Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
3439/2007-7
Relator: LUÍS ESPÍRITO SANTO
Descritores: EXPROPRIAÇÃO POR UTILIDADE PÚBLICA
AGLOMERADO URBANO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 12/13/2007
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Sumário: A existência na proximidade do imóvel expropriado de algumas quintinhas com construções habitacionais, que não constituem aglomerado urbano, não permite considerar-se o terreno em causa solo apto para construção ou valorizá-lo tomando em consideração a sua aptidão edificativa

(SC)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa ( 7ª Secção ).

I – RELATÓRIO
A expropriante Brisa – Auto-Estradas de Portugal, S.A., requereu a expropriação por utilidade pública urgente da parcela n.º 11, a destacar do prédio rústico com a área total de 36500 m2, sito no  […] concelho do Montijo, descrito na Conservatória do Registo Predial do Montijo […] parcela essa com a área de 11918 m2, pertencente a Manuel […] e sua mulher Brites […] com vista à construção da auto-estrada A13 Almeirim / Marateca, sublanço Pegões / Marateca.

Por despacho do Secretário de Estado das Obras Públicas foi declarada a utilidade pública, com carácter de urgência, das parcelas de terreno necessárias à construção do sublanço da A13 Pegões / Marateca, identificadas em quadro anexo ao despacho, quer pelo número de parcela, quer pelos proprietários, identificação matricial e predial, bem como área, autorizando-se logo a expropriante a tomar posse administrativa das mesmas.

A expropriante promoveu a realização da vistoria ad perpetuam rei memoriam, a qual teve lugar em 14 de Novembro de 2000 e da qual se lavrou auto ( fls. 37-42 ), a qual foi depois objecto de relatório complementar, por reclamação deduzida pelos expropriados ( fls. 49 ).

A expropriante promoveu igualmente avaliação da parcela, com vista à realização do depósito a que aludem os artigos 10º, n.º 4 e 20º, n.º 1, al. b), ambos do Código das Expropriações[1], tendo efectuado um depósito no valor de 9.851,76 euros ( fls. 54-60v ).
    
Em 27 de Dezembro de 2000, foi lavrado o termo de posse administrativa a favor da expropriante ( fls. 61-61v ).
    
Tendo-se frustrado a aquisição da parcela por via do direito privado, promoveu a expropriante a realização de arbitragem, a qual teve lugar, tendo o colégio arbitral produzido acórdão, com respostas aos quesitos elaborados por ambas as partes, onde atribuíram aos expropriados indemnização no montante correspondente a 8.733,95 euros ( fls. 75-82 ).
    
Em 5 de Setembro de 2001, foi proferido despacho de adjudicação à expropriante, com directa integração no domínio público estadual, da aludida parcela 11, livre de quaisquer ónus e encargos ( fls. 87-87v ), o qual transitou em julgado.
    
Inconformados com o acórdão arbitral, os expropriados interpuseram do mesmo recurso judicial ( fls. 93-99 ), o qual foi admitido ( fls. 111 ), tendo sido oferecida resposta pela expropriante ( fls. 113-116 ).
    
Procedeu-se à avaliação obrigatória a que alude o n.º 2 do art.º 61º do Código das Expropriações, tendo os peritos do Tribunal e o indicado pela expropriante elaborado relatório conjunto ( fls. 184-197 ). O perito indicado pela expropriada ofereceu relatório autónomo ( fls. 198-212 ).
    
Reclamaram os expropriados contra o relatório apresentado pelos peritos do Tribunal e da expropriante  (fls. 220-222 ), tendo tal reclamação sido atendida ( fls. 232 ), o que originou a prestação de esclarecimento adicional, quer pelos peritos do Tribunal e expropriante ( fls. 247 ), quer, sponte sua, pelo perito dos expropriados ( fls. 244-245 ).
    
Notificados para tal, as partes produziram as suas alegações ( fls. 310-316 ), nos termos do art.º 64º do Código das Expropriações.

Foi proferida sentença, na qual se decidiu revogar o acórdão arbitral ; atribuir aos expropriados a indemnização global de vinte e quatro mil, seiscentos e quarenta e cinco euros e nove cêntimos ( € 24.645,09 ) e determinar que esta quantia fosse actualizada desde a data da publicação da declaração de utilidade pública até à data da decisão final do processo, de acordo com a evolução do índice de preços no consumidor, com exclusão da habitação, excepto na parte relativa à quantia já levantada, a qual deve ser actualizada até à data do levantamento, ou seja, 8 de Março de 2002.

Apresentaram os expropriados recurso desta decisão, o qual foi admitido como de apelação ( cf. fls. 354 ).

Juntas as alegações de recurso de fls. 371 a 384, formularam os apelantes as seguintes conclusões :

1ª – A realidade é uma coisa e a ficção é outra e esta está desfasada da lei.
2ª – A construção prevista nos artsº 25º e 26º, do Código das Expropriações de 1999 não se esgota na construção de edifícios, mas abarca também qualquer tipo de construções, as vias, por exemplo.
3ª – Para tudo é necessário inteligência esclarecida, não podendo considerar-se um aproveitamento possível ( armazenamento a céu aberto de materiais e/ou equipamentos ) quando estamos perante um aproveitamento real, efectivo, presente e inscrito no ideal de mercado ( tipo de solo – construção de infra-estrutura viária ). 
4ª – A sentença recorrida contraria os princípios da proporcionalidade, da igualdade e da legalidade, bem como os acórdãos do Tribunal Constitucional nº 52/90 e 267/97, de 19 de Março de 1997.
5ª – Mantém-se, nos seus precisos termos, o requerimento de recurso alegado e concluído em 27 de Setembro de 2001, que aqui se dá como integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
6ª – Igualmente se dão como reproduzidas e integradas as alegações apresentadas em 22 de Abril de 2006, pelos expropriados, nos termos do art.º 64º, do Código das Expropriações de 1999.
7ª – A sentença em crise é nula porque os fundamentos ( a matéria dada como provada ) impunha e perfilava outra decisão baseada na classificação do terreno como solo para outros fins, mas com determinada edificabilidade, razão por que há manifesta nulidade da sentença, mas também erro causados de prejuízo de difícil reparação, porque estamos perante um confisco de um bem, por razões que a inteligência do homem comum não compreende.
8ª – A sentença impugnada é, de todo em todo, uma decisão surpresa contrária à matéria dada como provada, pelo que deve ser revogada/anulada ( art.º 668º, nº 1, alínea c), do Cod. Proc. Civil ). 
 Apresentou a expropriante contra-alegações, pugnando pela manutenção do decidido.

II – FACTOS PROVADOS.

Encontra-se provado nos autos que :
1.  Por carta de 21 de Julho de 2000, a expropriante comunicou aos expropriados a sua resolução de requerer a expropriação por utilidade pública com carácter de urgência de uma parcela de terreno sita […]  concelho do Montijo, propriedade daqueles, com a área de 11.918 m2, a destacar do prédio rústico sito no lugar […] concelho do Montijo, descrito na Conservatória do Registo Predial do Montijo  […] ( fls. 9 ).
2. Por Despacho n.º 16 667-D/2000 (2ª série), datado de 31 de Julho de 2000 e publicado no DR-II n.º 188, de 16 de Agosto de 2000 ( 2º suplemento ), o Secretário de Estado Adjunto das Obras Públicas, declarou a utilidade pública, com carácter de urgência, das expropriações das parcelas de terreno necessárias à construção do sublanço Pegões-Marateca da auto-estrada A 13, autorizando desde logo a Brisa, como expropriante, a tomar posse administrativa das referidas parcelas, entre as quais se encontra a n.º 11, descrita no ponto 1.
3. A parcela n.º 11, com a área total de 11.918 m2, seria destacada do prédio rústico sito no lugar […] concelho do Montijo.
4. Da vistoria ad perpetuam rei memoriam consta, para além da identificação da parcela, que:
a) O solo da parcela é de natureza franco-arenosa;
b) Existia uma zona, com cerca de 3500 m2, a toda a largura da parcela e iniciando a cerca de 80 m da extrema sul que estava inculta;
c) Todo o restante espaço da parcela encontrava-se arborizado com pinheiros mansos e eucaliptos;
d) O terreno, para além de dispor de aptidão para florestação, tem suficiente qualidade para a cultura arvense de sequeiro (pobre);
e) A zona inculta já tem servido para a cultura da aveia e o apascentamento de gado;
f) Nela existem as seguintes espécies arbóreas, misturadas umas com as outras:
i. Pinheiros mansos:
DAP 45 – 1 unid.
DAP 40 – 6 unid.
DAP 35 – 4 unid.
DAP 30 – 18 unid.
DAP 25 – 32 unid.
DAP 20 – 73 unid.
DAP 15 – 37 unid.
DAP 10 – 129 unid.
DAP 5 – 120 unid.

ii. Eucaliptos:
DAP 60 – 1 unid.
DAP 50 – 1 unid
DAP 40 – 3 unid.
DAP 35 – 8 unid.
DAP 30 – 7 unid.
DAP 25 – 20 unid.
DAP 20 – 29 unid.
DAP 15 – 4 unid.
DAP 10 – 42 unid.
DAP 5 – 5 unid.

g) A parcela tem uma configuração irregular e sobrealongada, praticamente no sentido norte-sul, medindo cerca de 190 m de comprimento máximo e tendo uma largura média de 63 m;
h) A sua superfície é, em geral, plana, apresentando inclinações suaves, descendo até cerca de metade do seu comprimento de sul para norte, apresentando depois uma pequena zona quase horizontal, subindo de seguida até à extrema norte;
i) A zona horizontal é a que se encontra inculta;
j) Perto da extrema sul corre um caminho público de acesso aos prédios, em terra batida, desenvolvendo-se no sentido sudeste-noroeste e que, a cerca de uma centena de metros a poente da parcela, passa a ter pavimento em macadame, tratando-se, depois, de uma estrada que vai conduzir à Estrada Nacional n.º 4;
k) Este caminho é dotado de energia eléctrica e de telefone;
l) O sobredito caminho conduz a um outro que margina a parte restante do prédio pelo nascente e que permite fácil acesso à parcela através dessa zona do prédio;
m) A parcela não faz parte de qualquer aglomerado urbano;
n) O aglomerado urbano mais próximo é Santo Isidro de Pegões, que se situa a cerca de 1700 m;
o) Existem, porém, casas mais próximas, uma delas a cerca de 250 m.
5. Por acórdão unânime dos árbitros nomeados pelo Presidente do Tribunal da Relação de Lisboa, o qual classificou a parcela como “ solo para outros fins ”, atribuída a indemnização global de 1.751.000$00, sendo 1.191.800$00 pelo valor do terreno e 560.000$00 pelas benfeitorias aí existentes, as quais consistem unicamente nas árvores existentes.
6. No relatório de avaliação subscrito pelos peritos indicados pelo Tribunal e pela expropriante, foi a parcela considerada “ solo apto para outros fins ”, tendo sido avaliado, tendo em conta o seu estado à data da vistoria ad perpetuam rei memoriam, em função da sua potencialidade para culturas arvenses ou hortícolas, por ter boa aptidão para essas culturas e se tratar de uso mais rentável do que o existente; levou-se em conta o seu rendimento através do arrendamento rural, por ser essa a forma mais frequente da exploração da propriedade rústica na região para prédios submetidos a culturas arvenses ou hortícolas, com recurso à tabela de valores máximos constantes da Portaria n.º 186/2002, de 4 de Março e a uma taxa de capitalização do valor de 3%, assim se obtendo o valor de 55.480 € para o prédio inteiro e 18.115,36 € para a parcela expropriada; as árvores foram avaliadas em 560.000$00, ou seja, 2.793,27 €; tratando-se de expropriação parcelar, consideraram que a parte sobrante não expropriada, embora mantendo viabilidade para a exploração preconizada, fica com dimensão e configuração relativamente menos favorável ao aproveitamento, que computaram em 10%, fixando o valor de 3.736,46 €; não foi computada qualquer indemnização a título de servidão non ædificandi por considerarem que a mesma em nada deprecia a parte sobrante; a final, o valor da indemnização global foi fixado em 24.645,09 €.
7. Em esclarecimento indicaram: a) que a qualificação da parcela como “ solo apto para outros fins ” levou em conta o PDM e as infra-estruturas existentes, nomeadamente a rede eléctrica e telefónica de que o caminho público se encontra dotado; b) que não consideraram qualquer faixa com capacidade edificativa, por tal ser incompatível com o PDM existente e as características da zona; c)  que a taxa de capitalização de 3% foi tomada em conta por ser aquela que, no caso vertente, mais adequadamente relacionava o valor do terreno e rendimento que o mesmo poderia geral anualmente.
8. No relatório de avaliação subscrito pelo perito indicado pelos expropriados, foi a parcela qualificada como “ solo apto para outros fins ”, muito embora a presença, na proximidade, de “ quintinhas ” e das infra-estruturas existentes, deva conduzir ao cálculo de montante indemnizatório tendo em conta a sua capacidade edificativa. Tendo em conta que as “ quintinhas ” têm uma área afecta à construção e a restante como exploração agrícola. À zona com potencialidade edificativa, que avaliou em 4300 m2, atribuiu um valor de 67.935,27 €, já ponderados os factores descritos nas als. a), e) e i) do art.º 26º, n.º 7. do Código das Expropriações, bem como 10 % a título de localização e qualidade ambiental, nos termos do n.º 6 da mesma disposição legal; à zona restante, de 7618 m2, com potencialidade agrícola, foram levados em conta os mesmos parâmetros de avaliação realizadas pelos peritos indicados pelo Tribunal e expropriante, com a diferença da utilização de uma taxa de capitalização de 2,5%, o que originou um valor de 13.864,76 €; logo, o valor do terreno foi avaliado em 81.800,03 €. A área a nascente, de 3760 m2, abrangida pela servidão non ædificandi foi avaliada em 5.158,72 € e a a poente, com 1064 m2, em 6.174 €. A título de benfeitorias, foram as árvores existentes avaliadas em 2793,27 €, valor considerado no acórdão arbitral. Assim, a indemnização global foi computada em 95.926,02 €.
9. Em esclarecimento, indicou que a taxa de capitalização depende da conjuntura do mercado e de outros factores económicos, aproximando-se a taxa de capitalização para explorações agrícolas de 2,5 %, por serem essas as taxas que têm vindo a ser praticadas nos últimos anos pelas entidades bancárias.
10. O prédio rústico de que a parcela 11 faz parte encontra-se abrangido pelo PDM do Montijo, ratificado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 15/97, de 1 de Fevereiro, com capacidade de uso “classes C e D” estando o terreno, na sua maior parte classificado como “Espaço Florestal – Área de Floresta de Produção” e numa área menor como “Espaço Agrícola não integrado na RAN”.

III – QUESTÕES JURÍDICAS ESSENCIAIS.

São as seguintes as questões jurídicas que importa dilucidar :

1 – Invocados vícios da sentença recorrida.
2 - Do valor da indemnização devida aos expropriados.

Passemos à sua análise :

1 – Invocados vícios da sentença recorrida.

Alegam os recorrentes que a sentença em crise é nula porque os fundamentos ( a matéria dada como provada ) impunha e perfilava outra decisão baseada na classificação do terreno como solo para outros fins, mas com determinada edificabilidade, razão por que há manifesta nulidade da sentença, mas também erro causados de prejuízo de difícil reparação, porque estamos perante um confisco de um bem, por razões que a inteligência do homem comum não compreende.

A sentença impugnada é, de todo em todo, uma decisão surpresa contrária à matéria dada como provada, pelo que deve ser revogada/anulada ( art.º 668º, nº 1, alínea c), do Cod. Proc. Civil ). 

Apreciando :

É absolutamente óbvia a falta de razão dos recorrentes neste ponto.

Inexiste qualquer dos vícios apontados.

Na sentença sob recurso o juiz a quo limitou-se a tomar em consideração os factos provados - que resultaram, mormente, das respostas aos quesitos proferidas pelos peritos e que constam dos laudos apresentados -, e a proceder ao seu enquadramento de direito – que se teve por mais adequado -, fundamentando desenvolvidamente as conclusões jurídicas aí expostas.

Não há, portanto, qualquer contradição entre os fundamentos e a decisão que, com base neles, foi proferida, verificando-se, diferentemente, uma natural e legítima discordância dos apelantes quanto ao mérito da sentença sob recurso.

Outrossim, não há qualquer “ decisão surpresa “[2] que justifique a nulidade arguida pelos expropriados.

É descabida e despropositada a referência à existência duma situação de “ confisco expropriativo “, uma vez que se discute nestes autos, no plano puramente jurídico, o quantum indemnizatório devido aos expropriados, sendo plenamente natural e plausível que esta temática seja apreciada por perspectiva diversa e antagónica da sustentada pelos apelantes[3].

2 - Do valor da indemnização devida aos expropriados.

O conhecimento da apelação incidirá essencialmente sobre a determinação da justa indemnização a atribuir ao expropriado, no âmbito do presente processo expropriativo, pela privação do bem de que era proprietário.

Dispõe o art.º 23º, nº 1, do Código das Expropriações : “ A justa indemnização não visa compensar o benefício alcançado pela entidade expropriante, mas ressarcir o prejuízo que para o expropriado advém da expropriação, correspondente ao valor real e corrente do bem de acordo com o seu destino efectivo ou possível numa utilização económica normal, à data da publicação da declaração de utilidade pública, tendo em consideração as circunstâncias e condições de facto existentes naquela data. “.

O cálculo da referida indemnização terá necessariamente que resultar dos critérios definidos e balizados no Código das Expropriações.

Ora,

Nos termos e para os efeitos do art.º 25º, do Código das Expropriações, foi a parcela expropriada qualificada, por todos e cada um dos peritos nomeados[4], como “ solo para outros fins “ ( alínea b) ), por não se integrar reconhecidamente no conceito de “ solo apto para construção “ ( alínea a) ).

Assim sendo,

O regime concernente ao cálculo do seu valor obedece ao critério enunciado no art.º 27º, do Código das Expropriações.

Dispõe o nº 1, deste preceito legal, que :
“ O valor do solo apto para outros fins será o resultante da média aritmética actualizada entre os preços unitários de aquisições e avaliações fiscais que corrijam os valores declarados efectuadas na mesma freguesia e nas freguesias limítrofes nos três anos, de entre os últimos cinco, com a média anual mais elevada, relativamente a prédios de idênticas características, atendendo aos parâmetros fixados em instrumento de planeamento territorial e à sua aptidão específica.”.

Acrescenta o nº 3 :
“ Caso não se revele possível aplicar o critério estabelecido no nº 1, por falta de elementos, o valor do solo para outros fins será calculado tendo em atenção os seus rendimentos efectivo ou possível no estado existente à data da declaração de utilidade pública, a natureza do solo e do subsolo, a configuração do terreno e as condições de acesso, as culturas predominantes e o clima da região, os frutos pendentes e outras circunstâncias objectivas susceptíveis de influir no respectivo cálculo. “.

Não obstante,

Entendem os recorrentes que, embora considerem que a parcela em causa deve ser classificada como “ solo para outros fins “, não se pode deixar de ter em consideração a sua capacidade edificativa, pela envolvente e pela proximidade de bairros, “ quintinhas “ e construções existentes.

Salientam, concretamente que no lugar onde se situa a parcela existem algumas quintas com construções habitacionais e a cerca de 200 metros situa-se a construção mais próxima da povoação de Pegões Velhos ( situando-se o aglomerado de Santo Isidro de Pegões a cerca de 1.700 metros ).

Mais acrescentam que a construção prevista nos artsº 25º e 26º, do Código das Expropriações de 1999, não se esgota na construção de edifícios, mas abarca também qualquer tipo de construções, as vias, por exemplo, tendo o terreno expropriado, não obstante a sua qualificação como “ solo para outros fins “, determinada edificabilidade.

Encontra-se provado, a este propósito, que :

Perto da extrema sul corre um caminho público de acesso aos prédios, em terra batida, desenvolvendo-se no sentido sudeste-noroeste e que, a cerca de uma centena de metros a poente da parcela, passa a ter pavimento em macadame, tratando-se, depois, de uma estrada que vai conduzir à Estrada Nacional n.º 4, sendo este caminho é dotado de energia eléctrica e de telefone.

O sobredito caminho conduz a um outro que margina a parte restante do prédio pelo nascente e que permite fácil acesso à parcela através dessa zona do prédio.

A parcela não faz parte de qualquer aglomerado urbano, sendo que o mais próximo é Santo Isidro de Pegões, que se situa a cerca de 1700 m;

Existem, porém, casas mais próximas, uma delas a cerca de 250 m.

O prédio rústico de que a parcela 11 faz parte encontra-se abrangido pelo PDM do Montijo, ratificado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 15/97, de 1 de Fevereiro, com capacidade de uso “ classes C e D ” estando o terreno, na sua maior parte classificado como “ Espaço Florestal – Área de Floresta de Produção ” e numa área menor como “ Espaço Agrícola não integrado na RAN ”.

Apreciando :

Não se vê fundamento na lei para, relativamente à situação sub judice, tomar em consideração a invocada aptidão edificativa da parcela expropriada.

Como se disse supra, à luz do critério estabelecido no art.º 25º, do Código das Expropriações, o terreno em causa não é passível de ser considerado como solo apto para a construção.

A mera existência de um caminho de terra batida, que dispõe de energia eléctrica e telefone, passando depois a estrada que conduz à E. N. 4, não satisfaz, a nosso ver, os requisitos exigidos na alínea a), do art.º 25º, do Código das Expropriações, onde se prevê, cumulativamente[5], “ acesso rodoviário e de rede de abastecimento de água, de energia eléctrica e de saneamento, com características adequadas para servir as edificações nele existentes ou a construir “.[6]

Também não é pelo facto de existirem nas proximidades diversas construções, denominadas pelos recorrentes de “ quintinhas “ – não constituindo, porém, um aglomerado urbano -, que poderá entender-se que o imóvel detinha, à data da declaração de utilidade pública, e para estes concretos efeitos, aptidão edificativa[7].

Basta ler o que consta a este respeito do auto da vistoria ad perpetuam rei memoriam, a fls. 37 a 39, para se concluir que o terreno reveste aptidão para a florestação e cultura arvense, de aveia e apascentamento de gado – não se destinando, de modo algum, à construção.

Esta era, em 14 de Novembro de 2000, a realidade, sendo o contrário pura ficção ou exercício de irrelevante futurologia.

Outrossim não colhe a argumentação expendida pelos recorrentes no sentido de que “A construção prevista nos artsº 25º e 26º, do Código das Expropriações de 1999 não se esgota na construção de edifícios, mas abarca também qualquer tipo de construções, as vias, por exemplo. “.

Não se vislumbra na lei o menor apoio para tal conclusão jurídica, sendo certo que o art.º 26º, do Código das Expropriações, pressupõe a qualificação da parcela expropriada como “ solo apto para a construção “, em resultado da aplicação do critério legal definido no preceito antecedente – o qual não contemplou, como se viu, o terreno em apreço.

Também não é aceitável a afirmação produzida pelos recorrentes nas suas alegações no sentido de que “ o terreno expropriado deve ser avaliado de acordo com a sua capacidade para produzir riqueza e a efectiva rentabilidade do projecto expropriante, com o consequente valor económico que tem para a entidade que o explora “.

Com efeito,

É, desde logo, o art.º 23º, nº 1, do Código das Expropriações, que esclarece que a justa indemnização a atribuir ao expropriado não se destina a compensar o benefício alcançado pela entidade expropriante.

O que está em causa, diferentemente, é o ressarcimento do prejuízo que advém para o expropriado com a privação do seu bem, aferido pelo valor real e corrente de acordo com o seu destino efectivo ou possível numa utilização económica normal, à data da declaração de utilidade pública.

Ora,

Consta da vistoria ad perpetuam rei memoriam, realizada no dia 14 de Novembro de 2000, que a parcela em apreço revestia a natureza de prédio rústico, tendo aptidão para a florestação e qualidade para a cultura arvense de sequeiro, sendo, na sua maior parte de “ área de floresta de produção “ e uma pequena parte de “ área agrícola não incluída na RAN “ ; não existiam, no interior da parcela, quaisquer construções, benfeitorias, ou infra-estruturas ; não fazendo parte de qualquer aglomerado populacional ( cfr. fls. 37 a 39 ).

Por outro lado,

O prédio rústico de que a parcela 11 faz parte encontra-se abrangido pelo PDM do Montijo, ratificado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 15/97, de 1 de Fevereiro, com capacidade de uso “ classes C e D ” estando o terreno, na sua maior parte classificado como “ Espaço Florestal – Área de Floresta de Produção ” e numa área menor como “ Espaço Agrícola não integrado na RAN ”, o que naturalmente impede a urbanização da mesma parcela.

Estes elementos de facto – objectivos e irrefutáveis - são claros e inequívocos no sentido de não poder ser considerada, para efeitos de atribuição de indemnização aos expropriados - face aos critérios legais vigentes -, a invocada aptidão edificativa da parcela em causa[8].

Não se descortina[9], ainda, qualquer violação de princípios de consagração constitucional, particularmente o da igualdade e da proporcionalidade[10].  

A sentença recorrida encontra sólida e exaustivamente fundamentada, concordando-se inteiramente com toda a argumentação dela constante, que foi ao encontro do conteúdo do laudo maioritário, elaborado pelos peritos nomeados pelo Tribunal e pela entidade expropriante, para a mesma se remetendo nos termos e para os efeitos do art.º 713º, nº 5, do Cod. Proc. Civil, mormente quanto à inaplicabilidade ao caso do disposto no art.º 26º, nº 12, do Código das Expropriações[11] e à inexistência de fundamento legal para a atribuição aos expropriados de qualquer montante indemnizatório por danos decorrentes do impacto ambiental[12] ; do duplo fraccionamento do prédio, em virtude da expropriação de outras parcelas e, finalmente, pela constituição de servidões non aedificandi.

A apelação terá necessariamente que improceder.

O que se decide, sem necessidade de outras considerações ou desenvolvimentos.

IV - DECISÃO :
 Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação, confirmando a sentença recorrida.

Custas pela apelante.

Lisboa, 13 de Dezembro de 2007.

( Luís Espírito Santo )

 ( Isabel Salgado)

  ( Roque Nogueira ).


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[1] Aprovado e publicado em anexo à Lei n.º 168/99, de 18 de Setembro.
[2] Nem sequer se percebe bem a que tipo de “ surpresa “ se referem os apelantes.
[3] Sem que nada justifique os deselegantes epítetos de “ forma clássica antiquada “ ; “ análise judicial pró expropriante/Estado/Município/Empresas Públicas e contra cives “ ; “ raciocínio antiquado e completamente enviesado “ com que os expropriados/recorrentes, através da ilustre mandatário judicial constituída, entenderam por bem brindar a decisão judicial que lhes foi ( parcialmente ) desfavorável.
[4] Tanto no relatório junto a fls. 184 a 189, subscrito pelos peritos nomeados pelo Tribunal e pela expropriante, como no de fls. 198 a 205, subscrito pelo perito Mário José Roncon Santos, indicado pelos expropriados - onde se pode ler : “ …considerando-o “ solo para outros fins “, não desprezando, no entanto, a sua capacidade edificativa, uma vez que a parcela se insere numa zona de “ quintinhas “.”.
[5] Em sentido oposto vide Osvaldo Gomes, in “ Expropriações por Utilidade Pública “,  pag. 187.
[6] No mesmo sentido, vide acórdão da Relação de Lisboa de 13 de Julho de 2005 ( relator Salazar Casanova ), in www.dgsi.pt.
[7] Vide acórdão da Relação de Évora de 20 de Janeiro de 2006 ( relator Verdasca Garcia ), publicado in Colectânea de Jurisprudência, edição “ Expropriações por Utilidade Pública “,  pags. 334 a 337.
[8] Conforme se sublinha no acórdão da Relação de Évora de 18 de Maio de 2006 ( relator Rui Moura ), publicado in Colectânea de Jurisprudência, edição “ Expropriações por Utilidade Pública “,  pags. 378 a 380 : “ …só quando os terrenos expropriados envolvam uma muito próxima ou efectiva potencialidade edificativa é que se impõe constitucionalmente que na determinação do valor do terreno expropriado se considere o jus edificandi entre os factores de valorização. Tal, porém, não acontece quando essa potencialidade edificativa seja uma realidade e não também quando seja uma simples possibilidade abstracta sem qualquer concretização nos planos municipais de ordenamento. “. No mesmo sentido, vide acórdão da Relação de Coimbra de 11 de Fevereiro de 2003 ( relator Serra Batista ), publicado in Colectânea de Jurisprudência, edição “ Expropriações por Utilidade Pública “,  pags. 275 a 277.
[9] Nem os recorrentes a explicitam de forma compreensível.
[10] Relativamente ao posicionamento do Tribunal Constitucional sobre esta temática o elucidativo acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 5 de Maio de 2005 ( relator Borges Soeiro ), publicado in Colectânea de Jurisprudência, edição “ Expropriações por Utilidade Pública “,  pags. 355 a 358.
[11] Conforme se refere no acórdão da Relação de Guimarães de 11 de Julho de 2005, publicado in Colectânea de Jurisprudência, edição “ Expropriações por Utilidade Pública “,  pags. 364 a 366, um dos pressupostos da aplicação do artº 26º, nº 12, do Código das Exprpriações, é que os solos sejam previamente classificados como aptos para construção.
[12] Vide acórdão da Relação do Porto de 4 de Novembro de 2004 ( relator João Bernardo ) e acórdão da Relação de Guimarães de16 de Março de 2005 ( relator António Magalhães ), ambos publicados in Colectânea de Jurisprudência, edição “ Expropriações por Utilidade Pública “,  pags. 324 a 327 e 341 a 344, respectivamente.