Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
974/13.1TXLSB-G.L1-3
Relator: A. AUGUSTO LOURENÇO
Descritores: ANTECIPAÇÃO EXECUÇÃO PENA ACESSÓRIA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 01/11/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NÃO PROVIDO
Sumário: 1.A execução da pena acessória nos termos do nº 1 do artº 188º-A do código de processo penal é automática e não carece de qualquer audição prévia do condenado.
2.A audição prevista no artº 188º-B do código de processo penal, reporta-se aos casos em que o juiz a requerimento ou oficiosamente pode decidir-se pela antecipação da execução da pena acessória, devendo nestes casos proceder às diligências referidas.
(Sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam, em Conferência, os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa.


RELATÓRIO:


No âmbito do processo nº 974/13.1TXLSB-G, a correr termos Tribunal de Execução de Penas de Lisboa, por decisão de 27/09/2016 foi ordenada a execução da pena acessória de expulsão do território nacional de J… C… F…, tendo o Tribunal decidido nos seguintes termos:

-«Em face de todo o exposto, ordeno a execução da pena acessória de expulsão do território nacional de J… C… F… a partir de 04 de Novembro de 2016.
-Cumpra-se o disposto no nº 1 e 2 do art. 188º C do CEPMPL
-Comunique a presente decisão ao serviço de estrangeiros e fronteiras (SEF) e ao tribunal da condenação,
-Após trânsito, emita os mandados de libertação, que devem ser cumpridos com referência à data sobre mencionada, a não ser que interesse a prisão do condenado à ordem de outros autos,
-Quando forem emitidos os mandados, comunique tal facto ao SEF».
*

Inconformado com a decisão, interpôs o condenado, J… C… F… recurso da mesma, (fls. 221 a 231, tendo apresentado a respectiva motivação e concluído:

«1.Não obstante o respeito que as, decisões judiciais, sempre e em qualquer circunstância merecem, vem o presente recurso interposto da douta decisão proferida a fls. dos autos, por não se conformar o Arguido/Recorrente com a mesma, e que ordenou a execução da pena acessória de expulsão do território nacional a partir de 4 de Novembro de 2016.
2.Foi o ora recorrente notificado da decisão de execução da pena acessória de expulsão, nos termos do disposto no art. 188-A, nº 1 al. b) sem que tivesse sido dado cumprimento ao disposto nos números 1 a 5 do art. 188º-B do CEPMPL - que impõem a audição de arguido e seu defensor, bem como a documentação da diligência, e redução a escrito do dispositivo.
3.Acresce que, sem que sequer se aguardasse pelo trânsito da decisão foram feitas as comunicações a que alude o nº 2 do art. 188º-C CEPMPL, em violação da referida disposição legal e motivo pelo qual não poderá, salvo o devido respeito por melhor opinião, a decisão ora posta em crise proceder.
4.Ora, o Código de Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade trata, nos seus Artigos 188-A a 188-C da Execução da Pena Acessória de Expulsão.
5.E nos termos da al. b) do nº 1 do art. 188º-A, tendo sido aplicada pena acessória de expulsão o juiz ordena a sua execução logo que hajam decorrido dois terços da pena.
6.Sucede, que a referida ordem de execução dependerá sempre do procedimento regido pelos arts. 188º-A, 188º-B e 188º-C, o que in casu não se verificou.
7.Decorrendo do referido nº 3 que deve oficiosamente; ou a requerimento do Ministério Público ou do Arguido ser solicitado parecer fundamentado ao director do estabelecimento.
8.Na verdade, apenas tal parecer permitirá despoletar o processo de Execução da Pena Acessória de Expulsão, e que não ocorre apenas nas situações em que se requer tal execução em momento anterior.
9.Sendo clara a inserção sistemática dó referido nº 3, que impõe ao Juiz a solicitação de parecer, tendo em vista a Execução da Medida de Expulsão.
10.Apenas tal processo poderá permitir uma justa execução da pena acessória e que, de outra forma, poderá por em causa os direitos do Arguido,
11.Ora, na situação sub judice, não foi ordenada a notificação de defensor para a audição do condenado, nem foi nomeado defensor para estar presente na referida audição, o que viola o disposto no nº 1 do art. 188-B e configura a nulidade insanável prevista na al. c) do art. 119º cód. procº penal aplicável ex vi do art. 154º CEPMPL.
12.Acresce que, não se encontra documentado o registo informático dos presentes Autos a acta relativa à diligência a que aludem os referidos nº 1 e 5 do CEPMPL.
13.Verifica-se igualmente que em violação do disposto no art. 188º-C, é ordenada a notificação das entidades a que alude o nº 2 e que impõe que apenas ocorra apôs trânsito.
14.O que prejudica, e não pode deixar de prejudicar o ora Recorrente por considerar o Tribunal de Execução de penas a sua decisão irrecorrível,
15.Acresce que, in casu, estamos na presença de existência de situação prevista na Lei como Limite à Expulsão, uma vez que, nos termos do disposto no art. 135º da Lei 23/2007 o ora Recorrente tem a seu cargo filho menor nacional.
16.Por outro lado, encontra-se pendente recurso de revisão da sentença que decretou a pena acessória de expulsão que o Tribunal de Execução de Penas mandou executar.
17.Efectivamente, em caso de procedência do recurso cuja entrada foi dada por se terem descoberto novos documentos de prova, a pena acessória de expulsão poderá vir a ser anulada ou substituída por outra que não implique a separação do ora Recorrente e da sua Família, pelo que deverá o Tribunal de Execução de Penal conhecer deste pedido e que igualmente deu entrada nesta data.
18.Sucede que no Acórdão que condenou o Arguido J… C… F… é desconsiderada a limitação legal à expulsão referida na Lei 23/2007 no seu art. 135º bem como a existência de título de residência válido, de que o arguido era titular quer à data da prática dos factos, quer ao direito de residência permanente que viria a ser titular em 2007/8.
19.Tais factos fundamentaram, tal como consta do Acórdão posto em crise, a condenação a título acessório dá pena de expulsão e que, a serem conhecidos do Tribunal impediriam que tal pena fosse decretada.
20.Assim, e porque a procedência do referido recurso poderá por em crise a medida de expulsão, deverá o Tribunal de Execução de Penas suspender, de igual forma, a execução da referida medida.
21.Ao decidir pela execução da pena acessória de expulsão do arguido nos termos em que o fez, a Mmª Juiz a quo, violou o disposto nos artigos art. 32º nº 1 da CRP, nos artigos 188º-A, 188º-B e 188º-C do CEPMPL e al. c) do art. 119º CPP e art. 135º da Lei 23/2007 de 4 de Julho de 2007.
Face à matéria ora alegada deverá ser declarada a nulidade insanável prevista a al. c) do art. 119º cód. procº penal, ordenando-se a repetição da audição do recluso ou, caso assim não se entenda, deverá ser decretada a suspensão da execução da pena de expulsão ora posta em crise tendo em conta o recurso de revisão que, procedendo, permitirá ao ora Recorrente reunir-se com a sua Família, logo que cumprida a pena a que foi condenado Justiça».
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O Ministério Público, em 1ª instância, respondeu ao recorrente nos termos de fls. 249 a 263, pugnando pela improcedência do recurso e concluindo nos seguintes termos:

«1.A decisão de 26-09-2016 ordenou a execução da pena acessória de expulsão do recorrente, a partir de 4 de novembro de 2016, data em que atingia os dois terços da pena principal de 9 anos de prisão que cumpre.
2.A execução da pena acessória de expulsão obedece ao regime específico previsto no artº 188-A do código de execução das penas e medidas privativas da liberdade, que comporta dois procedimentos.
3.O primeiro procedimento, aplicável às situações em que se determina a execução no marco fixado no nº 1 do artº 188º A do CEPMPL, consiste tão só na prolação de decisão determinando a execução da pena acessória a partir do marco alcançado, não prevendo a leia audição do recluso, pois a decisão não depende do seu consentimento, sendo consequência automática da condenação transitada em julgado cuja pena principal está em cumprimento.
4.O segundo procedimento, previsto no artº 188º-A, nº 2 e 3 e no artº 188º-B, do CEPMPL, reporta-se aos casos em que se pretende antecipar o marco legalmente fixado para a expulsão automática, ou seja por mero efeito da condenação.
5.Tratando-se da execução de uma pena principal de prisão que tem pena acessória de expulsão a lei fixa, com referência aos marcos do cumprimento da pena principal (meio ou dois terços), o momento a partir do qual, obrigatória e automaticamente, o tribunal de execução das penas ordena a expulsão.
6.lei possibilita a antecipação da execução da pena acessória de expulsão, mediante proposta do diretor do estabelecimento prisional que deve emitir parecer fundamentado e, mesmo não havendo proposta do diretor, pode o procedimento ser desencadeado, quer oficiosamente quer por iniciativa do Ministério Público ou do próprio condenado, pedindo o tribunal, nestes casos, o parecer fundamentado do diretor.
7.No caso de antecipação, exigem-se requisitos semelhantes àqueles para a concessão da liberdade condicional ao meio da pena, dai a necessidade do parecer fundamentado, sendo igualmente necessário que o recluso seja ouvido e que preste consentimento para a execução antecipada da pena assessória de expulsão.
8.A situação do recorrente não é de antecipação mas sim de execução automática e obrigatória da pena acessória de expulsão por já ter atingido o marco legalmente fixado, concretamente os dois terços da pena, restando apenas ordenar a sua execução, sem demais formalismos, nomeadamente a audição do recluso.
9.Tal formalidade não está legalmente prevista nem se justifica porque não se coloca a questão de a expulsão não se concretizar pois a decisão condenatória que a aplicou está transitada em julgado, razão pela qual a sua concretização não carece de ponderação pelo tribunal nem de consentimento do recluso.
10.A questão da não execução da pena acessória por estar pendente recurso de revisão da decisão condenatória ultrapassa os limites da competência do tribunal da execução das penas e medidas privativas da liberdade, que deve reportar-se apenas à pena a executar, sempre transitada em julgado.
11.Enquanto não for comunicada revogação ou alteração, o TEP tem que executar a decisão tal qual lhe foi comunicada pelo tribunal da condenação.
12.A expulsão aqui ordenada, porque o presente recurso suspende o seu efeito, não se concretizará enquanto não houver trânsito em julgado da decisão que ordenou a sua execução.
13.O facto de ter sido interposto recurso de revisão, ao que parece na mesma data em que se recorreu da decisão do TEP, não tem qualquer efeito sobre a ordem de expulsão dada pelo TEP, salvo se, entretanto e em tempo útil, a revisão for deferida e vier a ser proferida decisão que revogue a pena acessória de expulsão, antes da sua concretização.
14.A comunicação da decisão que ordenou a execução da expulsão antes do trânsito em julgado não prejudica o recorrente porquanto, por si só, não leva à execução da ordem, não estando emitidos mandados de entrega ao SEF, os quais só serão emitidos após o trânsito, aliás como as comunicações nos termos do artº 188º-C, nº 2, conforme ordenado na parte final do despacho recorrido.
15.O tribunal fez correcta interpretação e aplicação do direito, mormente, do artº 188º-A, nº 1 do CEP.
16.Pelo exposto, a decisão que ordenou a execução da expulsão do território nacional não violou qualquer disposição legal e, não sendo comunicada a revogação da decisão condenatória a que se reporta ou a suspensão dos seus efeitos deve ser mantida nos seus precisos termos.
Contudo V. Exªs, decidindo, farão, como sempre Justiça».
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Neste Tribunal o Exmº Procuradora-Geral Adjunto, não emitiu qualquer parecer, limitando-se à aposição do “visto” nos termos do artº 416º nº 1 do cód. procº penal, (cfr. fls. 270). 
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O recurso foi tempestivo, legítimo e correctamente admitido.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.
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FUNDAMENTOS.

O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões, extraídas pelo recorrente da respectiva motivação[1], que, no caso "sub judice", se circunscreve à apreciação dos pressupostos consignados no artº 188º-A do cód. de execução de penas, que define os critérios de execução da pena acessória de expulsão.
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DECISÃO RECORRIDA.

«I.RELATÓRIO.
Identificação do recluso: J… C… F…
Objeto do processo: execução da pena acessória de expulsão, com referência ao marco dos 2/3 da pena (art. 188º-A nº 1 do código da execução das penas e medidas privativas da liberdade, de ora em diante designado CEPMPL).

II.FUNDAMENTAÇÃO.

A)De facto.
i)Factos mais relevantes:
1.Circunstâncias do caso; o recluso foi condenado no processo nº 543/02.1PLLSB da 6ª vara criminal de Lisboa na pena de 9 anos de prisão e na pena acessória de expulsão do território nacional pelo período de 10 anos, pela prática de um crime de homicídio qualificado.
2.Marcos de cumprimento da pena: termo inicial em 06/0512013 (assinalando-se, ainda, 2 anos, 6 meses e 2 dias de desconto, dois terços em 04/11/2016 e termo em 04/11/2019.

ii)Motivação da matéria de facto:
A convicção do tribunal no que respeita a matéria de facto resultou da decisão condenatória junta aos autos, da ficha biográfica do recluso e do seu certificado de registo criminal.
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B)De direito.
De acordo com o disposto no art. 188º-A nº 1 al, b) do CEPMPL nos casos de condenação em pena superior a 5 anos, tendo sido aplicada pena acessória de expulsão, o juiz ordena a execução desta logo que se mostrem cumpridos dois terços da pena.
In casu alcançar-se-ão, em 04 de novembro de 2016, os aludidos requisitos; já que em tal data o recluso, que se mostra condenado em pena de prisão de 9 anos, terá atingido o cumprimento de dois terços da pena, sendo certo que fora condenado também na pena de expulsão.
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III-DECISÃO.
Em face de todo o exposto, ordeno a execução da pena acessória de expulsão do território nacional de J… C… F… a partir de 04 de novembro de 2016.
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Cumpra-se o disposto nos nº 1 e 2 do art, 188º-C do CEPMPL.

Comunique a presente decisão ao serviço de estrangeiros e fronteiras (SEF) e ao tribunal da condenação.
Após trânsito, emita os mandados de libertação, que devem ser cumpridos com referência à data sobremencionada, a não ser que interesse a prisão do condenado à ordem de outros autos.
Quando forem emitidos os mandados, comunique tal facto ao SEF».
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DO DIREITO.

Analisado o presente recurso, importa apenas verificar se, em face da factualidade julgada relevante é de concluir pela legalidade do despacho que ordenou a execução da pena acessória de expulsão aplicada ao recorrente, ou se estamos perante a invocada nulidade prevista no artº 119 al. c) do cód. procº penal conforme defende o recorrente, por falta de audição prévia do mesmo e do seu defensor.

Questão prévia.

Decorre da documentação apresentada e do teor da motivação de recurso que o recorrente, perante a decisão acima transcrita, que ordenou a execução da pena acessória de expulsão do condenado e ora recorrente, interpôs simultaneamente dois recursos, este, impugnando a decisão por alegada falta de audição do mesmo e outro pedindo a revisão de sentença condenatória, há muito transitada em julgado, por verificação de alegados factos novos entretanto surgidos.  

Independentemente do que vier a ser decidido no recurso de revisão, que não nos compete a nós conhecer e cuja tramitação e fase processual desconhecemos, a nossa apreciação cinge-se apenas à legalidade do despacho recorrido que ordenou a execução da pena acessória de expulsão, no sentido de saber se existe ou não obrigatoriedade de audição do recluso para efeitos de execução da pena acessória de expulsão do território nacional, e o efeito nessa decisão da pendência do recurso de revisão da decisão que aplicou a expulsão, concretamente se suspende a execução da pena acessória.

Com efeito, o recorrente J… C… F…, foi condenado no processo nº 543/02.1PLLSB da 6ª Vara Criminal de Lisboa na pena de 9 anos de prisão e na pena acessória de expulsão do território nacional pelo período de 10 anos, como cúmplice da prática de um crime de homicídio qualificado.

De acordo com os dados do traslado remetido a este Tribunal o recorrente iniciou o cumprimento da pena em 06/05/2013, (havendo a descontar 2 anos, 6 meses e 2 dias, já cumpridos preventivamente). Os dois terços da pena ocorreram em 04/11/2016 e o termo desta ocorrerá em 04/11/2019.

Perante esta factualidade e o disposto no artº 188º - A do CEMPL, o Tribunal de Execução de Penas, oficiosamente determinou a execução da pena acessória de expulsão na data em que o condenado perfez os dois terços de cumprimento da pena a que foi condenado.

O recorrente invoca a nulidade da decisão com base na não audição prévia do mesmo e da reapreciação das suas condições de vida, para além de alegar “erro de julgamento” na condenação que o levou a pedir a revisão de sentença.

Com efeito, diz-nos o artº 188º-A do CEPMPL:

«1.Tendo sido aplicada pena acessória de expulsão, o juiz ordena a sua execução logo que:
a)Cumprida metade da pena, nos casos de condenação em pena igual ou inferior a 5 anos de prisão, ou, em caso de execução sucessiva de penas, logo que se encontre cumprida metade das penas;
b)Cumpridos dois terços da pena, nos casos de condenação em pena superior a 5 anos de prisão, ou, em caso de execução sucessiva de penas, logo que se encontrem cumpridos dois terços das penas.

2.O juiz pode, sob proposta e parecer fundamentado do diretor do estabelecimento prisional, e obtida a concordância do condenado, decidir a antecipação da execução da pena acessória de expulsão, logo que:
a)Cumprido um terço da pena, nos casos de condenação em pena igual ou inferior a 5 anos de prisão, ou, em caso de execução sucessiva de penas, logo que se encontre cumprido um terço das penas;
b)Cumprida metade da pena, nos casos de condenação em pena superior a 5 anos de prisão, ou, em caso de execução sucessiva de penas, logo que se encontre cumprida metade das penas.

3.Independentemente de iniciativa do diretor do estabelecimento prisional, o juiz, oficiosamente ou a requerimento do Ministério Público ou do condenado, solicita o parecer fundamentado ao diretor do estabelecimento».
O recorrente invoca a falta de cumprimento do disposto no artº 188º-B nº 1 a 5 do CEPMPL, que no seu entender impõe a audição do condenado e do seu defensor antes de decidir a execução de tal pena.
Apreciadas as normas em causa, (artº 188º-A e 188º-B ambos do CEPMPL) cremos que a interpretação feita pelo recorrente não é a melhor e baseia-se em deficiente leitura da sistemática e enquadramento normativos.  
Na verdade, desde 08.10.12, data da entrada em vigor da nova redacção conferida ao art. 151º, 4 da Lei nº 23/2007, pela Lei nº 29/2012, que revogou tacitamente o art. 182º, 1, do CEPMS, a execução da pena de expulsão do território nacional passou a ser de aplicação automática logo que o recluso atinja o meio da pena, desde que a condenação na pena principal não seja superior a 5 anos de prisão ou dois terços quando seja superior. Apenas nestes casos a pena de expulsão é executada sem necessidade de avaliação e dos pareceres próprios à concessão da liberdade condicional[2].

Ao contrário do que sucedia no âmbito do regime legal anterior, em que a antecipação da pena acessória de expulsão do território nacional só podia ser equacionada e considerada, caso tivesse cumprido metade da pena e reunisse os pressupostos e requisitos para poder beneficiar da liberdade condicional (cfr. Ac. Trib. Rel. Lisboa de 6-2-2008, Proc. nº 768/2008-3, em www.dgsi.pt), actualmente, apenas importa a verificação daquele primeiro requisito e a condenação numa pena principal não superior a 5 anos de prisão ou de dois terços caso seja superior a 5 anos, para que aquela pena de expulsão seja executada, sem necessidade de aquilatar dos restantes pressupostos necessários à concessão da liberdade condicional.

A Lei nº 21/2013 de 21.02 veio introduzir alterações ao CEPMPL (Código de Execução de Penas e Medidas Privativas da Liberdade) aprovado pela Lei nº 115/2009 de 12.10, permitindo a antecipação da execução da pena acessória de expulsão aplicada a condenados a penas de prisão, verificado determinado circunstancialismo.

A execução da pena acessória nos termos do nº 1 do artº 188º-A citado é automática e não carece de qualquer audição prévia do condenado. A audição prevista no artº 188º-B, reporta-se aos casos em que o juiz a requerimento ou oficiosamente pode decidir-se pela antecipação da execução da pena acessória, devendo nestes casos proceder às diligências referidas.

Ora no caso concreto, não está em causa a antecipação da execução da pena de expulsão, mas sim o cumprimento do disposto no nº 1 do artº 188º-A do CEPMPL, por decurso do prazo aí estipulado, nele não se prevendo a realização de quaisquer diligências prévias.

Aliás, não podemos deixar de estranhar que o recorrente, que alega a existência de factos impeditivos da expulsão, já existentes à data dos factos e da sentença condenatória, (segundo diz) nunca os tivesse invocado em sede de julgamento, nem em sede de recurso e apenas agora, perante a iminência de execução de tal pena venha invocá-los e pedido a revisão de sentença. 

A razão desta alteração prende-se com uma nova filosofia do legislador que no fundo acaba por ser (em termos genéricos e não concretos ou específicos deste caso) mais benéfica, dado que ao executar a expulsão cumpridos os períodos legalmente determinados o condenado fica livre no seu país de origem porque a pena principal é declarada extinta, passando a vigorar a pena acessória que determina a impossibilidade de entrada e permanência em território português, pelo período fixado na condenação acessória.

Com a revogação da norma que possibilitava aos reclusos com pena acessória de expulsão, a substituição da liberdade condicional, criou o legislador um regime específico, uma vez verificados os pressupostos nos termos do artº 61º do cód. penal, pela antecipação da execução da pena acessória de expulsão, prevendo inclusive a antecipação (cfr. artº 188º-A, 188º-B e 188º-C todos do CEPMPL), sendo certo que apenas nestes casos se impõe a audição do recluso e do seu defensor, para além de se poderem pedir pareceres ou a realização de outras diligências.
   
Mas este não foi o caso da decisão recorrida, uma vez que esta se fundamentou no nº 1 do artº 188º-A do CEPMPL que exige apenas o decurso do cumprimento de dois terços da pena.

Inexiste por isso qualquer ilegalidade no despacho recorrido, que se limitou a fazer uma interpretação clara da lei. Nestes casos, a lei não impõe a audição do recluso, até porque a decisão não depende do seu consentimento, é uma consequência automática da condenação transitada em julgado cuja pena principal está em cumprimento.

A previsão do artº 188º-B do CEPMPL vem na sequência do disposto no nº 3 do artigo anterior que refere expressamente:
-“Independentemente de iniciativa do diretor do estabelecimento prisional, o juiz, oficiosamente ou a requerimento do Ministério Público ou do condenado, solicita o parecer fundamentado ao diretor do estabelecimento» e se limita a regular o procedimento a observar nos casos de antecipação, determinando, nomeadamente, que, “recebida a proposta ou parecer do diretor do estabelecimento prisional, o juiz designa data para audição do condenado, em que devem estar presentes o defensor e o Ministério Público".

Só que, este procedimento não é, como já referimos, aplicável ao caso do recorrente, já que não estamos perante nenhuma antecipação da execução da pena de expulsão, mas sim de uma execução automática e obrigatória da pena acessória de expulsão por já ter atingido o tempo de cumprimento legalmente lixado.

A decisão condenatória que a aplicou está transitada em julgado razão pela qual a sua concretização não carece de ponderação pelo tribunal nem de consentimento do recluso.

É certo que o recorrente interpôs simultaneamente recurso de revisão de sentença, mas tal não obsta ao reconhecimento da legalidade do despacho recorrido nem prejudica o recorrente, dado que ela só deverá agora ser executada após a decisão sobre o pedido de revisão, atento o efeito suspensivo fixado.

O tribunal recorrido, limitou-se a dar cumprimento ao estipulado na norma citada e ao disposto no artº 138º nº 4 al. e) do CEPMPL, que refere expressamente que “compete aos tribunais de execução das penas, em razão da matéria: determinar a execução da pena acessória de expulsão, declarando extinta a pena de prisão”.

Em face do exposto, concluímos que a decisão recorrida, fixando a data para a execução da pena acessória aos dois terços do cumprimento da pena principal e, subsequentemente, o despacho a ordenar a sua execução, a partir de 04.11.2016, e a consequente emissão de mandados de entrega ao Serviços de Estrangeiros e Fronteiras, após trânsito em julgado, para concretizar a expulsão, foi proferida com observância da lei aplicável ao caso concreto, sendo o recurso manifestamente infundado.

Quanto à questão da não execução da pena acessória por estar pendente recurso de revisão da decisão condenatória, a mesma ultrapassa os limites da competência do Tribunal da Execução das Penas que deve reportar-se apenas à pena a executar, sempre transitada em julgado, salvo se, entretanto e em tempo útil, a revisão for deferida e vier a ser proferida decisão que revogue a pena acessória de expulsão, antes da sua concretização. Enquanto não for comunicada revogação ou alteração, o TEP deve executar a decisão tal como lhe foi comunicada pelo Tribunal da condenação.

Por uma questão prática e de segurança jurídica, dever-se-á aguardar pelo desfecho do pedido de revisão de sentença, ainda que o recurso interposto (perante os elementos que dispomos) nos pareça um acto meramente dilatório.

Em face do exposto, concluímos não merecer reparo a decisão recorrida ao determinar a execução da pena acessória de expulsão do arguido J… C… F…  
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DECISÃO:

Nestes termos e pelos fundamentos expostos, acordam os Juízes da ...ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa em negar provimento ao recurso.
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Custas a cargo da recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 3 UC, (três unidades de conta)
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Lisboa 11 de Janeiro de 2017


(A. Augusto Lourenço)
(João Carlos Lee Ferreira)



[1]-Cfr. Ac. STJ de 19/6/1996, BMJ 458, 98.
[2]-Cfr. Ac. Trib. Rel. Lisboa de 08.01.2013, disponível em www.dgsi.pt/trl