Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
1579/21.9T8ALM.L1-4
Relator: ALVES DUARTE
Descritores: TRANSMISSÃO DA UNIDADE ECONÓMICA
CONCURSO
EMPRESA DE SEGURANÇA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 10/11/2023
Votação: UNANIMIDADE COM * DEC VOT
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA A SENTENÇA
Sumário: Tendo em conta a jurisprudência perfilhada no acórdão do Tribunal de Justiça (Sétima Secção), de 16/02/2023, no Processo C-675//21, publicado no Jornal Oficial da União Europeia de 11/4/02023 (consultável em https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/PDF/?uri=CELEX:62021CA0675&from=EN), para que se verifique transmissão do estabelecimento para efeitos do disposto no artigo 285.º do CT é agora essencial que o negócio ou actividade transmitida constitua uma unidade económica autónoma na esfera do transmitente.

(sumário do relator)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam, na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa:


I-Relatório.


A intentou a presente acção declarativa, com processo comum,[1] contra SECURITAS - Serviços e Tecnologia de Segurança, S.A. e PRESTIBEL - Empresa de Segurança, S.A.,, pedindo que fosse declarado ilícito o seu despedimento condenadas e as rés condenadas a pagar-lhe:
a) a título de indemnização, a quantia de € 4.390,17;
c) a título de proporcionais de subsídio de Natal, a importância de € 381,74;
d) a título proporcional de férias e férias não gozadas, a importância total de € 853,16;
e) juros de mora à taxa legal sobre as quantias em dívida, vencidos e vincendos até integral pagamento.

Para tanto, alegou, em síntese, que:
• trabalhou como vigilante desde 23 de Dezembro de 2019 para a 1.a ré, por contrato a termo certo, desempenhando as suas funções no cliente desta sito no Hospital B, em Lisboa;
• a partir de Julho de 2020 a empreitada, que fora explorada pela ré Securitas, passou a sê-lo pela ré Prestibel por  a ter obtido com efeitos a partir da referida data;
• embora tenha sido transmitido pela ré Securitas para a nova adjudicatária, nenhuma das rés o aceitou como trabalhador;
• a falta de disponibilidade para o receber redunda num despedimento ilícito, com as legais consequências.

Citada a ré, foi convocada e realizada audiência de partes, na qual as mesmas não quiseram acordar sobre o litígio que as divide.

Para tal notificada, a ré Securitas contestou, pugnando pela sua absolvição do pedido, para o que alegou, em resumo, que:
i) o trabalhador em causa estava inserido numa unidade económica mais vasta de vigilância humana que foi transmitida à ré Prestibel;
ii) verificando-se os pressupostos previstos no art.º 285.º, do Código do Trabalho;
iii) comunicou à ré Prestibel a transmissão do estabelecimento com a relação dos trabalhadores que seriam transmitidos.

Proferido despacho saneador, foi julgada a instância válida e regular, dispensada a fixação do objecto do processo e dos temas de prova, dispensada a selecção da matéria de facto, admitidas as provas arroladas pelas partes e confirmada a data para realização da audiência de julgamento anteriormente designada.

Realizada a audiência de julgamento, o Mm.º Juiz preferiu a sentença, na qual julgou a acção procedente e, em consequência, decidiu:
1. absolver a Ré PRESTIBEL - Empresa de Segurança, S.A.;
2. declarar ilícito o despedimento que o autor foi alvo e consequentemente condenar a ré SECURITAS - Serviços e Tecnologia de Segurança, S.A. a pagar-lhe:
i) a título de indemnização por despedimento ilícito, o valor de € 4.389,27;
ii) o valor de € 853,17 a título de proporcionais de férias e de subsídio de férias vencidos em 31/06/2020;
iii) o valor de € 382,79 a título de proporcionais de subsídio de natal vencidos em 31/06/2020;
iv) valores acrescidos de juros de mora desde a data do vencimento de cada uma das prestações que a integram até efectivo e integral pagamento.

Inconformada, a ré SECURITAS interpôs recurso, pedindo que a sentença seja revogada e a mesma absolvida, recaindo sobre a co-ré PRESTIBEL as consequências da recusa da transmissão da posição do contrato de trabalho que manteve com o autor e este último declarado trabalhador daquela co-ré desde 01-07-2020, culminando a alegação com as seguintes conclusões:
"1. A matéria de facto provada relativa aos pontos 32 e 34 deve ser alterada.
2. O ponto 32 dos factos provados está redigido de forma deficiente, incorrecta e incompleta, faltando aditar a este ponto matéria de facto relativa à formação dos vigilantes, alegada no art.º 11.º da contestação da Securitas e que foi dada por assente por acordo das partes, conforme consta do sistema de gravação (20220308142240) de 02:06 a 02:16 da gravação, pelo que deve o referido ponto 32 ser discriminado e completado com a restante matéria relativa às áreas de formação ministrada e, como tal, aditados estes factos aos já constantes deste ponto 32, para cuja redacção se sugere o seguinte teor:
'32. Para o cabal desempenho das suas funções de vigilantes, estes trabalhadores, incluindo o A., receberam formação inicial para serem possuidores dos respectivos cartões profissionais e formação contínua legal em diversas áreas, designadamente:
- Elaboração de registos e relatórios;
- Controlo de acessos;
- Prevenção e combate a incêndios;
- Técnicas de socorrismo;
- Procedimentos operacionais de emergência de alarmes;
- Operações de meios de videovigilância e centrais de alarmes;
- Técnica e prática de vigilância humana e electrónica;
- Revistas pessoais;
- Gestão de conflitos;
- Simulação de incidentes
3. Decorrente da anterior conclusão deve ser eliminado o ponto 1 (único) factos não provados.
4. O ponto 34. dos factos provados, relativo aos meios utilizados pelos vigilantes da Securitas, pertencentes e disponibilizados pelo Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central, E.P.E. (doravante designado CHULC) está redigido de forma deficiente e incompleta, não constando nele a referência ao software pertencente ao CHULC e instalado no computador também pertencente a este Centro Hospitalar para o controlo de acesso de viaturas autorizadas ao parqueamento nos hospitais em causa, atento o depoimento da testemunha Luís Filipe Pereira Silva, gravado no sistema de gravação (20220308143704) a 00:10:30 a 00:11:28, pelo que deve ser discriminado e completado o ponto 34 dos factos provados referente aos meios utilizados pelos vigilantes, pertencentes e disponibilizados pelo cliente, sendo aditado aos factos já constantes deste ponto 34, a referência ao software do computador que, também ele pertencia ao Centro Hospitalar e era utilizado pelos vigilantes, sugerindo-se, deste modo que a redacção dada seja alterada para a seguinte:
'34. As instalações e os meios utilizados, nomeadamente, secretária, cadeira, computador e respectivo software nele instalado, sistema de videovigilância, sistema de alarmes contra incêndios e intrusão, extintores e cacifos, pertenciam ao Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central e os mesmos passaram a ser utilizados a partir de 01.07.2020 pela PR ESTIB EL'.
5. O Autor exerceu as suas funções de vigilante para a Securitas desde 23.12.2019, estando colocado no Hospital B, pertencente ao Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central, E.P.E. (doravante designado CHULC), desde Dezembro de 2019, por força do contrato de prestação de serviços de vigilância e segurança celebrado entre a Securitas e o CHULC que vigorou de forma ininterrupta desde 05.07.2018 a 30.06.2020 (Factos provados n: 2 e 27).
6.O CHULC abriu concurso público (ref.ª interna CHULC3_0.0001/2020) para aquisição de serviços de segurança e vigilância privada nas instalações do referido Centro Hospitalar, pelo período de 1 ano, 2020, prorrogável por acordo expresso das partes até ao limite máximo de vigência de 31/12/2022 (facto provado n.º 28).
7. O concurso incluía diversas Unidades Hospitalares pertencentes ao Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central, nomeadamente, os Hospitais C e B, nos quais a Securitas tinha colocado a prestar serviço cerca de 20 vigilantes, sendo que o Autor estava colocado, no Hospital B, desde Dezembro de 2019 e os outros vigilantes há, pelo menos, 1 ano (facto provado n.º 29 e 33).
8. O CHUCL adjudicou a empreitada que incluía o local do trabalho do Autor nas instalações do citado Hospital B, com efeitos a partir de 01 de Julho de 2020 (factos provados n.º 13 e 14).
9. Os cerca de 20 vigilantes, incluindo o A., que a Ré Securitas tinha afectos aos Hospitais de B e C faziam, nomeadamente, a abertura e fecho das instalações ou serviços, rondas às instalações, controlo de acessos de pessoas e viaturas às instalações e zonas de estacionamento, controlo de movimentos de pessoas através de sistema de videovigilância, prestavam informações e davam orientação aos utentes que demandavam aqueles serviços, efectuavam relatórios de turnos e prestavam toda a segurança para que quer o pessoal que trabalhava nas instalações adjudicadas quer os doentes e acompanhantes, visitantes e outros utentes em geral, pudessem estar seguros e tranquilos, bem como a protecção de bens e equipamentos (facto provado n.º 33).
10. As instalações e os meios materiais (bens) essenciais e indispensáveis à prestação do serviço e utilizados pela Securitas até 30.06.2020, pertenciam TODOS ao CHULC que os disponibilizou, nomeadamente, secretária, cadeira, computador e respectivo software nele instalado, sistema de videovigilância, sistema de alarmes contra incêndios e intrusão e cacifos e os mesmos passaram a ser utilizados a partir de 01.07.2020 pela co-Ré PRESTIBEL, nos mesmos termos em que eram utilizados pela Securitas (factos provados n: 34), o que permitiu à Prestibel beneficiar da estrutura e organização da Securitas e prosseguir, de forma estável, sem qualquer tipo de interrupção e/ou constrangimento e em idênticos moldes, as mesmas actividades e serviço que a Securitas prestava até 30.06.2020 ao CHULC, não existindo bens significativos da Securitas para transmitir, além de canetas e 1 telemóvel de apoio (factos provados n.º 16 e 36).
11. Todos estes bens foram disponibilizados e colocados pelo cliente ao dispor da Securitas para serem utilizados na execução do serviço de vigilância e segurança contratado e são bens e equipamentos específicos afectos à operação de vigilância e segurança possibilitando a execução das suas funções aos vigilantes (nexo funcional).
12. Além daqueles bens pertencentes ao CHULC, a Securitas apenas utilizou, na prestação de serviços de segurança privada àquela entidade (além das canetas e 1 telemóvel de apoio), bens que pelas suas características, especificidades e natureza são intransmissíveis e não integram o núcleo essencial identificativo da unidade económica em causa, como sejam fardas, os rádios transmissores/receptores de apoio às comunicações (com frequência rádio atribuída em exclusivo à Securitas pela ANACOM e licença paga anualmente a esta entidade reguladora pela Securitas e os impressos para registo de acessos e ocorrências em modelo próprio e papel timbrado da Securitas (factos provados n.º 16 e 36).
13. À actividade de prestação de serviço de vigilância em apreço desenvolvida pela Securitas é essencial o capital humano, a mão-de-obra organizada e estabilizada no tempo e capaz de se autonomizar.
14. A Securitas exercia no cliente a sua actividade de vigilância e segurança privada de forma organizada, estável e duradoura, através de uma unidade própria, com outros vigilantes e foram retomados pela Prestibel equipamentos do cliente que tinham sido disponibilizados por este e utilizados pela Securitas na prestação de serviços de segurança privados acordados.
15. O Autor estava integrado num conjunto de meios organizados de vigilância (humanos e materiais), com identidade própria, constituindo uma unidade produtiva estável, dotada de autonomia técnico-administrativa com o objectivo de exercer a actividade económica de vigilância humana nas instalações do hospital B, pertencente ao CHULC, o que determina um encaixe financeiro considerável dado o elevado número de profissionais envolvidos (€ 2.599.090,80), sendo que o preço pago pela aquisição e prestação de serviços de vigilância e segurança privada humana que produz um bem incorpóreo - a segurança - constitui o valor desta unidade económica individualizada, distinta e autónoma da actividade do cliente.
16. Não era um indivíduo isolado que estava no hospital B; ele estava integrado num conjunto maior de uma equipa de cerca de 20 vigilantes, colocados nos Hospitais B e C há, pelo menos, 1 ano, que prestavam a actividade de vigilância unidos por um contrato de prestação de serviços de vigilância celebrado com o CHULC. Esta unidade de prestação de serviços esteve a prestar serviço de vigilância até desde 05/07/2018 a 30.06.2020, utilizando meios proporcionados pelo referido CHULC e sem qualquer interrupção aquela prestação de serviços foi afecta à PRESTIBEL, no dia 1 de Julho de 2020, por novo contrato de adjudicação (Factos provados n: 14, 27, 29 e 33). A actividade continuou a ser a mesma, nas mesmas instalações, os meios humanos e até os bens corpóreos continuaram a ser os mesmos e a prestação de serviços continuou a ser desempenhada por mão-de-obra de vigilância.
17. Mão-de-obra esta com formação inicial para ser possuidora do cartão profissional, dada pela Securitas e necessária para o exercício da sua profissão, de acordo com o art.º 25.º da Lei de Segurança Privada e com experiência na sua prática (como era o caso do Autor com ano e meio de exercício das funções de segurança ao serviço da Securitas e durante este tempo como vigilante no Hospital B e os seus colegas da equipa de vigilância há pelo menos 1 ano - factos provados 2, 27 e 29) e com formação contínua legal em diversas áreas (facto provado n.º 32), o que se traduz num elevado grau de conhecimentos e saber práticos e teóricos (know how) da sua profissão por parte destes vigilantes e que seria transmitido automaticamente com estes, caso a PRESTIBEL tivesse aceite a transmissão.
18. O que significa que o conjunto de trabalhadores que estavam ao serviço nos referidos hospitais do CHULC estava APTO, preparado e capaz de continuar a prossecução das funções diárias da mesma actividade após a transmissão, em termos em tudo semelhantes aos que desempenhavam antes sob a direcção da Securitas, por estarem devidamente organizados e estruturados e a actividade adjudicada à Prestibel não apresentava diferenças em relação à exercida anteriormente pela Securitas.
19. Este know-how, enquanto conhecimento especializado e assente em procedimentos, informações e experiência da organização concorrente, é personificado na concreta equipa de segurança afecta ao local a proteger e securizar, tendo em conta a disposição física, dimensões, construção, localização, dispersão geográfica, número e qualidade de utentes, tipo de serviços prestados, etc.
20. Estas especificidades determinaram a organização do trabalho prestado e a forma concreta de exploração do serviço, de tal forma que o conjunto de trabalhadores, adquiriu autonomia no seio da Securitas, formando um complexo humano, com formação profissional adequada às suas funções de vigilantes, estável e organizado entre si (com escalas de serviço, horários, folgas, férias, por exemplo) que confere, por si só, individualidade à actividade desenvolvida.
21. Após a mudança de titular verificou-se a manutenção daquela unidade económica, prosseguindo com a mesma actividade económica, antes e depois da transmissão, pois o estabelecimento continuou a funcionar, sem quaisquer lapsos de tempo ou interrupções de funcionamento, mantendo a mesma identidade, em termos de se poder concluir que o estabelecimento que existe depois, por natureza, é idêntico ao que existia antes.
22. O conjunto de meios (humanos e materiais) organizados com o objectivo de exercer uma actividade económica, prestação de serviços de segurança para o CHULC, manteve-se inalterado, já a que o referido 'capital humano' constitui o elemento primacial dessa unidade económica e permite definir a sua identidade.
23. Esta equipa de segurança, com todo o seu know-how, é uma unidade produtiva autónoma e estável, com organização específica e dotada de autonomia técnico-organizativa própria, manteve a sua identidade, permitindo a prossecução, de modo estável, de todas as actividades da empresa 'cedente', sendo facilmente reconhecida pelos utentes, como tratando-se da mesma e uma só.
24. Esta equipa de vigilantes estava inserida numa organização empresarial estruturada e bem organizada que assegurou o funcionamento da actividade de prestação de serviços de segurança e vigilância privada contratada com o cliente, cumprindo horários de trabalho de acordo com escalas de serviço organizadas pela Securitas, que não necessitava para executar e exercer diariamente as suas funções, tarefas e procedimentos, de reportar, comunicar ou solicitar instruções à estrutura hierárquica operativa da Securitas, pois estava cabalmente apta para tal, graças à sua contínua formação profissional obtida para dar resposta às exigências técnicas do seu trabalho diário e resolução dos problemas que surjam e à experiência adquirida na execução das tarefas e procedimentos definidos e exigidos pelo cliente (através de instruções, regras e diversas normas de carácter técnico, abrangendo inúmeras matérias relacionadas com a operação de segurança e vigilância contratada), constituindo uma equipa estável, duradoura e organizada de vigilantes que estavam colocados naquelas instalações desde há pelo menos 1 ano, utilizando meios e equipamentos disponibilizados pelo cliente e necessários e para o exercício das suas funções de vigilantes e que permaneceram nas instalações a partir de 01.07.2020.
25. O corpo de Supervisão e de Direcção da Prestibel, incluindo o supervisor e o Director Técnico de segurança prestam as suas funções em e para vários clientes desta empresa e não apenas no cliente CHULC como, aliás consta das funções do supervisor, constantes do CCT aplicável, pelo não fazem parte da mão-de-obra existente e afecta àquele estabelecimento, donde, obviamente, não constavam da listagem de trabalhadores a transmitir, remetida à Prestibel onde constam os vigilantes colocados nesse cliente.
26. O conceito de unidade económica não exige que do ponto de vista jurídico a unidade esteja pronta a funcionar isoladamente, não se exigindo um alvará, licença e director de segurança e supervisor. Apenas se requer entre os diferentes factores de produção transferidos se mantenha e permita que o cessionário os utilize com vista à prossecução de uma actividade económica idêntica ou análoga.
27. E, relativamente aos bens corpóreos levados pela Prestibel, tal circunstância não desvirtua a transmissão da unidade económica, uma vez que o essencial dos meios estruturados que constituem a unidade económica foram transmitidos e as folhas de papel e o fardamento com a identificação da empresa, não obstante permitam a identificação da empresa responsável pela vigilância e segurança, não integram a unidade económica, no seu núcleo essencial identificativo, inserindo-se nas exigências previstas pela Lei n.º 34/2013, de 16 de Maio.
28. Caso a PRESTIBEL não tivesse recusado a transmissão (ineficaz uma vez que a transmissão resulta ope legis, sem necessidade de acordo ou o consentimento do transmissário), teria recebido um conjunto de trabalhadores da Securitas que estavam ao seu serviço no referido perfeitamente aptos para a sua função de vigilantes e capazes de continuar a prossecução da mesma actividade após a transmissão, em termos em tudo semelhantes aos que desempenhavam antes sob a direcção da Securitas, por estarem devidamente organizados e estruturados e a actividade adjudicada à PRESTIBEL ser em tudo idêntica em relação à exercida anteriormente pela Securitas, mantendo deste modo a identidade da unidade económica após a transmissão.
29. E teria recebido (como recebeu em 01.07.2020) os meios essenciais para o desenvolvimento da prestação de serviços ao CHULC, nos Hospitais B e C, através dos meios colocados ao seu dispor por parte do CHULC e nas suas instalações.
30. Verificou-se, assim, transmissão de estabelecimento ou de parte de empresa da Securitas (transmitente) para a PRESTIBEL (adquirente) e a posição dos contratos dos trabalhadores transmitiu-se da primeira para a segunda nos termos do art5 2855 n5 1 e 5 do Código do Trabalho e aos trabalhadores ficou salvaguardada a manutenção de todos os direitos contratuais adquiridos, nomeadamente, retribuição, antiguidade, categoria profissional e conteúdo funcional e benefícios sociais adquiridos (n.º 3 do citado artigo).
31. A jurisprudência tem sido uniforme no sentido da aplicação dos art.os 285.º n.º 1 e 5 do Código do Trabalho, considerando haver transmissão nos casos de cessação dos contratos de prestação de serviços de segurança e a sua adjudicação a nova empresa.
32. E tem entendido que o que releva para aplicação do artigo 285.º do C.T. é a existência de uma verdadeira continuidade do estabelecimento, ou seja, há transmissão do estabelecimento quando se verifica a conservação da sua identidade e individualidade, através da existência de um conjunto estruturado e organizado de pessoas e a prossecução da respectiva actividade e não a transmissão de bens corpóreos ou incorpóreos, referindo-se neste sentido, a título meramente exemplificativo, entre outros, os seguintes e recentes Acórdãos: - Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 18.12.2019 proferido no Proc.º 2131/18.1T8PDL.L1; o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 14.01.2020 proferido no Proc.º 3196/18.1T8PDL.L1; o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 14.01.2021 proferido no Proc.º 2883/19.1T8STB.E1; o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 28.01.2021 proferido no Proc.º 959/18.1T8BJA.E1, o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 11.02.2021 proferido no Proc5 100/20.0T8SNS.E1; o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa (4i Secção) de 25-03-2021 proferido no Proc.º 1160/18.0T8AGH.L1; o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 30-06-2021 proferido no Proc.º 1190/19.8T8BRR.L1, o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa (4.ª secção) de 24-11-2021 proferido no Proc.º 18771/20.6T8LSB.L1; o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 10.03.2022 proferido no Proc.º 1746/20.2T8PTM.E1 e o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 27-04-2022 proferido no Proc.º 1644/20.0T8LSB.L1 (ainda não transitado em julgado).
33. E, também, neste sentido e de uma forma clarificadora de toda esta situação, a recente Lei 18/2021, de 8 de Abril, estendendo, no seu art.º 1.º, o regime jurídico aplicável à transmissão de empresa ou estabelecimento às situações de transmissão por adjudicação de fornecimento de serviços que se concretize por concurso público, ajuste directo ou qualquer outro meio, alterando, nomeadamente, o art.º 285.º do C.T., dispondo agora no seu n.º 10 que 'o disposto no presente artigo é aplicável a todas as situações de transmissão de empresa ou estabelecimento por adjudicação de contratação de serviços que se concretize por concurso público ou por outro meio de selecção, no sector público e privado, nomeadamente à adjudicação de fornecimento de serviços de vigilância (sublinhado nosso), alimentação, limpeza ou transportes, produzindo efeitos no momento da adjudicação.'
34. Em qualquer caso e não procedendo o alegado anteriormente - o que não se concede - se, porventura, a responsabilidade pelo despedimento do Autor vier a ser atribuída à Securitas a indemnização não deve exceder 15 dias por ano de antiguidade pela inexistência de culpa censurável desta naquele despedimento".

Contra-alegaram o autor e a co-ré Prestibel,[2] concluindo pela confirmação da sentença recorrida.

Admitido o recurso na 1.ª Instância e remetido a esta Relação, foram os autos aos vistos,[3] cumprindo agora apreciar o mérito do mesmo, cujo objecto, como pacificamente se considera, é delimitado pelas conclusões formuladas pelo apelante, sem prejuízo das questões que o tribunal conhece ex officio.[4] Assim, importa apreciar as seguintes questões:
i. a impugnação da decisão proferida acerca da matéria de facto;
ii. a transmissão do estabelecimento e com isso do contrato de trabalho acordado entre o autor e a ré SECURITAS para a ré PRESTIBEL e suas consequências.
***

II - Fundamentos.

1. Factos julgados provados.
"1. As RR. dedicam-se à actividade de prestação de serviços a terceiros de vigilância de segurança privada.
2. A R. Securitas admitiu o Autor ao seu serviço em 23 de Dezembro de 2019.
3. Mediante a celebração de contrato de trabalho, a termo certo, em regime de tempo inteiro, com termo em 22 de Dezembro de 2020, conforme contrato junto a fls. 29v, que se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
4. E para exercer funções de vigilante e integrante de tal categoria, por conta, sob orientação, direcção e fiscalização da Ré Securitas.
5. Com o salário base mensal de € 765,57, acrescido do subsídio de alimentação no valor diário de cada dia efectivo de trabalho prestado, de acordo com o CCT.
6. Por carta datada de 8 de Junho de 2020, a Ré Securitas informou o A. que o local onde o mesmo prestava serviço, no Hospital B, foi adjudicado à Ré Prestibel, e que seria transmitido para a mesma todos os postos de trabalho, com efeitos a partir do dia 01 de Julho de 2020, conforme carta junta a fls.35v, e que se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
7. A Ré Securitas procedeu ao pagamento do vencimento devido ao A. até ao mês de Junho de 2020.
8. Nos dias 1 e 2 de Julho o A. apresentou-se no seu posto de trabalho, no Hospital B, mas responsáveis da R. Prestibel não o aceitaram ao serviço.
9. A R. Securitas, em face da transmissão operada para a R. Prestibel, não comunicou ao A. a extinção do seu posto de trabalho nem a cessação do seu contrato de trabalho e a R. Prestibel não aceitou a prestação de trabalho pelo Autor.

Da contestação da Ré Prestibel
10. A 2.ª R. (Prestibel) iniciou em 01 de Julho de 2020, pelas 00h00, a prestação dos serviços de segurança e vigilância nas instalações no Hospital B.
11. Tendo para o efeito utilizado os seus próprios recursos humanos - vigilantes/Supervisor/Inspector.
12. Por carta datada de 08 de Junho de 2020, a 2a R. comunicou à 1a R. não aceitar a transmissão do estabelecimento e dos contratos de trabalho.
13. Na sequência da adjudicação que lhe foi efectuada no âmbito do Concurso Limitado por Prévia Qualificação n.º 3-0.0001/2020 para a prestação de serviços de vigilância e segurança aberto pelo Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central, EPE,
14. A 2.ª R. iniciou, em 01 de Julho de 2020, a prestação dos referidos serviços nos hospitais que integram o Centro Hospitalar da 3.ª R. - Hospital B e Hospital C.
15. A 2.ª R. não comunicou a admissão do Autor com uma antecedência não inferior a 24 horas relativamente à data de início da prestação de serviço, ao Departamento de Segurança Privada da Polícia de Segurança Pública.
16. Na data em que cessou a sua prestação de serviços no Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central, EPE, a 1a R. retirou o seguinte equipamento que servia de apoio às funções da segurança nos hospitais:
Hospital de Santo António dos Capuchos
a) documentação de apoio à execução dos serviços;
b) 1 (um) telemóvel de apoio;
c) diversos rádios emissores/receptores de apoio à actividade.
Hospital de Santa Marta
a) documentação de apoio à execução dos serviços;
b) 1 (um) telemóvel de apoio;
c) diversos rádios emissores/receptores de apoio à actividade.
17. Nenhuma peça de uniforme/fardamento foi cedida pela 1a R. à 2a R.
18. O procedimento de contracção pública para a aquisição de serviços de vigilância e segurança humana para o Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central, EPE, foi aberto como Concurso Limitado por Prévia Qualificação n.º 3-0.0001/2020.
19. Nos termos do n.º 4 da Cláusula 5a do Caderno de Encargos, sob a epígrafe 'Obrigações principais do prestador de serviços' lê-se '(...) o prestador de serviços fica ainda obrigado, designadamente, a recorrer a todos os meios humanos, materiais e informáticos que sejam necessários e adequados à prestação do serviço, bem como ao estabelecimento do sistema de organização necessário à perfeita e completa execução das tarefas a seu cargo, nos termos do caderno de encargos.'
20. Ainda nos termos do n.º 1 da Cláusula 8a do Caderno de Encargos, sob a epígrafe 'Direcção técnica' lê-se 'O prestador do serviço obriga-se a entregar a direcção técnica da prestação dos serviços a um técnico de reconhecida competência em trabalhos semelhantes, aceite pelo CHULC'.
21. Os trabalhadores da 1.ª Ré D, E e F prestavam serviço para a 1.ª R. no Hospital B e continuaram ao serviço da Securitas mesmo depois da 2.ª R., a Prestibel, iniciar a sua actividade nos Hospitais em 01 de Julho de 2020.
22. Nas instalações do Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central, EPE não existe em permanência qualquer graduado (Vigilante-Chefe/Supervisor) dos trabalhadores vigilantes ali adstritos.
23. O modo específico de realização das tarefas é determinado pelos graduados nas visitas que efectuam ao local de trabalho e pelo 'Director Técnico'.
24. Sendo a substituição de trabalhadores por motivo de falta, independentemente do motivo que a determine, efectuada pelos graduados e restante estrutura organizativa da 2a R.
25. É também competência dos graduados estipular o modo de prossecução dos serviços a prestar no cliente, cabendo aos vigilantes cumprir tais instruções de serviço.
26.É também competência dos graduados aprovar/alterar/organizar o mapa de férias dos vigilantes no local, cabendo a eles decidir, de forma a organizar convenientemente os serviços, a marcação dos períodos de férias dos vigilantes adstritos a cada posto de trabalho.
 
Da contestação da Ré Securitas
27. De Dezembro de 2019 a 30.06.2020 o A. desempenhou as suas funções de vigilante no Hospital B, por colocação da 1.ª Ré para cumprimento de um contrato de prestação de serviços de segurança privada celebrado entre a Securitas e o Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central, EPE que vigorou de forma ininterrupta desde 05/07/2018 a 30/06/2020.
28. Entretanto, o Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central abriu concurso público (ref.ª interna CHULC_3-0.0001/2020) para aquisição de serviços de segurança e vigilância privada nas instalações do referido Centro Hospitalar, pelo período de 1 ano, 2020, prorrogável por acordo expresso das partes até ao limite máximo de vigência de 31/12/2022.
29. O concurso incluía diversas Unidades Hospitalares pertencentes ao Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central, nomeadamente, os Hospitais B e C, nos quais a Securitas tinha colocado a prestar serviço cerca de 20 vigilantes, sendo que o A. estava colocado, no Hospital B, desde Dezembro de 2019 e os outros vigilantes há, pelo menos, 1 ano.
30. A proposta do júri datada de 13.05.2020 foi a adjudicação à PRESTIBEL - Empresa de Segurança, S.A. da prestação de serviços de segurança e vigilância às instalações do Centro Hospital Universitário Lisboa Central, objecto do referido concurso que incluía o Hospital B e o Hospital C, pelo valor de €  2.599.090,80.
31. A Securitas recebeu a notificação da decisão em 22/05/2020.
32. Para o cabal desempenho das suas funções de vigilantes, estes trabalhadores, incluindo o A., receberam formação inicial para serem possuidores dos respectivos cartões profissionais e formação contínua legal em diversas áreas, designadamente:
⦁ Prevenção e combate a incêndios;
⦁ Simulação de incidentes.
33. Os cerca de 20 vigilantes, incluindo o A., faziam, nomeadamente, a abertura e fecho das instalações ou serviços, rondas às instalações, controlo de acessos de pessoas e viaturas às instalações e zonas de estacionamento, controlo de movimentos de pessoas através de sistema de videovigilância, prestavam informações e davam orientação aos utentes que demandavam aqueles serviços, efectuavam relatórios de turnos e prestavam toda a segurança para que quer o pessoal que trabalhava nas instalações adjudicadas quer os doentes e acompanhantes, visitantes e outros utentes em geral, pudessem estar seguros e tranquilos, bem como a protecção de bens e equipamentos.
34. As instalações e os meios utilizados, nomeadamente, secretária, cadeira, computador, sistema de videovigilância, sistema de alarmes contra incêndios e intrusão, extintores e cacifos, pertenciam ao Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central e os mesmos passaram a ser utilizados a partir de 01.07.2020 pela PRESTIBEL.
35. O A. usava no desempenho das suas funções, farda da Ré com placa identificativa e cartão profissional para o exercício das suas funções, o qual é pessoal e válido dentro do seu prazo de validade, independentemente da entidade empregadora do titular.
36. Para além da farda, o A. usava, ainda, no desempenho das suas funções, os seguintes materiais e equipamentos fornecidos pela Securitas:
⦁ Canetas;
⦁ Impressos em papel para registos (de acessos e ocorrências) com o timbre da Securitas e entregues ao Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central.
⦁ Rádios transmissores/receptores com frequência e licença própria atribuída pela ANACOM à Securitas.
37. Para cumprimento de exigências legais, a Securitas tinha nas instalações das unidades hospitalares em causa, diversa documentação, em papel timbrado desta empresa e relacionada com a execução da prestação de serviço de vigilância e segurança em apreço, designadamente:
⦁ Contratos de trabalho dos vigilantes colocados nos hospitais em questão;
⦁ Horários de trabalho;
⦁ Livro de composição de turnos;
⦁ Livro de Registos de trabalho suplementar;
⦁ Plano de férias (de 1 de Abril a 31 de Outubro).
38. Não existiu qualquer contrato ou negócio jurídico entre a PRESTIBEL e a Securitas.
39. A Ré Securitas comunicou ao A. em 08.06.2020 e ao STAD em 05.06.2020, por cartas registadas com aviso de recepção, a transmissão do seu contrato de trabalho para a PRESTIBEL - Empresa de Segurança, S.A. por transmissão da prestação de serviços no Hospital B e C e que a referida transmissão se verificaria em 01 de Julho de 2020, procedendo a Securitas ao pagamento das retribuições correspondentes aos dias trabalhados até 30.06.2020.
40. À nova adjudicatária PRESTIBEL, a Securitas enviou também uma carta registada, com aviso de recepção, em 05.06.2020, a invocar a transmissão do estabelecimento com a relação, em anexo, dos trabalhadores cujos contratos de trabalho se transmitiam para a adquirente indicando o nome, a data de nascimento, o NIF, o NISS, a morada, a antiguidade contratual, o telemóvel, a categoria profissional, o tipo de contrato de trabalho, a filiação sindical e o número de cartão profissional, a remuneração mensal, o subsídio de férias já pago e férias já gozadas ambos em 2020.
41. Em aditamento à carta de 05.06.2020, a Securitas enviou uma carta registada, com aviso de recepção, em 17.06.2020, com a relação, em anexo da trabalhadora G cujo contrato de trabalho se transmitia para a adquirente indicando o nome, a data de nascimento, o NIF, o NISS, a morada, a antiguidade contratual, o telemóvel, a categoria profissional, o tipo de contrato de trabalho, a filiação sindical e o número de cartão profissional, a remuneração mensal, o subsídio de férias já pago e férias já gozadas ambos em 2020 que por lapso não constava na lista anexa à carta de 05.06.2020.
42. Na mesma data de 05.06.2020 a Securitas enviou à ACT - Centro Local de Lisboa Oriental a comunicação da transmissão do estabelecimento.
43. Dos 18 trabalhadores que constavam das listas enviadas à PRESTIBEL em 05.06.2020 e 17.06.2020, a Securitas chegou, entretanto, a acordo com os seguintes 3 (três) trabalhadores que estavam colocados no hospital de Santo António dos Capuchos para serem transferidos para outros estabelecimentos:
1 - D;
2 - E;
3 -  F".

2. Factos julgados não provados.
"1. Os trabalhadores, incluindo o A., receberam formação contínua legal em diversas áreas, designadamente:
Elaboração de registos e relatórios;
Controlo de acessos;
Técnicas de socorrismo;
Procedimentos operacionais de emergência em alarmes;
Operações de meios de videovigilância e centrais de alarme;
Técnica e prática de vigilância humana e electrónica;
Revistas pessoais;
Gestão de conflitos".

3. Motivação da decisão da matéria de facto.
(…)

4. O direito.
4.1. A impugnação da decisão da matéria de facto.
4.1.1 Vejamos então a impugnação da decisão proferida acerca da matéria de facto, começando pelo que o Tribunal a quo julgou provado sob o n.º 32 e cujo conteúdo é o seguinte:
"32. Para o cabal desempenho das suas funções de vigilantes, estes trabalhadores, incluindo o A., receberam formação inicial para serem possuidores dos respectivos cartões profissionais e formação contínua legal em diversas áreas, designadamente:
Prevenção e combate a incêndios;
Simulação de incidentes".

Sendo certo que motivou assim a sua decisão:
"A forma de organização do trabalho da 1.a Ré, os instrumentos utilizados e a formação ministrada resultou do depoimento da testemunha H, gestor da 1.ª Ré, que prestou um depoimento coerente e espontâneo merecedor da confiança do tribunal. A testemunha explicitou que os vigilantes neste cliente tinham formação do próprio cliente, usavam software e materiais do próprio clientes e estavam preparados para as funções diárias e resolver os problemas que surgissem.
Neste ponto a testemunha apenas mencionou a formação quanto a incêndios. Não foi produzida prova quanto a outras matérias de formação".

A apelante pretende que se altere essa decisão e se julgue agora provado que:
"32. Para o cabal desempenho das suas funções de vigilantes, estes trabalhadores, incluindo o A., receberam formação inicial para serem possuidores dos respectivos cartões profissionais e formação contínua legal em diversas áreas, designadamente:
- Elaboração de registos e relatórios;
- Controlo de acessos;
- Prevenção e combate a incêndios;
- Técnicas de socorrismo;
- Procedimentos operacionais de emergência de alarmes;
- Operações de meios de videovigilância e centrais de alarmes;
- Técnica e prática de vigilância humana e electrónica;
- Revistas pessoais;
- Gestão de conflitos;
- Simulação de incidentes".

E em consonância com isso se elimine o facto julgado não provado n.º 1 (único), valendo por dizer que pretende se acrescente os seguintes segmentos ao facto provado:
"(…)
Elaboração de registos e relatórios;
Controlo de acessos;
(…)
Técnicas de socorrismo;
Procedimentos operacionais de emergência de alarmes;
Operações de meios de videovigilância e centrais de alarmes;
Técnica e prática de vigilância humana e electrónica;
Revistas pessoais;
Gestão de conflitos;
(…)."

Argumenta a apelante que tal foi alegado no art.º 11.º da sua contestação e depois acordado entre as partes como assente, conforme resulta da passagem dos 02:26 ms aos 03:45 ms do sistema de gravação da audiência de julgamento.

A apelada PRESTIBEL nada disse sobre isso e o apelado trabalhador defendeu a subsistência do decidido, embora também nada tenha referido acerca da razão invocada pela apelante para ver alterado tal segmento da decisão.

Vejamos então se assiste razão à apelante.

Primeiramente cumpre dizer que efectivamente o facto em crise foi assim alegado no art.º 11.º da contestação da apelante SECURITAS.

Todavia, da acta lavrada da audiência de julgamento, que teve lugar no dia 08-03-2022, pelas 14:00 horas, acerca desta temática apenas consta que "De seguida foi pedida a palavra pelos Ilustres Mandatários das rés, que no seu uso disseram que pretendem dar como assente, por acordo, matéria de facto constante dos artigos 1.º, a 10.º, da Petição Inicial, artigo 5.º, onde consta 23 de Dezembro deverá constar 22 de Dezembro de 2020, artigo 7.º, acrescido do subsidio de alimentação valor diário de cada dia efectivo prestado de acordo com o valor no Código de Processo de Trabalho" e depois que "Seguidamente procedeu-se às DECLARAÇÕES DE PARTE do AUTOR que se identificou da seguinte forma: (…)". Ou seja, não consta que a matéria alegada naquele artigo da contestação tivesse sido acordada entre as partes (sendo certo que não fora assim alegado na petição inicial do apelado, mas em termos de tal modo genéricos que não permitem sequer configurar essa hipótese); e na acta devem ser transcritos, no prazo de cinco dias, inter alia, os requerimentos das partes e os despachos do juiz, podendo a desconformidade ser arguida no mesmo prazo, a contar da sua incorporação nos autos, em conformidade com o estatuído no art.º 155.º, n.os 5 e 6 do Código de Processo Civil. Todavia, no caso sub iudicio não foi apresentada qualquer reclamação contra a redacção da acta desde que foi incorporada nos autos (em 08-03-2023, quase três meses antes da interposição da apelação, sendo esses factos de que se conhece ex officio, nos termos do art.º 412.º, n.º 2 do Código de Processo Civil).

Ora, uma vez que não foi especificada qualquer prova pela apelante que impusesse decisão diversa da recorrida, naturalmente que nesta parte não poderá conceder-se a apelação e ter-se-á antes que a manter (tanto quanto ao facto julgado provado n.º 32 como ao julgado não provado n.º 1), atento o disposto no art.º 640.º, n.º 1, alínea b) do Código de Processo Civil.

4.1.2 A apelante também impugnou a decisão do Tribunal a quo que julgou provado o facto n.º 34, a saber:
"34. As instalações e os meios utilizados, nomeadamente, secretária, cadeira, computador, sistema de videovigilância, sistema de alarmes contra incêndios e intrusão, extintores e cacifos, pertenciam ao Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central e os mesmos passaram a ser utilizados a partir de 01.07.2020 pela PRESTIBEL".

Pretende que lhe seja aditado que também o software instalado no computador pertencia ao Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central e para isso especificou passagens do depoimento prestado pela testemunha H.

Se é certo que o facto que foi julgado provado pelo Tribunal a quo fora alegado pela apelante no art.º 15.º da sua contestação, também é verdade que esta não referiu ali nem em qualquer outro lugar daquele articulado o segmento de facto em apreço (e o mesmo se diga da petição inicial do autor e da contestação da co-ré PRESTIBEL). Sendo certo que a facto do computador pertencer ao Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central não impunha, ipso facto, que o mesmo ocorresse com o software nele instalado.

Ora, conforme vem sendo uniformemente considerado pela jurisprudência, mormente do Supremo Tribunal de Justiça, "o Tribunal da Relação não pode ordenar à 1.ª instância a ampliação da matéria de facto com factos que não tenham sido alegados pelas partes nos articulados"; o que se afere, de resto, da circunstância do n.º 1 art.º 72.º do Código de Processo do Trabalho estatuir que "… se no decurso da produção da prova surgirem factos essenciais que, embora não articulados, o tribunal considere relevantes para a boa decisão da causa, deve o juiz … tomá-los em consideração na decisão, desde que sobre eles tenha incidido discussão".[5]
  
Assim sendo, não poderia ser julgado provado e, por conseguinte, terá a impugnação da decisão proferida sobre essa matéria que improceder.

4.2. As questões jurídicas.
Vejamos agora as questões jurídicas suscitadas na apelação da ré, as quais, como vimos atrás, consistem em saber se ocorreu a transmissão do estabelecimento e com isso do contrato de trabalho acordado entre o autor e a ré SECURITAS para a ré PRESTIBEL e, nesse caso, quais as suas consequências.

E para o efeito importa desde logo dizer, como de resto na sentença recorrida, que para o efeito importa considerar o art.º 285.º do Código do Trabalho, mas na versão anterior à que lhe foi conferida pela Lei n.º 18/2021, de 8 de Abril, tendo em conta que a discutida transmissão do estabelecimento e do contrato de trabalho ocorreu no dia 01-07-2000 e o disposto nos art.os 4.º daquela Lei e 12.º, n.º 1 do Código Civil; e apenas essas normas, com exclusão das que resultam da contratação colectiva e respectiva extensão, isto porque, como igualmente refere a sentença recorrida, tendo em conta o estatuído pelo 496.º do Código do Trabalho, isto porque por um lado não se provou que o apelado trabalhador estivesse inscrito em qualquer sindicato e, por outro, resulta expressamente da Portaria de Extensão n.º 307/2019, de 13 de Setembro de 2019 (que seria potencialmente relevante) a sua exclusão de aplicação aos empregadores na Associação Nacional das Empresas de Segurança – AESIRF, como é o caso da apelada Prestibel.

Conforme vimos atrás, a sentença recorrida julgou a acção procedente e, em consequência, decidiu (1) absolver a apelada ré PRESTIBEL e (2) declarar ilícito o despedimento que o autor foi alvo e consequentemente condenar a apelante ré SECURITAS a pagar-lhe determinadas quantias a título de indemnização por despedimento ilícito, proporcionais de férias e de subsídios de férias e de Natal vencidos em 31-06-2020 e acrescidos de juros de mora desde a data do vencimento de cada uma das prestações que a integram até efectivo e integral pagamento, para o que convocou a seguinte ordem de razões:
"Nos presentes autos cumpre, antes de mais, apurar qual será a entidade empregadora do Autor.
A primeira questão a solucionar será então a de se considerar se, no caso, ocorreu efectiva transferência do contrato de trabalho.
Neste ponto dispõe o art.º 285.º, n.os 1 a 9, do Código do Trabalho (na versão anterior à Lei n.º 18/2021, de 08 de Abril):
(…)
A actual redacção do art.º 285.°, do Código do Trabalho, foi aquela que lhe foi dada  pela Lei n.º 14/2018, de 19 de Março. Diploma pátrio que transpôs para a ordem interna a Directiva 2001/23/CE DO CONSELHO de 12 de Março de 2001 relativa à aproximação das legislações dos Estados-Membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas ou de estabelecimentos, ou de partes de empresas ou de estabelecimentos.
Na aplicação do art.º 285.º, do Código de Trabalho, cumpre atender ao Acórdão do Tribunal de Justiça de 19 de Outubro de 2017, disponível em https://eur-lex.europa.eu/legal- content/PT/TXT/PDF/?uri=CELEX:62016CJ0200&from=EN, proferido no âmbito de um reenvio prejudicial. Apreciando a questão da validade de uma norma nacional que excluía a transmissão do contrato no âmbito da sucessão de clientes de empresas de segurança o Tribunal enuncia o campo de apreciação do juiz nacional para, à luz da directiva, confirmar da existência da transmissão de estabelecimento.
Ainda que dispensando a necessidade de vínculo entre as entidades empregadoras que se sucedem o Tribunal de Justiça mantém que será necessário - a transferência deve ter por objecto «uma entidade económica que mantém a sua identidade, entendida como um conjunto de meios organizados, com o objectivo de prosseguir uma actividade económica, seja ela essencial ou acessória»;
A apreciação dessa transmissão da entidade económica dependerá das circunstâncias da actividade em concreto - há que tomar em consideração todas as circunstâncias de facto que caracterizam a operação em causa, entre as quais figuram, designadamente, o tipo de empresa ou de estabelecimento de que se trata, a transferência ou não de elementos corpóreos, como os edifícios e os bens móveis, o valor dos elementos incorpóreos no momento da transferência, a integração ou não do essencial dos efectivos pelo novo empresário, a transferência ou não da clientela, bem como o grau de semelhança das actividades exercidas antes e depois da transferência e a duração da eventual suspensão destas actividades. Estes elementos devem ser apreciados no âmbito de uma avaliação de conjunto das circunstâncias do caso concreto e não podem, por isso, ser considerados isoladamente.
Sendo certo que a importância respectiva a atribuir aos diferentes critérios da existência de uma transmissão, na acepção da Directiva 2001/23, varia necessariamente em função da actividade exercida, ou mesmo dos métodos de produção ou de exploração utilizados na empresa, no estabelecimento ou na parte do estabelecimento em questão (acórdão de 26 de Novembro de 2015, Aira Pascual e Algeposa Terminales Ferroviarios, C-509/14, EU:C:2015:781, n. o 34).
Em particular, o Tribunal enuncia que num sector em que a actividade assenta essencialmente na mão-de-obra, a identidade de uma entidade económica não pode ser mantida se o essencial dos seus efectivos não for integrado pelo presumido cessionário (acórdão de 26 de Novembro de 2015, Aira Pascual e Algeposa Terminales Ferroviários, C- 509/14, EU:C:2015:781, n. o 35). Quando, ao invés, a actividade se baseia essencialmente em equipamentos, o facto de os antigos trabalhadores de uma empresa não serem integrados pelo novo empresário para o exercício dessa actividade não basta para excluir a existência de uma transferência de uma entidade económica que mantém a sua identidade.
Com estes elementos interpretativos voltemos atenção para a norma nacional do art.285.°, do Código do Trabalho.
Conforme resulta da disposição já citada a previsão da norma é referente à transmissão da titularidade de empresa, ou estabelecimento ou ainda de parte de empresa ou estabelecimento que constitua uma unidade económica. Sendo que tal previsão é estendida no n.º 2 à 'transmissão, cessão ou reversão da exploração de empresa, estabelecimento ou unidade económica’'.
Sendo definida como unidade económica o conjunto de meios organizados que constitua uma unidade produtiva dotada de autonomia técnico-organizativa e que mantenha identidade própria, com o objectivo de exercer uma actividade económica, principal ou acessória (n.º 5).
Na subsunção a esta previsão cumpre apurar se a sucessão na exploração dos serviços de segurança incluídos na contratação com a Ré PRESTIBEL se poderá considerar a transmissão ou cessão de exploração de uma unidade económica.
Neste ponto, e na aplicação do art.º 285.°, do Código do Trabalho, um dos primeiros pontos a considerar é que a sucessão na exploração da empreitada não resultou de qualquer negócio jurídico entre as Rés, mas antes do vencimento de concurso público.
Tem sido entendido que tal circunstância não obsta à consideração da transferência da unidade económica. Neste sentido veja-se o acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 2309-2008, relatado por GONÇALVES ROCHA, processo n.º 801/08-2, disponível em www.dgsi.pt: 'Ora, conforme acentua este autor (pg. 820), de importância central para a existência duma transferência do estabelecimento é que a entidade económica que este representa mantenha a sua identidade. E assim, o Tribunal de Justiça, ainda no domínio da Directiva 77/187, começou a afirmar que a aplicação da directiva não pressupunha necessariamente a existência dum vínculo contratual entre cedente e cessionário, sendo de aplicar desde que o estabelecimento mantenha a sua identidade, sendo de relevar neste ponto se a transmissão engloba os seus bens móveis ou equipamentos, mas também bens incorpóreos, tais como a transmissão do know-how, a sucessão da actividade sem interrupção, a manutenção da clientela e a identidade da actividade desenvolvida após a transferência.
Por isso é jurisprudência daquele Tribunal de Justiça que esta transmissão pode ocorrer mesmo quando há sucessivos concessionários que não têm qualquer relação contratual entre si'.
Mantém-se assim relevante perceber se existiu uma sucessão da exploração de uma concreta unidade económica ou se, ao invés, apenas ocorreu uma alteração na empresa fornecedora do serviço de segurança irrelevante para os efeitos do art.º 285.º, do Código do Trabalho.
A subsunção a esta classificação de unidade económica tem sido obtida mediante indícios da realidade em apreço. 'O critério de identificação de transferência de empresa laboriosamente construído pelo Tribunal das Comunidades assenta precisamente na ideia de uma apreciação global de diversos factores que não devem ser considerados isoladamente: é imprescindível considerar o conjunto das circunstâncias de facto que caracterizam a operação, desde a transmissão de bens do activo da entidade, designadamente, bens imóveis, equipamentos, bens incorpóreos como o know-how, a manutenção da maioria essencial dos efectivos, a manutenção da clientela, o grau de similaridade entre a actividade desenvolvida antes e a actividade desenvolvida depois' Joana Nunes Vicente 'Contrato de prestação de serviço versus cedência ilegal de trabalhadores: diálogo com a doutrina da transmissão de empresa' (Publicado em Questões Laborais, Coimbra, n.º 32, 2008, pp. 183-202).
Na avaliação desses indícios é naturalmente invocada a noção de estabelecimento comercial, no sentido do conjunto de bens materiais e imateriais que permitem a prossecução da actividade  económica.
Contudo, consoante a situação em apreço poderá justificar-se a relativização do suporte material de uma empresa (Joana Nunes Vicente, Ob. Cit).
Em particular, indica a Autora citada a distinção entre actividades de capital intensivo e actividades de mão-de-obra intensiva, para concluir que 'há transmissão de estabelecimento quando a entidade económica preserva a sua identidade, quer isto dizer, quando ocorre a passagem dos elementos constitutivos da empresa que determinam a sua identidade e que formam, por assim dizer, o seu suporte principal' o qual poderá ser diferente consoante o tipo de empresa sendo referida jurisprudência comunitária de referência (Acórdão Schmidt, Acórdão do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias de 14 de Abril de 1994, Proc. n.º C-392/92, Colectânea da Jurisprudência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, 1994, págs. 1-1511 e ss.) que inclui como elemento indiciador nas empresas intensivas de mão de obra a continuidade de trabalhadores e bem assim a prestada nos mesmos moldes, com o mesmo método de organização do trabalho.
Na jurisprudência nacional sobre esta questão é de referir o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 15-02-2006, processo n.º 12108/2005-4 , relatado por Ferreira Marques, disponível em www.dgsi.pt: 'este caso, só poderia falar-se em transmissão ou em transferência desta 'parte de estabelecimento' da Ré Strong para a CPS se, após o dia 12/10/2004, continuasse a manter-se a sua identidade, ou seja, se após aquela data, além da actividade de vigilância e segurança, se mantivessem os efectivos ou uma parte essencial dos efectivos que antes asseguravam aquela actividade. Poderia falar-se em transmissão ou transferência da referida unidade económica da Ré Strong para a CPS se, além da continuação da referida actividade, se mantivessem a assegurar essa actividade os colegas dos AA. ou uma parte substancial desses colegas. Como isso não se provou (nem sequer foi alegado) e como ficou apenas demonstrada a verificação de uma mera sucessão no exercício de uma actividade, não podemos falar em transmissão de um estabelecimento ou de parte deste e, consequentemente, não podemos concluir que os contratos de trabalho dos AA. e os direitos e obrigações emergentes desses contratos se transmitiram para a CPS.'
Nesta matéria é ainda de referir o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 06-12-2017, relatado por ANA LUISA GERALDES, processo n.º 357/13.3TTPDL.L1.S1, disponível em www.dgsi.pt: 'Não ocorre uma situação de transmissão de estabelecimento quando uma empresa deixa de prestar serviços de vigilância e segurança junto de determinado cliente, na sequência de adjudicação, por este, de tais serviços de vigilância a outra empresa, sem que se tivesse verificado a assunção de qualquer trabalhador da anterior empresa e tão pouco qualquer transferência de bens ou equipamentos de prossecução da actividade susceptível de consubstanciar uma 'unidade económica' do estabelecimento.'

Volvendo aos autos em apreço nada foi alegado, para além da mera sucessão na prestação de serviço, que permita concluir por uma manutenção da mesma unidade económica.

Por outra via, e ainda que a forma concreta de exploração do serviço (número de vigilantes por postos, horários de cada posto, número de rondas etc.) se mantenha idêntico entre os dois prestadores, a sua definição resultou dos termos contratados com o próprio cliente e não da transmissão ou assunção de know-how.
No que se refere a equipamento transmitido (ainda que não por negócio entre Rés) cumpre notar que inexiste equipamento especificamente afecto à operação de segurança que seja transmitido. De facto, o único equipamento em causa respeita à actividade do cliente e não da actividade de vigilância humana.
Regressamos ao critério do Acórdão do Tribunal de Justiça de 19 de Outubro de 2017, supra citado: A este respeito, há que recordar que a circunstância de os elementos corpóreos indispensáveis ao exercício da actividade em causa no processo principal e retomados pelo novo empresário não pertencerem ao seu antecessor, mas terem sido simplesmente disponibilizados pelo contratante, não pode levar a excluir a existência de uma transferência de empresa ou de estabelecimento.
Contudo, reforça o Tribunal 'Contudo, só os equipamentos que são efectivamente utilizados para prestar os serviços de vigilância, com exclusão das instalações que são objecto desses serviços, devem, se for caso disso, ser tomados em consideração para determinar a existência de uma transferência de uma entidade com manutenção da sua identidade, na acepção da Directiva 2001/23 (acórdão de 29 de Julho de 2010, UGT-FSP, C-151/09, EU:C:2010:452, n. o 31). '
Ora, no caso em apreço temos apenas as instalações do cliente como objecto da operação de vigilância e não existe qualquer equipamento especificamente afecto a operações de vigilância.

Cumpre observar que nada impede que ocorra efectivamente uma situação de transmissão de estabelecimento prevista no art.285.°, do Código do Trabalho, numa situação de sucessão de empresas de vigilância fora do contexto da cláusula 14.ª do CCT STAD. Assim, podemos equacionar operações de vigilância que impliquem o recurso a centrais de alarmes ou de videovigilância, o uso de pórticos de segurança e de equipamento de detecção etc. O que não é o caso nos presentes autos.
A mera existência de comunicações da Ré Securitas a dar conta aos trabalhadores da sua transferência é insuficiente para se considerar a transferência de empresa ou estabelecimento.
Não existiu qualquer transmissão de estabelecimento, mas antes uma empresa que ocupava um espaço para prestar um serviço, deixa de o fazer, e passa a estar outra no seu lugar a ocupar esse espaço. Cada uma delas leva os seus equipamentos, materiais, elementos organizados, estrutura financeira, e apenas o espaço físico deixa de ser ocupado por uma para passar a ser ocupada por outro. Inexistindo uma transmissão não pode pretender-se aplicar o art.º 285.º do CT e ver a posição de entidade empregadora passar para a Ré Prestibel.
Concluímos assim que a entidade patronal do A. mantinha-se a Ré Securitas que nunca deixou de o ser".

Cumpre dizer que se concorda com a decisão recorrida, tendo em conta:
a) por um lado, o acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça (Sétima Secção), de 16-02-2023, no Processo C-675//21, publicado no Jornal Oficial da União Europeia de 11-4-02023, (também consultável em https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/PDF/?uri=CELEX:62021CA0675&from=EN),[6] com o seguinte dispositivo:
"1) A Directiva 2001/23/CE do Conselho, de 12 de Março de 2001, relativa à aproximação das legislações dos Estados-Membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas ou de estabelecimentos, ou de partes de empresas ou de estabelecimentos, deve ser interpretada no sentido de que:
a inexistência de vínculo contratual entre o cedente e o cessionário de uma empresa ou de um estabelecimento ou de uma parte de empresa ou de estabelecimento é irrelevante para a determinação da existência de uma transferência na acepção desta directiva.

2) O artigo 1.º, n.º 1, da Directiva 2001/23 deve ser interpretado no sentido de que:
não é susceptível de ser abrangida pelo âmbito de aplicação desta directiva uma situação em que uma empresa prestadora de serviços que, para as necessidades de um dos seus clientes, tinha afectado a este último uma equipa composta por um certo número de trabalhadores é substituída, por esse cliente, para prestar os mesmos serviços, por uma nova empresa prestadora e em que, por um lado, esta última assume apenas um número muito limitado dos trabalhadores que integravam essa equipa, sem que os trabalhadores reintegrados tenham competências e conhecimentos específicos indispensáveis para a prestação dos serviços ao referido cliente, e, por outro, não se verificou a transmissão para a nova prestadora de bens corpóreos ou incorpóreos necessários para a continuidade desses serviços";

b) por outro, que aquele aresto levou a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça mais recente a inflectir decisivamente no sentido propugnado na decisão recorrida. Assim:

II - Para que se verifique transmissão do estabelecimento para efeitos do disposto no artigo 285.º do CT, é essencial que o negócio ou actividade transmitida constitua uma unidade económica autónoma na esfera do transmitente.
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 08-03-2023, no processo n.º 1644/20.0T8BRR.L1.S1, publicado em http://www.dgsi.pt

I - Sendo a actividade de segurança privada uma actividade que repousa fundamentalmente sobre a mão de obra, inexiste transmissão de estabelecimento quando uma empresa deixa de prestar serviços de vigilância e segurança junto de determinado cliente, na sequência de adjudicação (por este) de tais serviços a outra empresa, sem que para esta tenha transitado daquela qualquer trabalhador ou quaisquer outros recursos, competências ou instrumentos organizatórios, susceptíveis de consubstanciar uma 'unidade económica'.
II - Para efeitos da transmissão de empresa ou estabelecimento regulada no artigo 285.º, do CT, apenas releva a 'unidade económica' que para o adquirente seja transferida por parte do transmitente.
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 13-09-2023, no processo n.º 1150/20.2T8EVR.E1.S1, publicado em http://www.dgsi.pt

III - Sendo a actividade de segurança privada uma actividade que repousa fundamentalmente sobre a mão de obra, inexiste transmissão de estabelecimento quando uma empresa deixa de prestar serviços de vigilância e segurança junto de determinado cliente, na sequência de adjudicação (por este) de tais serviços a outra empresa, sem que para esta tenha transitado daquela qualquer trabalhador ou quaisquer outros recursos, competências ou instrumentos organizatórios, susceptíveis de consubstanciar uma 'unidade económica'.
IV - Para efeitos da transmissão de empresa ou estabelecimento regulada no artigo 285.º, do CT, apenas releva a 'unidade económica' que para o adquirente seja transferida por parte do transmitente.
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 13-09-2023, no processo n.º 11821/21.0T8LSB.L1.S1, publicado em http://www.dgsi.pt

Em todo o caso, mesmo admitindo, sem conceder, uma leitura mitigada do acórdão do Tribunal de Justiça e, portanto, considerar a necessidade de relevar a transmissão indirecta de bens corpóreos para o transmissário do serviço, que efectivamente ocorreu no caso sub iudice como se vê do facto provado 34, a verdade é que por serem constitutivos do direito sempre competiria à apelante o ónus da prova de que seriam essenciais para a prestação do serviço e sobrelevariam aos demais elementos (art.º 342.º, n.º 1 do Código Civil) e isso não ocorreu no presente caso. Veja-se: a utilização dos sistemas de videovigilância e de alarmes (únicos com relevo específico para o caso) era apenas parte do modus operandi dos trabalhadores vigilantes e sequer se provou qual a sua dimensão e consequente relevância no conjunto das instalações do cliente a vigiar e, por conseguinte, do serviço a prestar;[7] nenhum trabalhador da apelante foi transferido para a apelada Prestibel,[8] mas alguns deles mantiveram-se na apelante e foram transferidos para outros estabelecimentos;[9] provou-se as necessidades de mão-de-obra da apelante para prestar o serviço contratado ao cliente, mas não as da apelada;[10] e, por fim, também se provou que a apelante não transmitiu o seu Know-how para a apelada,[11] com quem, de resto, não celebrou qualquer contrato ou negócio.[12]

Uma palavra final para dizer que a conclusão 34 da apelante se deverá a manifesto lapso uma vez que a medida da indemnização pretendida se mostra inaplicável na apelação dado que a mesma foi calculada nos termos do art.º 393.º (contrato a termo) e não do art.º 391.º, n.º 1, ambos do Código do Trabalho (contrato por tempo indeterminado).

E com isto se conclui pelo improvimento total da apelação e consequente confirmação da sentença recorrida.
***

III - Decisão.
Termos em que se acorda negar provimento à apelação e confirmar a sentença recorrida.
Custas pela apelante (art.º 527.º, n.os 1 e 2 do Código de Processo Civil e 6.º, n.º 2 do Regulamento das Custas Processuais e Tabela I-B a ele anexa).
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Lisboa, 11-10-2023.

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(Alves Duarte)

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(Albertina Pereira)

________________ (voto a decisão, com a declaração anexa)
(Francisca Mendes)


Entendo que da conjugação do art. 72.º, n.º 1 do CPT com o art. 662.º, n.º 2, c) do CPC resulta que é possível a anulação do julgamento no processo laboral, com vista à ampliação da matéria de facto, de forma a serem apurados factos essenciais, mesmo que não tenham sido articulados. No caso concreto considero que o facto que se pretendia aditar não assume, só por si, relevância. Considero ainda o sistema de videovigilância um elemento corpóreo relevante, mas face ao recente Ac. do TJUE de 16.02.2023 e à necessidade de o juiz nacional efectuar uma interpretação conforme ao direito da União Europeia.
Considero ainda o sistema de videovigilância um elemento corpóreo relevante, mas face ao recente Ac. do TJUE de 16.02.2023 e à necessidade de o juiz nacional efectuar uma interpretação conforme ao direito da União Europeia.
Voto a decisão.

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(Francisca Mendes)



[1]Patrocinado pelo Ministério Público. 
[2]Na alegação desta sugeriu o aditamento da matéria de facto, mas a verdade é que não recorreu subordinadamente ou ampliou a apelação da co-ré apelante SECURITAS pelo que essa pretensão não poderá ser considerada (coisa diferente é a eventual ampliação oficiosamente determinada, o que por ora não se perspectiva sequer seja o caso).
[3]Art.º 657.º, n.º 2 do Código de Processo Civil.
[4]Art.º 639.º, n.º 1 do Código de Processo Civil. A este propósito, Abrantes Geraldes, Recursos no Processo do Trabalho, Novo Regime, 2010, Almedina, páginas 64 e seguinte.
[5]Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 18-04-2018, no processo n.º 205/12.1TTGRD.C3.S1; no mesmo sentido, seguiram os acórdãos da Relação de Lisboa, 16-03-2016, no processo 37/13.0TBHRT.L1-4, da Relação do Porto, de 16-01-2017, no processo n.º 2311/14.9T8MAI.P1 e de 07-10-2019, no processo n.º 3633/17.2T8VFR.P1, da Relação de Évora, de 26-04-2018, no processo n.º 491/17.0T8EVR.E1, da Relação de Coimbra, de 28-04-2017, no processo n.º 2282/16.7T8LRA.C1 e, por fim, da Relação de Guimarães, de 05-03-2020, no processo n.º 1984/18.8T8BCL.G1, como aquele publicados em http://www.dgsi.pt.
[6]Na sequência de reenvio determinado pelo acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 15-09-2021, no processo n.º 445/19.2T8VLG.P1.S1, publicado em http://www.dgsi.pt.
[7]Facto provado n.º 33.
[8]Factos provados n.os 10, 11, 21 e 43.
[9]Facto provado n.º 43.
[10]Provou-se apenas que a apelante tinha cerca de 20 vigilantes adstritos a todos os hospitais (factos provados 29 e 33) e que a apelada Prestibel assumiu a obrigação com o cliente de "(…) recorrer a todos os meios humanos (…) que sejam necessários e adequados à prestação do serviço (…)" (facto provado 21).
[11]Provou-se apenas que no local onde a apelante prestava o serviço "não existe em permanência qualquer graduado" (facto provado 22), "o modo específico de execução das tarefas é determinado pelos graduados nas visitas que efectuam ao local" (facto provado 23) que substituem os trabalhadores faltosos (facto provado 24), e "estipulam o modo de prossecução do serviço" (facto provado 25), organizam as férias e os serviços (facto provado 26), que os trabalhadores da apelante usavam fardas, rádios transmissores/receptores e frequências próprios atribuídas pela autoridade competente para o efeito (factos provados 16 e 36), livros e papéis próprios (facto provado 37).
[12]Facto provado 38.