Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
3037/12.3TBCSC.L1-2
Relator: ONDINA CARMO ALVES
Descritores: DIVÓRCIO
REAPRECIAÇÃO DA PROVA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 02/18/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: (art.º 663º nº 7 do CPC)

1. Havendo separação de facto, mantém-se o dever de assistência entre os cônjuges, que compreende a obrigação recíproca de prestação de alimentos;
2. Na acção de alimentos que a autora deduziu contra o seu cônjuge, tem aquela que alegar e provar o casamento entre ambos, a separação de facto, a necessidade de alimentos e a capacidade económica do réu de os prestar, enquanto elementos constitutivos do seu direito, tendo o réu, por seu turno, de alegar e provar, por forma a se eximir de dever de prestar alimentos, que a separação de facto é imputável ao cônjuge demandante.
3. Na separação de facto, os alimentos a prestar pelo cônjuge obrigado à prestação compreende o necessário para assegurar o mesmo padrão de vida económico e social que o casal mantinha antes da separação, ao invés do que sucede após o divórcio.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral:
ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA

RELATÓRIO

MARIA ……., residente na Rua ……, intentou, em 19.04.2012, contra RUI ……, residente na Rua ….., acção declarativa de condenação, com processo ordinário, através da qual pede que o réu seja condenado a prestar-lhe, a título de alimentos, uma pensão mensal no valor de 1.250,00 euros.

Fundamentou, a autora, no essencial, esta sua pretensão nos seguintes termos:
1. A autora e o réu são casados, tendo contraído casamento em 31.10.2004 e estando separados desde Novembro de 2010.
2. A autora abandonou o lar conjugal por ser vítima de violência doméstica.
3. A autora vive em casa arrendada pagando uma renda mensal de 1100,00 euros.
4. A autora aufere mensalmente um vencimento de 455,00 euros por mês.
5. O réu é dermatologista e aufere uma média mensal de 15.000,00 euros.
6. A guarda das filhas do casal foi atribuída à autora.
7. A autora tem despesas mensais no valor de 2.737,00 euros.
8. Têm sido os pais da autora a suportar a maior parte das despesas desta.
Citado, o réu apresentou contestação, pugnando pela improcedência do pedido formulado pela autora, não necessitando esta de alimentos e invocou, para tanto e em síntese, que:
1. As alegadas agressões estão contraditadas no processo crime que o requerido interpôs contra a requerente.
2. É falso que a Autora aufira 455,00 euros por mês e que o réu aufira 15.000,00 euros por mês.
3. A autora leva uma vida, a nível social e económico, muito acima da média.
4. É falso que a guarda das filhas do casal tenha sido atribuída à autora.
Foi proferido despacho saneador, dispensada a audiência prévia, abstendo-se o Exmo. Juiz a quo de fixar, quer a matéria assente, quer a base instrutória.
Foi levada a efeito a audiência de discussão e julgamento, após o que o Tribunal a quo proferiu decisão, em 27.06.2014, constando do Dispositivo da Sentença o seguinte:

Pelo exposto, julgo a presente acção parcialmente procedente e, em consequência, condeno o R a pagar à A uma pensão mensal de 1000.00 (mil) euros, a depositar até ao dia 8 de cada mês em conta que a A indicará em 5 dias.
(…)
Inconformado com o assim decidido, o autor interpôs recurso de apelação, relativamente à sentença prolatada.

São as seguintes as CONCLUSÕES do recorrente:
i. O Tribunal a quo, considerando que A. e R. são casados, que estão separados de facto, correndo ação de divórcio, que não se apurou que a separação seja imputável à A., concluiu que se mantem o dever de assistência por parte do R..

E considerando, ainda, que a Autora fez prova da insuficiência dos seus rendimentos para suportar as suas despesas e que o Réu tem capacidade financeira para suportar esta pensão, julgou a ação parcialmente procedente, e em consequência condenou o Réu a pagar à Autora uma pensão mensal de 1.000,00 (mil) euros, a depositar até ao dia 8 de cada mês.
ii. Não se conformando o Réu, ora Apelante, com a decisão proferida pela 1ª Instância apresentou o presente recurso.

iii. O Apelante pretende que esse Venerando Tribunal, ao abrigo do disposto nos artigos 640.º e 662.º do novo Código de Processo Civil, reaprecie a prova gravada, produzida em sede de julgamento e, consequentemente, altere a decisão sobre a matéria de facto proferida pelo Tribunal a quo, porquanto considera incorretamente julgados os factos constantes dos pontos 5, 14, 15, e 17 da enumeração dos factos provados (cfr. 1.4.5, 1.4.14, 1.4.15, e 1.4.17, supra).

iv. O R/Apelante considera que, com base na prova produzida em sede de julgamento, não poderia o Tribunal a quo dar como provado que o R., no dia 3 de Novembro de 2010, na presença da filha mais velha do casal, agrediu a Autora, causando-lhe hematomas.

v. O R./Apelante considera também que, com base na prova produzida em sede de julgamento, deveria o tribunal a quo ter julgado como não provada a necessidade da Autora em receber alimentos.

vi. Que a prova produzida nos autos bem como aquela produzida em sede de julgamento não permite que o Tribunal a quo possa ter dado como provado que o R. aufere rendimentos não inferiores a 11.000,00€ (onze mil euros mensais) e que por tal motivo tem possibilidade de prestar alimentos à R. no montante de 1.000,00€ (mil euros) mensais.

vii. Que existe contradição entre os factos provados e a decisão pelo que a sentença está ferida de nulidade (alínea d) do nº 1 do Art. 668º e nº 2 do Art.660.º, ambos do CPC.

viii. O R/Apelante considera, também, que em consequência da prova documental existente nos autos e daquela produzida em sede de julgamento, o Tribunal a quo, deveria ter dado como não provada a alegada agressão de 3 de Novembro de 2010;

Deveria ter dado como não provada a necessidade da Autora em receber alimentos,
Deveria ter dado como não provada a possibilidade contributiva do Réu,
e, em consequência,
Deveria ter julgado a ação improcedente e absolvido o R. do pedido.
ix. No que refere ao facto dado como provado que: “No dia 3 de Novembro de 2010, em condições não concretamente apuradas, na presença da filha mais velha do casal, o Réu agrediu a Autora, causando-lhe hematomas. A Autora recorreu a apoio médico no dia 8.11.2010 na Cuf …...”

Relativamente a este ponto entende o Apelante que o Tribunal a quo sobrevalorizou a força probatória do documento constante de fls. 212.
Por outro lado,
Do depoimento das testemunhas, Isabel …, Leonor … e Célia …. não é possível concluir que no dia 3 de Novembro o R. tenha agredido a Autora.
Analisando o depoimento de Célia … (Acta de 31 de Janeiro de 2014 - depoimento consta no programa “Habilus” 00:00:01 a 00:59:20.) e o depoimento de Isabel ….., (Acta de 27 de Janeiro de 2014. O seu depoimento consta no programa “Habilus” 00:00:01 a 01:10:01),entende o Apelante que os mesmos foram incorretamente avaliados por aquele tribunal porquanto não permitem provar a agressão.
O Ministério Público, relativamente aos factos acima referidos, no despacho de Acusação/Arquivamento proferido no Processo que correu termos pela 4ª Secção dos Serviços do Ministério Público de Cascais, com o nº 1423/10.2PBCSC, notificado ao Requerido em 1 de Julho de 2014, que se dá por reproduzida no documento que se junta (Doc. nº 1), proferiu despacho de arquivamento.
Atento o exposto, deverá esse Venerando Tribunal substituir a decisão proferida pelo Tribunal a quo no que a estes factos se refere substituindo-a por outra que julgue como não provado que “No dia 3 de Novembro de 2010, na presença da filha mais velha do casal, o Réu agrediu a Autora”
x. No que refere ao facto dado como provado: A Autora declara auferir um vencimento de 455,00€ por mês, na sociedade de que é sócia maioritária, Derme,S.L., com sede em ….., Espanha, considera o Apelante que, porque se impõe determinar se a Autora tem necessidade de receber alimentos deveria o Tribunal a quo ter apurado se a Autora tem como único rendimento o vencimento de 455,00€ que declarou auferir da sociedade “Serviços Médicos, Ldª”.

O Tribunal a quo não tomou em devida consideração a força probatória dos documentos existentes nos autos, nomeadamente os que refletem a contabilidade da sociedade Derme de que a Autora é sócia maioritária.
A prova testemunhal produzida em sede de julgamento, nomeadamente os testemunhos de Célia …..(Acta de 31 de Janeiro de 2014, consta no programa “Habilus” minutos 00:00:01 a 00:59:20.), da mãe da Autora, Virgínia ….. ( Acta de 18 de Novembro de 2013.- o depoimento consta no programa Habilus a minutos 00:00:01 a 02:04:14) Paulo …… (Acta de 28 de Fevereiro de 2014. O seu depoimento consta no programa “Habilus” de 00:00:01 a 00:53:02 e de 00:15:00) e Patrícia …… e Lurdes ……, (Acta de 28 de Fevereiro de 2014. O seu depoimento consta no programa “Habilus” minutos 00:00:01 a 00:23:57.) permitem concluir que a Autora tem outros rendimentos para além daqueles considerados pelo Tribunal a quo. Assim, com base em tais rendimentos e nos documentos constantes dos autos, deveria o tribunal recorrido ter dado como não provado que a Autora carece de alimentos.
xi. Relativamente ao facto dado como provado: “Os pais da Autora têm-lhe prestado assistência, contribuindo mensalmente para o pagamento das suas despesas”, considera o Apelante que o Tribunal a quo ao dar como provado este facto desvalorizou o testemunho prestado por Patrícia …… e Lurdes ……, (prestado ao minuto 14:30 - Acta de 28 de Fevereiro de 2014 -. O seu depoimento consta no programa “Habilus” minutos 00:00:01 a 00:23:57.)

Devidamente considerado aquele testemunho e devidamente considerados os documentos constantes dos autos que evidenciam os rendimentos da Autora, deveria o Tribunal a quo ter dado como não provado o referido facto.
xii. Finalmente, relativamente ao facto dado como provado: “O Réu aufere uma média mensal não inferior a 11.000,00 € “, considera o Apelante que o Tribunal a quo desconsiderou a força probatória do documento de fls 393, considera, também, o Apelante que o Tribunal a quo desconsiderou que os rendimentos das sociedades de que o R/Apelante é sócio não pertencem integralmente a este.

Considera, ainda, o Apelante que o Tribunal não levou em devida conta o facto de o R. deter apenas uma quota de 2% na sociedade Seven e deter uma quota na sociedade Dermaxis igual à da própria Autora.
Considera, finalmente, o Apelante que o Tribunal a quo cometeu um erro de julgamento quando confundiu os reais rendimentos do Réu com aqueles recebidos pelas sociedades.
Pede, por isso, o apelante, que o recurso seja julgado procedente, alterando-se a decisão sobre a matéria de facto e substituindo-a por outra que julgue não provados os factos acima descritos, e em consequência considere a acção improcedente e absolva o réu do pedido.

A ré apresentou contra-alegações, formulando as seguintes CONCLUSÕES:

i. Não há qualquer contradição entre os fundamentos e a decisão em causa não se registando qualquer nulidade da sentença recorrida.

ii. Face aos depoimentos transcritos, com as passagens das gravações devidamente localizadas, não há que alterar a resposta à matéria de facto constante dos pontos números 5, 14, 15 e 17.

iii. Ficam bem patentes as diferenças de condições económicas entre Apelante e Apelada, os respectivos rendimentos, o apoio dos pais da Apelada para prover à sua subsistência, as possibilidades do Apelante e as sociedade de “cobertura” que utilizava e utiliza para receber os seus honorários e furtar-se ao pagamento das contribuições.

iv. No quadro da separação de facto existente cabia ao Apelante fazer prova de que a separação era, unicamente, imputável à Apelada, o que não logrou fazer, uma vez que se provou o contrário.

v. Durante a separação dos cônjuges mantém-se o dever de assistência a prestar pelo Apelante nos termos do artigo 1675º, n.º 2 do Código Civil.

vi. Nada há a censurar a douta sentença recorrida que deverá ser confirmada.


Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
II. ÂMBITO DO RECURSO DE APELAÇÃO

Importa ter em consideração que, de acordo com o disposto no artigo 635º, nº 4 do Novo Código de Processo Civil, é pelas conclusões da alegação do recorrente que se define o objecto e se delimita o âmbito do recurso, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.
Assim, e face ao teor das conclusões formuladas a solução a alcançar pressupõe a análise das seguintes questões:
i. DA NULIDADE DA SENTENÇA AO ABRIGO DO DISPOSTO NA ALÍNEA D) DO N.º 1 DO ARTIGO 615.º DO CPC.
ii. DA REAPRECIAÇÃO DA PROVA GRAVADA em resultado da
impugnação da matéria de facto.
iii. DA VERIFICAÇÃO DE ERRO DE JULGAMENTO NA SUBSUNÇÃO JURÍDICA ADUZIDA, TENDO EM CONSIDERAÇÃO OS FACTOS APURADOS.
O que implica a análise:
Û DO DIREITO A ALIMENTOS ENTRE CÔNJUGES SEPARADOS DE FACTO.

III . FUNDAMENTAÇÃO

A – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Foi dado como provado na sentença recorrida o seguinte:
1. A e R casaram em 31.10.2004.
2. A casa de morada de família era na Rua……., cuja titularidade pertence ao Réu.
3. No Natal de 2006 estavam todos sentados à mesa para a Ceia de Natal e o Réu insurgiu-se contra a presença da irmã da Autora e de um amigo desta na Ceia de Natal de família, abandonando a sala.
4. Nem sempre A e R passava férias juntos.
5. No dia 3 de Novembro de 2010, em condições não concretamente apuradas, na presença da filha mais velha do casal, o R agrediu a A, causando-lhe hematomas.
A A recorreu a apoio médico no dia 8.11.2010 na Cuf …….
6. Em 11.11.2010, a Autora apresentou queixa-crime pelos factos ocorridos a 3.11.2010.
7. Em virtude da ocorrência de 3.11.2010, a mãe da A veio para casa da A.
8. No dia 24 de Novembro, A e R discutiram por aquela ter retirado uma verba de uma conta bancária para pagar a escola das filhas.
No mesmo dia, o Réu tentou tirar o computador pessoal da Autora.
A mãe da A tentou agarrar o computador e o R empurrou-a.
A filha mais velha do casal estava presente.
No mesmo dia, o R expulsou a mãe da A de casa.

9. No dia 28.11.2010, a A estava num quarto com as filhas e o R chamou-a. A A trancou-se no quarto e telefonou para a Polícia, tendo um grupo de intervenção entrado na casa de morada de família.
Foram apreendidas as armas do pai do R.
A A foi, nessa noite, com as filhas para o hotel onde se encontrava a mãe.
10. O pai do requerido tem um grau de incapacidade de 0,9040, sofrendo de Alzheimer com pelo menos 7 anos de evolução. Como tal, a mãe pediu ao filho, ora R., para tomar conta das armas do pai, das quais é proprietário pois foi militar.
11. A A arrendou um apartamento na Rua ……, com base numa renda mensal de 1.100,00 €.
12. A título provisório, a guarda das filhas foi atribuída à A e foi fixada uma pensão mensal de 350,00 € por cada filha, num total de 700,00 € mensais, a suportar pelo R.
13. A Autora tem as seguintes despesas mensais:
No arrendamento da casa, 1.100,00 € mensais.
Em empregada doméstica, 350,00 € mensais.
Em telefone, entre 23.2.2013 e 22.3.2010, gastou 110,29 €.
Em telefone/internet/tv em Maio de 2013 gastou 48,37euros e em Junho de 2013 gastou 59,37 euros .
Em água gastou 25,32 euros entre 3.1.2013 e 2.2.2013.
Em electricidade gasta cerca de 100,00 € mensais.
Em gás, gastou 161,08 euros no período compreendido entre 11.1.2013 e 11.3.2013 e 91,01 euros no período compreendido entre 11.3.2013 e 10.5.2013.
No ginásio que frequenta paga 72,00 € mensais.
14. A Autora declara um auferir um vencimento de 455,00 € por mês, na sociedade de que é socia maioritária, Derme,S.L., com sede em ….., Espanha.
15. Os pais da Autora têm-lhe prestado assistência, contribuindo mensalmente para o pagamento das suas despesas.
16. O Réu é dermatologista e presta serviços nas seguintes clínicas:
§ Clínica da Ajuda, em …….
§ Cuf Alvalade, em …..
Prestou serviço nas seguintes clinicas:
§ Cintra Médica, em …….
§ Centro Médico de ……., até Maio de 2013.
§ Medical ……., até Abril 2013.
§ Go Clinic, em ….. até Maio de 2013.
§ Cliconde, em …. até Abril de 2013.
§ Clínica do Parque, em ……, até Janeiro de 2013.
17. O Réu aufere uma média mensal não inferior a 11.000,00 €.
AO ABRIGO DO DISPOSTO NOS ARTIGOS 607º, Nº 4 E 663º, Nº 2, do NCPC
18. Nos termos do regime provisório, aludido em 12., ficou acordado, designadamente, que: As despesas escolares, nelas incluindo livros escolares, material escolar, equipamento para prática de desporto na escola e a mensalidade escolar que as menores frequentam, serão suportados por ambos os pais, na proporção de 50% para o pai e 50% para a mãe, desde que devidamente comprovada a sua realização.
19. No processo 1423/10.2PBCSC, do Tribunal Judicial da Comarca de …. – Serviços do Ministério Público – 4º secção - foi deduzida acusação, em 27.06.2014, contra Rui ……, pela prática de um crime de coacção na forma tentada p.p. pelos artigos 154º, nºs 1 e 2 e 22º, nºs 1 e 2 ambos do Código Penal e um crime de detenção de arma proibida, p.p. pelos artigos 86º, nº 1, al. c), por referência aos artºs 2º, nº 1 als. p) e q), 3º, nº 4, al. a), todos da Lei 5/2006, de 23 de Fevereiro.
20. No processo e na data referida em 19., foram proferidos despachos de arquivamento, com relação às demais queixas apresentadas por Maria …. contra Rui ……., seu marido, bem como as queixas deste contra aquela, conforme documento de fls. 531 a 547.
B - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

i. DA NULIDADE DA SENTENÇA AO ABRIGO DO DISPOSTO NA ALÍNEA C) DO N.º 1 sermeDO ARTIGO 615.º DO CPC

A sentença, como acto jurisdicional, pode atentar contra as regras próprias da sua elaboração e estruturação ou contra o conteúdo e limites do poder à sombra da qual é decretada, e então torna-se passível de nulidade, nos termos do artigo 615º, nº 1 do novo Código de Processo Civil.
A este respeito, estipula-se no apontado normativo, sob a epígrafe de “Causas de nulidade da sentença”, aplicável aos despachos ex vi do artigo 613º nº 3 do mesmo diploma que:
“1 - É nula a sentença:
a) Quando não contenha a assinatura do juiz;
b) Quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível.
d) Quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e) Quando condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido.....”
O apelante imputa à sentença a nulidade decorrente da alínea c) do citado normativo, por contradição entre os factos provados e a decisão, reconduzindo-se tal nulidade a um vício de conteúdo, na enumeração de J. CASTRO MENDES, Direito Processual Civil, II vol., 793 a 811, ou seja, vício que enferma a própria decisão judicial em si, nos fundamentos, na decisão, ou nos raciocínios lógicos que os ligam.
No que concerne ao aludido vício, doutrina e jurisprudência têm entendido que essa nulidade ocorre quando os fundamentos invocados deveriam conduzir, num processo lógico, à solução oposta da que foi adoptada.
Esta nulidade – oposição entre os fundamentos e a decisão – só se verifica, portanto, quando os fundamentos, quer de facto quer de direito, invocados pelo juiz devam, logicamente, conduzir ao resultado oposto ao que é expresso na sentença.
A contradição entre os fundamentos e a decisão a que se refere o citado normativo é uma contradição de ordem formal, que se refere aos fundamentos estabelecidos e utilizados na sentença, e não aos que resultam do processo.
E, tal nulidade traduzida na desconformidade entre a decisão e o direito aplicável - substantivo ou adjectivo – não se confunde com o erro de julgamento, ou seja, na subsunção dos factos à norma jurídica ou, muito menos, com o erro na interpretação desta.

É que, quando o juiz entende que dos factos apurados resulta determinada consequência jurídica e este seu entendimento é expresso na fundamentação, ou dela decorre, poderemos, sim, estar perante um erro de julgamento. Nesse caso, o juiz fundamenta a decisão, mas decide mal. Resolve as questões colocadas num certo sentido porque interpretou e/ou aplicou mal o direito - LEBRE DE FREITAS, CPC Anotado, vol. 2.º, pág. 670.
Na sentença recorrida, o tribunal a quo, tendo em consideração os factos alegados e que resultaram provados, aplicou o direito que julgou adequado e pertinente ao caso em apreciação, não se vislumbrando qualquer contradição entre os fundamentos e a decisão que, de resto, tão pouco o apelante a concretiza.
Situação diversa é a de saber se houve erro de julgamento, pois como se refere no Ac. do STJ de 21.05.2009 (Pº 692-A/2001.S1), acessível no supra citado sítio da Internet Se a questão é abordada mas existe uma divergência entre o afirmado e a verdade jurídica ou fáctica, há erro de julgamento, não “errore in procedendo”.
O alegado vício de conteúdo a que se refere o artigo 615º, n.º 1, alínea c) do Código do Processo Civil, não se verifica, por conseguinte, na sentença recorrida, pelo que improcede o que a tal respeito consta da apelação (CONCLUSÃO vii.).
Importa, então, apurar se há erro de julgamento, o que implica a análise das concretas questões suscitadas no recurso.

ii. DA REAPRECIAÇÃO DA PROVA GRAVADA em resultado da
impugnação da matéria de facto

Os poderes do Tribunal da Relação, relativamente à modificabilidade da decisão de facto, estão consagrados no artigo 662º do CPC, no qual se estatui:
1. A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.
2. A Relação deve ainda, mesmo oficiosamente:
a) Ordenar a renovação da produção da prova quando houver dúvidas sérias sobre a credibilidade do depoente ou sobre o sentido do seu depoimento;
b) Ordenar em caso de dúvida fundada sobre a prova realizada, a produção de novos meios de prova;
c) Anular a decisão proferida na 1.ª instância, quando, não constando do processo todos os elementos que, nos termos do número anterior, permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto, ou quando considere indispensável a ampliação desta;
d) Determinar que, não estando devidamente fundamentada a decisão proferida sobre algum facto essencial para o julgamento da causa, o tribunal de 1.ª instância a fundamente, tendo em conta os depoimentos gravados ou registados.
No que concerne ao ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto, estabelece o artigo 640ºdo CPC que:
1. Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:

a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;

b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;

c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.

2. No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:

a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;

b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.

O disposto nos n.ºs 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º.”

Considerando que, no caso vertente, a prova produzida em audiência foi gravada, e o recorrente deu cumprimento ao preceituado no supra referido artigo 640º do NCPC pode este Tribunal da Relação proceder à sua reapreciação, uma vez que dispõe dos elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os factos em causa.

O recorrente está em desacordo com a decisão sobre a matéria de facto proferida pelo Tribunal a quo, relativamente aos Nºs 5, 14, 15, e 17 da enumeração dos factos provados que, no entender do apelante, deveriam ter sido dados como não provados.

Há que aferir da pertinência da alegação do apelante, ponderando se, in casu, se verifica a ausência da razoabilidade da respectiva decisão em face de todas as provas produzidas, conduzindo necessariamente à modificabilidade da decisão de facto.

Foi auditado o suporte áudio e, concomitantemente, ponderada a convicção criada no espírito da Exma. Juíza do Tribunal a quo, a qual tem a seu favor o importante princípio da imediação da prova, que não pode ser descurado, sendo esse contacto directo com a prova testemunhal que, em regra, melhor possibilita ao julgador a percepção da frontalidade, da lucidez, do rigor da informação transmitida e da firmeza dos depoimentos prestados, levando-o ao convencimento quanto à veracidade ou probabilidade dos factos sobre que recaíram as provas.
Há, pois, que atentar na prova gravada e na supra referida ponderação, por forma a concluir se a convicção criada no espírito do julgador de 1ª instância é, ou não, merecedora de reparos.
Þ Vejamos:
Consta do nº 5 dos Factos dados como Provados:
No dia 3 de Novembro de 2010, em condições não concretamente apuradas, na presença da filha mais velha do casal, o R agrediu a A, causando-lhe hematomas
A A recorreu a apoio médico no dia 8.11.2010 na Cuf …...

Consta do nº 14 dos Factos dados como Provados:
A Autora declara auferir um vencimento de 455,00 € por mês, na sociedade de que é socia maioritária, Derme,S.L., com sede em ….., Espanha.
Consta do nº 15 dos Factos dados como Provados:
Os pais da Autora têm-lhe prestado assistência, contribuindo mensalmente para o pagamento das suas despesas.
Consta do nº 17 dos Factos dados como Provados:
O Réu aufere uma média mensal não inferior a 11.000,00 €.

Fundamentou a Exma. Juíza do Tribunal a quo, da seguinte forma a decisão sobre a matéria de facto, relativamente aos factos impugnados:
(…)
Foram indicadas para responder à matéria aqui em apreciação, as testemunhas arroladas, quer pela autora (Virgínia ….., Leonor ….., Alexandra ….., Glória ….., Isabel ……, Luís …..), quer pelo réu (Célia ….., Ana ….. Vera ……., Paulo ….., Rute ….., Patrícia …..e Lurdes ……, Irene …….).
Defende, em suma, o apelante, que o Tribunal a quo fez uma errada apreciação da prova, no que concerne aos depoimentos das testemunhas, desvalorizando os depoimentos, nomeadamente das testemunhas Célia ….., Patrícia ….. e Lurdes …..
Importa, então, analisar os depoimentos prestados em audiência, indicados pelo recorrente como relevantes, a propósito da factualidade impugnada aqui em causa, em confronto com a restante prova produzida, para verificar se tal matéria deveria merecer diferente decisão, em consonância com o preconizado pelo apelante, ou se, ao invés, a decisão da 1ª instância não merece censura, atenta a fundamentação aduzida pela Exma. Juíza do Tribunal a quo.
Importa, todavia e antes de mais, relembrar que no nosso ordenamento jurídico vigora o princípio da liberdade de julgamento ou da prova livre, segundo o qual, o tribunal aprecia livremente as provas e fixa a matéria de facto em sintonia com a convicção que tenha firmado acerca de cada facto controvertido, salvo se a Lei exigir, para a existência ou prova do facto jurídico, qualquer formalidade especial.
De harmonia com este princípio, que se contrapõe ao princípio da prova legal, as provas são valoradas livremente, sem qualquer grau de hierarquização, apenas cedendo este princípio perante situações de prova legal, nomeadamente nos casos de prova por confissão, por documentos autênticos, documentos particulares e por presunções legais.

Nos termos do disposto, especificamente, no artigo 396.º do C.C. e do princípio geral enunciado no artigo 607º, nº 5 do NCPC (artigo 655.º do anterior CPC) o depoimento testemunhal é um meio de prova sujeito à livre apreciação do julgador, o qual deverá avaliá-lo em conformidade com as impressões recolhidas da sua audição ou leitura e com a convicção que delas resultou no seu espírito, de acordo com as regras de experiência – v. sobre o conteúdo e limites deste princípio, MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA, A livre apreciação da prova em processo Civil, Scientia Iuridica, tomo XXXIII (1984), 115 e seg.
A valoração da prova, nomeadamente a testemunhal, deve ser efectuada segundo um critério de probabilidade lógica, através da confirmação lógica da factualidade em apreciação a partir da análise e ponderação da prova disponibilizada – cfr. a este propósito ANTUNES VARELA, MIGUEL BEZERRA E SAMPAIO E NORA, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 435-436.
É certo que, com a prova de um facto, não se pode obter a absoluta certeza da verificação desse facto, atenta a precariedade dos meios de conhecimento da realidade. Mas, para convencer o julgador, em face das circunstâncias concretas, e das regras de experiência, basta um elevado grau da sua veracidade ou, ao menos, que essa realidade seja mais provável que a ausência dela.
Ademais, há que considerar que a reapreciação da matéria de facto visa apreciar pontos concretos da matéria de facto, por regra, com base em determinados depoimentos que são indicados pelo recorrente.
Porém, a convicção probatória, sendo um processo intuitivo que assenta na totalidade da prova, implica a valoração de todo o acervo probatório a que o tribunal recorrido teve acesso – v. neste sentido, Ac. STJ de 24.01.2012 (Pº 1156/2002.L1.S1).
No caso vertente, e face ao teor dos depoimentos das testemunhas ouvidas, globalmente analisado e ponderado, entende-se, tendo em conta as considerações antes aduzidas, que não há como alterar a matéria de facto dada como provada pela 1ª instância e impugnada pelo réu/recorrente. Senão vejamos,

Ø No que concerne ao Nº 5 dos Factos Provados
§ Foram muito relevantes os depoimentos das testemunhas da autora, com particular destaque para as testemunhas Isabel …… e Luís ….., que mereceram inteira credibilidade e que demonstraram uma maior objectividade, tendo estas recolhido a autora, pouco tempo depois do momento em que ocorreu a contenda entre a autora e o réu, ouviram o que a filha mais velha de autora e réu comentou, relativamente à zanga entre os pais, presenciaram os hematomas que esta apresentava e, posteriormente, acompanharam a autora ao hospital da Cuf……, vindo esta a ser observada por um médico.
§ O depoimento da testemunha indicada pelo réu, Célia ….., que ao tempo trabalhava em casa de autora e ré, como empregada interna, não mereceu qualquer credibilidade, pois não é crível que, estando em casa, nunca tivesse presenciado qualquer discussão entre autora e réu, nem sequer demonstrado ficou que nesse dia 03.11.2010, que corresponde a uma 4ª feira, esta estivesse de folga.
§ Irreleva para o caso em apreciação o despacho de arquivamento, aludido em 20. da Fundamentação de Facto, visto não estar em causa uma decisão judicial de absolvição pela prática de um eventual crime de ofensas corporais, apenas se podendo concluir que, face à prova que foi apreciada pelo Exmo. Procurador-Adjunto, ao mesmo se lhe suscitaram dúvidas quanto à forma como ocorreram os factos, designadamente, no dia 03.11.2010.

Ø No que concerne ao Nºs 14 e 15 dos Factos Provados
§ Os depoimentos das testemunhas ……, Glória ….., mãe e irmã da autora, deram nota da situação laboral da autora, da reiterada contribuição dos pais da autora no pagamento das despesas desta, das razões pelas quais apenas recebe mensalmente € 455,00, da sociedade “Derma, S.L.”, de que é sócia maioritária, com sede em Espanha, face à ausência de trabalho, não tendo sido apresentada pelo réu qualquer contraprova susceptível de colocar em dúvida tais depoimentos.
§ Foi ponderado o que consta das declarações de rendimentos constantes de fls. 316 a 318.
§ De resto, a autora deixou de ter eventuais rendimentos resultantes da actividade da sociedade “Serviços Médicos, Ldª.”, de que autora e réu eram sócios, tendo o réu constituído nova sociedade. E, como resulta dos documentos de fls. 257 a 294, 297 a 315, a sociedade “Derma, S.L.” tem vindo a apresentar prejuízos.
§ Os depoimentos prestados a este propósito pelas testemunhas indicadas pelo réu em nada contribuíram para infirmar a factualidade aqui em causa, já que sendo parciais e pouco credíveis afirmaram, em suma, que a autora apresentava sinais de que teria uma vida muito confortável enquanto vivia com o réu, mas não lograram justificar se tal se devia ao facto de ser o réu que, maioritariamente, sustentava tal nível de vida. Ademais, referiram algumas testemunhas que muito do trabalho desenvolvido pela autora era efectuado, por intervenção do réu, em clínicas onde este habitualmente prestava serviço clínico, apontando, mormente, a “Go Clinic”.
§ De salientar que o próprio filho do réu, no seu depoimento, referiu que as despesas da casa eram pagas pelo réu.

Ø No que concerne ao Nº 17 dos Factos Provados
§ Tiveram grande relevo os depoimentos das testemunhas Leonor ….., Alexandra ….. e Luís ….., as quais, por estarem relacionadas com o meio laboral do autor, mostraram ter conhecimento das actividades por este desenvolvidas e dos réditos que este poderia auferir.
§ Foi particularmente revelador dos rendimentos susceptíveis de serem auferidos pelo réu, as declarações das clínicas nas quais o réu prestou serviços clínicos - ou que deixou de os prestar em 2013 - sendo certo que o próprio filho do autor, a testemunha Miguel ……, acabou por esclarecer que o pai havia substituído o trabalho numa clínica, onde auferia rendimentos substanciais, por outra em Campolide, que não está identificada nos autos.
§ É igualmente significativo o facto do autor, logo após a separação do casal, ter constituído, presumivelmente em substituição daquela que teria com a autora, uma nova sociedade, “Seven, Ldª.”, registada em 03.12.2010 (AP. 29/20100103), com sede na residência do réu, com um capital de € 5.000,00 e de que são sócios o réu, que foi nomeado gerente, e o filho deste, Miguel ….., tendo o réu uma quota de valor nominal de € 100,00 e o filho uma quota no valor nominal de € 4.900,00 (acessível em http://publicacoes.mj.pt)
§ Mas, apesar do filho do réu ser sócio maioritário da aludida sociedade, da qual é gerente o réu, aquele afirmou, no seu depoimento, nada saber sobre os rendimentos auferidos pelo pai.
§ Ficou igualmente demonstrado que os serviços clínicos prestados pelo réu em algumas clínicas são pagos à dita sociedade, “Seven, Ldª.”, como consta de vários documentos emitidos por algumas dessas clínicas, nomeadamente a Clínica Cuf, na qual o réu continua a prestar actividade médica, e que, por isso, não identificou os honorários pagos – v. fls. 454.
§ Por todas estas circunstâncias foram desconsiderados os valores constantes das declarações de rendimentos para efeitos de IRS, apresentadas pelo réu (documentos fls. 41-54 e 250-251).
§ Tão pouco o réu apresentou qualquer elemento contabilístico ou declarações de IRC demonstrativos da situação financeira da empresa de que é sócio gerente.
§ Dos apurados valores auferidos pelo réu, afigura-se razoável o valor fixado pela 1ª instância, no Nº 17 dos Factos Provados.
Assim sendo, perante o teor dos depoimentos das testemunhas ouvidas, globalmente analisado, concomitantemente com a análise dos documentos juntos aos autos, em conformidade com o que acima ficou dito, entende-se que nada permite afastar a convicção criada no espírito do julgador do tribunal recorrido, convicção essa que não é merecedora de reparo.
Mantém-se, portanto, e nos seus precisos termos, a factualidade dada como provada na 1ª instância.
Improcede, por conseguinte, tudo o que, em adverso, consta da alegação de recurso do réu/apelante (CONCLUSÕES iv. a vi. viii. a xii).

E, improcedendo a pretensão do apelante, no que concerne à alteração da decisão sobre a matéria de facto, mantendo-se a mesma inalterável, igualmente se corrobora a fundamentação de direito aduzida na sentença recorrida.
Com efeito, nos termos do artigo 1675º do Código Civil, o dever de assistência que compreende a obrigação de prestar alimentos, mantém-se durante a separação de facto, apenas cessando nas circunstâncias previstas nos nºs 2 e 3 do citado normativo.
Ora, pretendendo o cônjuge a quem são pedidos os alimentos eximir-se daquele dever, sempre terá de alegar e provar, nos termos do nº 2 do artigo 342º do Código Civil, que a separação de facto é imputável ao cônjuge demandante – v. neste sentido Acs. STJ de 16.05.2002 (Pº 02B1306), de 07.05.2009 (Pº 5385/07.5TBALM.S1) e de 04.11.2010 (Pº 995/07.3TBCTBC1.S1); Ac. R.L. de 29.10.2009 (Pº 6931/07.0TCLRSL.L1-6), de 25.02.2010 (Pº 517/07.6TBAMD.L1-8) e de 24.03.2015 (Pº 6222/14.0T8LRS-A.L1-7).
Acresce que demonstrou a autora/apelada os elementos constitutivos do seu direito, o casamento entre autora e réu, a separação de facto dos cônjuges e a sua necessidade de alimentos, bem como a capacidade económica do réu de os prestar, não tendo ficado apurado que a separação do casal fosse imputável à autora.
Igualmente se concorda com a sentença recorrida, no que concerne à fixada medida dos alimentos, entendendo-se que, não obstante incumba a autora diligenciar pelo desenvolvimento da sua actividade profissional, face às despesas que necessariamente tem, não só com a renda e manutenção da casa que necessitou de arrendar, como também com a sua própria subsistência, tendo ainda de suportar, na proporção de 50%, nomeadamente, o colégio das filhas do casal, mostra-se equilibrado, por equitativo, o montante de € 1.000,00 determinado na sentença recorrida, sendo certo que até ao decretamento do divórcio o réu terá de assegurar à autora o mesmo bom nível de vida económico e social que o casal detinha, e que era o da autora, antes da separação de facto, situação que já não ocorrerá após o divórcio, como bem se salientou na sentença recorrida.
Destarte, improcede a apelação, confirmando-se a sentença recorrida.
O apelante será responsável pelas custas respectivas nos termos do artigo 527º, nºs 1 e 2 do Código de Processo Civil.

IV. DECISÃO

Pelo exposto, acordam os Juízes desta 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar improcedente o recurso, mantendo-se a decisão recorrida.

Condena-se o apelante no pagamento das custas respectivas.

Lisboa, 18 de Fevereiro de 2016
Ondina Carmo Alves – Relatora
Olindo dos Santos Geraldes
Lúcia Sousa