Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | PEREIRA RODRIGUES | ||
Descritores: | RESERVA DE PROPRIEDADE APREENSÃO DE VEÍCULO | ||
Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 06/22/2006 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | AGRAVO | ||
Decisão: | PROVIDO | ||
Sumário: | I - No caso de venda de veículo com reserva de propriedade, tal reserva tanto se pode destinar a garantir ao vendedor o preço de compra do veículo como a assegurar perante um terceiro as prestações decorrentes de um contrato de mútuo, celebrado entre este e o comprador do veículo, para financiamento do custo do mesmo veículo. Num caso como noutro estamos em face de obrigações contraídas por efeito da aquisição do veículo e que podem facultar a estipulação da reserva da propriedade. II - E o não cumprimento das obrigações que determinaram a constituição da reserva da propriedade facultam ao titular de tal reserva que requeira em juízo a imediata apreensão do veículo III - Assim, verificando-se que um veículo automóvel foi vendido mediante o pagamento de determinadas quantias, a liquidar nos termos de um contrato de financiamento celebrado entre o comprador e a entidade financiadora e que foi constituída reserva de propriedade a favor da entidade financiadora com vista a garantir o pagamento daquelas quantias, o não cumprimento do contrato de mútuo por parte do comprador, faculta ao financiador que requeira a apreensão do veículo, por ocorrer uma situação de incumprimento das obrigações que estiveram na origem da reserva da propriedade. | ||
Decisão Texto Integral: | ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA: I. OBJECTO DO RECURSO. No Tribunal Cível da Comarca de Lisboa, a Instituição Financeira de Crédito A. propôs contra B. os presentes autos de procedimento cautelar de apreensão de veículo, pedindo a apreensão do veículo automóvel de marca "Fiat", modelo "Seicento", com a matrícula …., a abrigo do disposto no art.° 15° do D.L. n° 54/75, de 12 de Fevereiro. Sobre o requerimento veio a recair douto despacho liminar a indeferir a pretensão da requerente, com a seguinte fundamentação: “A requerente limita-se a alegar que o contrato foi resolvido por carta datada de 24 de Novembro de 2005, demandando o requerido na qualidade de instituição de crédito que financiou a aquisição do veículo cuja apreensão requer e alega como fundamento o incumprimento do contrato de financiamento. Dos documentos juntos aos autos, designadamente da certidão de ónus e encargos junta aos autos a fls. 9 consta a inscrição da reserva de propriedade do veículo cuja apreensão se requer a favor do Banco .. A requerente não alega, pois, quaisquer factos atinentes ao contrato de alienação celebrado com o requerido, uma vez que a causa de pedir é somente contrato de financiamento, ou quaisquer factos passíveis de consubstanciar o termos da celebração do contrato de compra e venda entre o requerido e vendedor e, nesse caso, os termos da cessão da posição contratual ou cessão de créditos entre vendedor e requerente/financiadora, não decorrendo dos termos do contrato as condições em que o alienante do veículo "transferiu" para a financiadora a reserva de propriedade, estabelecida como condição suspensiva do contrato de compra e venda. Acresce que dependendo a eficácia da providência da posterior propositura da acção principal para decretamento da resolução do contrato de compra e venda, não pode deixar de se entender que à requerente, como mutuante, não lhe assiste tal direito, uma vez que do incumprimento das obrigações decorrentes do contrato de mútuo apenas lhe assiste o direito de resolver o contrato de mútuo e dessa resolução apenas lhe advém o direito de exigir ao mutuário o capital não reembolsado e eventual indemnização pelo incumprimento do contrato”. Inconformada com a decisão, veio a A. interpor recurso para este Tribunal da Relação, apresentando doutas alegações, com as seguintes CONCLUSÕES: (…) Não houve contra-alegação. Admitido o recurso na forma, com o efeito e no regime de subida devidos, subiram os autos a este Tribunal da Relação, sendo que nada obstando ao conhecimento do agravo, cumpre decidir. A questão a resolver é a de saber | II. FUNDAMENTOS DE FACTO. Os factos a tomar em consideração para conhecimento do agravo são os que decorrem do relatório acima inscrito. | III. FUNDAMENTOS DE DIREITO. Conforme decorre do estabelecido nos art.s 1317º/a), 408º/1 e 409/1 do CC nos contratos de alienação de coisa determinada, a transmissão do direito real opera-se, por regra, por “mero efeito do contrato”. Porém, esta regra é meramente supletiva, na medida em que as partes podem afastá-la, designadamente mediante uma estipulação de ”reserva de propriedade”, também denominada de “pacto de reserva de domínio” (pactum reservati dominii), segundo a qual o alienante pode reservar para si (ou até para terceiro) a propriedade da coisa até ao cumprimento total ou parcial das obrigações da outra parte ou até à verificação de qualquer outro evento (1). A causa de pedir da presente providência mostra-se, assim, suficientemente alegada na petição, pois que consiste ela no contrato de financiamento incumprido e na constituição da reserva da propriedade do veículo a favor do financiador, não sendo relevantes os termos do contrato de alienação do veículo porque em causa não está um eventual incumprimento deste contrato. Daí que se entenda que a douta fundamentação aduzida no despacho sindicado, com o devido respeito, não é de aplicar no caso vertente em que não está em discussão o incumprimento do contrato de compra e venda do veículo, mas sim o do contrato de financiamento daquele. Procedem, no essencial, as conclusões do recurso, sendo de revogar a decisão recorrida. | IV. DECISÃO: Em conformidade com os fundamentos expostos, concede-se provimento ao agravo e revoga-se a decisão recorrida, que deve ser substituída por outra a ordenar o prosseguimento da providência.
Custas pela agravante nos termos do art. 453º/1 do CPC. Lisboa, 22 de Junho de 2006. FERNANDO PEREIRA RODRIGUES FERNANDA ISABEL PEREIRA OLINDO GERALDES
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