 2003)
B. Em 15 de Março de 2012, a N..., EPE PORTUGAL, o S...e a FU..., S.A. acordaram na introdução de alterações no Contrato Constitutivo de Fundo de Pensões N..., EPE_EPE/S...celebrando nova versão do Contrato Constitutivo, que está em vigor. (Doc n.º 3 junto com a p.i. que se dá por integralmente reproduzido)
C. Em 2 de Janeiro de 2013, a N..., EPE PORTUGAL, o S...e a FU..., S.A. introduziam alterações no Contrato Constitutivo de Fundo de Pensões N..., EPE_EPE/S...celebrando nova versão, que está em vigor. (Doc n.º 4 junto com a p.i. que se dá por integralmente reproduzido)
D. Nos termos do art.º 2 do referido Contrato Constitutivo, o Fundo de Pensões N..., EPE_EPE/S...tem como “finalidade exclusiva garantir o pagamento de pensões complementares de reforma, aposentação e invalidez e pensões complementares de sobrevivência de acordo com ao Plano de Pensões estabelecido no presente contrato”.
E. São beneficiários do Fundo de Pensões N..., EPE_EPE/S...“os CTA`s” [Controladores de Tráfego Aéreo] aposentados ou reformados por velhice ou invalidez, bem como os cônjuges sobrevivos daqueles ou equiparados com direito a pensão de sobrevivência”. (art.º 1.º, alínea d) do Contrato Constitutivo);
E.1. Só podem vir a beneficiar das pensões pagas pelo Fundo de Pensões os CTA que tenham aderido ao plano de pensões e tenham celebrado contrato de trabalho por tempo indeterminado com a N..., EPE até 30 de Setembro de 2007 e sejam abrangidos pelo Acordo de Empresa relativo aos Controladores de Tráfego Aéreo (art.º 58 da p.i. por referência ao art.º 456 da p.i.);
F. Para além das contribuições financeiras pagas pela N..., EPE PORTUGAL, e pelo S...ao F..., também os participantes e os beneficiários do Fundo de Pensões devem contribuir mensalmente para o financiamento do Fundo de Pensões com um montante correspondente a 0,5% da sua retribuição ou pensão total respectivamente (art.º 6º, n.º 1 do Contrato Constitutivo);
F.1. As contribuições a cargo do Associado N..., EPE PORTUGAL, E.P.E são variáveis, na medida em que as mesmas são do montante necessário para, adicionados às do S...e dos Participantes, permitirem em cada momento a realização do plano de pensões e pagamento dos respectivos benefícios, sendo, assim, reavaliados mensalmente através de um estudo actuarial. (art.º 5 do Contrato Constitutivo)
G. Os beneficiários do Fundo de Pensões que não sejam filiados no S...devem efectuar uma contribuição mensal adicional, para substituir a contribuição do Associado S...para o financiamento do Fundo de Pensões. (art.º 6, n.º 2 do Contrato Constitutivo);
H. O Fundo de Pensões N..., EPE_EPE/S...“visa garantir o pagamento das pensões complementares de Reforma, da Aposentação e de Invalidez e as pensões complementares de sobrevivência nos termos do art.º 25 e seguintes (art.º 24º do Contrato Constitutivo)
I. De harmonia com o art.º 25.º, n.º 1 do Contrato Constitutivo “ a partir da data em que os Participantes passem à situação de reforma, de aposentação ou de invalidez, o Fundo pagará mensalmente aos beneficiários uma pensão complementar igual à diferença entre a pensão correspondentes à retribuição líquida que o CTA [Controladores de Tráfego Aéreo] auferiria se permanecesse ao serviço com as mesmas funções e categoria daquelas que desempenhava quando se reformou ou aposentou e a pensão paga pelos organismos oficiais”;
J. O art.º 26, n.º 1, do Contrato Constitutivo, sob a epígrafe “Retribuição Líquida” dispões que “[p] ara efeitos do disposto no artigo anterior e seguinte, considera-se retribuição, todas as prestações de carácter fixo e regular, com excepção do subsídio de insularidade, do subsídio de isenção de horário de trabalho e do subsídio de refeição” ao passo que o n.º 2 deste artigos estabelece que “[a] determinação da retribuição líquida efectua-se mediante a dedução à retribuição dos descontos obrigatórios que seriam retidos na fonte caso o trabalhador continuasse no activo”;
(ii) Contribuição Extraordinária de Solidariedade (CES)

K. A Lei n.º 55-a/2010 de 31 de Dezembro (Lei do Orçamento do Estado para 2011) criou a contribuição extraordinária de solidariedade cujo regime foi posteriormente objecto de alterações. (art.º 162 da p.i. não impugnado)
L. A Sociedade Gestora do Fundo de Pensões comunicou aos pensionistas o modo como ia calcular a pensão a pagar em 2011. (Doc n.º 6 junto com a p.i.)
M. Através de e-mail de 20 de Setembro de 2011, a Sociedade Gestora do Fundo de Pensões comunicou aos pensionistas que passava a incluir a reposição da CES 20’11, tendo emitido recibos correspondentes à reposição do CES. (docs. 7 e 8 junto com a p.i.)
N. Em resposta a uma comunicação do S..., a Sociedade Gestora do Fundo de Pensões explicou, em carta de 26 de Novembro de 2013, que, “no caso de um Fundo de Pensões de benefício definido, em que cada beneficiário aufere um complemento calculado no momento de passagem à reforma, sendo actualizado (ou não) em função do que foi determinado no plano de pensões, a aplicação da CES é simples e resulta da quota-parte da CES correspondente à parcela da pensão mensal na soma das pensões do beneficiário”. Nessa carta, chama-se a atenção para que o plano de pensões N..., EPE “apresenta uma particularidade que consiste em o complemento de pensão ser recalculado mensalmente com o objectivo de garantir a cada beneficiário um valor líquido da soma das pensões auferidas igual à retribuição líquida que os beneficiário auferiria se permanecesse ao serviço com as mesmas funções e categoria que desempenhava quando se reformou ou aposentou”, situação que “aparentemente” a Lei do Orçamento de Estado para 2011 não considerou. Na mesma carta explica-se que, cautelarmente, a Fu..., S.A. não tinha “em linha de conta com a redução na pensão líquida resultante da CES (infringindo o disposto no contrato constitutivo do Fundo de Pensões) tendo a própria Fu..., S.A. e os associados do Fundo de Pensões N..., EPE e S...solicitado pareceres jurídicos sobre o tema” Afirma-se que em Agosto de 2013 fora veiculado um parecer jurídico à Fu..., S.A. “no qual se concluía que o cálculo do complemento de pensões deve respeitar o princípio determinado no plano de pensões (equalização dos líquidos), pelo que após o acordo dos Associados efectuámos o recálculo de pensões” Por força do art.º 20 da Lei do Orçamento do Estado de 2012 (Lei n.º 64-B/2011 de 30/12) havia sido mantida a CES sendo alargada a base de incidência e aumentados as respectivas taxas contributivas, explicitando o n.º 16 desse art.-º 20 a natureza imperativa da CES prevalecendo o seu regime sobre quaisquer outras normas especiais ou excepcionais em contrário e sobre instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho e contratos e trabalho, não podendo ser afastado ou modificados pelos mesmos. Nessa medida a FU..., S.A. entendia que a CES deveria ser suportada exclusivamente pelo beneficiário (docs. n.º 5 e 20 juntos com a p.i. que se dão por integralmente reproduzidos);
O. A pedido da N..., EPE PORTUGAL a Inspecção-Geral de Finanças na Informação n.º 160/2013 datada de 31 de Janeiro de 2013, depois de historiar a evolução da CES nas leis do Orçamento para 2011, 2012 e 2013 conclui no sentido de que “[n]o caso concreto do Fundo de Pensões da N..., EPE não parece haver dúvidas de que o mesmo se encontra no âmbito da aplicação da CES desde a sua criação pelo Orçamento para 2011, na medida em que se trata de um Fundo de Pensões Colectivo em que o maior contribuinte é a empresa pública N..., EPE, com garantia de financiamento necessário para o integral cumprimento das responsabilidades do Plano de Pensões” sendo certo que “[e]xistindo a retenção do valor do CES aos pensionistas sendo os mesmos posteriormente compensados de igual valor pela N..., EPE, além de distorcer o objectivo daquela contribuição vai acarretar uma acréscimo de despesa para a empresa, sem justificação legal que a fundamente”. Por força da imperatividade do regime da CES não poderia ser considerado o valor desta para efeitos da aplicação do art.º 25 º do Contrato Constitutivo do Fundo (Doc n.º 1 junto com a contestação da N..., EPE PORTUGAL)
P. A doutrina deste Parecer da IGF foi acolhida pelos Despachos n.ºs 328/2013-SCAP de 10 de Fevereiro de 2013, da Secretária de Estado da Administração Pública e n.º 446-13-SET de 3 de Março de 2013, da Secretaria de Estado do Tesouro (docs n.ºs 2 e 3 juntos com a contestação da N..., EPE PORTUGAL)
Q. A N..., EPE PORTUGAL comunicou o teor deste entendimento da Tutela à FU..., S.A. e ao S...(docs 1 e 2) juntos com a contestação da FU..., S.A.;
R. Nos anos de 2012 a 2016 não foi seguida a orientação acolhida no ano de 2012, tendo deixado de ser considerado o valor da CES cobrada aos pensionistas e outros beneficiários para efeitos e brutalização (art.º 193 da p.i. não impugnado);
S. O F... considerou nos anos de 2011 a 2016 para efeitos e “brutalização” o “líquido inflacionado com IRS (Cat H) tendo levado em conta as variações da taxa de IRS aplicável a cada pensionista (art.ºs 225 a 229 da p.i. não impugnados e Docs 6 e 9 juntos com a p.i.);
T. A partir de 2013, O F... passou a considerar a sobretaxa cobrada em sede de IRS para efeitos de “brutali8zação” (art.ºs 248 e 249 da p.i., não impugnados);
U. O F... considerou nos anos de 2011 a 2016 para efeitos de brutalização as contribuições para a ADSE, tendo levado em conta as sucessivas alterações das taxas de contribuições para a ADSE aplicáveis (art.ºs 201 a 225 da p.i. não impugnados e Docs 6, 8 e 13 juntos com a p.i.);
132. Relativamente aos factos controvertidos apurou-se o seguinte:
1. Dos art.ºs 25, 26 e 27 do Contrato Constitutivo do Fundo de Pensões N..., EPE-EPE/S... decorrida que as Partes pretendiam garantir aos CTA aposentados o mesmo rendimento que teriam no activo se continuassem a desempenhar a actividade. Para tal, seria necessário determinar o rendimento líquido que o CTA teria no activo e proceder ao correspondente cálculo da pensão de reforma. Por via dos citados preceitos do Contrato as Partes pretendiam a equalização dos salários líquidos dos Controladores de Tráfego Aéreo no activo na fixação da pensão dos CTA pensionistas. O referido cálculo deveria ser feito pela equalização dos líquidos, não tendo sido previstas excepções a este modelo. Mas não se concluiu que nesse processo-designado de brutalização se incluíssem todos os impostos e contribuições não previstos à data da negociação em concreto a CES (Contribuição Extraordinária de Solidariedade), pois este imposto, tendo sido criado depois do contrato constitutivo, não se encontrava na previsão dos negociadores no que respeita à designada brutalização. Do acordo resulta que a brutalização incluía o IRS e eventuais agravamentos deste imposto, subsequentes ao Contrato, assim como a ADSE mas a CES estava fora da previsão das Partes nas negociações. A questão da equalização, com respeito à CES, nunca foi colocada nas negociações do Contrato Constitutivo do Fundo. Posteriormente, houve troca de correspondência em que o Demandado apresentou sugestões para minimizar o Impacto da CES na pensão complementar de reforma, alterando o regime do Fundo de Pensões (e-mail de 2/12/2013. Não ficou apurado o valor em que comportaria a “brutalização” da CES nos anos de 2012 a 2016.
2. O processo de brutalização decorre de regras matemáticas, assente numa fórmula não contestada pelas Partes, constante do art.º 25 do Contrato Constitutivo do Fundo de Pensões, de modo a obter a designada equalização dos líquidos entre os CTA no activo e os pensionistas. Ainda que a brutalização da CES constitua um processo complexo, não há um obstáculo matemático à sua operacionalização.
3. Não ficou provado o erro na equalização dos líquidos (art.ºs 114 a 136 da p.i.) impugnados pelos art.ºs 203 e ss da contestação da FU..., S.A..
III- FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
III.1. A única questão que importa analisar nesta acção arbitral e a de saber se a decisão do Tribunal Arbitral, na circunstância em que não foi dispensada a fundamentação pelas partes nem tendo havido transacção conforme prevê o n.º 3 do art.º 42 da LAV, a mesma deve ser fundamentada, o que não ocorre na decisão arbitral o que constitui fundamento de anulação nos termos do art.º 46/3/a iv;
III.2. Em suma o Autor fundamenta o seu pedido de anulação de decisão arbitral no seguinte:
  • O Contrato Constitutivo é um contrato de direito privado celebrado ao abrigo da autonomia contratual das partes segundo o art.º 405/1 do CCiv que ao LOE de 2012 não alterou nem s sucessivas leis do Orçamento do Estado dos anos de 2013, 2014, 2015, 2016, por isso o art.º 25/1 está em vigor, segundo o requerente a vontade das partes nesse contrato consistiu em aplicar o princípio da equalização dos líquidos sem qualquer excepção ou limitação o que determinava que a operação de brutalização teria sempre que se fazer incluindo eventuais agravamentos de impostos ou novas contribuições especiais entretanto criadas;
  •  Sendo o Contrato Constitutivo um negócio formal, por força do n.º 1, do art.º 238, do CCiv, qualquer interpretação que excepcione da operação de brutalização, incluindo o CES, não tem correspondência com o teor dessa disposição contratual, a sobretaxa do IRS e a CES têm a mesma natureza são ambas contribuições com natureza excepcional e transitória, o requerido não tinha qualquer possibilidade de as distinguir, ao não brutalizar o CES nos anos de 2012, 2013, 2014, 2015 e 2016 o demandado incumpriu o n.º 1 do art.º 25;
  •  A decisão arbitral considerou que, sendo o contrato constitutivo de 1999, tendo a CES surgido em 2011, as partes subscritoras do Contrato Constitutivo não poderiam ter previsto a CES, têm diferente previsão legal, a inexistência do CES aplicável aos associados do requerente no activo, criaria uma aplicação enviesada da equalização dos líquidos e por isso não a poderiam brutalizar;
  • Uma vez que se trata de contribuições com a mesma natureza excepcional e transitória, a sentença arbitral teria que justificar de forma clara porque é que o requerido poderia distingui-las;
  •  A decisão arbitral, no 5.º parágrafo da pág. 76, refere que “poder-se-ia concluir como o demandante que há uma conduta díspar ao não se proceder à brutalização da CES mas atender à mesma operação no que respeita à sobretaxa do IRS”, por isso subscreve a posição do demandante, adianta depois 3 razões para justificar que o requerido possa distinguir a operação de brutalização da CES e a operação de brutalização da sobretaxa do IRS, em primeiro lugar refere que ambas têm diferente previsão legal, mas a sentença não desenvolve esta conclusão, ou seja não é possível saber quais são as diferenças na previsão legal de uma e outra o que era essencial para a fundamentação, sendo essa passagem da sentença ininteligível e desprovida de fundamento, em segundo lugar a sentença refere que o IRS e a sobretaxa do IRS se encontram directamente na previsão do art.º 25 “justificando-se, por isso, a correspondente brutalização”, o raciocínio é o de que a CES não estaria prevista no art.º 25, mas no art.º 25 não se encontra nenhuma previsão relativa ao IRS e à sobretaxa do IRS, a fórmula de cálculo ali prevista consiste no cálculo da pensão bruta virtual mensal que é necessário projectar para o valor da retribuição líquida mensal que o beneficiário receberia se permanecesse ao serviço com as mesmas funções e categoria, por isso é necessário que a pensão bruta virtual mensal projectada inclua todos os impostos e quaisquer outras contribuições ou montantes que seriam aplicáveis caso fosse paga essa pensão onde se incluem a sobretaxa do IRS e o CES, o que significa que a sentença arbitral teria que justificar porque considera que a sobretaxa do IRS está incluída na operação e brutalização ou seja na fórmula de cálculo do art.º 25 e a CES não está, aliás não poderia haver nenhuma previsão da sobretaxa do IRS no contrato constitutivo que foi celebrado em 1999 pois a sobretaxa só começou a vigorar de forma permanente a partir de 2013, o que faz com exista uma contradição insanável da sentença arbitral que torna a sentença insuficiente e incompreensível; em terceiro lugar, de acordo com a sentença arbitral, haveria diferenças relevantes entre a sobretaxa do IRS e a CES dado que a inexistência da CES aplicável aos associados do requerente no activo daria origem a “uma aplicação enviesada da equalização dos líquidos”, mas a sentença não explica os fundamentos desta passagem, o art.º 25 não faz nenhuma distinção na sua fórmula de cálculo entre contribuições que incidam sobre associados do requerente no activo e outras contribuições que incidam sobre pensionistas no activo, como a alegada diferença entre a sobretaxa do IRS e a CES não encontra apoio no contrato constitutivo ao Tribunal Arbitral caberia justificá-la face ao contrato e ao direito aplicável, nenhuma das 3 razões é inteligível e por consequência o 5.º parágrafo do art.º 76 não tem fundamento razão pela qual a decisão tem de ser anulada nos termos da subalínea vi da alínea a) do n.º 3 do art.º 46 e do n.º 3 do art.º 42 da LAV por falta de fundamentação na parte relativa à comparação entre a CFES e a sobretaxa de IRS
    III.3 Dispõe o art.º 46/3/a vi da LAV:

    Pedido de anulação
    1 - Salvo se as partes tiverem acordado em sentido diferente, ao abrigo do n.º 4 do artigo 39.º, a impugnação de uma sentença arbitral perante um tribunal estadual só pode revestir a forma de pedido de anulação, nos termos do disposto no presente artigo.
    2 - O pedido de anulação da sentença arbitral, que deve ser acompanhado de uma cópia certificada da mesma e, se estiver redigida em língua estrangeira, de uma tradução para português, é apresentado no tribunal estadual competente, observando-se as seguintes regras, sem prejuízo do disposto nos demais números do presente artigo:
    a) A prova é oferecida com o requerimento;
    b) É citada a parte requerida para se opor ao pedido e oferecer prova;
    c) É admitido um articulado de resposta do requerente às eventuais excepções;
    d) É em seguida produzida a prova a que houver lugar;
    e) Segue-se a tramitação do recurso de apelação, com as necessárias adaptações;
    f) A acção de anulação entra, para efeitos de distribuição, na 5.ª espécie.

    3 - A sentença arbitral só pode ser anulada pelo tribunal estadual competente se:
    a) A parte que faz o pedido demonstrar que:

    i) Uma das partes da convenção de arbitragem estava afectada por uma incapacidade; ou que essa convenção não é válida nos termos da lei a que as partes a sujeitaram ou, na falta de qualquer indicação a este respeito, nos termos da presente lei; ou
    ii) Houve no processo violação de alguns dos princípios fundamentais referidos no n.º 1 do artigo 30.º com influência decisiva na resolução do litígio; ou
    iii) A sentença se pronunciou sobre um litígio não abrangido pela convenção de arbitragem ou contém decisões que ultrapassam o âmbito desta; ou
    iv) A composição do tribunal arbitral ou o processo arbitral não foram conformes com a convenção das partes, a menos que esta convenção contrarie uma disposição da presente lei que as partes não possam derrogar ou, na falta de uma tal convenção, que não foram conformes com a presente lei e, em qualquer dos casos, que essa desconformidade teve influência decisiva na resolução do litígio; ou
    v) O tribunal arbitral condenou em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido, conheceu de questões de que não podia tomar conhecimento ou deixou de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar; ou

    vi) A sentença foi proferida com violação dos requisitos estabelecidos nos n.os 1 e 3 do artigo 42.
    º; ou
    vii) A sentença foi notificada às partes depois de decorrido o prazo máximo para o efeito fixado de acordo com ao artigo 43.º ; ou
    b) O tribunal verificar que:
    i) O objecto do litígio não é susceptível de ser decidido por arbitragem nos termos do direito português;
    ii) O conteúdo da sentença ofende os princípios da ordem pública internacional do Estado português.
    4 - Se uma parte, sabendo que não foi respeitada uma das disposições da presente lei que as partes podem derrogar ou uma qualquer condição enunciada na convenção de arbitragem, prosseguir apesar disso a arbitragem sem deduzir oposição de imediato ou, se houver prazo para este efeito, nesse prazo, considera-se que renunciou ao direito de impugnar, com tal fundamento, a sentença arbitral.
    5 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, o direito de requerer a anulação da sentença arbitral é irrenunciável.
    6 - O pedido de anulação só pode ser apresentado no prazo de 60 dias a contar da data em que a parte que pretenda essa anulação recebeu a notificação da sentença ou, se tiver sido feito um requerimento no termos do artigo 45.º, a partir da data em que o tribunal arbitral tomou uma decisão sobre esse requerimento.
    7 - Se a parte da sentença relativamente à qual se verifique existir qualquer dos fundamentos de anulação referidos no n.º 3 do presente artigo puder ser dissociada do resto da mesma, é unicamente anulada a parte da sentença atingida por esse fundamento de anulação.
    8 - Quando lhe for pedido que anule uma sentença arbitral, o tribunal estadual competente pode, se o considerar adequado e a pedido de uma das partes, suspender o processo de anulação durante o período de tempo que determinar, em ordem a dar ao tribunal arbitral a possibilidade de retomar o processo arbitral ou de tomar qualquer outra medida que o tribunal arbitral julgue susceptível de eliminar os fundamentos da anulação.
    9 - O tribunal estadual que anule a sentença arbitral não pode conhecer do mérito da questão ou questões por aquela decididas, devendo tais questões, se alguma das partes o pretender, ser submetidas a outro tribunal arbitral para serem por este decididas.
    10 - Salvo se as partes tiverem acordado de modo diferente, com a anulação da sentença a convenção de arbitragem volta a produzir efeitos relativamente ao objecto do litígio.

    Por seu turno o art.º 42/3 estatui:

    Artigo 42.º
    Forma, conteúdo e eficácia da sentença
    1 - A sentença deve ser reduzida a escrito e assinada pelo árbitro ou árbitros. Em processo arbitral com mais de um árbitro, são suficientes as assinaturas da maioria dos membros do tribunal arbitral ou só a do presidente, caso por este deva ser proferida a sentença, desde que seja mencionada na sentença a razão da omissão das restantes assinaturas.
    2 - Salvo convenção das partes em contrário, os árbitros podem decidir o fundo da causa através de uma única sentença ou de tantas sentenças parciais quantas entendam necessárias.

    3 - A sentença deve ser fundamentada, salvo se as partes tiverem dispensado tal exigência ou se trate de sentença proferida
    com base em acordo das partes, nos termos do artigo 41.º
    4 - A sentença deve mencionar a data em que foi proferida, bem como o lugar da arbitragem, determinado em conformidade com o n.º 1 do artigo 31.º, considerando-se, para todos os efeitos, que a sentença foi proferida nesse lugar.
    5 - A menos que as partes hajam convencionado de outro modo, da sentença deve constar a repartição pelas partes dos encargos directamente resultantes do processo arbitral. Os árbitros podem ainda decidir na sentença, se o entenderem justo e adequado, que uma ou algumas das partes compense a outra ou outras pela totalidade ou parte dos custos e despesas razoáveis que demonstrem ter suportado por causa da sua intervenção na arbitragem.
    6 - Proferida a sentença, a mesma é imediatamente notificada através do envio a cada uma das partes de um exemplar assinado pelo árbitro ou árbitros, nos termos do disposto n.º 1 do presente artigo, produzindo efeitos na data dessa notificação, sem prejuízo do disposto no n.º 7.
    7 - A sentença arbitral de que não caiba recurso e que já não seja susceptível de alteração no termos do artigo 45.º tem o mesmo carácter obrigatório entre as partes que a sentença de um tribunal estadual transitada em julgado e a mesma força executiva que a sentença de um tribunal estadual.
    III.4. A sentença arbitral não foi fundamentada?
    III.5. O que se deve entender por fundamentação de uma decisão arbitral?
    III.6. Por fundamentação “deve entender-se o exame prático da prova produzida, a especificação dos factos provados, nomeadamente os admitidos por acordo ou por confissão, as razões que justificam a aplicação da lei aos factos e a conclusão resultante da conjugação dos factos provados com a lei aplicável. Nisto consiste a fundamentação da sentença (cfr. Aliás com o art.º 607/3 do C.P.C. para a sentença judicial)[2]. A nível da sentença proferida por um tribunal estadual a fundamentação exerce não só uma função endoprocessual de permito o fácil exercício de meios de impugnação através do conhecimento dos motivos da decisão como extraprocessusal de viabilizar o controlo do modo como os órgãos jurisdicionais exercem o poder que lhes está atribuído pela comunidade e opinião pública.[3] Na decisão arbitral só há cumprimento do dever de fundamentação quando resulte claro para uma pessoa média o caminho e a razão da decisão.[4]Tratando-se de um julgamento de equidade o árbitro ou árbitros deve declarar que utilizaram o critério ex aequo et bono, pois se a sua decisão em equidade conduzir a um idêntico resultado ao do q eu obteria se a decisão tivesse sido tomada ex iure stricto a sentença judicial pode ser arguida de nulidade por falta do devido esclarecimento pelos árbitros do critério de julgamento que efectivamente adoptaram.[5] A prática internacional evoluiu claramente no sentido da fundamentação. A convenção de Genebra de 21/4/1961 dispõe presumir-seque as partes pretenderam uma fundamentação. A Lei-Modelo da UNCITRAL prevê no art.º 31/2 a fundamentação das decisões salvo acordo diverso e os grandes regulamentos internacionais evoluíram nesse sentido, racionalização da arbitragem, o seu prestígio e a própria tranquilidade das partes implica fundamentação, já que uma decisão arbitral não se limita a dirimir um litígio, ela constitui uma peça na ordem global prevenindo geral e especialmente novos litígios, tem um papel pedagógico que apenas pode ser lavado a cabo mediante uma fundamentação consistente, a decisão deve ser apoiada na prova deve indicar os depoimentos documentos ou peritagem em que se apoie, a decisão deve responder a todos os factos relevantes sempre com justificação e todas as questões decisivas devem ser solucionadas de modo justificados, o que não quer dizer que todos os argumentos jurídicos das partes tenham de ser considerados ou que as soluções possíveis careçam de exposição e de decisão, os pontos essenciais não podem ser passados em branco. A fundamentação não pode ser apenas formal deve ser efectiva, deve indicar as razões reais que levaram a tomar as opções feitas, opções essas que se fundam na prova e no Direito, os árbitros devem aplicar o Direito, as opções tomadas fundadas no Direito devem ser apresentadas em termos sérios, plausíveis e convincentes. As questões nucleares de que dependa a decisão, decididas e fundamentadas devem ser explicadas.[6]
    III.7. As partes não prescindiram da fundamentação. Da leitura da sentença arbitral e tal como consta de II supra o Tribunal Arbitral especificou os factos provados e não provados e fundamentou a sua decisão de factos na prova produzida. Não é a falta de fundamentação de facto que vem posta em crise tanto quanto resulta da petição de anulação. Também não vem questionado que o Tribunal Arbitral não tenha equacionado correctamente a questão em litígio, ou seja que não tenha definido correctamente o objecto do litígio. O Tribunal sob VI e 134 refere que “a questão jurídica em análise fica circunscrita à interpretação do Contrato Constitutivo do Fundo de Pensões N..., EPE-EPE/SINCITA mais concretamente ao art.º 25 deste acordo e ao modo de proceder à equalização dos líquidos atenta a criação de uma contribuição extraordinárias (CES) não prevista pelas Partesa controvérsia surge tão-só no que respeita à ponderação da CES na medida em que o Demandante entende qu esta contribuição extraordinária deve seguir o regime-geral-nomeadamente o art.º 25 do Contrato Constitutivo-, enquanto o Demandado entende que o regime particular desta contribuição extraordinária obsta à brutalização pretendida”. Estando correctamente definido o objecto do litígio a sentença arbitral sob “B. Natureza do contrato Constitutivo do Fundo de Pensões”, analisa aquele contrato, começando por dizer que “Tanto o Contrato Constitutivo como o Acordo de Empresa são negócios jurídicos de direito privado, sujeitos às regras de formação dos negócios jurídicos (art.ºs 217 e ss do Código Civil, doravante CC) e ao regime comum dos contratos (art.ºs 405 e ss do Cc)”, desenvolve a temática da liberdade contratual e dos seus limites referindo que essa liberdade tem de ser exercida dentro dos limites da lei, “seja da Lei vigente à data da celebração do contrato ou de lei subsequente que limite os efeitos acordados pelos contraentes”, cabendo atender “ao disposto na Lei 55-A/2010 de 31/12 Lei do Orçamento do Estado para 20111 que criou a CES e mais concretamente ao disposto no art.º 20 da Lei do Orçamento do Estado de 2012 (Lei n.º 64-B/2011 de 30/12), que mantendo a CES alarga a base de incidência e aumenta as respectivas taxas contributivas explicitando no n.º 16 desse art.º 20 a natureza imperativa da CES, prevalecendo o seu regime sobre quaisquer outras normas especiais ou excepcionais em contrário e sobre instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho, não podendo ser afectado pelos mesmos…prevalecendo …sobre demais contratos como o decorrente do Contrato Constitutivo do Fundo…assim sendo tal como resulta do art.º 405 n.º 1 do CCiv em consonância com o disposto no art.º 12, n.º 1 do CCiv, as leis do Orçamento de Estado…condicionam a aplicação do acordo alcançado anteriormente pelo S...e pela N..., EPE, impondo limites à liberdade contratual no que respeita ao cálculo da pensão tendo em conta a CES durante o período em que vigorou, 2011-2016….”; interpretando o Contrato Constitutivo, segundo as normas dos art.ºs 236 a 238 do CCiv, desconhecendo-se a vontade real das partes, porque “particularmente neste caso em que não se pode identificar o declarante e o declaratário do conteúdo das cláusulas do Contrato Constitutivo ainda que se possa antever que o sentido do art.º 25 foi querido pelo S..., o pendor subjectivista da norma interpretativa (parte final do n.º 1 do art.º 236 que limita o critério da impressão do declaratário às situações em que este não possa razoavelmente contar com ele) encontra maior dificuldade de aplicação sendo o sentido da declaração conhecido do declaratário sinda que deficientemente expresso será este que prevalece (art.º 236, n.º 2 do CCiv). O n.º 2 do art.º 236 do CCiv consagra a regara falsa demonstrativo non nocet, que para a presente situação só seria relevante sendo provado tal conhecimento…nenhuma das partes invocou tal excepção…” adiantando que “na situação em análise há uma vontade comum de atingir um desiderato (equalização dos líquidos)” conclui que “não será de atender à regra interpretativa da falsa demonstratio…porque a dúvida interpretativa tem que ver com a aplicação da CES, contribuição inexistente à data da negociação do preceito (art.º 25º)…nesta ponderação do equilíbrio contratual (art.º 237) há que atender às consequências da brutalização da CES sabendo-se que tal contribuição-por ser extraordinária e desconhecida da Partes à data da negociação do art.º 25-não foi atendida pelas Partes na formulação da equalização dos líquidos entre 2012 e 2016” e que se deve atender à conduta das partes posterior ao contrato, porquanto tal conduta poderia infirmar o sentido objectivo que se retiraria das declarações proferidas aquando da celebração do vínculo, designadamente, a circunstância de no ano de 2011 a N..., EPE ter procedido à brutalização da CES recusando tal brutalização no cálculo da pensão complementar nos anos seguintes, conduta a que retira carácter abusivo porquanto “em primeiro lugar a alteração legislativa operada entre a LOE de 2011 e a LOE de 2012 (solução esta replicada nas LOE dos anos subsequentes) que reformulou o carácter imperativo da CES, por outro a N..., EPE procedeu à brutalização  com respeito ao ano de 2011 na sequência da consulta a dois escritórios de advogados mas posteriormente a tutela fixou interpretação vinculante para uma EPE no sentido de a CES não poder ser suportada por terceiro. A N..., EPE PORTUGAL entidade sujeita a tutela e superintendência do Ministro das Finanças e Equipamento (cfr art.º 4.º/1 do DL 404/98 de 18/12) estava vinculada ao entendimento do IGF homologado por membros do Governo…os estatutos da N..., EPE PORTUGAL anexos ao referido DL 74/03 explicitam que a tutela económica e financeira desta empresa abrange a aprovação dos orçamentos anuais de exploração e respectivas actualizações que impliquem reduções de resultados previsionais e acréscimos de despesas de investimento….” Depois em síntese conclusiva refere-se “…a equalização dos líquidos foi pensada no contexto vigente à data das negociações tendo a CES surgido posteriormente e não podendo este tributo integrar-se na previsão das Partes; até porque depois de ter sido criada a CES, as Partes renegociaram o Contrato Constitutivo do Fundo de Pensões e nada previram quanto à resolução da controvérsia em torno da brutalização da CES…nesse iter o Demandante apresentou propostas tendo em vista minimizar o impacto da CES que não passavam pela sua brutalização”. Finalmente e sob “D da brutalização da CES” a sentença arbitral desenvolve as razões pelas quais, na perspectiva dos senhores árbitros, no cálculo da pensão não se deveria efectuar a brutalização da CES, desde logo referindo que a CES foi um imposto extraordinário criado num contexto de crise económica “…que recaía unicamente sobre os pensionistas…visando unicamente os pensionistas e não os trabalhadores no activo…contribuição extraordinária a ser suportada só pelo pensionista...não se podendo repercutir em terceiros mormente sobre o Fundo de Pensões N..., EPE/S..., principalmente porque este é suportado em 99% por uma empresa do sector empresarial do Estado (N..., EPE). A imperatividade da CES…bem como a sua finalidade…não permitem que o desiderato legal seja inviabilizado por um contrato entre privados (Contrato Constitutivo do Fundo de Pensões)…a contribuição decorrente da CES…coloca deliberadamente em situação de desigualdades os CTA no activo e os CTA pensionistas. Esta desigualdade não foi nem podia ser antevista na negociação do Contrato Constitutivo do Fundo de Pensões e não pode por via da interpretação de uma cláusula (art.º 25) inviabilizar-se o fim pretendido pela CES…a referida contribuição tinha de ser cobrada ao pensionista cujo sacrifício não podia ser suportado por terceiro; em especial a N..., EPE PORTUGAL enquanto entidade pública sujeita à tutela e à interpretação feita peal IGF não podia proceder à brutalização da CES a partir de 2012…a CES era uma contribuição que incidia na fase do pagamento da pensão e depois do respectivo cálculo. Se se incluísse a CES na brutalização o cálculo da pensão assentaria num ciclo vicioso aplicando CES sobre CES. A via não é matematicamente inviável, mas contraria a solução legal tal como gizada principalmente na LOE de 2012…poder-se-ia concluir como o Demandante que há uma conduta díspar ao não se proceder à brutalização da CES, mas atender à mesma operação no que respeita à sobretaxa do IRS. Mas além da diferente previsão legal (CES e sobretaxa de IRS) tanto o IRS como a correspondente sobretaxa encontram-se directamente na previsão do art.º 25 do Contrato Constitutivo do Fundo de Pensões, justificando-se por isso a correspondente brutalização. Acresce ainda uma diferença relevante: o IRS e a sobretaxa do IRS incidentem tanto sobre o CTA no activo como sobre o CTA pensionista mas a CES não encontra aplicação aos CTA no activo, correspondendo deste modo a uma aplicação enviesada da equalização de líquidos…”
    III.8. A decisão arbitral, do que se acaba de transcrever aplicou o Direito aos factos dados como provados e não provados e justificou, minimamente, as opções tomadas, fundadas no Direito, as quais foram apresentadas em termos sérios, plausíveis e convincentes, tendo sido explicada a questões nuclear de que depende a decisão. Sustenta a Autora que a sentença arbitral teria que justificar, de forma clara, porque é que o requerido F... poderia distinguir a CES da Sobretaxa do IRS, não é possível saber quais as diferenças da previsão legal da CES e da Sobretaxa de IRS que fazem com que o requerido possa distinguir a CES da Sobretaxa sendo incompreensível da sentença nesse ponto. Ora, quanto a esse aspecto a decisão arbitral, ainda que de forma sucinta, como do que acima resulta, justificou as diferenças das previsões legais a justificar essa distinção; a inteligibilidade da fundamentação resulta, ainda, na perspectiva da Autora, de ao contrário do afirmado na fundamentação da decisão, inexistir, no art.º 25, do Contrato Constitutivo, qualquer previsão relativa ao IRS ou à Sobretaxa de IRS e que a operação de brutalização decorre da fórmula de cálculo prevista no contrato segundo a qual, na opinião da Autora, se teria de projectar a pensão bruta virtual mensal para uma pensão líquida virtual mensal iguala à retribuição líquida mensal que o beneficiário receberia se permanecesse ao serviço com as mesmas funções e categoria, pensão bruta virtual mensal projectada essa que tem de incluir todos os impostos e quaisquer contribuições ou montantes que seriam aplicáveis caso fosse paga essa pensão bruta virtual mensal onde se incluem a CES e a Sobretaxa do IRS, o que significa que a sentença arbitral teria que justificar porque considerar que a sobretaxa de IRS está incluída na operação de brutalização e a CES não está, nunca poderia haver nenhuma previsão da sobretaxa de IRS no Contrato Constitutivo que foi celebrado em 1999 pois a sobretaxa de IRS começou a vigorar de forma permanente a partir de 2013 existindo assim uma contradição insanável na sentença arbitral. A decisão arbitral explica, de modo sucinto, porque é que os impostos existentes em 1999, aquando da celebração do contrato constitutivo e os seus agravamentos estavam previstos no Contrato, com vista à equalização dos líquidos (sendo a Sobretaxa do IRS um agravamento do IRS) e porque é que a CES não foi prevista no Contrato explica como da transcrição supra resulta a diferença essencial (a CES deve ser suportada unicamente pelo CTA pensionista e não poe terceiro, no caso a N..., EPE, e não incide sobre CTA no activo), nenhuma ininteligibilidade aqui se descortinando. Por último a Autora sustenta não ser ininteligível e sem fundamento a passagem da decisão arbitral, segundo a qual, a aplicação do CES, inaplicável aos associados do requerente no activo daria origem a uma aplicação enviesada da equalização de líquidos, já que o art.º 25 do Contrato Constitutivo não faz nenhuma distinção na sua fórmula de cálculo entre as contribuições que incidam sobre associados do Requerente no activo e a outras contribuições que incidam sobre associados pensionista do requerido, exigia-se que o Tribunal explicitasse o seu raciocínio de forma clara, face ao Contrato Constitutivo e ao Direito aplicável, não sendo possível atingir o raciocínio do Tribunal Arbitral. A passagem em questão não é mais do que um juízo de valor conclusivo de tudo quanto se discorreu na decisão arbitral sobre as diferenças entre a Sobretaxa do IRS e a CES, designadamente, do referido no § 4 da pág. 76, onde se refere que “…a inclusão da CES, no cálculo da pensão, assentaria num círculo vicioso aplicando CES sobre CES que não sendo matematicamente inviável contraria a solução legal como gizada, principalmente na LOE de 2012…”; é certo que a decisão recorrida não ilustra com um exemplo prático (cálculo de pensão complementar do CTA pensionista e de um CTA no activo) de que modo é que a aplicação da equalização de líquidos prevista no art.º 25 do Contrato Constitutivo com a brutalização a CES poderia ser enviesada, mas o raciocínio está explicitado, de forma suficiente.
    III.9 A este respeito, ainda, diremos que as partes, ao optarem pela arbitragem, quiseram que a decisão dos árbitros sobre o litígio fosse definitiva e que os tribunais estaduais fossem afastados deste; é verdade que essa definitividade da sentença arbitral que tende a reduzir o controlo dos tribunais estaduais sobre o modo como os árbitros dirimiram o litígio que lhes foi submetido não é um valor absoluto, porque qualquer arbitragem desenrola-se no quadro de uma ordem jurídica que confere validade e eficácia jurídica à convenção pela qual as partes atribuem a árbitros competência para decidirem litígios suscitadas entre elas e é por isso que é aos tribunais arbitrais desse Estado que compete anular uma sentença arbitral que a lex arbitri considere como não podendo ser aceite por razões atinentes ao modo como o tribunal chegou a essa sentença ou à solução que por ela foi dada ao litígio é neste ponto que surge o controlo via ordem pública; todo o raciocínio seguido pelo árbitro deve poder ser objecto de exame do juiz tanto em matéria de direito como em matéria de facto, desde que isso tenha influência sobre a aplicabilidade de um princípio ou regra de ordem pública, o controlo da sentença arbitral em matéria de direito deve abranger não só a aplicabilidade das normas e princípios de ordem pública vocacionados para reger a situação litigiosa mas também a concreta aplicação pelo árbitro de tais princípios e regras, o juiz não pode limitar-se a verificar se os princípios e regras foram tidos em conta pelo árbitro sem escrutinar o modo como este os aplicou, o juiz deve, confrontando a solução acolhida pelo árbitro com a que teria adoptado, examinar os efeitos decorrentes da aplicação das regras ou princípios da ordem pública no caso em apreço, só se justifica a anulação da sentença arbitral, se a aplicação criada pela sentença arbitral colidir com os fins ou por aquela regras ou princípios; quando o juiz verifique o erro do árbitro deve, comparando a situação criada pela sentença arbitral com a que resultaria da correcta aplicação da regra ou princípio da ordem pública desaplicada pelo árbitro verificar se é grave a divergência detectada entre essas duas situações, à lua dos objectivos prosseguidos por tal norma ou princípios, pois só uma ofensa grave aos fins que aqueles prosseguem deve ser sancionada.[7]
    III.6.3. No caso concreto não foi invocado o fundamento do art.º 46/3/bii seja a ofensa aos princípios da ordem pública pelo que verdadeiramente este Tribunal estadual está limitado quanto ao mérito da decisão pelo que o Tribunal arbitral decidiu, muito embora pudesse anular a decisão recorrida se a mesma na sua fundamentação fosse ininteligível ou contrariasse manifestamente princípio de ordem pública; a sentença arbitral, na sua fundamentação não só discrimina os factos provados e não provados que criticamente analisa, identifica sem mácula o objecto do litígio, interpreta o art.º 25 do Contrato Constitutivo (em causa) à luz do Direito, explicita as normas jurídicas e as leis, assim como o iter lógico que embora sucinto não é ininteligível no seu todo, razão pela qual não ocorre fundamento para a sua anulação.
    IV- DECISÃO.
    Tudo visto acordam os juízes em julgar improcedente a acção e consequentemente absolvem a Ré F… e a interveniente N..., EPE do pedido.
    Regime da Responsabilidade por Custas: As custas são da responsabilidade do Autor que decai e porque decai (art.º 527/1 e 2).

    Lxa., 21/03/2019
    João Miguel Mourão Vaz Gomes
    Jorge Manuel Leitão Leal
    Pedro Martins
    _______________________________________________________
    [1] Iniciais que doravante se utilizarão para designar a categoria profissional de controlador de tráfego aéreo, que serão também designados de beneficiários do requerido Fundo.
    [2] PEREIRA BARROCAS, Manuel, “Manuela de Arbitragem, Almedina 2.ª edição, págs. 503/504
    [3] CORREIA DE MENDONÇA, Luís e MOURAZ LOPES “Julgar : contributo para uma análise estrutura da sentença…” CEJ 2004, 203 e ss
    [4] FRANÇA GOUVEIA, Mariana, Curso de Resolução Alternativa de Litígios, 2015, Almedina 3.ª edição sob 5.11.1.2
    [5] Autor e obra citados, pág. 526
    [6] MENEZES CORDEIRO, António, Tratado da Arbitragem, Almedina, 2016, reimpressão, págs. 441/442 e 401/402
    [7] SAMPAIO CARAMELO, António, “Temas de Direito de Arbitragem”, Coimbra Editora, 2013, págs. 327/332