Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
54/09.4TJLSB.L1-6
Relator: AGUIAR PEREIRA
Descritores: PROPRIEDADE HORIZONTAL
ENCARGOS DE CONSERVAÇÃO DE PARTES COMUNS
ELEVADORES
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 12/06/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: 1. De acordo com o disposto no artigo 1424º nº 4 do Código Civil não participam nas despesas de conservação e reparação dos ascensores os condóminos cujas fracções não sejam por eles servidas;
2. Situando-se a fracção no rés do chão, no vestíbulo da entrada principal do prédio, e local de onde parte o elevador, os respectivos proprietários não comparticipam nas despesas com o elevador;
3. É anulável a deliberação tomada em assembleia geral de condóminos na parte em que, contra o voto dos respetivos proprietários, se decidiu que a fracção correspondente ao rés do chão comparticiparia nas despesas de reparação e substituição do elevador.
(AP)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Em nome do Povo Português, acordam os Juízes Desembargadores da 6ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

I – RELATÓRIO
a) Alexandra e António, residentes na Avenida (…) – ... em Lisboa propuseram a presente acção declarativa contra:
1. Condomínio do Prédio sito na Avenida (…) em Lisboa, representado pela respectiva administração;
2. Vítor
3. Pedro
4. Joaquim
5. José
6. Isabel
7. Adriano
8. Filomena
9. Maria
10. Susana
11. José
12. Banco
13. Norberto
14. Maria
15. Silvina
16. O – Construções e Projectos, Ldª
17. Fernando
18. Maria
19. João
20. Ana
21. Maria
22. José
23. Maria
24. Vírginia
25. Eduardo
todos melhor identificados nos autos, visando a anulação da deliberação tomada na Assembleia de Condóminos de 17 de Dezembro de 2008 na parte em que inclui numa das catorze fracções a pagar as obras de reparação do elevador a fracção M, correspondente ao rés do chão direito de que os autores são proprietários.
Alegam, em síntese, serem proprietários da aludida fracção correspondente ao rés do chão direito, situada no vestíbulo de entrada do prédio constituído em regime de propriedade horizontal sito na Avenida (…) em Lisboa, sendo igualmente os réus proprietários de fracções do mesmo prédio.
Mais alegam que em Assembleia Extraordinária de Condóminos de 17 de Dezembro de 2008, foi deliberado que a fracção M suportaria as obras de reparação do elevador na proporção da permilagem de todas as fracções, contrariando, sem a revogar, anterior deliberação da Assembleia de Condóminos.
Alegam ainda que a deliberação em causa é contrária ao regulamento do prédio e ao disposto no artigo 1424º do Código Civil.

b) Contestaram o réu Condomínio, para pedir a improcedência da acção, os réus Vítor e Pedro, para invocar a sua falta de interesse processual na lide e o Banco, invocando a caducidade do direito a pedir a anulação da deliberação.

c) Teve lugar uma audiência preliminar.
Considerando-se habilitada para conhecer do pedido a Exmª Juiz proferiu então sentença em que:
1. Julgou parte legítimas os réus Vítor e Pedro;
2. Julgou improcedente a excepção de caducidade invocada pelo réu Banco;
3. Julgou a acção procedente e anulou a deliberação constante da acta numero trinta e seis referente à Assembleia Geral Extraordinária de Condóminos realizada em 18 de Novembro de 2008 e confirmada na Assembelia de Condóminos de 17 de Dezembro de 2008, na parte em que inclui numa das 14 fracçoes a pagar as obras de reparação do elevador a fracção M correspondente ao rés do chão direito de que os autores são proprietários.

d) O réu Condomínio do prédio sito na Avenida (…)em Lisboa interpôs recurso de apelação com efeito devolutivo.
São do seguinte teor as conclusões das respectivas alegações:
“A. O presente recurso é o meio próprio para conhecer das objecções à selecção da matéria de facto assente porque os RR. apenas a conhecem, pela primeira vez, com a notificação da sentença.
B. A matéria de facto assente é obscura e, aparentemente, contraditória devendo, por uma questão de clareza, ter sido dado corno assente que os condóminos podem aceder à casa destinada a habitação de porteiro, localizada na sub-cave do prédio, utilizando o elevador porque é um facto alegado pelos AA. e admitido na Contestação e na audiência preliminar.
C. Tal facto deverá ser levado aos factos assentes ao abrigo da faculdade concedida pelo 712 do Código de Processo Civil.
D. Resulta, de forma clara, do nº 4 do artigo 1424° do CC e de jurisprudência uniforme que as despesas das partes comuns devem ser custeadas por todos os condóminos que tenham a possibilidade ou susceptibilidade de utilizar as partes ou os equipamentos comuns.
E. Um condómino que, objectivamente, esteja em condições de ser servido por elevador não está isento de contribuir para a sua manutenção só porque não quer servir-se do mesmo.
F. Os autores aceitaram essa susceptibilidade ao assumirem o compromisso de, caso quisessem utilizar o ascensor, comparticipariam daí em diante nas despesas e, ainda, reembolsariam o conjunto dos condóminos das despesas que não haviam comparticipado anteriormente.
G. No prédio dos autos, como ficou assente, é servida por elevador uma parte comum, sita na sub cave, destinada a habitação de porteira, utilizada como “sala de condomínio” e que, também, serve de acesso ao logradouro.
H. Os autores têm a possibilidade ou a susceptibilidade de utilizar o ascensor para aceder ao espaço comum destinado a habitação de porteira, designadamente para aceder ao porteiro, caso exista, para com ele tratar de assuntos do prédio; para aceder à sala de condomínio, para assistir a uma reunião ou tratar de assuntos do condomínio; para aceder ao logradouro, por forma a descer menos dois lanços de escadas, o que facilmente se admitirá caso se pretenda transportar algum objecto mais volumoso.
I. E atente-se, como está assente o uso do elevador para acesso a esta parte comum economiza aos condóminos do R/c dois lanços de escadas (do R/c para a cave e, daí, para a sub-cave);
J. A sentença sob recurso ao entender que os proprietários da fracção M não têm possibilidade de utilizar o elevador faz errada interpretação dos factos e incorrecta aplicação do nº 4 do artigo 1424° do CC, que, desta forma viola.
K. A assembleia de condóminos pode deliberar a adopção de um critério equitativo/proporcional em função da regularidade ou da intensidade da utilização das partes comuns, como por exemplo dos diversos lanços das escadas comuns de acesso aos andares superiores.
L. Os condóminos reunidos em assembleia, a pedido dos autores, tendo presente que o uso possível por parte dos proprietários fracção M é, evidentemente, inferior aos dos demais condóminos, decidiram isentá-los da comparticipação para as despesas decorrentes do uso normal do elevador.
M. Os autores apenas foram isentos das despesas correspondentes à manutenção de rotina e às reparações pontuais decorrentes do uso normal dos ascensores e não das despesas extraordinárias, que importem beneficiação e valorização do prédio, como era o caso da despesa em apreço.
N. A obra é muito mais que uma reparação “de rotina” porque, na prática, consiste na substituição do elevador do prédio por um integralmente novo, em todos os seus componentes, excepto na cabine, a conformá-lo com a legislação em vigor, designadamente, o DL 320/2002;
O. Foi decidido isentar da comparticipar as despesas de manutenção 'de rotina' dos condóminos da fracção M, atenta a intensidade da utilização que podem fazer do elevador, mas, porque mantêm a susceptibilidade da sua utilização, deverão contribuir para uma obra, tendo em vista a conformidade com a legislação em vigor, que consiste na substituição do elevador prédio por um novo;
P. O critério seguido pela assembleia de condóminos é perfeitamente razoável e encontra acolhimento na letra do nº 4 do artigo 1424° do CC, e na jurisprudência, na parte em que admite a adopção de um critério equitativo/proporcional em função da regularidade ou da intensidade da utilização.
Q. O facto de os condóminos em assembleia terem decidido isentar os condóminos da fracção M de despesas com manutenção dos elevadores não implicou um reconhecimento, ou representou um indício, de que os seus proprietários não têm a possibilidade de utilização dos elevadores.
R. Os condóminos, deliberando por maioria, não podem alterar a realidade dos factos que é a de que os condóminos da fracção M têm a possibilidade de utilizar o elevador.
S. Ainda que se viesse a entender, o que sem conceder se admite, que a deliberação de 18/11/2008 é revogatória da em 23/05/2006, pela qual decidiu isentar os condóminos da fracção M, tal revogação seria válida porque não é contrária à lei ou a regulamentos anteriores.
T. A, aliás douta, sentença recorrida viola o nº 4 do artigo 1424º e o artigo 1433º, ambos do Código Civil.”
Rematando as conclusões pede o réu apelante a revogação da douta sentença impugnada e a manutenção da deliberação constante da acta nº trinta e seis da assembleia geral de condóminos realizada em 17 de Dezembro de 2008.
e) Os autores, ora apelados, apresentaram contra alegações, em que concluem:
“1) Os factos provados contêm erros materiais que, nos termos do artigo 667º do Código de Processo Civil, podem ser rectificados pelo Juiz a quo, ainda antes da subida do recurso (…);
2) Por lapso de escrita, do facto 10° do saneador sentença consta «A representante da fracção M afirmou que se compromete a fazê-lo» quando devia constar, «A representante da fracção M afirmou que não se compromete a fazê-lo.» (…);
3) A matéria de facto não é obscura. O alegado nos artigos 59° e 62° da PI está provado no facto 22° tendo o tribunal a quo redigido apenas um artigo, uma vez que, o facto alegado no artigo 62° da PI subsume o facto alegado no artigo 59° da PI, pois se todos os condóminos, mesmo os não habitacionais, podem aceder à casa da porteira e se pretenderem, utilizar o elevador, quer isto dizer, que os autores também podem.
4) O que a recorrente pretende é construir a redacção de um novo facto, que diga-se, nada trás de novo à matéria de facto provada. Para tanto, pretende que esse facto seja levado aos factos assentes ao abrigo da faculdade concedida pelo artigo 712º do Código de Processo Civil. No entanto, a recorrente não cumpre o estipulado na alínea a) e b) do artigo 6850 do mesmo código, pelo que, o aditamento deve ser rejeitado.
5) Do artigo 1424º nº 4 do Código Civil, não é possível concluir que o critério a utilizar na repartição das despesas com os ascensores é o da susceptibilidade da utilização comum, antes pelo contrário, deste artigo retira-se que o critério a seguir deverá ser o da susceptibilidade da utilização do ascensor para aceder a uma parte de utilização individual. Foi este o critério acolhido pelo acórdão da Relação de Lisboa de 27-05-2004 (processo 1028/2004 in www.dgsi.pt).
6) No entanto, mesmo que fosse de acolher o critério seguido no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, citado pela recorrente, este não poderia ter aplicação ao caso concreto uma vez que: a) todos os restantes condóminos do prédio cujas fracções, da mesma forma que a fracção dos A.A., não são servidas pelo ascensor, deveriam, igualmente, participar nessas despesas. Decisão que seguisse o referido critério, mas que inclui-se apenas a fracção dos recorridos, excluindo as restantes seria ilegal; b) Vai além da causa de pedir e do pedido; c) Não obstante, actualmente, as reuniões de condóminos ocorrerem na casa da porteira, esta não se destina a uso comum mas a uso individual do porteiro (cf artigo 142° do c.c, e facto n" 4 a pág. 13 e 14 da sentença); d) Todos os condóminos podem aceder à casa da porteira pelas traseiras sem terem necessidade de passar pelas escadas de serviço servidas por elevador.
7) Ao contrário do que a recorrente alega, está provado que os recorridos ficaram isentos de pagar manutenção e reparações do elevador. (…). A alegação de que as reparações de que estavam isentos eram, apenas, as «de rotina», não é mais, do que pretender alterar os factos dados como provados, o que não é admissível. Aliás, se assim não fosse, não faria sentido o compromisso por parte dos recorridos, de que, caso pretendessem usar o elevador, pagariam os valores entretanto dispendidos em reparações. Note-se que estes valores não eram referentes a manutenções, mas apenas a reparações.
8) Do facto de os recorridos se terem comprometido a, caso pretendessem usar o elevador pagar os valores entretanto dispendidos em reparações, não é possível concluir, como pretende a recorrente, que os recorridos aceitaram que estavam em condições de, objectivamente, serem servidos por elevador. É que o critério utilizado pelos recorridos, não é o de poderem utilizar o elevador, uma vez que essa utilização é-lhes possível, nem que seja para visitar um vizinho dum andar superior, mas sim, o da sua fracção ser servida por elevador, o que é diferente, e não pode ser objecto de confusão.
9) A sentença não viola o nº 4 do artigo 1424º e o artigo 1433º, ambos do Código Civil, pelo que deve ser mantida nos exactos termos em que foi proferida”.
g) Colhidos os vistos legais dos Exmºs Juízes Desembargadores adjuntos, cumpre agora apreciar e decidir, ao que nada obsta.

II – FUNDAMENTAÇÃO
a) OS FACTOS
São os seguintes os factos considerados provados, por acordo entre as partes, tal como descritos na douta sentença recorrida:
1. Os autores são proprietários da fracção autónoma designada pela letra «M», correspondente ao r/c Dto., do prédio sito na Avenida , (…) sito em Lisboa.
2. Os 2º e 3º réus são proprietários das fracções autónomas designadas pelas letras «A» e «B» do prédio sito na Av. (…).
O 4º réu é proprietário da fracção autónoma designada pela letra «C» do mesmo prédio.
Os 5º e 6º réus são proprietários das fracções autónomas designadas pelas letras «O», «F», «G» e «8» do mesmo prédio.
Os 7º e 8º réus são proprietários das fracções autónomas designadas pelas letras «E» e «U» do mesmo prédio.
A 9ª ré é proprietária da fracção autónoma designada pela letra «H» do mesmo prédio;
Os 10º e 11º réus são proprietários da fracção autónoma designada pela letra «I» do mesmo prédio;
O 12º réu é proprietário das fracções autónomas designadas pelas letras «J» e «L» do mesmo prédio;
Os 13º, 14º e 15º réus são proprietários da fracção autónoma designada pela letra «N» do mesmo prédio;
O 16º réu é proprietário da fracção autónoma designada pela letra «O» do mesmo prédio;
Os 17º e 18º réus são proprietários da fracção autónoma designada pela letra «P» do mesmo prédio:
Os 19º e 20º réus são proprietários da fracção autónoma designada pela letra «Q» do mesmo prédio;
A 21ª ré é proprietária da fracção autónoma designada pela letra «R» do mesmo prédio;
O 22º réu é proprietário da fracção autónoma designada pela letra «T» do mesmo prédio;
A 23ª ré é proprietária da fracção autónoma designada pela letra «V» do mesmo prédio.
A 24ª ré é proprietária da fracção autónoma designada pela letra «X» do mesmo prédio.
O 25º réu é proprietário da fracção autónoma designada pela letra «Z» do mesmo prédio.
3. Os autores são proprietários do rés-do-chão direito (a que corresponde a fracção «M») do prédio sito na Av. (…), em Lisboa.
4. Conforme consta da escritura constitutiva da propriedade horizontal do prédio, celebrada em 30.05.1984, no Décimo Cartório Notarial de Lisboa, «… tanto o rés-da-chão como os andares se destinam a duas habitações em cada piso, no total de doze habitações servidas por uma escada geral comum, com um ascensor, a partir do vestíbulo da entrada principal do prédio, na porta numero quarenta e seis do arruamento»; consta ainda da mesma escritura que a cave é preenchida por uma ocupação para armazém com entrada através de uma escadaria aberta, em passagem sob o prédio, que corresponde à fracção autónoma designada pela letra «L» e que na sub-cave acham-se duas ocupações para ateliers e a habitação do porteiro, com acesso tanto pela escada de serviço nas traseiras, como pela escada principal do prédio.
5. Existe ainda um logradouro comum onde existem arrecadações que constituem fracções autónomas.
6. Para este logradouro comum, todas as fracções têm saída directa pela porta da cozinha, não existindo no prédio nenhuma porta que sirva de acesso, independentemente, só ao logradouro. Ou seja, o acesso ao logradouro é feito ou pelo portão que dá directamente acesso, pela via pública, ao logradouro, ou através de passagem obrigatória pelo interior das fracções ou pelo interior da casa da porteira.
7. Os autores não são proprietários de nenhuma arrecadação ao nível da cave ou sub-cave, sendo que a sua fracção se situa no vestíbulo da entrada principal do prédio de onde parte o elevador.
8. Consta da "Acta Número Vinte e Nove", referente à Assembleia Geral Ordinária de Condóminos realizada em 10 de Janeiro de 2006, pelas 18:30 horas, e presidida pela Dra. Bárbara (…), e onde estiveram presentes ou representados condóminos representativos de oitenta e um virgula sete por cento do total do capital investido no prédio, correspondente às fracções A, B, C, O, E, F, G, H, I, J, L, M, N, P e Q, sob o "Ponto Três", que: "( ... )
--- A Administradora referiu que alguns condóminos pretendiam ver o Orçamento alterado em termos de imputação de despesas.
Nomeadamente, o Sr. Eng.º Pereira (…) que defendia que as arrecadações deveriam passar a comparticipar em menos despesas, e a Sr.ª Dr.ª Alexandra (…) que considera que os rés-do-chão do prédio deveriam deixar de comparticipar nas despesas do elevador. ( ... )
--- A Sr.ª Dr.ª Alexandra (…) considera que de acordo com o disposto no Código Civil, a possibilidade de acesso à fracção é que leva à obrigação do pagamento dos elevadores. De acordo com a Jurisprudência, apenas se houver arrecadações ou estacionamentos na cave, os rés-da-chão serão obrigados a comparticipar nas respectivas despesas. No caso concreto, o Título Constitutivo da Propriedade Horizontal não prevê a existência de estacionamentos nas traseiras do prédio. Além, disso, o estacionamento existente, para além de convencionado entre os condóminos é precário, uma vez que nem todas as fracções têm lugar de estacionamento nas traseiras todos os anos.
--- Para além do exposto, no seu caso, não utiliza a casa da porteira e o elevador do prédio para aceder à sua fracção, utilizando a escada das traseiras. ( ... )
--- O Sr. Dr. Sousa (…) disse considerar que a condómina do rés-do-chão direito tinha razão mas que o critério dependeria da utilização efectiva do elevador. Por esta razão disse secundar a proposta da Dr.ª (…) desde que o rés-do-chão não utilize o elevador. Sublinhou, no entanto, não ser despiciente para o valor das fracções do prédio o facto da existência do elevador, do estacionamento nas traseiras, etc.
--- O Sr. Eng.º Pereira (…) referiu que o elevador começou a ser imputado aos rés-do chão, a partir do momento em que se fez o estacionamento das traseiras, pelo que a retirada do valor do elevador estaria relacionada com a abdicação da possibilidade de estacionar nas traseiras.
--- A Dr.ª (…) respondeu que no prédio, existe a faculdade de utilização da casa da porteira para aceder às traseiras mas que este não era um acesso feito por uma parte comum.
--- O representante do atelier esquerdo referiu que não via distinção entre o acesso ao estacionamento ou à casa da porteira. O rés-do-chão não pagaria elevadores nos casos em que não havendo partes comuns do prédio com faculdade de acesso pelo elevador, este não o pudesse utilizar. Não é o caso neste prédio.
--- O condómino do 3º Esquerdo sugeriu que este assunto voltasse a ser debatido em próxima Assembleia, a convocar para o efeito, e que a respectiva decisão tenha efeitos retroactivos a Janeiro de 2006.
--- Todos os condóminos presentes acordaram nesta sugestão.
(…)” – conforme documento junto aos autos a fls. 79 a 84 e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
9. Por "Convocatória" datada de 09/05/2006 e subscrita pela Administração, na pessoa da Sra. Bárbara (…), diz-se que:
“Caro Condómino,
“Convoca-se a Reunião Extraordinária do Condomínio do prédio sito na Avenida , (…) em Lisboa, para o próximo dia 23 de Maio de 2006, pelas 14:30h na casa da porteira do prédio, com a seguinte Ordem de Trabalhos:
1º - Divisão do orçamento aprovado pelas Fracções
Discussão e votação da proposta do .... de não pagar manutenção/reparações do elevador. (.,,)
a) Caso à hora marcada não se encontre presente um número de condóminos representativo da maioria do capital investido no prédio, convoca-se desde já nova reunião a realizar no mesmo dia, no mesmo local, às 15h, com a mesma Ordem de Trabalhos.
(…)” – conforme documento junto aos autos a fls. 85 e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
10. Consta da "Acta Número Vinte e Nove", referente à Assembleia Geral Extraordinária de Condóminos realizada em 23/05/2006, pelas 14:30 horas, e presidida pela Dr.ª Bárbara (…), e onde estiveram presentes ou representados condóminos representativos de sessenta e sete virgula quatro por cento do total do capital investido no prédio, correspondente às fracções A, S, D, F, G, I, J, L, M, N, Q, S, T, X e Z que: "( ... )
--- Entrou-se, de seguida, na Ordem de Trabalhos prevista:
--- Ponto 1a): A representante da fracção M (…) referiu ter apresentado anteriormente à Assembleia a sua proposta, pelo que se escusou a repeti-Ia. A Administradora relembrou os presentes que a condómina da fracção M tinha solicitado na última Assembleia a isenção dos pagamentos dos valores referentes à manutenção e às reparações dos elevadores uma vez que, em sua opinião, não tem possibilidade de utilizar os elevadores, visto habitar o rés-da-chão, Quanto ao acesso às traseiras da casa da porteira, considera tratar-se a casa da porteira de uma fracção com vista à habitação de uma porteira e apenas por anuência de todos os condóminos a mesma é utilizada para aceder ao parqueamento das traseiras.
--- Para além desta razão, efectivamente não utiliza o elevador.
--- A representante da fracção M acrescentou que caso venha a necessitar posteriormente, por qualquer razão, de utilizar o elevador, se compromete a pagar todos os valores entretanto despendidos em reparações dos ascensores acrescentados do valor de actualização da moeda, de acordo com a permilagem que lhe cabe.
--- A assembleia questionou a representante da fracção M sobre se também se compromete a constituir sobre esta matéria um ónus em caso de venda da sua fracção a futuro proprietários.
--- A representante da fracção “M” afirmou que não se compromete a fazê-lo.
--- O proprietário da fracção T (Dr. Sousa) afirma não concordar com a constituição do ónus e considera que a decisão da Assembleia deve onerar apenas a representante da fracção M.
--- A Administradora fez um esclarecimento em relação à questão.
Afirma que por princípio os moradores do R/C que não possam utilizar os elevadores não pagam quaisquer valores que envolvam reparação/manutenção. Contudo, caso o possam utilizar já são obrigados a pagar. O critério estipulado por lei é de pagamento sempre que haja possibilidade de utilização.
--- Antes de posta a votação esta questão, o representante da fracção “I” fez uma declaração de não voto que leu à Assembleia.
--- Subscreveram a declaração de não voto os representantes das fracções O, F, G, I, Q e S, perfazendo 17,6% do capital investido.
--- A representante da fracção M (representativa de 5,5%) declarou não querer votar esta questão, uma vez que tinha interesse directo na resolução da mesma.
--- Posta a votação, foi aprovada pela maioria dos votos presentes a proposta da representante da fracção M, com 24,3% de votos favoráveis (fracções A, B, N, T, X, Z), 20% de abstenção (representante das fracções J, L) ( ... )" – conforme documento junto aos autos a tis. 88 a 94 e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
11. Durante o ano de 2008, tornou-se necessária a realização de uma obra de reparação do elevador.
12. Por "Convocatória" datada de 6 de Novembro de 2008 e subscrita pela Administração, na pessoa da Sra. Lenira (…), diz-se que:
“Caro Condómino,
“Convoca-se a Reunião Extraordinária do Condomínio do prédio sito na Avenida , (…), em Lisboa, para o próximo dia 18 de Novembro de 2008, pelas 15 Horas, na casa da porteira do prédio, com a seguinte Ordem de Trabalhos:
1º - Apresentação, discussão e votação do orçamento para a obra a realizar no elevador do Edifício: - Formas de pagamento; Divisão das despesas.
2º Outros assuntos de interesse para os condóminos (…).
Caso à hora marcada não se encontre presente um número de condóminos representativo da maioria do capital investido no prédio, convoca-se desde já nova reunião a realizar no mesmo dia, no mesmo local, às 15.30H, com a mesma Ordem de Trabalhos. (...)" – conforme documento junto aos autos a fls. 95 e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
13. Consta da "Acta Número Trinta e Seis", referente à Assembleia Geral Extraordinária de Condóminos realizada em 18 de Novembro de 2008 pelas 15:00 horas, presidida pela Dr.ª Bárbara (…), e onde estiveram presentes ou representados condóminos representativos de cinquenta e três por cento do total do capital investido no prédio, correspondente às fracções J, L, P, R, S, T, U e V que: "( ... )
--- Relativamente à divisão das despesas o Sr. Dr. (…) considera que esta obra é um benefício para o prédio e que, como tal, a divisão dos valores deverá ser ponderada em função do número de fracções e não pela permilagem. O Sr. Dr. Sousa (…) disse tratar-se de um problema de princípio, uma vez que será introduzido no prédio uma benfeitoria que é quase uma inovação. No que diz respeito à consideração deste equipamento do ponto de vista legal, a lei diz que os elevadores são presumivelmente um bem comum do prédio independentemente da utilização que lhes é dada.
--- O Dr. Sousa (…) referiu que do seu ponto de vista esta é uma situação diversa das simples reparações e manutenções e que deveria ser imputada a todas as fracções que possam utilizar o elevador. Afirmou ainda que não pretendia radicalização de posições.
--- O Dr. Sousa (…) disse ter feito resumo do exposto nesse levantamento podendo concluir que três pontos fundamentais:
1) Indispensabilidade de realização desta obra; aspectos de natureza técnica; escolha da empresa;
2) Acompanhamento da obra
Quem paga a obra: condóminos utilizadores ou todos os condóminos.
(…)
Em relação ao pagamento da mesma obra foi acordado fazer cobrança extraordinária imediata de 30% do valor final da mesma, imputada a 14 condóminos por igual e não pela correspondente permilagem, apesar do Sr. (…) ter sugerido divisão pela permilagem, uma vez que se considera que uma obra desta natureza favorece o imóvel independentemente de todos utilizarem ou não o elevador. Esta deliberação foi aprovada pela unanimidade dos presentes e representados (…) – conforme documento junto aos autos a fls. 96 a 99 e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
14. Por carta datada de 25 de Novembro de 2008, subscrita pela Autora Alexandra (…) e dirigida à Administração do Condomínio do prédio sito na Av. ,(…), e ao cuidado da Sra. Dr.ª Bárbara (…), diz-se que: "( ... )
Acuso a recepção da carta datada de 21 de Outubro de 2008, mas que na realidade é de 21 de Novembro de 2008, que acompanhava as Actas das Assembleias de Condóminos de 21 de Outubro de 2008 e de 18 de Novembro de 2008 (actas nº 35 e 36).
Como estou em desacordo com a deliberação tomada sobre a divisão das despesas com a reparação a realizar no elevador do prédio, pretendo impugnar essa deliberação, pelo que, nos termos facultados pelo artigo 1433º do Código Civil, requeiro a V. Exa. que convoque uma Assembleia Extraordinária, a ter lugar no prazo de 20 dias, com a seguinte ordem de trabalhos:
Ponto único – Revogação da deliberação da Assembleia Geral de Condóminos referente ao modo de distribuição e imputação das despesas com a reparação do elevador. (…)” – conforme documento junto aos autos a fls. 100 e 101 e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
15. No seguimento da recepção da notificação para essa assembleia, a autora mulher teve o cuidado de informar a administradora Dr.ª Bárbara (…), que não ia estar presente na assembleia.
16. De acordo com o artigo 6º do Regulamento do Prédio sito na Av. , (…), que tem como epigrafe, "Despesas comuns", consta que:
“1. As despesas decorrentes da conservação e fruição das partes comuns, do pagamento de serviços de interesse comum ou de quaisquer inovações em partes comuns são repartidas pelos condóminos consoante a regra do artigo 1424º e 1426º do Código Civil.
2. Esta repartição de encargos pode ser alterada, quando ponderosas razões o justifiquem, por deliberação unânime dos condóminos.
3. (…)”.
17. Os autores para entrarem na sua fracção pela porta do prédio, entram directamente para o vestíbulo do prédio de onde parte o elevador e onde se situa a sua fracção.
18. Os autores, assim como todos os condóminos habitacionais podem aceder ao logradouro através da casa da porteira, que se destina a habitação do porteiro, ou pelas portas de acesso ao logradouro.
19. Há alguns anos atrás (data que os autores não sabem precisar) se decidiu em Assembleia de Condóminos que o logradouro fosse organizado de forma a permitir o parqueamento de veículos automóveis dos condóminos, e uma vez que era mais incómodo aos condóminos que moram nos andares superiores, descerem pela escada de serviço até ao logradouro, permitiu-se aos condóminos que utilizassem a casa da porteira como local de passagem.
20. Consta da Acta nº 29, junta aos autos a fls. 88 a 94 e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, de 23 de Maio de 2006, foi dito pela representante da fracção "M", que "caso venha a necessitar, posteriormente, por qualquer razão, de utilizar o elevador, se compromete a pagar todos os valores entretanto despendidos em reparações dos ascensores acrescentados do valor de actualização da moeda, de acordo com a permilagem que lhe cabe."
21. Presentemente a casa destinada a habitação de porteiro, por não existir porteiro, tem sido utilizada para se proceder às assembleias de condóminos.
22. Pelo que todos os condóminos (mesmo os das fracções que não se situam dentro do prédio - como sejam o armazém e as arrecadações) a ela podem aceder e, se assim pretenderem, utilizar o elevador.
23. Em 2008 tornou-se necessária a realização de uma obra no elevador que consiste na instalação e montagem de um ascensor novo em todos os seus componentes, com excepção da cabina, de molde a dar cumprimento à nova legislação sobre ascensores, constante do DL 320/2002, tendo a referida obra sido adjudicada à empresa P... e ....
24. Consta da "Acta Número Trinta e Sete", referente à Assembleia Geral Extraordinária de Condóminos realizada em 17 de Dezembro de 2008, pelas 18:00 horas, presidida pela Dr.ª Bárbara (…), e onde estiveram presentes ou representados condóminos representativos de sessenta virgula oito por cento do total do capital investido no prédio, correspondente às fracções A, B, J, L, M, N, P, R, T, X e Z que:
“( ... ) Assim, foi dada a palavra à Sra. Dr.ª Alexandra (…) que informou ter impugnado a Acta anterior porque no seu entender a obra deve ser paga pelos condóminos utilizadores. O Sr. Dr. Vítor (…) apoiou esta posição que acabara de intervir dizendo que havia impugnado a acta anterior pela mesma razão, como tal, nenhuma das questões abordadas até ao momento lhe diziam respeito e solicitou também entrada na ordem dos Trabalhos.
--- O Sr. Eng.º Barroso (…) lembrou o artigo 1432 do Código Civil que prevê a possibilidade de inclusão de novos pontos na Ordem de Trabalhos, após votação.
--- O Sr. Dr. Sousa (…) disse que não lhe tinha sido dado conhecimento da impugnação feita pelo proprietário das fracções A e B, Sr. Dr. Vítor (…), à Acta em questão, ao que a Administradora respondeu que tendo este condómino impugnado aquele documento com os mesmos argumentos da Sra. Dr.ª Alexandra (…), e tendo sido convocada Assembleia para voltar a abordar o assunto, não lhe parecer necessário fazer correr esta informação antes da realização da mesma.
--- Teve a palavra a Sra. Dr.ª Alexandra (…), proprietária do R/C Direito, para lembrar que a sua fracção ficou isentada de pagar valores referentes a manutenção e reparações do elevador através de deliberação exarada na em Acta nº 30, após ter feito proposta ao condomínio nesse sentido. Esta aprovação teve por base o facto de que a Condómina não utiliza o equipamento em questão e foi frisado que não seria extensível a futuros condóminos. Já a Condómina do R/C Esquerdo, sempre pagou estas despesas de acordo com a sua permilagem, uma vez que é utilizadora.
--- Assim, a Sra. Dr.ª Alexandra (…) expôs os seus dois pontos e vista em relação a este assunto. Referiu que a decisão tomada na última Assembleia de dividir as despesas equitativamente por 14 Condóminos é contra a lei e que para ser aprovada pelo Condomínio necessitaria de ter sido aprovada por unanimidade e através de escritura pública.
--- Foi mencionado que aquando da decisão de divisão desta despesa por 14 fracções, foi ponderado o peso da permilagem face à efectiva utilização dada ao equipamento, optando-se assim pela divisão simples pelo total de fracções.
--- Continuou a mesma Condómina afirmando que a imputação de custas desta obra à sua fracção é ilegal por ir contra uma decisão contrária de Assembleia anterior.
--- O Sr. (…) afirmou que cabe à Dr.ª Barbara (…) não deixar os condóminos tomar decisões ilegais assim como de os informar de decisões tomadas em assembleias anteriores. A Administradora retorquiu que os condóminos foram devidamente informados, durante a última Assembleia, da única deliberação tomada anteriormente no que respeita a despesas de elevadores.
--- A Sra. Dr.ª Alexandra (…) disse que apenas poderia utilizar o elevador para se deslocar até à casa da Porteira que serve de passagem para as traseiras/ estacionamento, sem que seja esse o seu destino na Propriedade Horizontal, não sendo um acesso efectivo ao R/C Direito. Uma vez que todas as habitações têm portas de acesso às traseiras e que não tem lugar nas traseiras para estacionar a sua viatura considera que não tem de pagar o valor da obra de beneficiação do elevador.
--- O Sr. Dr. Sousa (…) teve a palavra para dizer que considera que a condómina acima devia pagar esta obra uma vez que pode utilizar o elevador e porque se entende que esta é uma obra de inovação e de beneficiação para o prédio, mantendo-se sem pagar manutenção ou reparações pontuais que decorrem do uso. Para além disto, foi acrescentado por outro condómino presente que caso o condómino possa usar deve pagar.
--- O Sr. Eng.º Barroso (…) acrescentou que a questão não se prende com o valor a pagar pois caso este fosse dividido por treze fracções em vez de catorze, tal representaria apenas um acréscimo de € 140.00 (cento e quarenta euros) no total a pagar por fracção. A questão prende-se, ao invés, com o princípio da divisão das despesas e a necessidade de esclarecer muito claramente quais os valores a suportar por cada condómino.
--- Posta à votação a alteração ela deliberação de divisão equitativa das despesas da obra do elevador foi decidido passar a imputar estas despesas pela permilagem das fracções. Foi relembrado que, haverá lugar a um pagamento inicial de 30%, assim como uma cobrança aos condóminos em conformidade, e que os restantes 70% serão pagos em 24 meses, sendo cobrados trimestralmente aos condóminos.
--- Seguidamente foi colocada à votação a revogação da deliberação de divisão do custo da obra de beneficiação por catorze fracções. Votou a favor a Sra. Dr.ª Alexandra (…) e abstiveram-se as fracções A e B e o Sr. (…), contra todas as restantes fracções presente e representadas. Assim, foi deliberado manter a decisão de divisão do valor pelas catorze fracções.
--- A Sra. Dr.ª Alexandra (…) referiu que por uma questão de princípio vai impugnar esta decisão até ao final.
--- O Sr. Dr. Macedo (…) disse ter votado a favor não pelo valor em questão mas sim pela amplitude da obra que considera uma inovação para o prédio. --- ( ... )" – conforme documento junto aos autos a fls 248 a 252 e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
B) O DIREITO
Importa agora apreciar as questões a decidir tendo em conta o teor das conclusões das alegações dos recursos interpostos que, como é sabido, e salvo questões de que seja lícito ao Tribunal conhecer oficiosamente, delimitam o respectivo âmbito de conhecimento.
De acordo com as conclusões das alegações apresentadas as questões colocadas prendem-se com a alteração da matéria de facto e, posteriormente, com a violação do disposto no artigo 1424º nº 4 do Código Civil
1. A primeira questão colocada tem a ver com a alteração da matéria de facto ao abrigo do disposto no artigo 712º do Código de Processo Civil, por alegada obscuridade ou contradição na matéria dada como provada na primeira instância.
Quanto a esta questão deve, de forma clara e liminar, dizer-se que, como de resto o próprio apelante admite nas suas alegações, não existe qualquer obscuridade ou contradição na matéria de facto, em especial a relativa aos acessos à casa destinada à habitação do porteiro.
Indo ao cerne das dúvidas colocadas, dos factos dados como assentes e da forma como se encontra redigida tal decisão, resulta claro, em especial da conjugação dos factos, 22, 21 e 4, que à casa destinada à habitação do porteiro, situada na subcave se pode aceder por qualquer um dos seguintes meios: através do elevador, pela escada (interior) principal do prédio e pela escada de serviço nas traseiras.
Tal resulta claramente não só da escritura de constituição da propriedade horizontal como da posição das partes expressas nos articulados, pelo que carece de qualquer fundamento a invocação de contradição ou obscuridade na matéria de facto supra descrita.
2. Vejamos então do impugnado mérito da sentença.
Na presente acção foi pedida a anulação de uma deliberação da assembleia de condóminos do prédio sito na Avenida (…) em lisboa, deliberação essa tomada em 17 de Dezembro de 2008, cujo teor era alegadamente contrário à lei.
Tal pretensão assentava, pois, na previsão do artigo 1433º nº 1 do Código Civil sendo que a ilegalidade da deliberação resultava do facto de contrariar a distribuição dos encargos pelas despesas dos ascensores (artigo 1424º nº 4 do Código Civil), contra a vontade expressa da autora na respectiva assembleia de condóminos.
3. O artigo 1424º do Código Civil, (na redacção introduzida pelo Decreto Lei 267/94 de 25 de Outubro), inserido no capítulo regulador do regime da propriedade horizontal, sob a epígrafe “Encargos de conservação e fruição” tem a seguinte redacção, na parte que agora interessa:
“1. Salvo disposição em contrário, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum são pagas pelos condóminos em proporção do valor das suas fracções.
(…)
3. As despesas relativas aos diversos lanços de escadas ou às partes comuns do prédio que sirvam exclusivamente algum dos condóminos ficam a cargo dos que dela se servem.
4. Nas despesas dos ascensores só participam os condóminos cujas fracções por eles possam ser servidas.”
Ou seja, estando em causa partes comuns do edifício de que só alguns condóminos possam usufruir, a regra geral de comparticipação nas despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns de acordo com o valor de cada uma das frações, é alterada através da consagração legal de isenção de participação nesses encargos ou despesas daqueles condóminos que não as possam utilizar no âmbito da normal utilização da sua fracção.
Como se salienta no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de Fevereiro de 2005, de que foi relator o Juiz Conselheiro Ferreira de Almeida (in www.dgsi.pt) o que releva é o uso que cada condómino pode fazer dessas partes comuns, independentemente do uso que efectivamente faça.
Como se escreve no acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 11 de Outubro de 2001, citado na douta sentença impugnada “a razão de ser da comparticipação dos condóminos nas despesas comuns reside na afectação ou possibilidade de aproveitamento da serventia de certos bens ou serviços ao uso de determinadas fracções do condomínio”. Daí que a obrigação de contribuição nessas despesas não esteja dependente da efectiva utilização mas da possibilidade de utilização das partes comuns no âmbito da fruição da respectiva fracção autónoma.
4. Os autores são proprietários de uma fracção situada no rés do chão, no vestíbulo da entrada principal do prédio de onde parte o elevador e não são proprietários de nenhuma arrecadação ao nível da cave ou sub cave.
No acesso à fracção de que são proprietários os autores não utilizam os elevadores instalados no edifício ou, dito de outro modo, tendo em conta a formulação legal: a fracção situada no rés do chão de que os autores são proprietários não é nem pode ser servida pelos ascensores instalados no edifício sito na Avenida (…) em Lisboa.
Como se escreve na douta sentença impugnada dos factos resulta que os autores entram e saem da sua fracção sem qualquer possibilidade de usarem os elevadores instalados no prédio.
Neste mesmo sentido e versando casos em tudo semelhantes em que a fracção estava situada no ponto de partida do elevador decidiram, por exemplo, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de Fevereiro de 2005, já citado, e o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 23 de Setembro de 2010 (processo 5879/08.5TBCSC.L1-B) de que foi relator o Juiz Desembargador Dr. António Valente.
5. A ser assim, como de facto é, a deliberação tomada pela assembleia de condóminos em 17 de Dezembro de 2008, confirmando anterior deliberação no mesmo sentido, ao impor aos autores, contra sua vontade expressa, uma co-responsabilidade pelo pagamento das despesas de substituição do elevador é anulável nos termos do artigo 1433º nº 1 do Código Civil, por contrária à lei.
Bem andou, por isso, a douta sentença impugnada ao julgar a acção procedente e ao anular a deliberação tomada pela assembleia geral dos condóminos do prédio sito na Avenida (…) em 17 de Dezembro de 2008 na parte em que inclui numa das fracções que deverão suportar a reparação do elevador a fracção “M” correspondente ao rés do chão direito e de que os autores são proprietários.
A apelação improcede, confirmando-se a decisão recorrida.

III – DECISÃO
Por tudo quanto vem de ser exposto, acordam em julgar improcedente a apelação e em confirmar a douta sentença impugnada.
Custas pelo réu apelante.

Lisboa, 6 de Dezembro de 2012

Manuel José Aguiar Pereira
Gilberto Martinho dos Santos Jorge
Maria Teresa Batalha Pires Soares