Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
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| Relator: | SALAZAR CASANOVA | ||
| Descritores: | PENHORA PENSÃO COMPLEMENTAR DE REFORMA | ||
| Nº do Documento: | RL | ||
| Data do Acordão: | 09/19/2007 | ||
| Votação: | DECISÃO INDIVIDUAL | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Meio Processual: | AGRAVO | ||
| Decisão: | CONCEDIDO PROVIMENTO | ||
| Sumário: | I- A penhora do crédito a que se referem apólices inerentes a Planos de Poupança Reforma é admissível II- O tribunal, requerida a penhora de crédito “com resgate imediato dos créditos emergentes dos contratos de seguro relativos às apólices identificadas”, deve ordená-la, determinando a notificação pessoal do devedor nos termos do artigo 856.º do Código de Processo Civil com a cominação do n.º3 do mesmo preceito. | ||
| Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: 1. No âmbito da execução instaurada por I […] SA em que são executados A. […] Lda., Luciano […] foi nos autos prestada infirmação de que Luciano […] é titular de apólice nº […] na […]-Companhia […] de Seguros […] SA inerente a um Plano Poupança Reforma e que Maria […] é titular de apólice nº […] na […] Companhia […] de Seguros […] inerente a um Plano Poupança Reforma. 2. A exequente requereu a penhora com resgate imediato dos créditos emergentes dos contratos de seguro relativos às apólices identificadas, pedindo, para o efeito, que se oficiasse à mencionada Companhia de Seguros. 3. O requerimento foi indeferido com o fundamento de que não tem fundamento legal face ao disposto no artigo 4.º a contrario do Decreto-lei n.º 158/2002, de 2 de Julho 4. Interposto recurso de agravo, sustentou a recorrente na sua minuta que o diploma em apreço, no que respeita às condições de reembolso, vale em relação às partes no âmbito da relação contratual; não tem o exequente, alheio à relação contratual, que aguardar, tratando-se de penhora de crédito, pela data do respectivo vencimento. 5. A questão em causa desdobra-se em duas sub- questões: saber em primeiro lugar se a penhora de fundos de PPR é admissível; depois, saber se , correspondendo o regime da penhora a uma efectiva penhora de créditos, o devedor, ou seja, a entidade à ordem da qual o fundo de poupança se encontra depositado, tem de o resgatar imediatamente. 6. As entidades gestoras dos fundos de poupança dispõem efectivamente de valores de que são depositárias e que estão obrigadas a resgatar nos termos da lei: ver artigos 1º a 4º do Decreto-lei n.º 158/2002, de 2 de Julho. 7. Os executados que dispõem de planos de poupança são efectivamente credores das entidades que dispõem de fundos que administram e gerem. 8. Nada obsta, por isso, à penhora dos créditos. 9. A penhora de créditos consiste na notificação ao devedor de que o crédito fica à ordem do agente de execução (artigo 856.º/1 do C.P.C.). 10. Cumpre ao devedor declarar se o crédito existe, quais as garantias que o acompanham, em que data se vence e quaisquer outras circunstancias que possam interessar à execução. 11. De facto, a partir do momento em que o fundo de poupança se constitui entrelaçam-se depositante e entidade depositária dos fundos numa teia de relações concretizadas na lei. 12. Se é verdade que o titular do PPR dispõe de um crédito sobre a entidade gestora, não é menos verdade que a respectiva penhora se há-de sujeitar ao regime que tenha sido estipulado, nos casos em que o crédito resulta de convenção, ou ao regime legalmente imposto quando não haja convenção ou quando esta não possa afastar o regime legal na parte em que este seja imperativo. 13. Como a penhora se traduz na notificação pessoal do devedor, há-de entender-se que “ o crédito fica à ordem do tribunal de execução, de sorte que o devedor não se exonera se pagar ao executado. Isto equivale a dizer que o crédito se considera apreendido para a execução; o devedor só se exonera mediante o pagamento à pessoa que o tribunal designar” (Processo de Execução, José Alberto dos Reis, Vol II, pág. 191). 14. Isto, no entanto, não significa que a penhora imponha uma exigibilidade imediata do crédito nos casos em que o crédito não tem vencimento imediato. 15. Por isso, logo que a dívida se vença, o devedor que não a haja contestado é obrigado a depositar a respectiva importância nos termos referidos no artigo 860.º/1 do C.P.C. 16. O exequente considera que o crédito pode ser resgatado imediatamente. E, por isso, não se limitou a pedir ao Tribunal a penhora do aludido crédito, pediu ainda a penhora com indicação de resgate imediato. 17. Afigura-se-nos que o Tribunal não pode deixar de ordenar a penhora nos termos requeridos. 18. Outra coisa, diversa, é a de saber se um tal entendimento deve prevalecer. 19. O Tribunal, deferindo a penhora, abre a sequência processual a que aludem os artigos 856.º e seguintes do Código de Processo Civil. 20. Tratando-se de bem ou direito impenhorável é certo que o Tribunal não pode ordenar a penhora. Não é este o caso. 21. Assim sendo, à luz dos termos em que o requerimento é apresentado, o Tribunal não pode deixar de deferir a pretensão do exequente. 22. Pode dar-se inclusivamente o caso de o devedor, uma vez notificado, nada dizer, entendendo-se que ele reconhece a obrigação, nos termos da indicação do crédito à penhora (artigo 856.º/3 do C.P.C.). 23. Se o devedor sustentar que o crédito não é imediatamente resgatável, há-de declarar a data em que o crédito se vence e, face a tal declaração, o Tribunal ou determina o depósito em conformidade com a declaração ou determina o depósito imediatamente se considerar que o resgate é imediato. 24. Não nos parece, portanto, que o litígio, quanto a este ponto, se abra neste momento. 25. A decisão recorrida considerou que o resgate imediato ofende o princípio da liberdade contratual. O resgate imediato traduzir-se-ia numa imposição coerciva da antecipação dos efeitos do contrato. 26. O recorrente sustenta que o regime legal vale nas relações entre devedor/credor, não vale relativamente à penhora que é acto do Estado. 27. Cabe, no entanto, desde logo, interrogarmo- -nos sobre se os executados e a entidade gestora dos fundos depositados estipularam que o resgate só se poderia efectuar a partir de um determinado momento ou sob determinadas condições, afastando o regime legal e, a ser assim, se uma tal convenção é válida. Com efeito, a lei intervém na fixação do regime de tais fundos, o que se compreende visto que dele derivam benefícios fiscais para os titulares de tais poupanças, admitindo a faculdade de resgate que poderá ser objecto de acordo entre as partes. Uma coisa, porém, é o acordar-se quanto aos termos em que o resgate se efectiva, outra é impedir-se o resgate, situação que se traduziria já no afastamento de uma possibilidade reconhecida por lei. 28. Se nos situarmos no plano do regime fixado no Decreto-lei n.º 158/2002, de 2 de Julho, verificamos que a lei não afasta a possibilidade de o titular do fundo de poupança (PPR, no caso) o resgatar quando quiser conforme prescreve expressamente o artigo 4.º/5 que diz: “ fora das situações previstas nos números anteriores o reembolso do valor PPR/E pode ser exigido a qualquer tempo, nos termos contratualmente estabelecidos e com as consequências previstas nos nºs 4 e 5 do artigo 21º do Estatuto dos Benefícios Fiscais” . 29. A jurisprudência tem decidido que na acção executiva, por força da substituição do Tribunal ao devedor, o Estado pode exigir o resgate do crédito nos mesmos termos em que o devedor o poderia fazer. A vontade deste é substituída pela vontade do Estado que actua munido de jus imperii e isto não colide com o regime contratual visto que é de acordo com esse regime que o Estado exige o resgate imediato: ver Ac. da Relação de Lisboa de 23-6-005 (António Valente) in www.dgsi.pt, Ac. da Relação do Porto de 20-12-2005 (Henrique Araújo) C.J.,5, pág. 209, Ac. da Relação de Guimarães de 22-3-2006 (Pereira da Rocha), C.J.,2, pág. 268, Ac. da Relação do Porto de 23-10-2006 (Fonseca Ramos) também in www.dgsi.pt. Concluindo: I- A penhora do crédito a que se referem apólices inerentes a Planos de Poupança Reforma é admissível II- O tribunal, requerida a penhora de crédito “com resgate imediato dos créditos emergentes dos contratos de seguro relativos às apólices identificadas”, deve ordená-la, determinando a notificação pessoal do devedor nos termos do artigo 856.º do Código de Processo Civil com a cominação do n.º3 do mesmo preceito. Decisão: concede-se provimento ao recurso determinando-se que o Tribunal ordene a penhora nos termos requeridos Lisboa, 11 de Outubro de 2007 (Salazar Casanova) (Silva Santos) (Bruto da Costa) |