Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
7613/2007-2
Relator: VAZ GOMES
Descritores: ARRESTO
CADUCIDADE
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 02/14/2008
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: AGRAVO
Decisão: PROVIDO
Sumário: Não obstante alguma equivocidade que possa resultar de uma interpretação puramente literal do n.º 4 do art.º 389, parece-nos que, à semelhança do que sucede na regra geral sobre a caducidade constante do direito substantivo (n.º 1 do art.º 333 do CCiv), em matéria de direitos disponíveis, como é o caso dos autos, o levantamento da providência em consequência do decurso do prazo de 2 meses estabelecido no art.º 410, está dependente de alegação pela parte interessada, que é o requerido, do facto determinante, cabendo ao beneficiário da providência a prova do correspondente facto negativo.
(V:G.)
Decisão Texto Integral: Acordam os juízes na 2.ª secção (Cível) do Tribunal da Relação de Lisboa

Os Agravados requereram por averbamento ao processo principal, contra os agravantes em 31/07/2000 a presente providência cautelar de arresto das quotas que constituem o capital social da sociedade comercial D, Lda, matriculada sob o n.º da Conservatória do Registo Comercial da Amadora e todos os bens constantes da Relação de Bens junta como documento n.º 1 a fls. 9/11,; em suma alegam que entregaram aos requeridos a importância de PTE20.000.000,00 na data de assinatura do contrato-promessa de cedência de quotas a título de sinal e princípio de pagamento, tendo os requeridos garantido então a inexistência de passivo da Sociedades, razão que determinou os agravados a celebrara o referido contrato-promessa, só tendo tomado conhecimento da existência de um passivo de PTE 43379.107,00 em 24/07/2000 quando solicitarem uma certidão dos documentos arquivados no Cartório Notarial de M onde consta uma Adenda à Acta n.º  que os agravantes mantiveram secreta; embora notificados da resolução do contrato e para procederem à entrega da quantia que lhes entregaram os agravantes nunca o fizeram, tentando a todo o custo que os agravados adquirissem as quotas; os agravantes têm fundado receio da lesão grave do seu direito.

Aos 15/11/00 por ordem o Meritíssimo juiz da 13.ª Vara Cível de Lisboa onde os autos haviam sido distribuídos sob o n.º , foram remetidos para apensação ao processo n.º  que corre termos na 2.ª Vara, 2.ª secção do Tribunal da Comarca de Lisboa, onde aos 20/11/00 foram autuados sob o n.º .

Ordenada, realizou-se a inquirição das testemunhas arroladas pelos requerentes; fixados os factos provados foi proferida sentença aos 12/09/2000 que julgou procedente a providência com arrolamento dos referidos bens, cujo auto dos bens existentes na P datado de 28/12/2000 consta a fls. 161/166.
Datado de 26/02/2001 consta requerimento de oposição dos requeridos e agravantes onde, em suma, vieram dizer que em 15/11/99 celebraram com os requerentes um contrato-promessa de arrendamento com opção de compra, com vista à aquisição do imóvel e em 10/11/1999 os requerentes celebraram com ambos os requeridos um contrato-promessa de cessão de quotas tendente à aquisição pelos primeiros da totalidade das quotas da referida Sociedade D, Lda. que explorava e explora o comércio de pastelaria no imóvel em causa passando os requerentes a ocupar o mesmo em 15/11/99, nele passando a exercer a actividade de comércio de pastelaria, mantendo neste momento os requerentes a posse do mesmo, pelo que se não verifica o fundado receio de perda dos bens móveis arrestados. Marcado dia e hora para inquirição das testemunhas dos requeridos, foram fixados os factos, após o que se decidiu em 07/05/2001 (cfr. fls. 215/217), julgar improcedente a oposição e manter o arresto decretado, por se manter o fundado receio de perda da garantia patrimonial.

Houve trânsito em julgado da decisão.

Por requerimento dirigido ao processo n.º  em Março de 2007 (salvo erro porquanto a data do requerimento junto a fls. 225 não é completamente perceptível) o requerido J veio dizer que foi negado aos Autores o direito de retenção sobre o estabelecimento comercial, decisão essa transitada em julgado e que por força do disposto nas disposições conjugadas dos art.ºs 333 do CCiv e 410 do CPC se impõe que se julgue caducada oficiosamente a providência cautelar com ordem à depositária M para proceder à imediata entrega dos bens corpóreos da Sociedade terceira em relação ao processo, o que mereceu o despacho de 19/04/07 de fls. 223 no sentido do indeferimento em virtude de por sentença transitado em julgado ter sido reconhecida a existência do direito dos requerentes à quantia de PTE20.000.000,00.
Deste despacho agravou o requerido J.
Por requerimento de fls. 232 os agravados requerentes vieram informar: que interpuseram já execução da sentença contra os aqui agravantes e requeridos que corre termos sob o n.º no 3.º juízo, 2.ª secção dos Tribunais de Lisboa e que ainda propuseram contra o mesmo acção cível de incumprimento do contrato promessa de venda de imóvel que corre seus termos na 14.ª vara cível 3:º secção, Lisboa, com o n.º .

Admitido o agravo, o co-réu produziu alegações onde conclui:
A. A decisão ora submetida a juízo rescisório padece de erro de interpretação e aplicação do Direito ao caso concreto.
B. Por decisão do venerando Tribunal da Relação de Lisboa, no âmbito dos presentes autos e no que se referia à sentença proferida nos mesmos, os Autores, ora agravados, viram negado o peticionado direito de retenção sobre o estabelecimento comercial, conforme havia sido decidido em sede de Tribunal de 1.ª instância.
C. Assim e como resultado do douto acórdão do Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, transitado em julgado, cabia ao M.imo Juiz a quo, na sequência do requerimento apresentado pelo ora agravante, ter notificado os AA para procederem à entrega do estabelecimento comercial, revelando assim respeito pela decisão referida por este Venerando Tribunal, o que infelizmente não ocorreu.
D. O Mmo Juiz a quo cujo juízo rescisório ora se pugna vem a confundir o direito de retenção (entretanto julgado inexistente por este Venerando Tribunal), com a providência cautelar do arresto que havia sido decretada e que incidia sobre os bens móveis encontrados no estabelecimento comercial em causa.
E. A verdade é que, também, quanto a esta os AA não tinham qualquer legitimidade para reter os bens móveis (recheio do estabelecimento) e isto porque a mesma encontrava-se caducada!
F. No entanto e quanto ao despacho cujo juízo rescisório se pugna a questão em causa incide no facto de o Mma Juiz a quo ter invocado que dos autos não resultaram factos que integrassem a pretensão do ora agravante, leia-se, a requerida caducidade da providência cautelar do arresto, nos termos do disposto no art.º 410 do CPC.
G. Os AA, ora agravados, apesar de devidamente notificados do douto acórdão deste Venerando Tribunal, remeteram-se a uma atitude totalmente passiva, ou seja, não apresentaram a competente acção executiva para efeitos de cobrança dos créditos que se mostram reconhecidos.
H. Nos termos conjugados dos art.ºs 333 do CCiv e 410 do CPC impunha-se ao Mmº juiz a quo que julgasse caducada a providência cautelar decretada nos autos apensos e, em consequência, ordenasse a notificação da fiel depositária, M, para proceder à imediata entrega dos bens corpóreos pertencentes à sociedade – terceira em relação ao processo – que foram confiados àquela pelo Tribunal.
I. Ao não ter decidido desta forma, o tribunal a quo violou os supra citados dispositivos legais, vícios que ora se argúem para os devidos efeitos legais.
J. O despacho revidendo revela um total desrespeito pelos artigos 333 do Civ e 410 do CPC, na medida em que depois de volvidos dois meses sobre o trânsito em Julgado do Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, os AA, ora agravados não promovem a acção executiva competente, pelo que se impunha a declaração de caducidade da providência do arresto anteriormente decretada.
K. No despacho cujo juízo revidendo se pugna o M.mº juiz a quo omite totalmente o facto de a acção executiva não ter sido intentada, o que de per si se mostra como facto objectivo desencadeador da caducidade prevista no art.º 410 do CPC, que se impunha decretar.
L. Nestes termos impõe a V.ª Ex.ªs Venerandos Juízes Desembargadores, trazerem a luz do conhecimento aos presentes autos e em consequência revogarem o despacho revidendo, decretando a caducidade da providência cautelar do arresto, nos termos do disposto no art.º 410 do CPC e em consequência ser a fiel depositária notificada para procede à entrega dos bens arrestados, pertença de terceiros, alheios aos presentes autos.

Em contra-alegações os requerentes agravados em suma sustentam que não assiste razão aos agravantes quanto à entrega do imóvel, pois não foi objecto do processo principal, nem da providência cautelar em causa nem é proprietário do mesmo, não sendo sócio da sociedade comercial D, mas sim o co-requerido J a quem cedeu a sua quota na mencionada sociedade e não é proprietário do imóvel que vendeu a V, conforme documentos que junta; para além disso corre ano 3.º juízo de execução de Lisboa, 2.ª secção com o n.º 5575.0YYLSB da sentença condenatória já transitada em julgado correndo também na 14.ª Vara Cível de Lisboa, 3.ª secção com o n.º  contra o agravante e V por via do incumprimento do contrato-promessa de compra e venda do imóvel.

O Meritíssimo juiz do Tribunal recorrido manteve o despacho recorrido.

Recebido o recurso foram os autos aos vistos legais, nada obstando ao conhecimento do recurso.

Questão a resolver: saber se deve ser ordenado o levantamento da providência cautelar aqui decretada em virtude da sua caducidade, padecendo a decisão recorrida da violação do disposto nos art.ºs 333 do CCiv e 410 do CPC ao não a decretar.

II- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Esta documentalmente (documento autênticos) provado o seguinte:
1. Aos 7/05/2001 foi julgada improcedente a oposição deduzida pelos requeridos J e J A ao arresto das quotas e dos bens móveis indicados no art.º 16 do requerimento inicial, decretado aos 11/09/00, que se manteve e efectivado aos 28/12/2000 (cfr. fls.114/116 e 161/166 dos autos).
2. Em Março de 2007 (salvo erro como acima se disse) o requerido J dirigiu ao proc.º , da 2.ª vara 2.ª secção um requerimento com seguinte teor: “1.º Por decisão do Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, foi negado aos Autores o peticionado direito de retenção sobre o estabelecimento comercial, decisão essa já transitada em julgado e que deve ser cumprida e feita cumprir por Vossa Excelência. 2) Ou seja, nos termos conjugados do disposto no artigo 333 do Código Civil e artigo 410 do Código do Processo Civil, impõe-se que V.º Exa. Julgue oficiosamente caducada a providência cautelar decretada nos autos apensos e, em consequência, ordene a notificação da depositária, M para proceder à imediata entrega dos bens corpóreos pertencentes à sociedade – terceira em relação ao processo – que foram confiados àquela pelo Tribunal. 3.ª A não ser decidido desta forma, estará este Tribunal a violar princípios basilares do Direito, nomeadamente o princípio da Legalidade, sendo certo que as decisões dos Tribunais Superiores são para serem cumpridas pelos Tribunais Inferiores e por todos os destinatários, ainda que tenham alterado decisões anteriormente proferidas e, até mesmo, indo contra posições adoptadas. Termos em que Vossa Excelência deverá julgar caducada a providência cautelar e dando exequibilidade à decisão do Venerando Tribunal da Relação, ordenar que a depositária M restitua os bens corpóreos e o imóvel a quem de direito, assim s fazendo a Costumada Justiça. (…)”
3. Sobre esse requerimento incidiu o despacho de 19/04/07 de fls. 223/224 com o seguinte teor: “Foi a providência decretada nestes autos requerida para acautelar o direito de crédito dos requerentes à quantia de 20.000.000$00. Ora, por sentença transitada em julgado foi reconhecida a existência daquele mesmo direito. Nada teve a ver aquela providência decretada com o acautelar do direito de retenção. Assim, não resulta dos autos a ocorrência de factos que integrem a pretensão do R. J – ver art.º 389,1, e e) do CPC(…).
4. No dia 26/07/2000 foi averbada na 13.ª vara 1.ª secção (posteriormente, em 30/10/2001 dando entrada na 2.ª vara 2.ª secção) acção de processo ordinário a que coube o n.º de processo  em que são AA A e JA e RR J e J A onde o s AA pedem a condenação dos RR a ver resolvido o contrato processa de cedência de quotas celebrado entre as partes por culpa exclusiva dos RR devendo em consequência os RR ser condenados a restituir aos AA a quantia de Esc. 20.000.000$00 recebida a título de sinal e princípio de pagamento em suma alegando que as partes celebraram em 10/11/99 um contrato promessa de cedência de quotas de que os RR são titulares na Sociedade Comercial D Lda pelo valor de Esc. 35.000.000$00 tendo na data da assinatura do contrato sido paga a quantia de 20.000.000$00 pelos AA aos RR a título de sinal e princípio de pagamento, tendo na data da celebração do contrato sido garantido pelos RR que a sociedade não tinha nenhum passivo o que foi determinante para a celebração do contrato convencionando-se a escritura até 15/03/2000; a escritura não foi outorgada até àquela data sendo obrigação dos RR a de comunicar aos AA a data e o local da celebração da escritura o que não ocorreu, posteriormente por ordem do Tribunal de Família de Menores de Lisboa for arrolada a quota do R. J, tendo os AA vindo a saber de várias acções contra a sociedade.;houve contestação dos RR e dedução do pedido reconvencional com reconhecimento do direito de fazer sua a quantia de 20.000.000$00 recebida dos AA e que estes fossem condenados a pagar-lhes a quantia de Esc 585.000$00 a título de compensação pela exploração que estão  afazer do estabelecimento comercial desde 15/11/99 e até que cesse a exploração; os AA replicaram e posteriormente requereram a ampliação do pedido no sentido de os RR serem condenados a restituir-lhes a quantia de 40.000.000$00 bem como a restituição de 50% das rendas pagas por força da cl. 6.ª, n.º 2. do contrato promessa de arrendamento; na preliminar foi admitida parcialmente a ampliação do pedido quanto à restituição do dobro do 20.000.000$00 e indeferida quanto ao resto de que recorreu o R Jorge por sentença de 15/11/04 foi proferida sentença que reconheceu a validade da resolução do contrato-promessa de cedência de quotas e condenou os RR a pagarem aos AA a quantia de cento e noventa e nove mil, quinhentos e dezanove euros e dezasseis cêntimos e absolveu os AA do pedido reconvencional; por acórdão da Relação de Lisboa de 17/10/06 decidiu-se alterar a sentença condenando-se os RR a pagar aos AA  apenas a quantia de € 99.759,57 e revogara a sentença na parte em que reconhece aos AA  o direito de retenção, que transitou em julgado em 2/11/06 conforme certidão cópias certificadas de fls.368/431 que aqui se reproduzem na íntegra.
5. Correm pelo 3.º juízo 2.ª secção dos Juízos de Execução de Lisboa uns autos de execução sob o n.º  e com carimbo de entrada na Secretaria Geral das Execuções de Lisboa de 22/02/07 (cfr. fls. 435), em que são Exequentes A e J e executados J e J A cujo título executivo é a sentença proferida no processo , da 2.ª vara 2.ª secção Cível de Lisboa pelo valor de € 99.759,57 e que se encontra a aguardar que o solicitador de execução proceda à citação de J tendo a citação do executado JA ocorrido em 03/08/07; tem por apenso uns embargos de terceiro com o n.º A em que é embargante D Lda; na execução forma penhorados os bens móveis de fls. 487/ a 506 de que ficou fiel depositária a Snra. D. M sendo o local do depósito “ a sede da executada”, tudo conforme certidão e cópias certificadas de fls. 434/506 que aqui se reproduz na íntegra.
6. Aos 13/04/07 A e J propuseram contra J e V acção declarativa com processo ordinário que corre termos pela 14.ª vara 3.ª secção de Lisboa sob o n.º  e onde pedem que o Tribunal considere resolvido o contrato promessa de 15/11/99 entre AA e RR celebrado por culpa exclusiva destes se condene o 1.º R a pagara aos AA a quantia de € 12. 469,95 acrescida de juros legais desde a citação até integral pagamento e ainda condene solidariamente ambos os RR a pagarem ao A A a quantia de e 20.000,00 a título de danos patrimoniais e aos AA a quantia de € 35.000,00 a título de danos morais conforme certidão e cópias certificadas de fls. 352/363.

III- FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Matriz jurídica relevante para a apreciação da questão: Art.ºs 410, 389/1/a 2 do CPC[1] e 333 do CCiv.

Estatui o art.º 410: “O arresto fica sem efeito, não só nas situações previstas no art.º 389, as também no caso de, obtida na acção de cumprimento sentença com trânsito em julgado, o credor insatisfeito não promover execução dentro de dois meses subsequentes, ou se, promovida execução, o processo ficar sem andamento durante mais de trinta dias, por negligência do exequente.”

O art.º 389/1/a dispõe: “O procedimento cautelar extingue-se e, quando decretada, a providência caduca se o requerente não propuser a acção da qual a providência depende dentro de trinta dias, contados da data em que lhe tiver sido notificada a decisão que a tenha ordenado, sem prejuízo do disposto no número 2”.

O art.º 389/1/c dispõe: “O procedimento cautelar extingue-se e, quando decretada, a providência caduca se a acção vier a ser julgada improcedente, por decisão transitada em julgado.”

O art.º 389/1/e dispõe: “ O procedimento cautelar extingue-se e, quando decretada, a providência caduca se o direito que o requerente pretende acautelar se tiver extinguido”.

O art.º 389/2 dispõe: “Se o requerido não tiver sido ouvido antes do decretamento da providência, o prazo para a propositura da acção de que aquela depende é de 10 dias, contados desde a notificação ao requerente de que foi efectuada ao requerido a notificação prevista no n.º 5 do art.º 385.”

O art.º 333/1 do CCiv dispõe: “A caducidade é apreciada oficiosamente pelo tribunal e pode ser alegada em qualquer fase do processo, se for estabelecida em matéria excluída da disponibilidade das partes.”

A primeira questão que urge apreciar é a de saber se a caducidade da medida do arresto a que se refere o art.º 410 tem alguma coisa a ver com a caducidade dos art.ºs 328 e ss do CCiv.

Os art.ºs 328 e ss do CCiv inserem-se no Capítulo III intitulado “O Tempo e a sua Repercussão nas Relações Jurídicas” do Subtítulo III intitulado “Os factos Jurídicos” do Título II “As Relações Jurídicas” do Livro I do Código Civil. A caducidade aí referida transporta efeitos extintivos de um direito como simples consequência do decurso do prazo fixado pela lei ou pelas partes para o seu exercício; em sede de providências cautelares, o decurso os prazo para a instauração da acção ou a paralisação da instância principal determinam, tão só, a extinção dos efeitos jurídicos emergentes de uma decisão cautelar, a par da extinção da própria relação jurídica procedimental[2].

O arresto tal como qualquer outro procedimento cautelar é sempre dependência da causa que tenha por fundamento o direito acautelado (cfr. art.º 383/1); daí que a falta de propositura da acção da qual a providência depende dentro de certo prazo acarrete a extinção do procedimento cautelar e a caducidade da providência nele concretamente decretada (cfr. art.º 389).[3]

O art.º 410 tal como art.º 389/1/a, contém em si não uma verdadeira obrigação, antes um ónus, decorrente da natureza não autónoma e instrumental do arresto, que recai sobre o interessado e que se traduz na necessidade de promover a instauração da acção executiva dentro do prazo de dois meses a contar do trânsito em julgado da sentença declarativa, sob pena de suportar na sua esfera jurídica as consequências extintivas aí previstas; é um mecanismo que impele o requerente e beneficiário da providência a ser diligente na defesa, accionando os meios comuns para a tutela definitiva do seu direito obtida apenas a título provisório no procedimento e, por isso, carecido de melhor confirmação veiculada pelos meios comuns de natureza declarativa ou executiva.[4]

O despacho sob recurso analisou a questão sob o ponto de vista da acção declarativa e sobre a questão do direito de retenção analisado na mesma concluindo que se não verificam as situações das alíneas c) e e) do n.º 1 do art.º 389 ou sejam improcedência da acção por decisão transitada em julgado e extinção do direito que a cautelar pretendia salvaguardar e, é claro, sob essa perspectiva o despacho está absolutamente correcto nem os recorrentes lhe assacam qualquer erro nessa perspectiva. Não analisou o despacho recorrido a questão sob o ponto de vista do art.º 410, disposição expressamente citada e que não foi abordada no despacho, tendo no mesmo despacho sido ordenada a notificação dos requerentes da providência para esclarecer se entretanto já teriam intentado a execução, data da entrada e sua identificação. No recurso não está em causa a propositura da acção declarativa de que o arresto foi instrumental, antes a propositura da subsequente acção executiva de que, também, o arresto é instrumental, uma vez que é vocação do arresto o da sua conversão em penhora na execução. Mas essa causa de caducidade não foi abordada no despacho recorrido e implicitamente se relegou para momento posterior o seu conhecimento. Resta saber se ocorre erro de julgamento da decisão recorrida quanto à não verificação da caducidade, na perspectiva do recorrente e se tal pode ser apreciado.

Não obstante alguma equivocidade que possa resultar de uma interpretação puramente literal do n.º 4 do art.º 389, parece-nos que, à semelhança do que sucede na regra geral sobre a caducidade constante do direito substantivo (n.º 1 do art.º 333 do CCiv), em matéria de direitos disponíveis, como é o caso dos autos, o levantamento da providência em consequência do decurso do prazo de 2 meses estabelecido no art.º 410, está dependente de alegação pela parte interessada, que é o requerido, do facto determinante, cabendo ao beneficiário da providência a prova do correspondente facto negativo.[5]

Ora dos elementos documentais, embora de forma deficiente, a caducidade, sob essa perspectiva, está levantada, mas o que foi decidido nada tem a ver com a caducidade da providência com o fundamento no art.º 410 do CPC. Aliás, o despacho recorrido de 19/04/07 relegou implicitamente, como se disse, para momento posterior, ou seja para momento em que fossem juntas as certidões relativas ao processo executivo a decisão sobre essa questão concreta de caducidade.

Tendo sido pedida a declaração de caducidade da providência pelo requerido Jorge Campilho Ferreira, que é parte na providência, tanto basta para aferir da legitimidade processual para o requerimento de caducidade e subsequente levantamento da mesma, assim improcedendo o argumento dos requerentes em contra alegações; vem pedida a restituição dos bens corpóreos e do imóvel (cfr. fls. 226) e é óbvio que esta última parte do pedido nunca poderia ser atendida na medida em que no arresto que foi decretado a fls. 116 apenas se contemplaram os bens móveis constantes da relação de fls. 9/11 e concretizada a fls. 161/166 v.º e bem assim como das quotas sociais da Sociedade Comercial Doce Recanto concretizada a fls. 125 e registada a título provisório aos21/09/2000 conforme apresentação 6 da certidão de matrícula de fls. 469.

Acontece que o despacho recorrido não abordou a questão da caducidade sob a perspectiva do recorrente como abundantemente se referiu e os Tribunais de recurso não conhecem de questões novas salvo as que a lei lhes impõe o conhecimento oficioso e no caso concreto não sendo de conhecimento oficioso a questão em apreço, não tendo essa específica causa de caducidade sido apreciada não põe o Tribunal sobre ela conhecer.

IV- DECISÃO

Tudo visto acordam os juízes em julgar improcedente o agravo por não padecer de qualquer erro a decisão sob recurso relativamente à matéria de caducidade expressamente decidida, decisão que se confirma; não se conhece da questão nova suscitada no recurso e não apreciada no despacho sob recurso.
Custas pelos agravados

Lxa. 14/02/08

João Miguel Mourão Vaz Gomes

Jorge Manuel Leitão Leal

Nelson Borges Carneiro

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[1] Pertencem ao Código de Processo Civil todas as disposições legais que forem mencionadas sem indicação de origem.
[2] António S. Abrantes Geraldes , Temas da Reforma do Processo Civil, 2.ª edição, III volume págs. 270/271.
[3] São realidade distintas como assinala Abrantes Geraldes obra e local citados, a extinção do procedimento que tem a ver com a relação jurídico-processual enquanto complexo de actos interligados entre si e obedecendo a ordem sequencial, e a caducidade que respeita à medida concretamente decretada no procedimento.
[4] Autor e obra citadas, págs. 271/272; ver as citações aí feitas de Alberto dos Reis no sue CPC Anotado, vol. I, pág. 629, Rodrigues Bastos, Código de Processo Civil Anotado, vol. I, 3.ª edição, pág. 171
[5] Autor e obra citados, pág. 287 em relação ao prazo de 30 dias da alínea a) do n.º 1 do art.º 389 do CCiv em conjugação com o n.º 4 do mesmo preceito cuja interpretação se não deve cingir ao elemento literal indo mais longe e devendo conjugar-se com os elementos racional e teleológico: é que tal como acontece no caso dos autos a acção foi proposta num tribunal diferente do do procedimento, o que exclui desde logo o conhecimento oficioso da acção correspondente, o que também já resultava do anterior art.º 383/2.